Introduzindo o estudo da Astrobiologia em colégio da rede estadual do Rio de Janeiro: uma experiência no âmbito do Proemi

Angela Ferreira Portella

Instituto de Biologia (Ibrag/UERJ), Polo Cederj Nova Friburgo/RJ

Adriana Oliveira Bernardes

Polo Cederj Nova Friburgo/RJ

Introdução

Temas de Astrobiologia são apresentados todos os dias pela mídia, e muitos desses temas são alvo de interesse dos alunos, que discutem entre si e recorrem ao professor em busca de mais informações.

Um dos temas fortemente debatidos na atualidade é a possibilidade de vida em outros planetas, o que tem estado cada vez mais presente, relacionado à descoberta de água sólida em Marte, aos estudos das diversidades de luas do nosso sistema solar e das descobertas de exoplanetas pelo telescópio espacial Kepler, da Nasa (Agência Espacial Norte-Americana).

De acordo com Ivanissevich (2005), o poder de alcance das mídias é muito grande; são os meios mais rápidos para divulgar a ciência para a população. Trabalhos foram realizados e descobriu-se que as pessoas querem saber de ciência da mesma maneira que querem saber de esportes ou política.

Para Albagli (1996), pelo jornalismo científico a ciência vem sendo expandida. Desde as grandes guerras ele vem crescendo e atingindo cada vez mais o grande público; é o meio mais tradicional para a divulgação científica. Por conta disso, a Astrobiologia pode se tornar uma grande ferramenta educacional, estimulando o aluno à construção do seu próprio conhecimento, à criatividade e à capacidade de raciocínio.

Pela vida que conhecemos na Terra e do estudo de seres extremófilos (que habitam ambientes extremos), abre-se a discussão sobre a possibilidade de vida em outros lugares do universo, de acordo com suas características. A Astrobiologia ainda ajuda a entender melhor a vida em nosso planeta, como podemos melhorá-la e preservá-la da melhor maneira possível.  Vinculada aos conteúdos de Astronomia, por sua característica interdisciplinar pode ser introduzida como tema transversal no Ensino Médio.

A Astronomia, que foi incluída ao currículo da disciplina de Física na rede estadual do Rio de Janeiro em 2012, faz parte do conteúdo do 1º ano do Ensino Médio.

A seguir estão relacionadas as habilidades e competências presentes no currículo.

Habilidades e competências – Cosmologia

  • Saber comparar as ideias do universo geoestático, de Aristóteles-Ptolomeu, e do heliostático, de Copérnico-Galileu-Kepler.
  • Conhecer as relações entre os movimentos da Terra, da Lua e do Sol para a descrição de fenômenos astronômicos (duração do dia/noite, estações do ano, fases da lua, eclipses, marés etc.).
  • Reconhecer ordens de grandeza de medidas astronômicas.

Habilidades e competências – Movimento e referencial

  • Compreender os conceitos de velocidade e aceleração associados ao movimento dos planetas associados ao movimento dos planetas.

Habilidades e competências – Conceito e tipos de força (as quatro forças fundamentais da natureza)

  • Perceber a relação algébrica de proporcionalidade direta com o produto das massas e inversa com o quadrado da distância, da Lei da Gravitação Universal de Newton.

Habilidades e competências – relatividade restrita e geral

  • Reconhecer os modelos atuais do universo (evolução estelar, buracos negros, espaço curvo e Big-Bang).
  • Compreender que o tempo e o espaço são relativos devido à invariância da velocidade da luz.
  • Reconhecer o tecido espaço-tempo, sendo o tempo a quarta dimensão.

Fonte: BERNARDES, A. O.; REIS, J. C. O. Astronomia no Currículo Mínimo de Física do Estado do Rio de Janeiro. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/revista/artigos/astronomia-no-curriculo-minimo-do-estado-do-rio-de-janeiro.

 

Observamos que as habilidades e competências a serem trabalhadas vão desde o Modelo Geocêntrico de Aristóteles a questões de como ocorreu, após o Big-Bang a evolução estelar, a formação dos planetas e de buracos negros.

