ProEMI – Proposta de Inovação, Integração e Interdisciplinaridade – Análise de uma experiência realizada numa escola estadual

Lívia Carvalho Teixeira Lins

Conhecendo o Programa Ensino Médio Inovador

De acordo com o que orienta a Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96), em seu Artigo 2ª, a educação tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando. O Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI), instituído pela Portaria nº 971/09, tem se mostrado um importante instrumento para a elaboração do redesenho curricular nas escolas de Ensino Médio. Busca melhorar a qualidade na formação intelectual, humana e social dos nossos alunos, direcionando-os ao seu pleno desenvolvimento como cidadãos crítico-reflexivos. Para isso, faz-se necessária a disseminação da cultura para o desenvolvimento de um currículo mais dinâmico e flexível, contemplando a interface entre os conhecimentos das diferentes áreas e a realidade dos estudantes.

O Plano Nacional da Educação (aprovado em junho de 2014) propõe, em sua terceira meta, a universalização do Ensino Médio, já prevista no Art. 208 da Constituição Federal de 1988, até o ano 2020 para jovens entre 15 e 17 anos, prevendo a taxa líquida de 85% de atendimento para essa faixa etária.

Continuando no que tange aos termos legais, o documento orientador do ProEMI (da Secretaria de Educação Básica do MEC) aponta para a instituição do Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio – Portaria nº 1.140, de 22 de novembro de 2013; os estados e o Distrito Federal firmaram compromisso com o MEC para garantir a oferta de formação continuada aos professores de Ensino Médio, ação articulada ao Redesenho Curricular, proposto pelo Programa Ensino Médio Inovador – ProEMI.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (Resolução CNE/CEB nº 2, de 30 de janeiro de 2012) são a base tanto para a formação continuada de professores como para a elaboração dos projetos de Redesenho Curricular no âmbito do ProEMI.

Após um breve relato do que diz respeito à parte legal/direcionadora do Programa, podemos adentrar sua proposta pedagógica de “incrementar” o currículo dos alunos de Ensino Médio.

O documento base estabelece um referencial de tratamento curricular, indicando as condições para a implantação do Projeto de Redesenho Curricular (PRC). Dentre elas estão: a carga horária de 3.000 horas, em que 2.400 horas são obrigatórias, acrescidas de 600 horas a serem implantadas de forma gradativa; ações que direcionem conforme o proposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio; ações que articulem os conhecimentos à vida dos estudantes, seus contextos e realidades, de comunidades quilombolas e indígenas, dentre outras; foco na leitura e letramento como elementos de interpretação e de ampliação da visão de mundo; atividades que fundamentem os processos de iniciação científica e de pesquisa; atividades em Línguas Estrangeiras e adicionais; incentivo às atividades de produção artística; incentivo às atividades esportivas e corporais; incentivo às atividades que envolvam comunicação, cultura digital e uso de mídias e tecnologias em todas as áreas do conhecimento; estímulo à atividade docente em dedicação integral à escola. Todas as mudanças curriculares deverão atender às normas e aos prazos definidos pelos conselhos estaduais para que as alterações sejam realizadas.

ProEMI – Como fazer acontecer?

Em agosto de 2013, recebemos em nossa escola – Escola Estadual de Ensino Médio Inovador José Guedes Cavalcanti, localizada no bairro de Camalaú, em Cabedelo, Estado da Paraíba, que possui cerca de 450 alunos divididos em treze turmas – o Programa Ensino Médio Inovador, que nos apresentou uma proposta que mudaria toda a nossa rotina escolar. Mudar, ousar, reinventar... requer de nós passos mais firmes, e esse é um desafio diário em nossa profissão. Mesmo diante de algumas dificuldades encontradas no inicio de nosso percurso, resolvemos dar as mãos e acolher o ProEMI, na certeza de belas mudanças no nosso ambiente educacional.

Para que aconteça a educação integral com qualidade é necessário promover qualidade no ensino; no entanto, é preciso que haja esforços e investimentos dentro da instituição, inclusive em suas condições físicas e materiais, bem como professores comprometidos com esse tipo de educação, onde possam dar ao aluno condições de aprender por garantir o acesso, a inclusão, a permanência e o sucesso na escola (Lima, 2013).

É certo que inúmeras dificuldades foram interpostas no inicio da nossa caminhada: compreender o programa; direcionar nossos planejamentos com a mínima formação necessária para a efetivação da articulação entre o conhecimento contextualizado e a interdisciplinaridade. É importante mencionar que a escola em pauta passava por um processo de reforma, que até hoje não foi concluída. No entanto, nosso objetivo maior estava relacionado à formação integral do aluno, na missão de articular as disciplinas da base nacional comum e da parte diversificada.

