Educação no RJ: as ações por trás do sucesso

Entrevista com Antonio Neto, Subsecretário de Gestão de Ensino da Seeduc

por Cristiane Brasileiro

A entrevista desta semana tem um valor especial, pois se relaciona diretamente com o notável resultado do RJ no último Ideb, no qual o estado passou para a quarta posição no ranking nacional (depois de ter estado na penúltima colocação, há apenas três anos). Para buscarmos destrinchar as ações que estão por trás dessa alavancada notável, entrevistamos Antonio José Vieira de Paiva Neto.

Aos 49 anos, ele é professor de Sociologia formado em Ciências Sociais e Direito. Entrou para rede estadual em 1993, no Programa dos CIEPs, para lecionar nos Ginásios Públicos Estaduais. Com o fim do Programa, passou a atuar como professor de Sociologia e Direito no curso técnico do Centro Interescolar Estadual Miécimo da Silva, onde se tornou Diretor em 2004. Convidado para ser Coordenador do Ensino Médio Estadual em 2008, logo se tornou Diretor Geral de Educação, chegando à Subsecretaria de Gestão do Ensino em 2011, a convite do Secretário Wilson Risolia.

Vejamos, então, o que ele tinha a nos dizer a respeito das ações mais relevantes que estiveram por trás da elevação dos resultados da Educação no RJ – e, muito especificamente, dentro da rede pública estadual. Um panorama especial, elaborado para esta entrevista, com detalhes de um esforço que catalisou os esforços de milhares de profissionais e algumas parcerias estratégicas inovadoras.

Considerando os resultados extraordinários do RJ no último Ideb, a que ações você atribuiria esse sucesso, falando em termos mais sintéticos?

Para falarmos de resultados, precisamos contar um pouco da nossa história. Na prática, iniciamos um grande trabalho de reestruturação administrativa e pedagógica na Educação. O quadro de precarização e desorganização administrativa da educação do estado nos últimos 20 anos produziu um cenário de ineficiência com impacto direto na vida de milhares de jovens e adultos de nosso estado. Dentro desse contexto, fizemos um trabalho de diagnóstico da nossa rede que se desdobrou em um Planejamento Estratégico estruturado em cinco frentes de ações, a saber: políticas de ensino, de gestão de pessoas e valorização, de orçamento e infraestrutura, de transparência e comunicação e, principalmente, políticas de gestão e meritocracia.

Portanto, o resultado do último IDEB da rede estadual do Rio de Janeiro decorreu de um Planejamento Estratégico composto de uma série de ações articuladas a partir das cinco frentes mencionadas anteriormente. Todas as ações foram pensadas com o claro objetivo de elevar o nível de aprendizagem dos alunos da rede.

Entre as ações mais estruturantes do Planejamento, aquelas relacionadas à dimensão de Ensino foram especificamente as que mais impactaram no resultado. Pois a desorganização do Ensino, resultante da falta de Orientação Pedagógica e de padrões mínimos de aprendizagem nas escolas e acompanhamento da gestão escolar eram as grandes causas para os péssimos indicadores que chegamos a ter.

Ao longo desse trabalho prévio de diagnóstico, quais foram os principais problemas do ensino na rede estadual que foram detectados por vocês?

A partir daquele diagnóstico realizado, conseguimos visualizar os principais problemas da nossa rede.  Entre eles, estavam:

  • 63% dos alunos do Ensino Médio com dois ou mais anos de atraso escolar;
  • pior Indicador de fluxo escolar do Brasil (ou seja, maior nível de reprovação e abandono escolar com aprovação muito reduzida, apenas 50 % dos alunos matriculados na 1ª série do Ensino Médio conseguia terminar essa etapa de escolaridade);
  • existência de funções pedagógicas ocupadas por indicação política (diretores de Escola, Coordenadores Regionais e demais funções estratégicas com indicações pouco transparentes);
  • equipe técnico-pedagógica precária nas Escolas (falta de profissionais de apoio, escriturários, inspetores de alunos, coordenadores pedagógicos etc);
  • carência de 11 mil professores na rede;
  • professores desestimulados;
  • ausência de monitoramento da Gestão Escolar;
  • desorganização do ensino com falta de Orientação Pedagógica nas escolas (na prática, cada escola e mesmo cada professor decidia o que cada turma iria estudar, ou seja, total falta de padrões mínimos de aprendizagem).

Você poderia, agora, detalhar um pouco mais as ações que você considerou como fundamentais para o alcance do resultado atual refletivo no Ideb?

