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A gravidez na adolescência e a escola
Nem sempre os opostos se excluem. Não, não estamos falando da filosofia de Heráclito nem da dialética de Hegel, mas o fato é que quando pensamos na palavra “mãe” ou “pai”, o que naturalmente se contrapõe é o vocábulo “filho”. São funções opostas, apesar de não serem excludentes, já que uma pessoa pode ser “pai” ou “mãe” e “filho” ao mesmo tempo. Mas, convenhamos, um adulto cujos pais são vivos, ao ter um filho, passa a ser menos filho do que antes, pois seu papel principal agora passa a ser o de pai.
Um Compromisso com a Liberdade e a Dignidade Humanas
No próximo dia 9 de agosto estaremos lembrando 5 anos da morte de Betinho. Tal dia não deixa de ser uma data especial para o Ibase, de quem o Betinho foi um dos fundadores, 21 anos atrás, e diretor geral. É um dia para lembrarmos o legado do Betinho e a nossa missão institucional. Aliás, nada parece mais oportuno do que reafirmar a convicção na democracia e na possibilidade de através de uma democracia inclusiva e participativa, de base, edificar os fundamentos de uma sociedade sustentável, de liberdade e dignidade humanas para todas e todos os brasileiros, sem exceções. Na atual conjuntura de eleições no Brasil, mas em que a crise de um capitalismo virado cassino global ameaça a tudo e a todos e aumenta o descrédito na democracia, o Ibase se sente desafiado, como o Betinho, a apostar na cidadania em ação, a força motriz e transformadora das democracias. Nunca é demais lembrar que o Ibase, antes de ser o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, foi concebido como I-Base - Instituto para a base, um agente da democracia construída de baixo para cima.
P de Professor
Gilles Deleuze, em uma de suas últimas entrevistas para a TV, falou sobre sua vida como professor. Em um tom meio nostálgico, lembrou que começou a lecionar num tempo em que o professor de Filosofia era visto como “o louco da aldeia”. Um sujeito estranho, com ideias um pouco suspeitas, mas que deveria ser “tolerado” e deixado “meio à vontade” para exercitar suas excentricidades em sala de aula.
O que é ser solidário?
Em resposta a uma ética da exclusão, estamos todos desafiados a praticar uma ética da solidariedade. Assim pensava Herbert José de Souza, o sociólogo Betinho. Ele, que foi um dos fundadores da Ação da Cidadania, foi se tornando, por meio de suas ideias e ações por uma sociedade melhor, também uma forte referência de humanidade e cidadania para muitos de nós.
Educar o educador
(In: Gullar, Ferreira. Indagações de Hoje. Rio de Janeiro, José Olympio, 1989. pp.152-157)
De como Machado de Assis virou personagem da literatura infanto-juvenil
Ludi na Revolta da Vacina é o terceiro livro desta personagem criada por Luciana Sandroni. Neste livro, que conquistou o Prêmio Carioquinha de 1998, a família Manso (os irmãos Ludi, Chico e Rafa; seu Marcos e dona Sandra, seus pais; e Marga, a empregada), ao atravessar o Arco do Teles, no Centro do Rio de Janeiro, saem do final do século XX para cair no início do século, no meio dos acontecimentos que foram reunidos na chamada Revolta da Vacina. Assim, junto com a família da Ludi, aparecem na aventura o sanitarista Oswaldo Cruz, o chefe de polícia Piragibe, o prefeito Pereira Passos e Machado de Assis.
