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O despreparo dos professores: um ensaio sobre um dos problemas que afeta o processo ensino-aprendizagem dos educandos

JOSÉ LUÍS MONTEIRO DA CONCEIÇÃO

Pedagogo, mestrando em Educação, professor da rede particular de ensino na Bahia

A aprendizagem é algo fundamental na vida do ser humano; por isso ela deve ser construída e reconstruída na companhia de profissionais da educação capacitados e qualificados, capazes de propiciar aos seus receptores competências e habilidades necessárias para a sua formação. Pensando nessa questão, discutimos o despreparo do professor para a ação educativa, enfocando esse problema como um dos causadores da dificuldade dos alunos durante o processo de ensino e aprendizagem.

É impossível negar que parte significativa das questões que dizem respeito à formação ética do cidadão se devem a um instrumento capaz de humanizar e desenvolver a sociedade, o qual chamamos de “educação”. Fenômeno que possibilita aos indivíduos construir seu caminhar na sociedade e o saber para adquirir conhecimento e aprendizagem, a fim de entender e compreender a realidade em que se encontra inserido.

A educação está fundamentada e respaldada nos pilares educacionais preconizados por Dellores (2001), que traça os quatro pilares formadores e sustentadores da prática educativa do professor e aprendizagem do educando:

  • Aprender a conhecer: aprendizagem dos científicos e culturais que ajudam a distinguir o que é real e o que é ilusório e a ter assim acesso inteligente aos saberes de nossa época. Neste contexto, o espírito científico como aquisição fundamental da aventura humana é indispensável. Aprender a conhecer também significa ser capaz de estabelecer pontes entre os diferentes saberes, entre esses saberes e seus significados para nossa vida cotidiana.
  • Aprender a fazer: ação sobre o meio envolvente, um aprendizado da criatividade, mostrando nossas potencialidades para de fato participar e ser parceiro na prática pedagógica do professor.
  • Aprender a viver juntos: respeito às normas que regem as relações entre os seres que compõem uma coletividade, segundo o expresso no relatório da Unesco.
  • Aprender a ser: o ser humano integral é aquele que já tem consciência da responsabilidade como dever e da liberdade como direito. Tem consciência de sua utilidade individual e social, age e interage com base não só no conhecimento mas também no autoconhecimento.

Segundo Brandão, ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Partindo dessa concepção, percebe-se o quanto é importante a educação na vida individual e coletiva dos seres humanos. Constrói-se um elo entre o homem e o saber.

Para que a educação exerça seu valor significativo e tenha sentido concreto na teoria e na prática das pessoas, faz-se necessário ter um aliado que possa estar lado a lado no processo de aprendizagem, ajudando os indivíduos a refletir, criar consciência crítica da sua própria realidade e principalmente interagir com o outro, não só numa concepção filosófica (dialogicidade), mas psicológica (interacionista): a escola. Espaço que, por seu papel pedagógico, desenvolve práticas docentes, estudo, saberes, ensino, aprendizagem, construção e troca de conhecimento. A esse respeito, Costa (2010) afirma:

A escola é uma instituição social com objetivo explícito: o desenvolvimento das potencialidades físicas, cognitivas e afetivas dos alunos, por meio da aprendizagem dos conteúdos (conhecimentos, habilidades, procedimentos, atitudes e valores) que, aliás, deve acontecer de maneira contextualizada desenvolvendo nos discentes a capacidade de tornarem-se cidadãos participativos na sociedade em que vivem (p. 73).

Nesse processo, precisamos ter o maior cuidado principalmente quando se fala de aprendizagem, até porque estamos trabalhando na formação de sujeitos para que tenham a possibilidade de criticar, refutar, intervir e participar nas decisões.

O professor é o mentor de todo o trabalho e tem a incumbência de promover para os seus alunos um ensino de qualidade, de facilitar a aprendizagem, de conduzir as aulas de maneira dinâmica, prazerosa, de aguçar nos alunos o poder de argumentação interativa e questionadora, dar a orientação didática adequada, fazer o acompanhamento das atividades propostas, ser eficiente e eficaz na disciplina que ministra, mostrar o domínio do conteúdo, ter formação plena, segundo exigência do Ministério da Educação para que os alunos obtenham uma formação digna de excelência.

Isso, sim, dá certo conforto, nos deixa menos preocupados e promove o desenvolvimento intelectual e emocional do aluno, permitindo assim a educação de qualidade. Para Libâneo (2005, p. 117), ''devemos inferir, portanto, que a educação de qualidade é aquela mediante a qual a escola promove, para todos, o domínio dos conhecimentos e o desenvolvimento de capacidades cognitivas e afetivas.