Fazendo um levantamento pelo site do Ministério da Educação, as escolas de João Pessoa contempladas com o programa Ensino Médio Inovador foram estas: Escola Cônego Luiz Gonzaga Oliveira; Escola Francisca A. Cunha; Escola Professora Liliosa de Paiva Leite; Escola Professor Matheus Augusto de Oliveira; Escola Professora Ursula Lianza. Na cidade de Cabedelo, na região metropolitana de João Pessoa, a única escola escolhida para receber o Programa foi a José Guedes Cavalcanti.

O primeiro passo dado foi à escolha de um professor-articulador, que deveria se dedicar exclusivamente ao programa e sistematizar as ideias e ações propostas pelos professores para o projeto de redesenho curricular.

O Projeto de Redesenho Curricular (PRC) deverá apresentar ações que comporão o currículo e estas poderão ser estruturadas em diferentes formatos, tais como disciplinas optativas, oficinas, clubes de interesse, seminários integrados, grupos de pesquisa, trabalhos de campo e demais ações interdisciplinares, e, para sua concretização, poderão definir aquisição de materiais e tecnologias educativas e incluir formação específica para os profissionais da educação envolvidos na execução das atividades (Brasil, 2013, p. 13).

Aceito o desafio, nossa preocupação estava em como estruturar e desenvolver esse programa em nossa escola, como sistematizá-lo e torná-lo de fato um programa integrador e inovador. Estudamos o programa, sua estrutura, seus direcionamentos e começamos a dar alguns passos – poucos, mas valiosos.

O documento orientador direciona os professores para a participação em reuniões semanais; nesses encontros a equipe planejava e organizava os conteúdos curriculares em parceria com outras disciplinas. Esses encontros semanais foram de grande importância para a efetivação da prática docente. Nesses momentos nos aprofundamos no conhecimento do programa, sugerimos, estudamos e nos capacitamos.

Nossa primeira ação concreta foi a manhã ProEmi, realizada em outubro de 2013. Na ocasião apresentamos o Programa a toda comunidade escolar, os professores explanaram seus projetos e as propostas para o ano seguinte, seguido de atrações culturais e um café da manhã.

O programa foi iniciado efetivamente em 2014. Os macrocampos já estavam teoricamente estruturados e fomos a campo para a real efetivação do que fora proposto.

Compreende-se por macrocampo um campo de ação pedagógico-curricular
no qual se desenvolvem atividades interativas, integradas e integradoras dos
conhecimentos e saberes, dos tempos, dos espaços e dos sujeitos envolvidos
com a ação educacional. Os macrocampos se constituem, assim, como um
eixo a partir do qual se possibilita a integração curricular com vistas ao enfrentamento e à superação da fragmentação e hierarquização dos saberes
(Brasil, 2013, p. 15).

Os macrocampos apresentam a proposta de integrar ciência, trabalho, cultura e tecnologia ao currículo do aluno, expandindo seu universo de experiências. Nesse sentido, o currículo do aluno deve estar direcionado de forma a garantir seu desenvolvimento intelectual e seu direito ao ato de aprender (Brasil, 2013).

Em nossa escola tínhamos seis macrocampos: acompanhamento pedagógico; leitura e letramento; iniciação científica e pesquisa (estes três primeiros obrigatórios, de acordo com o documento orientador); como macrocampos adicionais, acrescentamos produção e fruição de artes; comunicação, cultura digital e uso de mídias; e cultura corporal.

Este estudo refletirá nossa experiência com interdisciplinaridade, integração e inovação por meio do projeto desenvolvido pelo macrocampo Comunicação, Cultura Digital e Uso de Mídias, intitulado Paraíba Fatos e Fotos.

Projeto Paraíba Fatos e Fotos

Idealizado pela professora de História e professora do macrocampo de Comunicação, Cultura Digital e Uso de Mídias, podemos antecipar que o resultado foi um sucesso de proporções maiores das que esperávamos.

Esse projeto teve como objetivo incentivar o uso correto das mídias digitais e instigar no aluno o interesse pela pesquisa. O projeto foi realizado em cinco etapas, contando com a colaboração da equipe docente, da interação com as disciplinas e com os outros macrocampos.

