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Níveis de escolaridade e mercado de trabalho em mutação

Tatiana Serra

Quem tem hoje por volta de 60 anos de idade e procurou o primeiro emprego em plena juventude (há 40 anos, mais ou menos) deve se lembrar de que ter ensino superior completo era privilégio de pouquíssimos. Nessa época, a exigência do ensino médio completo, o então chamado científico, era sinal de bons salários; ter apenas o ensino fundamental era o mais comum. Porém, a impressão que se tem é de que ou tudo passou rápido demais ou andam pulando etapas por aí.

Até bem pouco tempo atrás, podia se dizer que as melhores vagas de emprego se apresentavam da seguinte forma: “Para preencher esta vaga, é preciso ter ensino superior completo”, dizia o anúncio de um jornal... E lá deixavam de marcá-lo em vermelho boa parte das pessoas, enquanto apenas a minoria conquistava vagas como essa. Mas pergunta-se: de quando seria esse anúncio? Do século passado, provavelmente. Afinal, as taxas de desemprego, os pré-requisitos para uma vaga, as estatísticas... Enfim, há muitos indícios de que ter cursado uma faculdade já não é o “suprassumo” na busca por melhores salários – vale ressaltar que a expressão “suprassumo” (o mesmo que “melhor”) é aqui bem empregada como referência ao século passado.

Porém, isso não significa que hoje só haja espaço para quem tem no mínimo uma faculdade no currículo. As pessoas com nível superior completo ainda não são a maioria dos brasileiros. Na verdade, estamos longe disso, e ainda temos cerca de 10% de analfabetos, de acordo com dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) divulgados pelo IBGE em setembro de 2010. O mercado de trabalho é que tem exigido mais e melhores qualificações. Quem consegue chegar à universidade e concluir seu curso – já que algumas pessoas que ingressam numa universidade pouco tempo depois abandonam – logo se depara com a necessidade de se especializar. Então, mestrado, doutorado e pós-doutorado, entre outros, passam a ser as próximas conquistas almejadas pelo recém-formado.

Por outro lado, mas ainda falando em especialização, o mercado também exige, dos que não têm acesso às universidades, habilidades específicas vindas de cursos técnicos – aqueles que hoje equivalem ao ensino médio ou aqueles mais curtos que o ensino superior e que oferecem diploma equivalente a uma faculdade. Com isso, vive-se uma mutação nos níveis de escolaridade e no mercado de trabalho.

Novo mercado de trabalho

Se as exigências do mercado de trabalho estão mudando, é sinal de que suas outras características também estão em transformação. Em entrevista à revista Você S.A., em março de 2010, a professora Isabel Macarenco (autora do livro Competência: a essência da liderança pessoal, em parceria com a professora Maria de Lurdes Zamora Damião) falou sobre esse “novo mercado de trabalho”.

Questionada sobre as regras do jogo no atual mundo corporativo, Macarenco disse: “Entender sobre o negócio, sobre a área de atuação e sobre a contribuição a ser agregada com o perfil pessoal e profissional permite entender as novas regras que permeiam o mundo das competências. Para facilitar a compreensão do jogo atual, podemos utilizar as concepções de Alvin Toffler (escritor especialista em apontar tendências para o mercado) sobre a história da civilização, que nos ensinou que essa história já passou por três ondas de transformação: a primeira compreende o período agrícola, a segunda o período industrial e a terceira o período da revolução da informação”.

Por que a informação teria se tornado tão importante na terceira onda? Isabel explica que “a razão está no fato de que a sociedade se desmassificou e vem se tornando cada vez mais complexa, quase que impossível de geri-la sem informação e sem tecnologia da informação (computadores e telecomunicações). Na nova civilização e no mundo corporativo da terceira onda, é necessário que processos sejam continuamente melhorados, produtos modificados, sendo, consequentemente, exigido alto grau de inovação por parte das empresas (competências organizacionais) e por parte de seus funcionários (competências individuais)... Buscar conhecimentos mais ampliados é ir além da área de formação técnica, é sinal de sabedoria, porque facilita o saber lidar com a diversidade de culturas e formas humanas de organização presentes na teia”.

Estudo nem sempre garante futuro melhor

Estudo realizado pela Orga­nização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) publicado no início de setembro de 2010 mostra que em 2008 a taxa de desemprego de brasileiros economicamente ativos (25 a 64 anos) foi maior entre os que têm ensino médio completo. Conforme publicou a Gazeta do Povo, em 28 de setembro, “o índice foi de 6,1% contra o porcentual de desocupados de 4,7% entre os que não concluíram essa etapa da escolarização. Entre os países que não são membros da organização mas são parceiros (além do Brasil, Eslovênia, Estônia e Israel), a existência de maior número de desempregados com mais qualificação só foi observada no Brasil.

A explicação para o índice de desemprego mais elevado entre pessoas com ensino médio completo não é conclusiva, mas há algumas hipóteses, como a qualificação por meio do trabalho (e não pelo estudo) e a mu­­dança do perfil exigido. Para o professor de Economia da UFF, Cláudio Considera, um dos reflexos desse índice pode ser o fato de setores precisarem de mão de obra especializada em uma determinada área, o que não implica escolaridade formal.

Um desses segmentos é o de serviços. Em 2008, por exemplo, a área liderou a geração de empregos, com 648 mil postos, seguida por construção civil e indústria da transformação, de acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). No primeiro semestre deste ano, o setor de serviços continuou a ser o líder em geração de vagas, com 480 mil em­­pregos. ‘Para esses setores, o que vale é o treinamento que o trabalhador já teve em experiências anteriores no mercado. O nível de escolaridade acaba importando pouco’, explica Considera.

Economista do Depar­ta­mento Intersindical de Esta­tística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Cid Cordeiro lembra que o perfil do mercado de trabalho nesta década também se modificou. ‘Nos anos 90, como o desemprego era alto, as empresas estabeleciam critérios que a função não exigia. Hoje, com mais postos, as exigências caíram e se contrata trabalhador com ensino médio apenas para cargo que realmente precise’. Para ele, essa nova organização ajuda inclusive a diminuir a insatisfação no trabalho.

Já Paulo Corbucci, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), acredita que o ensino médio se perde no meio do caminho da dinâmica do mercado de trabalho brasileiro. Segundo ele, existem três situações: a de pessoas com ensino superior completo, que têm a possibilidade de conseguir trabalho em profissões regulamentadas; grande demanda para ocupações onde não são necessários muitos anos de estudo, e sim formação específica ou técnica (como construção civil, trabalhadores domésticos e serviços); e a proporção de pessoas com ensino médio completo. Estas últimas ficam no meio do ‘caminho’; portanto, com maior dificuldade para se inserir no mercado.

Outra possibilidade seria o jovem estar mais focado em entrar no ensino superior do que em trabalhar. Ainda segundo dados do estudo da OCDE, a taxa de homens jovens (com idade entre 15 e 19 anos) que não estão na força de trabalho é de 37,3%, índice que diminui à medida que a idade avança”.

Cursos de mestrado e doutorado em crescimento

O número de cursos de mestrado e doutorado cresceu 20% no Brasil nos últimos três anos, segundo a Folha online em 14 de setembro de 2010; esse era um dos resultados da avaliação trienal (2007-2010) divulgada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao MEC. “O maior crescimento foi na região Norte, com incremento de 35% nos últimos três anos. Foram avaliados 2.718 programas de pós-graduação, que correspondem a 4.099 cursos, sendo 2.436 de mestrado, 1.420 doutorados e 243 mestrados profissionais.

De acordo com o presidente da Capes, Jorge Guimarães, a razão para essa disparidade é histórica e está ligada à organização econômica e científica do país. Segundo a Capes, entre 2007 e 2010 a pós-graduação brasileira formou 100 mil mestres, 32 mil doutores e 8 mil mestres profissionais”.

Escolaridade da população adulta aumentou

Conforme publicou o site iG no dia 8 de setembro de 2010, “melhorou a escolaridade da população adulta do País com mais de 25 anos de idade. Dados da PNAD, divulgada pelo IBGE, mostram que o número de brasileiros nessa faixa etária que são portadores diplomas de ensino médio ou superior cresceu 7,1% desde que começou a ser medido, em 2004.

Naquele ano, 18,4% da população possuíam o ensino médio ou equivalente completos; 2,8% não tinham concluído o ensino superior e o diploma universitário era uma realidade para 8,1% das pessoas. Em 2009, os mesmos indicadores passaram para 23%, 3,5% e 10,6%, respectivamente.

A rede privada de ensino foi a que mais atendeu aos universitários brasileiros, uma tendência já verificada em outros anos. Do total de estudantes nessa fase, 76,6% estavam matriculados em instituições privadas de ensino superior”.

Mas e quanto à qualidade dos cursos? De acordo com os resultados apresentados pelo MEC nos últimos anos, podemos acreditar que, infelizmente, a bandeira levantada por boa parte dessas instituições está mais no campo da quantidade de cursos do que no campo da qualidade.

De todo modo, são dados que nos levam a considerar que, com o aumento do nível de exigência para a empregabilidade, é papel do professor incentivar seus alunos a continuar seus estudos, com vistas a melhorar suas possibilidades de inserção e movimentação no mercado de trabalho. 

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Publicado em 5 de outubro de 2010

Publicado em 05 de outubro de 2010

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