As surpresas de uma feira literária
A feira literária do colégio onde leciono acontece uma vez por ano. Nesse período a comunidade escolar fica em polvorosa, muitos alunos empenhados em mostrar um bom trabalho, professores orientando as turmas sobre como apresentar os temas, cartazes e mais cartazes enfeitando as paredes internas do prédio. Cada turma fica responsável por apresentar um tema de sua preferência, não necessariamente ligado a literatura. Essa referência inserida no nome da feira explica-se pelo fato de que, para fazer o trabalho, pressupõe-se que a turma deverá fazer diversas leituras sobre o assunto. O evento, portanto, está mais para uma feira cultural. Depois de alguns dias de preparação, a escola fica uns dois ou três dias em função da feira. Cada turma utiliza a própria sala para apresentar a todos os professores de seu respectivo turno, aos orientadores e à direção. Todos nós ganhamos uma ficha de avaliação para ser preenchida ao término de cada apresentação.
Universidade e Nação
Assistimos, impotentes, a mais uma longa greve nas nossas Universidades Federais. Já quase nem é mais notícia. A conjuntura de terror e guerra, deste preciso momento, nem é desculpa para tal desconhecimento, pois há anos é assim. O drama vivido pelas Universidades parece distante de nós, como se não fosse parte dos impasses que atravessamos como Nação em busca do seu lugar e seu caminho entre os outros povos do Planeta Terra. Desastrada ilusão! Dói na alma o visível sucateamento de prédios e espaços das Universidades, basta passar pelo Fundão para se ter uma ideia. Mas o mais trágico é o desmonte do projeto de Universidade Pública que está por trás. De algum modo, a crise que corrói por dentro as fundamentais instituições públicas que são as nossas Universidades Federais é como uma ameaça de destruição de nossa capacidade coletiva de pensar, de criar no pensamento as possibilidades do nosso futuro. O desmonte da Universidade Pública, não nos enganemos, está minando uma base essencial do Projeto de Nação para o Brasil. A Universidade é uma instituição relativamente recente no Brasil. A primeira - a Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro - foi criada nos anos 10 do século XX, agregando as instituições universitárias existentes. Este fato tem muito a ver com um traço de nossa história econômica, política e cultural de país determinado do exterior, com dificuldades em definir um projeto para si mesmo. Mas, a partir de então, a história muda. Projeto de Nação e Universidade passam a andar muito colados. Lembro aqui o nascimento da USP - Universidade de São Paulo, no pós-30, em que se forja a hegemonia urbano-industrial sobre os interesses agroexportadores. A USP nasce como projeto de Universidade no bojo do movimento da Semana Modernista. Até hoje pensa o país, cria para ele, sendo uma instituição bastante emblemática neste sentido. Outro exemplo é a UnB - Universidade de Brasília. Foi no bojo do caldeirão de ideias e projetos de uma Nação democrática e desenvolvida, do final dos 50 e início dos 60, que Darcy Ribeiro concebeu a UnB, nova como concepção de Universidade e nova pela ousadia de pensar o Brasil. Junto com tais criações universitárias vieram um pujante movimento universitário, cujo efeito até hoje sentimos. Os militares, a seu modo e contra o nosso gosto, forjaram um consistente projeto de Universidade tecnocrática a serviço de sua proposta de desenvolvimento autoritário acelerado para o Brasil. Na luta contra a ditadura, pelas Diretas-Já e Assembleia Constituinte, novamente a questão universitária adquiriu relevo, tanto pela participação do movimento estudantil e do novo e poderoso movimento de docentes de ensino superior, como pelos debates em torno a um projeto de Educação e Universidade para o Brasil. Enfim, as vicissitudes da Universidade Brasileira estão no centro de nossas buscas como Nação. Hoje contamos com um relativamente complexo sistema universitário de ensino e pesquisa. Mas a espinha dorsal do sistema - as Universidades Federais - está sendo corroída em sua capacidade de hegemonia de pensamento e ação. O tudo é mercadoria e mercado, e por suas regras se regula, chegou à Universidade e a está destruindo. Criar e