Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

Alfabetização e poesia

Palmyra Baroni Nunes

Mestre em Linguística Aplicada, professora da rede municipal do Rio de Janeiro

Quem sobe nos ares não fica no chão,
Quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
Estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

(Ou Isto ou Aquilo, Cecília Meireles)

O ano de 2011 marca os cento e dez anos do nascimento da escritora Cecília Meireles. Autora de diversas obras, dentre as quais se encontra uma bastante conhecida de crianças e adultos, o livro de poesias Ou isto ou aquilo. Nele, existe uma coletânea de poesias cheias de aliterações, que contribuem para a criação de imagens e ritmos que facilitam a compreensão e interpretação dos textos e que podem ser usadas pelo professor com seus alunos para diversos fins. Os sons das palavras não são escolhidos de forma aleatória; pelo contrário, eles acabam por contribuir para que o leitor construa significados, descobrindo, assim, a beleza das poesias.

Pensando na riqueza das poesias de Cecília nesta obra, acredito haver uma bem-sucedida relação entre alfabetização e poesia. Segundo Mary Kato, em seu texto Como a criança aprende a ler: uma questão platoniana (Zilberman e Silva, 2004), existe uma fase no aprendizado da criança em que esta adora versos rimados e brinca com palavras que rimam. Tal fase se estende da alfabetização ao letramento. Daí a importância de trabalhar com poesias na sala de aula, por se tratar de um gênero textual em que forma, conteúdo e ritmo podem ser explorados de maneira significativa para ensinar a ler, desenvolver a fluência na leitura oral e na interpretação de textos pela criança. Por ser um gênero que mexe com o imaginário, rico em significados, a habilidade da escrita também pode perfeitamente ser incentivada e melhorada pela produção de poesias feitas pelos próprios alunos. Além disso, a musicalidade presente nos textos de Cecília aumenta a consciência fonológica dos alunos, auxiliando, assim, no processo de alfabetização.

O trabalho com poesias na alfabetização pode acontecer de formas distintas, pois diversas áreas do conhecimento são ativadas, desde o reconhecimento da repetição de um fonema até o sentido estabelecido pela repetição desse fonema. Com isso, podem ser desenvolvidas atividades variadas com as poesias, tendo objetivos distintos, para atingir alunos em diferentes fases de aprendizagem.

Quando os alunos ainda apresentam pouca experiência com a leitura, as atividades podem ser de reconhecimento de sílabas e palavras que estão sendo trabalhadas pelo professor. É importante expor as poesias trabalhadas na sala de aula, para que possam ser usadas sempre que necessário, ou seja, conforme vão sendo apresentados, fonemas e sílabas podem ser identificados em poesias já lidas pela turma, para que os alunos percebam seu avanço na leitura. Com essas atividades, os fonemas e as palavras são apresentados dentro de um contexto, sempre associados a textos.

Com o objetivo de verificar a fluência e, ao mesmo tempo, autonomia na leitura de palavras, os alunos podem receber as poesias com lacunas, para que identifiquem as palavras que faltam para completar esses espaços. Após a leitura, devem colocar as palavras no local onde elas se encaixam, sempre recebendo feedback do professor.

A escrita também pode ser contemplada com atividades em que os alunos devem escrever as palavras que estão faltando nas poesias, como um ditado contextualizado. Podem ainda ser convidados a interpretar e fazer sentido com atividades em grupo em que os versos são recebidos e depois colocados em ordem; através da leitura da poesia original, os alunos checam se a ordem está correta e, caso não esteja, fazem as mudanças adequadas. Essas atividades contribuem para que os alunos ganhem maior confiança e intimidade com a leitura e a escrita. Além disso, a leitura das poesias em voz alta ajuda a perceber o que as repetições representam dentro do contexto.

Apresentar as poesias em painéis envolve outras linguagens, uma vez que a criação deles busca a interpretação da poesia e a tradução daquilo que os alunos entenderam por meio de desenhos em que geralmente todos dão palpites ao participar de sua confecção. Por outro lado, algumas poesias são mais bem apreciadas e entendidas se representadas pelos alunos, que podem buscar diferentes e interessantes formas de mostrá-las, criando uma atmosfera de união e troca, tão importante em qualquer ambiente escolar.

Numa época em que muito é discutido sobre os benefícios que o desenvolvimento de um trabalho eficaz com gêneros textuais traz para classes de alfabetização, este texto demonstra a contemporaneidade das poesias de Cecília Meireles. Assim como outros escritores, ela nos deixou um solo bastante fértil, que pode ser explorado tanto para ensinar a ler quanto para ensinar a gostar de ler, já que poesia e alfabetização fazem um entrelace perfeito para a aprendizagem. O ano de 2011 traz uma bela oportunidade de fazer com que esse entrelace aconteça – o que seria também uma bela homenagem à escritora Cecília Meireles.

Referência

Zilberman, R & Silva, E. T. Leitura: perspectivas interdisciplinares. São Paulo: Ática, 2004.

Publicado em 15 de março de 2011

Publicado em 15 de março de 2011

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.