Partindo dessa concepção teórica, a escola é o espaço ideal para que tudo isso aconteça, mas é preciso deixar bem claro junto ao corpo docente essa preocupação com a aprendizagem dos educandos. A escola precisa oferecer situações que favoreçam – e não que dificultem a aprendizagem.

Infelizmente, a realidade acaba contradizendo e quebrando esse tão sonhado desejo na teoria, pois nos deparamos com muitos professores que não apresentam mínimas condições de ministrar uma aula. O que se percebe na prática da educação, na maioria dos casos, é realmente o despreparo desses profissionais que irão formar outros profissionais. Essa situação ocorre dentro dos espaços escolares (sala de aula), e o único que será prejudicado no processo ensino aprendizagem é o aluno.

É fato e questão de lógica: Se o professor não está preparado para atuar dentro do processo educativo, com certeza os alunos não têm como aprender. O despreparo do professor resulta diretamente em sérias dificuldades de aprendizagem por parte dos alunos.

Segundo Eduardo de Freitas, da equipe Brasil Escola, “a Unesco realizou uma pesquisa com a finalidade de traçar o perfil do professor brasileiro das escolas públicas e privadas, dos de todo o país, revelando que 1,600 profissionais da educação são pobres no quesito de construção da própria formação”. E acrescenta: “o que conduz a tal situação são baixos salários, que impedem o professor de ter acesso a todas as novas tecnologias e às várias formas de cultura”. Nesse sentido, a pesquisa revelou que 45% dos professores entrevistados nunca tiveram a oportunidade de conhecer um museu ou foram somente uma vez, 40% nunca assistiram a uma peça teatral, 25% jamais foram ao cinema e, por fim, em plena revolução técnico-científica-informacional, aproximadamente 60% dos professores não têm acesso à internet e não possuem correio eletrônico.

É lamentável ver uma situação como essa se repetir várias vezes em nosso cotidiano e ser anunciada nos veículos de comunicação. O professor precisa entender que ele é um dos sujeitos mais importantes durante a construção da aprendizagem; por isso é fundamental que procure se qualificar para que os alunos possam construir seu conhecimento ao lado de pessoas comprometidas com a educação, conhecedoras, pesquisadoras, investigadoras e principalmente formadoras de opinião.

Diante de tal situação registrada até o momento, podemos afirmar que a responsabilidade educacional é entregue toda para o professor, pois é quem conduz e medeia o processo de ensino e aprendizagem. Sendo assim, faz-se necessária a sua formação plena, pois dará sustentabilidade para atuar com competência e mérito na prática pedagógica.

A formação contínua de professores seria uma das formas mais eficazes para mudar o retrato apresentado. Essa questão vem sendo debatida e discutida ao longo da história desde o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que aconteceu por volta de 1932. Esse importante marco na história da educação brasileira prenunciava que:

todos os professores, de todos os graus, cuja preparação geral se adquirirá nos estabelecimentos de ensino secundário, devem, no entanto, formar o seu espírito pedagógico conjuntamente nos cursos universitários, em faculdades ou escolas normais, elevadas ao nível superior e incorporadas ás universidades (Manifesto, apud Ghiraldelli Júnior, 1990).

A segunda lei a reger a educação brasileira (5.692/71) mostrou também preocupação quanto ao assunto. Nos anos 1980, ocorre intenso debate acerca do tema. Essa presença é registrada na concretização dos Seminários Regionais para Reformulação dos Cursos de Formação de Recursos Humanos para a Educação (1981) e do Encontro Nacional para a Reformulação dos Cursos de Preparação de Recursos Humanos para a Educação (1983), sob os olhares do MEC.

O interesse governamental naquele momento coincide com a emergência de uma reflexão a esse respeito no seio dos educadores, tema discutido em vários eventos de caráter estadual e nacional. Nos anos 1990, a preocupação quanto à formação de professores foi mais forte. Colocou em pauta a necessidade da formação de uma força de trabalho preparada para lidar com tais inovações. Nesse sentido, seria necessário preparar o profissional de educação para enfrentar o mundo das inovações, de maneira ele pudesse atuar com as ferramentas disponíveis.