Trabalha-se então desde a compreensão da formação do sistema solar após o Big-Bang, à sua organização composta pelo sol e os planetas, sendo que conhecendo sua diversidade, a questão da possibilidade da vida em outros locais do universo surge naturalmente.

A Astrobiologia é uma área que estuda a origem, distribuição, evolução e futuro do universo. Ela está relacionada à sua evolução, em que todo tipo de vida está conectado, abordando sistemas biológicos e por ser uma área interdisciplinar fomenta a comunicação e discussão entre diferentes áreas.

Segundo Lima e Santos (2016), esta ciência surgiu no século XX, sendo classificada como a área que estuda a existência de vida no Universo, unificando assim conhecimentos científicos. Ela faz o estudo principalmente de organismos extremófilos (seres que vivem em ambientes inóspitos podendo assim habitar exoplanetas com condições extremas).
O astrobiólogo faz uma comparação usando de anatomia, paleontologia e biologia molecular, do que conhecemos sobre vida até os dias atuais, e a possibilidade de vidas em outros planetas. Esta ciência procura responder questões como: De onde viemos? Para onde vamos? Estamos sozinhos?

Neste trabalho introduzimos o tema Astrobiologia no 1º ano do Proemi (Programa de Ensino Médio Inovador) através da realização de oficinas promovidas na escola por graduandas do curso de Ciências Biológicas do Pólo Cederj Nova Friburgo, os quais realizaram trabalho de Iniciação Científica.

Objetivo

Introduzir o ensino de Astrobiologia em turmas do 1° ano do Ensino Médio da rede pública estadual.

Metodologia

Este trabalho foi desenvolvido em escola pública da cidade de Nova Friburgo, localizada no Estado do Rio de Janeiro.

O colégio oferece: Ensino Fundamental, Ensino Médio Inovador e NEJA (Educação de Jovens e Adultos). A escola conta com mais de 700 alunos, divididos em turno de manhã, tarde e noite.

Inicialmente realizamos pesquisa bibliográfica sobre o tema Astrobiologia e possíveis trabalhos ligados a sua introdução no ensino médio.

O trabalho foi realizado em turmas matutinas do 1° ano do ensino médio, com alunos na faixa etária de 14 e 15 anos, de ambos os sexos, num total de 47 estudantes distribuídos em três turmas do Proemi (Programa de Ensino Médio Inovador).

A fim de sondar o conhecimento e visão das turmas sobre o tema, elaboramos e aplicamos o questionário  abaixo:

 

QUESTIONÁRIO

1) O que é Astrobiologia?
( ) Ciência que estuda somente os Astros.
( ) Ciência que estuda somente a biologia nos Astros.
( ) Área que estuda origem, distribuição, evolução e futuro do universo.

( ) Área que estuda origem, distribuição, evolução e futuro dos astros do sistema solar.

2) A Astrobiologia abrange somente a física e a biologia?
( ) SIM.
( ) NÃO.

3) Como foram formados os elementos complexos na origem do universo?
( ) Com a explosão das super novas, liberou-se energia, e assim elementos complexos se formaram.
( ) Foi apenas com a junção do Hélio e Hidrogênio (elementos simples).

( ) Por serem complexos ainda não se tem certeza de sua existência.

4) O que é universo biofílico?
( ) É um universo onde não se pode ter vida.

( ) É um universo favorável a vida.

5) Síndrome de Gaia é:
( ) síndrome encontrada no planeta extrassolar de Gaia.
( ) problemas e dificuldades encontradas na exploração de planetas.

( ) uma síndrome que afirma que o planeta é um ser vivo e autossustentável.

6) Europa é uma lua de qual planeta?
( ) Saturno.
( ) Netuno.

( ) Marte.

( ) Júpiter.

7) Quais serão as atividades da espaçonave Europa Clipper na Lua Europa?
( ) Apenas fazer a observação deste Astro.

