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Os desafios e as conquistas da Educação Inclusiva

Mariana Cruz

Ilustração

Luísa Azevedo Guedes, pesquisadora e professora do Colégio Pedro II, concedeu uma entrevista à revista Educação Pública na qual debate o tema de estudo de seu mestrado, sobre Educação Inclusiva. Luisa é também membro do LaPEADE – Laboratório de Pesquisas, Estudos e Apoio à Participação e à Diversidade em Educação da Faculdade de Educação da UFRJ, coordenado pela professora Mônica Pereira dos Santos.

Nesta entrevista, além de uma abordagem histórica e sociológica do tema, Luísa mostra que, apesar dos avanços nessa área, ainda há uma verdadeira “luta política” a ser travada a fim de que se mude a concepção perversa de que pessoas com deficiência não fazem parte da sociedade. Ela direciona seus esforços para tornar a Educação Inclusiva uma realidade cada vez mais presente, para que assim as crianças de hoje, deficientes ou não, tenham a possibilidade de viver a “riqueza desse tipo de relação”.

Educação Pública - Historicamente, como se deu o processo da Educação Inclusiva?

Luísa - É importante ter em mente que a história da inclusão escolar é a história das exclusões.  E que essa história das exclusões caminha junto à história da própria escola e, mais ainda, junto à história da formação da nossa sociedade. O que eu quero dizer é que pensar em inclusão, hoje, é pensar numa construção histórica, na história do homem e das sociedades. Algumas situações que hoje achamos serem “naturais” na verdade são construções históricas. Podemos pensar que houve uma época em que nós achávamos “natural” ou “normal” que a educação e, especificamente, a escola era só pra alguns, e muitos de nós naquela época não estariam na escola. Por exemplo: Houve uma época em que escola não era pras mulheres. O lugar das mulheres era em casa, no ambiente privado da família. Sua socialização era restrita e não passava pela cabeça dos homens nem das mulheres que elas deveriam estar nas escolas. O que era necessário aprender se aprendia no ambiente familiar. As mulheres não precisavam sequer saber ler e escrever. Essa era tarefa do homem, e não havia uma demanda da sociedade para que elas soubessem ler e escrever. Mulher não estudar era “natural”. Podemos ir mais longe: numa época não existia infância, o conceito de infância não existia. As crianças, os infantes (palavra que significa “sem fala”) eram considerados não adultos. Não havia cuidados para a infância, não havia um olhar diferenciado pras crianças, espaços pensados pras crianças. Elas eram vistas como seres incompletos. Muitas crianças morriam porque não eram cuidadas. Isso era “natural”. A ideia de infância, que hoje pra gente é obvia, é uma ideia construída sócio-historicamente. A discussão sobre infância hoje está no centro do debate sobre educação. Como exemplo disso, temos leis que asseguram os direitos da criança; mas isso não foi sempre assim. Esses exemplos dão a dimensão de como algumas coisas consideradas por nós como “naturais” pertencem a sociedades e épocas determinadas. É necessário desconstruir essa ideia de “natural” pra colocar no lugar desse conceito o conceito de “construído socialmente”.

E aí entra outra discussão, que é a discussão sobre normalidade. Pra se pensar em normalidade é preciso que a gente tenha uma ideia do que significa anormalidade. Um conceito não existe sem o outro. E a gente aprende desde pequeno que existem coisas que são normais e outras que não são. Essa forma de pensar está presente na sociedade. Muitas profissões vêm contribuindo pra criar e corroborar determinadas classificações.  Classificar faz parte de nossa cultura. Em cada época existe aquilo que é considerado normal e aquilo que é considerado anormal.  Como a gente está imerso na cultura, acaba que nossas concepções, nossos valores estão tão colados na gente, na nossa forma de pensar, que é difícil ter um olhar exotópico, um olhar de fora da gente que enxergue essas construções das quais, na maioria das vezes, não temos consciência. Um olhar que duvida da gente mesmo, que subverte a lógica dominante, que questiona os nossos valores que foram construídos na nossa história de vida e na história da nossa sociedade, que nos faz duvidar daquilo que nos parece tão natural.

