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Minha aluna Vivian
Alexandre Rodrigues Alves
Há uns seis meses apareceu uma mensagem na minha conta da rede Orkut: “Ahhhhh, até que enfim encontrei você!!!!” assim mesmo, com essas repetições enfáticas. Claro que eu me lembrava da Vivian, minha aluna uns dez anos atrás, que eu não via desde que ela concluiu o Ensino Fundamental.
No dia seguinte, acho que era feriado, outra mensagem: “Mande seu telefone para o meu e-mail, quero ligar pra você”.
Vivian era uma aluna muito dedicada, que não trabalhava e estudava à noite, porque já tinha uma alta distorção idade/série, como chama o MEC. Aproveitava o dia para estudar, fazer cursos... Fazia tudo para ser uma das melhores alunas da turma e da escola. Discutia assuntos da atualidade, perguntava muito, pedia explicações sobre esses temas... Estava sempre entre os destaques no Conselho de Classe – indicada até por quem não era professor dela – e tirava as melhores notas da escola. Quando o diretor queria saber alguma coisa sobre a turma, inclusive quanto a problemas de relacionamento com algum professor, ele a procurava.
Expansiva, faladeira, barulhenta, muitas vezes queria responder antes de todos às perguntas que eu fazia para a turma, quando na verdade eu sabia que ela sabia, mas queria instigar os outros alunos. Ela não percebia isso, até que um dia, depois da aula, eu comentei com ela: “espera os outros responderem, porque, se não for assim, você fica malvista pelos colegas, como exibida, puxa-saco... E não me ajuda a trabalhar com seus colegas”. Ela entendeu e passou a segurar a onda, mas às vezes não resistia.
Escrevia bem, com um grande mérito: não buscava complicar ou usar palavras difíceis. Nos dias de prova, eu procurava deixá-la perto dos alunos fracos mas esforçados: se era pra dar cola, que desse pra quem está tentando aprender, e não para aqueles que querem vencer pela preguiça e pela esperteza.
Vivian representava um padrão de estudante que já naquela época era a moda antiga: não faltava, ficava até o fim da aula, levantava a mão pra perguntar qualquer coisa, estava sempre atenta à aula... E até trazia bolinho inglês para os professores no dia 15 de outubro!
Aliás, houve um dia em que ela estava conversando, completamente desinteressada da aula. Perguntei o que houve, ela não quis dizer. Fiquei mais tranquilo ao perceber que ela estava contente, que era coisa boa. Apesar de meus esforços, não consegui descobrir o que era.
Como na época em que ela estudou na escola não era oferecido o Ensino Médio, ao concluir o Fundamental ela se afastou, e nunca mais apareceu por lá. Perdemos contato.
Voltando ao Orkut. Informei meu telefone e em menos de cinco minutos ela me ligou. Ficamos conversando uma meia hora. Eu só dizia a ela: “você é louca, sua conta vai ficar uma fortuna!” E ela retrucava: “Não tem problema, eu não ia deixar de falar com você depois de tanto tempo”.
Contou de sua vida, que começou a trabalhar aqui no Rio de Janeiro e não acabou o Ensino Médio; depois se casou e acompanhou o marido quando ele foi transferido: mudou-se de mala e cuia para Santa Catarina. Agora está trabalhando numa rede de supermercados, vendendo cartão de fidelidade. No Sul, procurou um colégio particular em regime de supletivo para concluir os estudos; quase foi expulsa porque cobrava aula dos professores, interesse dos alunos. Mandou cartas pra Secretaria de Educação que resultaram em visitas das autoridades à escola para averiguar as denúncias. Aí achou melhor sair enquanto estava viva.
No telefonema, contou ainda que estava para sair de férias e vinha visitar a mãe, no Rio, e pretendia aproveitar a oportunidade pra passar na escola para reencontrar professores de sua época.
Eu já tinha meio que esquecido desse telefonema. Na escola, o sinal estava para tocar antes das aulas; no meio do burburinho do pátio, aparece Vivian. Mais cheinha (ela era muito magrinha), mas espevitada do mesmo jeito. Já tinha jeito de mulher, porte de profissional de vendas, ar de trabalhadora. Conversamos muito. Quando o sinal tocou, subi para a sala, coloquei um exercício no quadro-negro e voltei para continuar a conversa. Contou-me um pouco mais de suas experiências catarinenses, como foi importante, na sua profissão, saber escrever e organizar suas ideias no papel, mostrou fotos de eventos internos do supermercado, em que recebeu algumas premiações e promoções. Numa delas eu me surpreendi: “Ei, essa aqui não é a Daniela?” “É, ela é a minha supervisora.” “Pois é, ela trabalhou no banco, comigo! Não sei se ela vai se lembrar de mim, tem mais de 10 anos...” Ela gostou de saber, mas se despediu logo porque “não ia perder a oportunidade de estar no Rio de Janeiro, sem o marido, e não sair pra badalar”, e ainda tinha que se arrumar...
Tempos depois ela me mandou uma mensagem: “Dani ficou super contente de saber que você foi meu professor e contou boas histórias do tempo em que vocês trabalharam juntos”.
Há uns dias visitei sua página no Orkut, e tinha lá um álbum: “Fotos do Rio”. Além das fotos das festas na empresa, tinha uma foto comigo, na escola, que ela pediu para um inspetor tirar. Mas tinha também uma com outra professora... Fiquei com ciúmes, mas não comentei nada com ela.
Encontrar e reencontrar uma aluna como a Vívian traz sempre uma sensação de sucesso profissional, de trabalho benfeito.
Publicado em 25 de maio de 2010
Publicado em 25 de maio de 2010
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