( ) Coletar amostras do solo, composição química, temperatura e principalmente descobrir a profundidade da camada de gelo.
( ) Procurar água e vida extraterrestre.

Em seguida, foi feita uma oficina com apresentação do tema em slides, apresentados pela aluna do 9° período do curso de licenciatura em Biologia do Cederj/UERJ.

Resultados

Os resultados encontrados foram satisfatórios. Os alunos realizaram todas as atividades propostas na oficina com entusiasmo e bastante interesse. Houve um aumento considerável no número de questões acertadas por eles após a oficina.

Seguem os gráficos obtidos:

  

Fonte: Pesquisa.

Antes da realização da oficina cerca de 34% dos alunos acertaram a questão 1 sobre o conceito de Astrobiologia e 66% dos alunos erraram a questão. Após a oficina houve uma inversão desta porcentagem, tendo 34% de erros e 66% de acertos.

  

Fonte: Pesquisa.

Nesta questão observamos uma porcentagem de erro de 15% antes da oficina e após de 11%, tendo uma queda de 4%, o que mostra que apesar de grande parte dos alunos já conhecerem o conceito de interdisciplinaridade, pois cerca de 85% acertaram a questão antes da atividade,  a oficina contribuiu para que este conceito fosse reforçado e difundido para demais alunos.

  

Fonte: Pesquisa.

Para a questão 3 onde se perguntava  “Como foram formados os elementos complexos na formação do universos?” tivemos uma queda na taxa de acertos após a oficina. Isto demonstra a necessidade de uma melhor discussão sobre o tema. Por ser um assunto complexo, cabe ao professor detalhar melhor as explicações desde a formação dos elementos mais simples aos mais complexos, a fim de evitar confusões pelos alunos.

  

Fonte: Pesquisa.

Vemos na questão 4, referente ao conceito de universo biofílico, um grande número de acertos antes e após a oficina, chegando até a 96% de respostas corretas após a realização da mesma pelos alunos, sendo que a maioria deles nunca havia ouvida falar sobre este tema. Observa-se neste caso a capacidade de raciocino do aluno antes da oficina em tentar descobrir a resposta correta apenas analisando a semântica da palavra.

  

Fonte: Pesquisa.

A questão 5 foi referente ao conceito sobre Síndrome de Gaia, vemos 68% de erros e 32% de acertos antes da oficina, e uma queda após a realização da mesma, chegando a 74% de acertos e 26% de erros.

  

Fonte: Pesquisa.

Nesta questão foi apresentada a Lua de Júpiter, Europa. Antes da oficina percebemos que cerca de 75% dos alunos desconheciam este astro, obtendo 25 % de acertos. Após a oficina houve um aumento pra 96% de acertos, chegando quase aos 100%, o que demostra que os alunos estavam atentos às orientações dadas na apresentação de slides.

  

Fonte: Pesquisa.

Nesta última questão discutimos os objetivos da espaçonave Europa Clipper. Ela foi dada como exemplo a fim de gerar uma discussão com os alunos sobre o que pode ser encontrado em outros planetas e como estas informações são coletadas e interpretadas. Antes e após a oficina obtivemos o mesmo número de acertos 81%, e erros 19%. Apesar de ser um bom resultado, não foi o esperado, já que o número de acertos após a oficina não modificou. Provavelmente o tempo gasto com esse tema na oficina não foi o suficiente, já que se trata de um assunto amplo, o que deve ser observado em futuras oficinas.

De acordo com os dados obtidos vemos que o aproveitamento dos alunos foi grande após a oficina, tendo colaborado para a aquisição de conhecimento pelos estudantes.

Notou-se que assuntos mais complexos e amplos devem ser trabalhados com mais cautela, talvez de maneiras independentes, a fim de elucidar quaisquer dúvidas referentes ao assunto por parte dos estudantes.

Segue abaixo um gráfico comparativo dos acertos antes e depois da oficina para comparação.

    

      Fonte: Pesquisa.