Todas as grandes ações já mencionadas, por estarem articuladas, foram importantes para o alcance do resultado, mas eu gostaria de destacar que a dimensão do Ensino realmente configurou-se como uma das mais relevantes nesse processo. Entre as ações dessa dimensão, podemos citar:

  • Criação de um Currículo Mínimo para todas as etapas de escolaridade;
  • Programa de Formação Continuada para professores regentes;
  • Novo Sistema de Avaliação Externa (SAERJ) que incorporou a avaliação diagnóstica bimestral;
  • Criação de Programa de Reforço Escolar;
  • Programa de Tecnologia com material digital disponível para professores;
  • Programa de Leitura com material e formação para 900 Agentes de Leitura;
  • Reestruturação da Educação de Jovens e Adultos (EJA);
  • Programa de Correção de Fluxo;
  • Programa de Formação para Gestores da Educação (da sede e das escolas);
  • Introdução da GIDE (gestão integrada da escola), metodologia de gestão escolar com a criação da função do Agente de Acompanhamento da Gestão Escolar (são 250 AAGEs que acompanham semanalmente as atividades escolares para orientar a gestão escolar com objetivo de elevar a aprendizagem dos alunos);
  • Criação das funções de Coordenadores Pedagógicos e Orientadores Educacionais nas escolas;
  • Programa de Formação para Coordenadores Pedagógicos;
  • Criação do Programa Dupla Escola;
  • Desenvolvimento de proposta de Educação Integral para o Ensino Médio.

Para realizar algumas dessas ações, a SEEDUC estabeleceu parcerias com várias instituições públicas ou privadas, com o objetivo de potencializar o desenvolvimento das atividades. Dentre elas, eu gostaria de citar especialmente a parceria com a Fundação CECIERJ.

Aproveitando a sua lembrança a esse respeito, quais seriam, a seu ver, os pontos mais interessantes e produtivos dessa parceria da Seeduc com a Fundação Cecierj?

A participação da Fundação Cecierj foi fundamental na transformação da educação do estado do Rio de Janeiro. Através do trabalho sério e responsável dessa Instituição, pudemos contar com a participação de diversos profissionais comprometidos que, muitas vezes, emprestaram sua inteligência e talento a favor da Educação Pública de qualidade.

Podemos destacar, aqui, as ações mais fundamentais dessa parceria que ajudou a SEEDUC no alcance dos resultados e no enfrentamento de dois grandes problemas diagnosticados em nossa rede: o altíssimo índice de reprovação e a distorção idade-série.

O primeiro grande trabalho dessa parceria foi a Criação de um Currículo Mínimo para todas as etapas de escolaridade. Essa ação inovadora e única no país foi a que garantiu padrões mínimos de aprendizagem em nossa rede, e está sendo responsável, também, pela redução da desigualdade da rede estadual de ensino. A partir do Currículo Mínimo, pudemos expandir o nosso Sistema de Avaliação estabelecendo as avaliações diagnósticas bimestrais, criadas para medir a aplicação do currículo.

A partir do diagnóstico apresentado pelas avaliações, foi possível mapear todas as lacunas de aprendizagem de nossos alunos e, assim, desenvolver um grande Programa de Reforço Escolar para alunos com dificuldades na aprendizagem. Esse Programa compreendeu a elaboração de material pedagógico para professor e aluno, além de formação específica para desenvolvimento de dinâmica de sala de aula.

A criação do Programa de Formação Continuada para professores do ensino regular, por sua vez, foi de fato uma das grandes inovações na Política Educacional do estado. Voltado para a aplicação e o apoio à implementação do Currículo Escolar (principalmente nas disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática), essa ação procurou superar algumas lacunas entre teoria educacional e prática de sala de aula, na formação dos professores. Foi, assim, uma ação pensada fundamentalmente para Gestão da Aprendizagem, com impacto direto e relevante na gestão de sala de aula. Ou seja, o Programa de Formação Continuada tornou-se um dos grandes instrumentos capazes de proporcionar melhores condições de trabalho para o nosso professor regente.

Outra ação fundamental para enfrentamento do abandono escolar e da distorção idade-série, foi a reestruturação da Educação de Jovens e Adultos através do Programa NOVA EJA. Este Programa consiste em uma reorganização curricular aplicada a uma estrutura modular e semestral, que permite um novo percurso de formação do jovem ou adulto. Partimos de uma metodologia inovadora e do suporte de um material didático específico para o aluno da EJA, com orientação pedagógica com formação diferenciada para todos os professores regentes dessa modalidade.

Por tudo isso, enfim, podemos dizer que o papel da Fundação CECIERJ foi fundamental para que o estado do Rio de Janeiro pudesse, não só alcançar os resultados nos indicadores nacionais, mas transformar efetivamente a qualidade da educação pública.

E qual foi, até este momento, o alcance efetivo desses programas de Formação Continuada para os professores da rede estadual?

Atualmente, essa formação envolve 17 mil professores que, além do curso em si, inteiramente gratuito, recebem uma bolsa auxílio no valor de R$ 300,00 mensais. Além desse benefício mais imediato, esses professores também passaram a ter acesso a cursos de pós-graduação gratuitos, e em caráter altamente profissionalizante, em universidades públicas que fizeram parceria com a Fundação Cecierj – elevando ainda mais, dessa forma, a qualificação acadêmica e profissional dos professores da rede, e com isso atingindo indiretamente também, com certeza, todos os alunos desses professores.

Publicado em 07 de outubro de 2014

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