Os estudos de Gilberta de Martino Jannuzzi sobre a história da deficiência no Brasil apontam que, a partir do século XVIII, com o surgimento das “rodas de expostos”, que eram instituições religiosas de acolhimento das crianças abandonadas, teria havido os primeiros espaços de acolhimento das crianças com alguma “anomalia”. Até então, essas crianças eram simplesmente abandonadas até morrerem nas ruas. Não se sabe ao certo que tipo de cuidado as crianças tinham nessas instituições, mas, a partir do século XIX, além da assistência, da alimentação, passaram a oferecer algum tipo de educação. No século XIX, ainda, foram criados institutos especializados de educação para crianças surdas e para as crianças cegas. Lembre-se de que nessa época o ensino nas escolas não era pra todos. Pouquíssimos tinham acesso à educação e poucos iam à escola. Nas camadas mais ricas, o ensino acontecia em casa, com preceptores. Acontecia que as crianças consideradas como tendo anomalias mais explícitas chamavam a atenção de estudiosos, que criaram e trabalharam em instituições especializadas. A institucionalização das pessoas deficientes acontecia em paralelo com a institucionalização das pessoas “normais”.

O modelo seriado de escola surgiu no Brasil no século XIX, quando se começou a separar os alunos por nível de adiantamento. Uma das hipóteses é de que isso pode ter facilitado a criação de classes para crianças com dificuldades de aprendizagem. Ainda no século XIX houve preocupação de desenvolver o país, que era ainda um país rural. As instituições para deficientes não tinham investimento porque não produziam mão de obra e não eram espaços de ideologização.

No final do século XIX, no Brasil, a escola passou a ter caráter mais positivista, com o ensino das Ciências, Matemática, Astronomia, Física, Biologia, Sociologia... O ensino ficou enciclopédico. O ensino da escola regular (não tinha essa denominação, mas vou chamar assim) foi se distanciando do ensino das escolas (das poucas escolas) para deficientes, que tinha um caráter profissionalizante (de trabalhos manuais), defendido em nome da garantia de subsistência dos deficientes. A mesma concepção de ensino das escolas das camadas populares.

Esse breve histórico dá a ideia de como a concepção de educação dos deficientes surgiu, em paralelo com a concepção de educação para as pessoas consideradas normais. Hoje, pra muitos é “natural” que os deficientes estejam em escolas especiais, mas vemos que, assim como a concepção de educação da escola regular que temos hoje foi construída, a concepção de uma escola separada para os deficientes também foi. Mais tarde, no século XX, estudiosos começaram a pensar numa alternativa de educação pras pessoas com deficiência, percebendo que a escola especial contribuía para segregá-las ainda mais na sociedade. Começou-se a falar em integração dessas pessoas na escola. Primeiro, criando turmas especiais em escolas regulares; depois, pensando em alternativas para essas crianças fazerem parte de turmas regulares durante um período do dia para conviver com outras crianças, ditas “normais”. Em paralelo a isso, a concepção de que essas crianças não podiam aprender por causa das suas limitações foi se modificando. Achava-se que crianças com determinadas deficiências tinham o mesmo limite para aprender. Estudos sobre o cérebro e a descoberta da sua plasticidade, ou seja, da sua capacidade constante de aprendizagem, contribuíram para que se tivesse outro tipo de olhar pras pessoas com deficiência. Junto aos avanços da ciência, movimentos de pessoas com deficiência e suas famílias passaram a reivindicar seu lugar como membros da sociedade e a questionar a segregação.

Todo esse movimento de mudança de pensamento nos levou a pensar na inclusão, que é diferente do conceito de integração de que eu já falei. A inclusão das pessoas com deficiência pressupõe uma reorganização social que inclua de fato esses grupos para que sejam membros das instituições sociais. No caso da escola, exige que ela se reestruture pra atender à diversidade. Aquela escola em que o professor é considerado o único detentor de um conhecimento que passa para os alunos não serve mais pra dar conta da diversidade, que na verdade sempre existiu, mas que nunca foi foco de preocupação das práticas escolares. Se antes a pergunta era como esse aluno “diferente” (muitas aspas!) vai se adaptar à escola, com suas atividades, seu tipo de avaliação, agora a pergunta passa a ser: o que nós da escola precisamos modificar ou inventar pra garantir que todos os alunos participem da escola, se sintam membros dela, para que ela seja seu espaço de expressão, de atuação e para que eles aprendam?