Pela observação destes gráficos nota-se claramente a evolução entre o número de acertos e erros antes e após a oficina. Vemos que o número de questões com apenas 20 a 40 % de acertos antes da oficina foi maior que após a oficina. Antes da oficina vemos apenas 4 questões com porcentagens de acerto maiores que 40%, já após este número aumentou para 6 questões.

Conclusão

Neste trabalho introduzimos de forma inovadora o tema Astrobiologia no Ensino Médio em duas turmas do 1o ano de colégio público de Nova Friburgo/RJ, totalizando a participação de 47 alunos na oficina oferecida.

O tema atual e interdisciplinar possibilitou uma discussão ampla de temas de Astronomia, trazendo para escola um ambiente dialógico, que sabemos ser necessário para contribuir para alfabetização científica dos alunos.

Verificamos que através dos resultados obtidos nos questionários, que o aluno conhece o tema e tem um conhecimento básico do assunto, porém, após a oficina o índice de acertos aumentou, mostrando que o trabalho realizado possibilitou o aprendizado dos mesmos.

Consideramos que esse espaço dialógico, criado a partir do momento que o aluno tem a oportunidade de participar de uma oficina da área de ciências, é importantíssimo para torná-la mais próxima do aluno.

Vimos com este trabalho que com a inserção das oficinas, trazendo uma metodologia de ensino diferenciada, tem-se a valorização das diversidades educativas, o que promove outras formas de aprendizado, estimulando o aluno a buscar o conhecimento por caminhos alternativos.

Inserimos também neste estudo assuntos referentes ao cotidiano dos alunos o que desperta um maior interesse dos mesmos pelo conteúdo, tornando o aprendizado atrativo ao aluno.

Para os professores as oficinas também possuem grande importância, pois além de ensinarem o conteúdo, também aprendem de maneira dinâmica com os alunos, havendo assim uma construção coletiva do conhecimento.

Referências

ALBAGLI, S. Divulgação científica: informação científica para a cidadania? Revista  Ciência da Informação, v. 25, n. 3, p. 396-404, set./dez. 1996.

BERNARDES, A. O.; REIS, J. C.O. Astronomia no Currículo Mínimo do Estado do Rio de Janeiro. Revista Educação Pública. 2016. Disponível em:https://educacaopublica.cecierj.edu.br/revista/artigos/astronomia-no-curriculo-minimo-do-estado-do-rio-de-janeiro. Acesso em: 16/03/2017.

BONI, V.; QUARESMA, S. J. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências Sociais. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC, v. 2, nº 1, p. 68-80, jan./jul. 2005. Disponível em: www.emtese.ufsc.br.

CANIATO, R. Astronomia e Educação. Universo Digital,1996. Disponível em:< http://www.liada.net/universo/articulos/Caniato/Astronomia%20e%20Educacao.pdf>. Acesso em: 16/03/2017.

IACHEL, G.; BACHA, M.G.; PAULA, M.P.; SCALVI, R.M.F. A montagem e a utilização de lunetas de baixo custo como experiência motivadora ao ensino de astronomia. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 31. nº 4. 2009.

IVANISSEVICH, Alicia. A mídia como intérprete: Como popularizar a ciência com responsabilidade e sem sensacionalismo. In: VILAS BOAS, S. (Org.). Formação e informação científica. São Paulo: Summus, 2005. p.13-30.

LIMA, C.C.S.; SANTOS, M.S. Os extraterrestres e o ensino de Ciências: Astrobiologia como Eixo Integrador no Ensino Fundamental e Médio. In: VIII Fórum Internacional de Pedagogia. 2016. Disponível em:< http://editorarealize.com.br/revistas/fiped/trabalhos/TRABALHO_EV057_MD1_SA9_ID2122_30092016204225.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2017.

RIO DE JANEIRO. Secretaria de Educação. Currículo Mínimo Estadual de Física. Fevereiro de 2012.

Publicado em 05 de setembro de 2017

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