A atuação organizada, unida e efetiva dos profissionais da educação pela afirmação dos trabalhadores da educação, por melhores condições salariais, por um olhar mais cuidadoso com a categoria, pela defesa da prioridade das condições de trabalho, do caráter e da função pública dos serviços educacionais, registrou a década de 1980, dando novo significado à luta e busca pela reformulação dos cursos acerca da formação ligada ao magistério.

Foi a partir da Conferência Brasileira de Educação, realizada em 1980 em Goiânia, que se iniciou uma mobilização dos profissionais da educação no país; com ela foram estabelecidas duas vertentes para o debate em torno da questão: a primeira, encaminhada pelo MEC, e a segunda, encaminhada pela sociedade civil, buscando interferir nas decisões e garantir a autonomia da universidade na perspectiva de fixar currículo e propor a formação do educador em consonância com os anseios da sociedade.

Diante desses fatos históricos no que diz respeito à busca e à luta incessante pela formação do professor, é necessário pensar um pouco mais nesse ser tão precioso e grandioso, até porque ele faz parte do processo de construção do conhecimento da criança.

Reafirmamos que o professor precisa estar muito bem preparado para a mediação pedagógica, pois ministrar uma aula que reúne pessoas com características, peculiaridades, saberes, culturas e realidades totalmente diferentes não é fácil como imaginamos.

A pessoa que medeia o processo de aprendizagem tem que ter certo domínio, “saber fazer”. Para exemplificar, façamos uma comparação: um chefe de cozinha tem que saber plenamente tudo sobre comida. Como se faz, prepara, serve, o que deve ser colocado, o que combina, qual ingrediente dá um toque especial para a comida ficar muito mais gostosa, qual tempo de cozimento, qual o melhor tempero, entre outros aspectos. Vamos supor que tenhamos um falso chefe de cozinha, que não entendesse nada de comida e que fizesse tudo ao contrário. Imagine essa situação e diga: como seria? Quais seriam os prejudicados? Isso afetaria alguma coisa? A resposta é imediata: com certeza os clientes seriam prejudicados, não iriam gostar nem retornar ao local. O suposto chefe seria alvo de crítica e o restaurante entraria em falência. Na educação não é diferente. O nosso alvo é a aprendizagem; se o professor não tem condições suficientes para conduzir, os alunos serão prejudicados e não têm como aprender; sentirão dificuldades.

Infelizmente, vivemos em um país com baixo índice de educação e que apresenta um conjunto de professores mal preparados. Muitos deles não têm a formação necessária e atuam de maneira esporádica. Alguns se formam para a área que realmente lhe dê possibilidade de lecionar nas escolas, mas outros fazem cursos totalmente diferentes e estão ensinando livremente sem nenhuma intervenção (uma pessoa desempregada que fez faculdade de Enfermagem e não conseguiu emprego na área, mas domina completamente conteúdos de Matemática está por aí ensinando como se tivesse licenciatura. Pode até saber Matemática, mas não sabe a didática, a parte metodológica, não sabe conduzir o assunto nem ver quais são as melhores estratégias).

O professor é um ser imprescindível no ato de educar. Transforma as informações em conhecimento, abre caminhos para novos saberes e faz do homem um ser de consciência crítica, um herói e construtor da sua própria história. Veja quanta responsabilidade, quanto compromisso tem um professor!

Não podemos mais permitir o despreparo desses profissionais, pois a educação é algo precioso e precisa ser muito bem cuidada e amparada por alguém que goste e mostre capacidade, pois essas questões envolvem a formação humana.

Referências bibliográficas

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O Que é Educação. (33ª ed.) São Paulo: Brasiliense, 1995 (Coleção Primeiros Passos).

COSTA, Vera Lucia Pereira. Função social da escola. Disponível em: www.drearaguaina.com.br/projetos/funcao_social_escola.pdf. Acesso em 23 de março de 2011.

DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. São Paulo: Cortez, 1998.

FREITAS, Eduardo. Professores bem remunerados apresentam resultados positivos para a educação. Disponível em: http://educador.brasilescola.com/orientacoes/a-qualidade-professor-brasileiro.htm. Acesso em: 20 de abril de 2011.

GHIRALDELLI JÚNIOR, Paulo. História da educação. São Paulo: Cortez, 1990.

LIBÂNEO, J. C.; OLIVEIRA, J. & TOSCHI M. S. Educação escolar: políticas, estrutura e organização. 2a ed. São Paulo: Cortez, 2005 (Coleção Docência em Formação).

Publicado em 12 de julho de 2011

Publicado em 05 de julho de 2011

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