O projeto foi iniciado com a ideia de unir o uso das novas tecnologias com o aprendizado da história, geografia, arte e cultura da Paraíba. A primeira etapa desse projeto foi constituída por uma discussão e elaboração dos caminhos que seriam percorridos para alcançarmos nosso objetivo. Em seguida, aplicamos um questionário discursivo e objetivo, elaborado pela professora de Artes, de diagnose para os alunos de todas as turmas de Ensino Médio da escola que estavam interessados em participar do projeto. O questionário perguntava sobre as preferências e aptidões, pois desejávamos trabalhar história, geografia, desenho, pintura, libras, fotografia, literatura de cordel e xilogravura.

Iniciamos efetivamente em abril de 2014 com a oficina de fotografia, ministrada por uma professora colaboradora do Projeto. Nesse mesmo mês iniciamos um curso básico de Libras, pois o projeto acolheu uma aluna surda da segunda série do Ensino Médio. No mês seguinte tivemos nossa primeira aula de campo; assim colocamos em prática os conhecimentos adquiridos nas aulas de história e geografia da Paraíba casando com o curso de fotografia.

Seria inviável percorrer todo estado com mais de trinta alunos; por isso elaboramos um roteiro que contemplasse as disponibilidades orçamentárias e cronológicas. Começamos nosso trajeto na Estação Cabo Branco – Ciência, Cultura e Arte em João Pessoa. No início do mês de junho fizemos o roteiro pelo centro histórico de João Pessoa, iniciando na Praça Presidente João Pessoa, indo ao Palácio do Governo e ao Tribunal de Justiça. Então seguimos para o Centro Cultural São Francisco, Praça Dom Adauto, Igreja do Carmo, Mosteiro de São Bento, Casa da Pólvora e Academia Paraibana de Letras. No mês de julho, visitamos o Brejo Paraibano, as cidades de Ingá e Campina Grande. Nossa quarta aula de campo foi a Fortaleza de Santa Catarina, em nossa cidade, Cabedelo. Lá nosso guia foi o aluno Luan Dias, do 3º ano B, contando toda a história do forte.

No final de julho seguimos paras as cidades de Alagoa Grande e Areia, fotografando, descobrindo as belezas da Paraíba e gratificados pelo interesse despertado nos alunos. Momento impar foi quando constatamos que estávamos conseguindo transcender o esperado. Durante esse mês os alunos tiveram uma oficina de xilogravura, ministrada pela professora de Artes.

Segundo Macedo (2013), “um projeto interdisciplinar no Ensino Médio supõe que ele seja assumido não como ‘médio’, ou seja, o que fica entre o Ensino Fundamental e o Superior, mas sim como um ensino concludente da Educação Básica”.

Conseguir integrar as disciplinas estudadas em sala de aula, como História, Geografia e Artes à proposta do Programa de Redesenho Curricular, juntamente com os macrocampos de Comunicação, Cultura Digital e Uso de Mídias e produção e fruição das artes se apresentava concretamente diante de nós.

Inovação e interdisciplinaridade – resultados do Projeto Paraíba Fatos e Fotos

Direcionando o conceito de interdisciplinaridade pelo enfoque pedagógico, tentamos levantar questões relacionadas ao currículo escolar e ao processo de ensino-aprendizagem concretizados na proposta do Projeto Paraíba Fatos e Fotos.

De modo geral, a literatura sobre esse tema mostra que existe pelo menos uma posição consensual quanto ao sentido e à finalidade da interdisciplinaridade: ela busca responder à necessidade de superação da visão fragmentada nos processos de produção e socialização do conhecimento (THIESEN, 2008).

Concluímos nosso projeto com a realização de um encontro no dia 29 de agosto de 2014 nos turnos da manhã e tarde. Nesse dia foram expostos todos os resultados dos trabalhos realizados pelos alunos durante o percurso do projeto. Foram apresentadas 133 fotografias; com base nessas fotos os alunos confeccionaram telas com tinta guache, papel canson e carvão.

Integrando a história, a arte e a literatura, os alunos criaram lindos poemas e cordéis baseados no que aprenderam. Além disso, contamos com a honrosa presença de uma aluna surda, que foi acompanhada por uma intérprete durante todo o projeto, contemplando uma fantástica integração entre essas ciências, provando que existe possibilidade de integrar, inovar e criar novos diálogos que culminem em efeitos produtivos.

Coletamos alguns depoimentos de alunos e professores que participaram do projeto, fazendo a seguinte pergunta: de que forma a inovação e a interdisciplinaridade trabalhadas no Projeto Paraíba Fatos e Fotos contribuíram para sua formação pessoal e intelectual?

As respostas dos alunos envolvidos no projeto foram muito positivas; a maioria se referiu à oportunidade de conhecer efetivamente a história do nosso estado, outros mencionaram a importância das oficinas ministradas, vários ressaltaram o empenho da equipe pedagógica envolvida no projeto. Dentre os depoimentos expostos pelos alunos, gostaríamos de expor um deles, escrito por uma aluna da terceira série do ensino médio.

O Projeto Paraíba Fatos e Fotos modelou comportamentos como também edificou o pensamento intelectual de todos que realmente vestiram a camisa e se comprometeram a desvendar e ao mesmo tempo conhecer lugares novos, mas já arraigado de histórias, tais quais se apresentavam como uma grande descoberta por todos os caminhos tracejados. A inovação que o referido projeto acrescentou na estrutura de cada aluno é de extrema importância, pois a finalidade era registrar os fatos e fotografar cada detalhe encontrado, com o propósito de reeducar-nos, ou seja, ensinar a maneira correta do manuseio de aparelhos eletrônicos que tanto evoluem e acabam causando uma ‘febre’ por tanta procura e usos incorretos. A cada lugar histórico visitado adquirimos conhecimentos e experiências e, ao mesmo tempo, passamos a enxergar o mundo à nossa volta, passamos a valorizar a história, os lugares. A chance de reviver cada momento e a partir de então ser o escritor de um fato futuro. Enfim, este projeto inovou completamente um pensar que antes se limitava às redes sociais com resquícios viciosos prejudicando todo um aprendizado, para projetar um novo pensar que colocava em prática toda doutrina absorvida por ilustres mestres, de acordo com as memórias marcadas na Paraíba”.

Em seus depoimentos, os professores expuseram que, apesar das dificuldades encontradas no inicio do percurso, o programa/projeto os fizeram sair da sua zona de conforto para reinventar suas práticas e suas metodologias, melhorando a qualidade de ensino.

Diante de tais depoimentos, encontramo-nos sem palavras para encerrar este artigo. No entanto, estamos cientes de que cumprimos nossa missão, e, mesmo diante das dificuldades encontradas em nosso dia a dia, sentimos que estamos dando passos, indo além e desconstruindo um discurso negativista sobre sala de aula, escola pública e comodismo docente. Podemos fazer diferente, podemos construir, podemos contagiar... caminhando sempre!

Referências

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para assuntos jurídicos. Planejando a Próxima Década – Conhecendo as 20 Metas do Plano Nacional de Educação. Brasília, 2014. Disponível em: http://pne.mec.gov.br/images/pdf/pne_conhecendo_20_metas.pdf. Acesso em 02 set. 2015.

______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Currículos e Educação Integral. Coordenação Geral do Ensino Médio. Programa de Ensino Médio Inovador: Documento Orientador. Brasília, 2013. 33 p. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=13249-doc-orientador-proemi2013-novo-pdf&category_slug=junho-2013-pdf&Itemid=30192. Acesso em: 17 mar. 2016.

______.  Pacto Nacional pelo fortalecimento do Ensino Médio. Brasília, 2013. Disponível em: http://pactoensinomedio.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=5. Acesso em: 29 fev. 2016.

______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação Básica. Define Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, 2012. 8 p. Disponível em: http://pactoensinomedio.mec.gov.br/images/pdf/resolucao_ceb_002_30012012.pdf Acesso em 30 mar. 2016.

______. Lista de Escolas contempladas no ProEMI. Disponível em: http://pdeinterativo.mec.gov.br/listaEscolasContempladasProemi.php. Acesso em: 29 fev. 2016.

LIMA, Lucineide Soares. O ProEMI na visão dos professores e alunos da EEB Prof. Aníbal Nunes Pires. UFSC. Florianópolis. 2013. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/105667/LUCINEIDE%20SOARES%20LIMA.pdf?sequence=1. Acesso em 03 abr. 2016.

MACEDO DE, Lino. Do impossível ao necessário. Revista Pátio Ensino Médio, profissional e tecnológico, Porto Alegre, ano V, nº16, mar./maio 2013.

THIESEN, Juares da Silva. A interdisciplinaridade como um movimento articulador no processo ensino-aprendizagem. Rev. Bras. Educ., v. 13, nº 39, Rio de Janeiro, set./dez. 2008.

Publicado em 25 de outubro de 2016

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