Mas por que hoje é possível falar em inclusão? Porque algumas transformações vêm ocorrendo. O próprio espaço da escola tem sido questionado, as concepções de escola vêm sendo questionadas. Não há uma transformação significativa do modelo de escola em relação àquela escola positivista criada em outras épocas, mas há novos modelos de experiências que estão surgindo a partir desse questionamento do que é ensinar, do que é aprender, do que é a escola. Essas novas formas de pensar a educação vão criando possibilidades de pensar numa escola ideal pra uma sociedade ideal, que dê conta da diversidade que existe, que sempre existiu.

Questionamos um modelo de escola do tipo que enxerga nossos filhos como seres passivos na relação com o conhecimento. A gente quer uma escola em que ele tenha espaço pra se expressar, pra construir o conhecimento, e não só absorver um conhecimento dado por um adulto, sem questionamento, sem participação.

Educação Pública - O que é, de fato, uma escola que trabalha com inclusão?

Luísa - Muitas vezes o conceito de inclusão tem sido associado, de forma restrita, à questão das deficiências. Políticas e práticas focadas em tal questão têm contribuído para combater a segregação dessa população, que historicamente tem sido atendida em espaços restritos da sociedade. No entanto, numa instituição, quando consideramos que o conceito de inclusão está relacionado a esse grupo de forma restrita, podemos estar contribuindo para a manutenção de práticas excludentes, na medida em que colocamos o sujeito com deficiência no lugar do “diferente”,dooutro  em contraposição a nós, que seríamos os pertencentes ao grupo da normalidade, dos “iguais”. E ainda pode contribuir para o silenciamento de todas as outras diferenças presentes na escola e todas as dificuldades que temos em lidar com elas. Diferenças essas que dizem respeito àqueles que são ou se sentem excluídos mesmo estando dentro da escola. A exclusão é um processo sócio-histórico e, portanto, objetivo e gerador de desigualdades. Mas é também subjetivo, o que significa que só podemos compreender o sentimento de exclusão do outro se tivermos um olhar atento e cotidiano. Assim, é importantíssimo que haja o entendimento de que inclusão não é sinônimo de inserção. A primeira barreira a ser vencida é a de estar fora da escola. Uma vez dentro do sistema educacional, surgirão muitas outras barreiras à participação plena e ao aprendizado. Se a inclusão passa a ser vista como um processo que busca a minimização das barreiras impostas pela escola e à escola, então ela significa um constante investimento por reconhecer e combater as diferentes formas de exclusão.

A inclusão, vista sob essa perspectiva mais ampla, foca o olhar nos processos que ocorrem no interior da escola e dos sistemas de ensino e na sua revisão quando percebemos que são excludentes. A ideia de “barreiras à aprendizagem e à participação” que são impostas pela escola e à escola retira do aluno a responsabilidade pelo seu não aprendizado e sua não participação. No LaPEADE preferimos utilizar o termo “barreiras”, ao invés de falarmos em “necessidades educacionais especiais”, porque está presente neste último a ideia de que as questões que podem impedir o aprendizado estão no aluno. Já o primeiro conceito desloca para a escola e os sistemas de ensino a responsabilidade pelo não aprendizado desse aluno. Se todos os alunos devem estar na escola, se devem aprender e ter uma participação plena, o tipo de problematização que se faz necessária diz respeito à escola e a como reestruturá-la para atender à demanda de todos que dela participam.

Educação Pública - O bullying ocorre normalmente com pessoas que saem do padrão, mesmo que não tenham nenhuma necessidade especial. O que dizer então das pessoas com necessidades especiais em relação a tal conduta?

Luísa - O bullying é um nome novo para uma prática antiga. Percebo que esse termo tem sido usado de forma indiscriminada e precisamos problematizar isso. No entanto, considero que nomear tal prática é importante para desvelá-la nas suas diferentes manifestações. Aprendemos desde cedo a classificar as pessoas, e essas classificações são baseadas em valores que estão presentes na nossa sociedade capitalista e na época da qual fazemos parte. O tipo de preocupação que as pessoas envolvidas com as instituições educacionais precisam ter, acredito, diz respeito a uma subjetividade que só pode ser percebida e avaliada a partir de um olhar e de uma escuta atentos ao cotidiano da escola e aos sujeitos que participam dela. As diferenças que se apresentam na comparação que fazemos entre pessoas consideradas “normais” e pessoas com deficiência são percebidas de forma mais evidente por nós porque estamos acostumados a vê-las como diferentes. Essa é uma construção histórica. Precisamos deixar de entender a diferença no outro e entendê-la como uma relação entre os sujeitos, como algo que está no meio, entre mim e o outro. A diferença é o que nos constitui como sujeitos singulares. Se denominamos o outro “diferente”, então é porque nos consideramos fazendo parte do grupo dos “iguais”, e essa percepção nos conforta. É necessário desconstruir essa lógica, e uma das formas, acredito, é através de políticas de ação afirmativa. Isso significa lutar para que as pessoas com deficiência participem dos espaços oficiais existentes na nossa sociedade. Um deles é a escola regular. No entanto, como já disse antes, a simples inserção desses sujeitos na escola não é sinônimo de inclusão. Se inclusão é um processo sem fim, porque se trata de uma luta contra todas as formas de exclusão, a sua inserção é apenas o início desse processo. Acredito que o primeiro passo para essa construção é a criação de estratégias para que cada membro da escola encontre a sua responsabilidade nesse processo. Essa inclusão ampla na qual acredito envolve a todos, adultos e crianças, que precisam se sentir responsáveis pela inclusão de todos. Não acho que seja um caminho fácil, porque, nessa perspectiva, é preciso modificar valores e concepções que estão “colados” na gente, assim como rever as políticas e práticas das instituições. Para isso, é preciso ampliar o diálogo e a participação de todos. Não é um caminho fácil, mas é um caminho possível.

Educação Pública - As creches e escolas que trabalham com educação infantil muitas vezes têm um ambiente mais protetor, mais propício para lidar com crianças com necessidades especiais. Mas quando essas crianças chegarem ao ensino fundamental e, principalmente, ao ensino médio, como será a vida delas (as turmas são mais cheias, com apenas um professor, as panelinhas começando a se formar etc.)?

Luísa - Parece ser um grande desafio, já que tanto se discute sobre as formas de a escola receber as pessoas com deficiência. Vejo nas escolas muita resistência a esse tipo de inclusão e até a esse tipo de inserção. Para que a sociedade e a comunidade escolar reconheçam a legitimidade da presença desses grupos na escola regular é necessária a revisão dos seus valores, das suas concepções. E isso é muito difícil, porque geralmente não temos consciência de onde eles vêm, de como foram construídos. Uma vez inseridas na escola as pessoas com deficiência, a percepção sobre como deve ser a adaptação dessa escola pra acolher a diversidade – que tem como base as concepções e valores dos sujeitos envolvidos nela – vai estar relacionada às suas concepções sobre os papéis da escola, do aluno, do professor e dos demais profissionais da instituição. Quanto mais as séries avançam, maior valor é dado ao conhecimento intelectual no currículo. Outras formas de conhecimento e outras formas de aprender vão tendo menos importância na escola, tal como a concebemos hoje. Essa concepção de escola se configura em uma significativa barreira para o aprendizado e para a participação de muitas crianças e jovens, se considerarmos que cada um tem facilidades e dificuldades diferentes, assim como cada um tem formas diferentes de aprender. Esse tipo de barreira gera muitas exclusões dentro da escola. E mais exclusões ainda quando esses alunos têm algum tipo de deficiência intelectual ou quando a escola considera que têm dificuldades de aprendizagem. Precisamos ter em mente que a escola e a sociedade consideram como deficiência e dificuldade de aprendizagem formas de construir o conhecimento, de apreender o mundo que se distanciam da forma como a escola tem construído a sua concepção de ensino/aprendizagem. Vejo uma mobilização maior ainda no primeiro segmento do fundamental por problematizar o trabalho com crianças com deficiência ou dificuldades de aprendizagem, bem como um número maior de experiências bem-sucedidas nesse sentido em relação aos demais níveis posteriores. Acredito que seja porque o fundamental seja menos fragmentado que os demais, porque em geral tem um professor ou poucos professores que acompanham a turma no dia a dia. A fragmentação nos níveis posteriores se configura como uma barreira para o diálogo e a participação dos membros da escola. Outro problema, acredito, é a valorização do conhecimento específico de cada disciplina em detrimento de outros conhecimentos que a escola proporciona relativos à relação com o conhecimento do mundo e à socialização. É como se a cada novo nível a estrutura dos sistemas de ensino e das escolas (suas culturas, políticas e práticas) fosse permitindo a construção de processos mais excludentes. Mas estamos falando de uma configuração de sistema de ensino tal como se apresenta, na maioria dos casos, hoje. Isso não significa que não haja experiências que sirvam de modelo nem que não haja possibilidade de pensar numa escola mais inclusiva nos ensinos fundamental e médio. Na verdade, acredito que tornar escolas mais inclusivas é, ao mesmo tempo, mais simples e mais complexo do que imaginamos. Significa um olhar focado no cotidiano e que, ao mesmo tempo, se desprende dele pra compreender a estrutura na qual estão inseridas as práticas realizadas. Acredito ser mais simples porque a inclusão acontece no dia a dia, nas estratégias cotidianas preocupadas com olhares e escutas atentas para os sujeitos que fazem parte da comunidade escolar, nas relações entre eles e entre eles e o conhecimento. Mais complexa porque é preciso ser vista como um processo que envolve a todos. Enquanto for concebida como ações pontuais, a compreensão e a revisão dos objetivos das práticas realizadas na escola continuarão restritas a essas práticas pouco inclusivas (ou mais excludentes).

Educação Pública - Como trabalhar com os alunos considerados "normais"  na lida com alunos com necessidades especiais que sejam da mesma classe ou da mesma escola?

É possível que a percepção da diferença que existe entre nós (pessoas que se identificam como normais) e as pessoas com deficiência gere práticas mais excludentes do que geram as outras percepções que temos sobre outras diferenças, enquanto não for considerada “natural” a presença desses grupos na escola regular. Uma forma de trabalhar essa questão na escola é garantir que haja espaço para que esses possíveis estranhamentos sejam verbalizados e trabalhados. Acredito ser importante, também, que se considere essa questão como mais uma das questões presentes na relação entre as crianças. A escola é espaço de construção do conhecimento, mas também é espaço de socialização, o que significa ter a responsabilidade de mediar as relações entre as crianças. Para um trabalho desse tipo, é necessário que os conflitos sejam revelados e trabalhados coletivamente, de forma a contribuir para que todos se sintam responsáveis por aquele espaço e pelas relações que se estabelecem nele. Com relação à aprendizagem formal proporcionada pela escola, a convivência entre pessoas em diferentes estágios do conhecimento é importantíssima. Vygotsky fala da importância do outro no processo de aprendizagem. É na relação com o outro, adulto ou criança, que aprendemos. Existem conhecimentos dos quais estamos em via de nos apropriar, e quando uma criança está no papel de mediador do conhecimento do outro estabelece novas relações com esses saberes, os nomeia e se apropria deles também de uma nova forma. Esse tipo de aprendizado é aquele que envolve a experiência com as limitações e possibilidades do outro e com as nossas, é uma grande riqueza proporcionada pela experiência com a diversidade. A luta política pela inclusão tem um olhar pro presente e outro pro futuro. Objetiva modificar o presente com práticas que ocorrem no aqui e agora e modificar o futuro. A gente aprendeu que as pessoas com deficiência não fazem parte da sociedade, não convivemos com elas na nossa história de vida. Nossos filhos, com ou sem deficiência, estão tendo a possibilidade de viver a riqueza desse tipo de relação. Digo riqueza porque o momento em que vivem é de mudança. Duas crianças nascidas hoje, uma com deficiência e outra sem, têm mais chance de experimentar diferentes tipos de relação, diferente de 30 anos atrás.  Uma criança estabelecer vínculos, construir amizades com crianças com deficiência contribui para que, quando adulto, não lide com as deficiências como nós aprendemos (ou não aprendemos) a lidar. Muitos adultos não sabem ainda como lidar com essa nova lógica. Esse aprendizado nós não vivemos na nossa história de vida. Então nossos filhos vivem ainda no entremeio dessa mudança. Convivem conosco, que representamos o passado, e com o presente vivido por eles, que possibilita mudanças no futuro. Esse lugar do meio é rico porque eles estão aprendendo a modificar coisas dentro deles e, ao mesmo tempo, a criar outras que nós nem sabemos.

17/05/2011

Publicado em 17 de maio de 2011

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