pensar, seja criar ciência e tecnologia, como criar sentido humano às coisas, está muito além das regras da economia mercantil e de sua ideologia. Isto é trágico para o país que precisa encontrar-se consigo mesmo. Precisamos de muita ideia, de muito pensamento, de teorias, de hipóteses, de pesquisa, de ousadia, enfim, para transformar nossos sonhos em possibilidades de construção de um futuro de liberdade, igualdade na diversidade, de solidariedade e muita cidadania. Gestar um projeto de desenvolvimento democrático e sustentável de Nação Brasileira é impossível sem um ousado projeto de Universidade. Realmente não dá para aguentar o discurso dos privilégios de que seriam beneficiárias as Universidades Federais, seus professores e alunos, de que se vale o governo e praticamente o conjunto das elites, tanto na política como no meio jornalístico, cultural e empresarial. Abusos e problemas nas Universidades devem existir, aos montes. O seu combate não deve ser confundido com o próprio desmonte das instituições, como se vitais não fossem. Seria bom que nossos governantes entendessem que não existe grande Nação sem suas grandes Universidades. Afinal, que lógica é esta que considera vital gastar recursos públicos para termos saudáveis bancos e banqueiros e considera um desperdício investir nas Universidades Federais que são nosso futuro? Por fim, mas não menos importante, a hemorragia em nossas Universidades Federais é, num certo sentido, uma facada na própria sociedade civil brasileira. Mesmo mantidas pelo governo, as Universidades são por excelência instituições públicas centrais na conformação da cidadania e da participação. Este talvez seja o seu traço mais marcante. Sua autonomia e liberdade são, num certo sentido, sinônimos do grau de autonomia e liberdade de que gozam movimentos e organizações da sociedade civil, mesmo os mais pobres e excluídos, que estão segregados da atual vida universitária. As Universidades são indispensáveis como base de participação e tecido de defesa cidadã, instituições centrais em qualquer democracia. Sãs as Universidades que, por definição, juntam o universal ao específico, o traduzem e o recriam segundo as necessidades e possibilidades locais. Salvemos as nossas Universidades Federais pois isto é fundamental para que o encontro do Brasil consigo mesmo como Nação não seja irremediavelmente comprometido.
Uma crônica
Hoje fui aposentado. O Estado me aposentou, impiedosamente. Pior: me proibiu de trabalhar, de hoje em diante, na universidade cuja concepção, gestação, nascimento, criação e crescimento compartilhei durante os últimos 35 anos. Só posso trabalhar na condição de “velho” – “sênior”, uma elegância fantasmagorizada – se a universidade me quiser. Assim, estou condenado para o resto da minha vida a ganhar salário do Estado sem trabalhar. Estou me sentindo mal. Um insulto. Uma deformação do ser humano. Uma ordem suprema da nação inapelavelmente fere os princípios e as leis do jogo na luta pela produção e reprodução da espécie humana. Alguém pode impedir o outro de trabalhar? Sinto que ninguém tem legitimidade para proibir alguém de trabalhar.
Traduzir Gullar
Poemas deveriam nos marcar para sempre. Quase como se fossem uma tatuagem. No espírito e também no corpo. Um grande poeta é uma voz dentro de nossas vidas. Respira conosco. Mais que isso: seus versos se misturam aos nossos olhos e passamos a ver o mundo e as coisas e, quem sabe, as pessoas, juntamente com a poesia contida em um grande poema que consegue nos habitar. Ninguém escolhe ser poeta. Não há escolha. Mas podemos escolher ser bons leitores, leitores fortes, como venho repetindo. Ferreira Gullar é um poeta forte. Marcou os caminhos e descaminhos da grande poesia brasileira do século XX e, sem dúvida alguma, em função de sua contemporaneidade poética, continuará marcando alguns dos novos caminhos do fazer artístico neste século. Por quê? Simplesmente porque ele dialoga com nosso sentir e nosso viver contemporâneos. Exemplo? Segue o mais comum deles, visto que é dos mais conhecidos. E que, por comum, por ser já de todos, não se traduza aqui como banal. Banais somos nós quando não conseguimos ver a força dos versos largos e imperativos de uma grande voz. Ei-la: