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Cidade surda
Alexandre Amorim
Como se fosse um Godzilla, o Rio de Janeiro cresceu mais do que devia. É uma metrópole gorda metida em um corpinho de província, e isso causa certo desconforto. Aliás, vários desconfortos. Para mim, um dos maiores incômodos de viver no Rio são os barulhos que essa cidade gera. São milhões de pessoas querendo ouvir música, querendo se comunicar, propagandear alguma ideia ou algum produto, vender o seu peixe. Quem já foi à feira sabe como um vendedor de peixe faz barulho, e é justamente por isso que eu me incomodo: os decibéis da cidade são inversamente proporcionais ao nosso direito de tranquilidade.
Essa vontade de se comunicar em um lugar cuja população mal cabe em sua geografia acaba se desvirtuando em exageros: desde o carro com equipamento de som para anunciar candidatos políticos ou eventos imperdíveis até as festas em condomínios, passando pelos celulares com tocadores de mp3, ensaios de samba que vão até de manhã ou festividades em praças públicas, todos exacerbam a vontade de se comunicar e invadem a tranquilidade alheia. O som é constantemente mais alto do que deveria e invade as casas do entorno sem pedir licença. No caso dos celulares, invade os ouvidos alheios em ônibus, trens e metrôs. Me impressiona bastante a necessidade de amplificação de qualquer som, desde um cantor de bar, com seu banquinho e violão (e que agora precisa também de um microfone e amplificador) até o vendedor de loja que se posta na calçada com a voz magnificada por aparelhos eletrônicos. Microfone é como avião: foram inventados por pessoas de boa vontade, mas caíram em mãos erradas.
A Resolução Municipal 198, de 2002, prevê policiamento e ações contra o abuso sonoro, mas algumas inovações poderiam ajudar. Proponho que a prefeitura fomente um prêmio para quem inventar um aparelho que corte a parte elétrica/eletrônica do aparelho cujo barulho exceder os decibéis permitidos. Se o celular tocar música alta, a bateria queima. O carro de som desliga cada vez que se liga o microfone. Nos bares, desligam-se o som, a luz e a geladeira. E – é claro – nos prédios, acaba a luz do prédio todo, menos a dos elevadores, para as pessoas da festa poderem ir para suas casas e deixar a vizinhança dormir em paz.
Publicado em 26/10/2010
Publicado em 26 de outubro de 2010
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