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Filosofia: Por que na Grécia?

Fábio Souza C. Lima

Historiador e filósofo, especialista em Educação, professor

Sócrates foi o primeiro a evocar a filosofia do céu à terra, deu-lhe a cidadania nas cidades, introduziu-a também nas casas e a obrigou a ocupar-se da vida e dos costumes, das coisas boas e das más.

Cícero

Muitas pessoas se perguntam sobre o que fez de especial aquele pequenino conjunto de Cidades-Estados, para ser considerado até os dias de hoje “berço da civilização ocidental”. Entenda-se aí: por que o pensamento filosófico surgiu logo na Hélade?

Bom, primeiro devemos entender que pensar é uma atividade extenuante, cansativa. É duro para uma pessoa trabalhar fisicamente o dia inteiro e ainda se dedicar a refletir filosoficamente. Precisamos então que exista um grupo especial de pessoas que possa se voltar exclusivamente, ou pelo menos por grande parte de seu tempo, à especulação filosófica. Esse grande tempo dedicado a pensar era chamado pelos gregos de “ócio produtivo”, ou seja, o tempo que se passa refletindo com o intuito de resolver algum problema ou elaborar um conhecimento novo. O problema é que, até os dias de hoje, filósofo também tem família, paga conta de luz, gás água, telefone, transporte, compra roupa, se alimenta... E, se for professor, ganha pouco para isso!

O pensador, para continuar em seu ócio produtivo, precisa ter condição financeira razoável ou de alguém que tenha posses suficientes para arcar com seus custos. Esse responsável por bancar seus gastos faz com que o intelectual ou artista possa se dedicar às suas obras. Séculos depois, já dentro do Império Romano, foi chamado de mecenas. Ainda nos dias atuais, um estudante de universidade pública pode pleitear diversos tipos de bolsas que têm a mesma finalidade de custear sua formação, como as bolsas de mestrado e doutorado. Na Grécia, essas condições materiais surgiram por volta dos séculos VII e VI a.C., sendo decisivas para o pensamento filosófico.

Contudo, a título de curiosidade, o termo ócio tem origem no grego scholé, de onde também deriva o termo Escola. Opa, mas não é para os alunos saírem dizendo que estão aí na escola para ficar sem fazer nada. O ócio da escola deve ser produtivo! E é por isso que, de forma geral, seus pais não o puseram para trabalhar. Certamente eles esperam, como também esperavam aqueles que ajudavam os pensadores da Antiguidade a pagar suas contas, que os alunos produzam algo. É por isso que, da mesma forma que um comerciante rico que recebeu um belo conselho ou uma pintura que atingiu seus sentimentos, seus pais – e até os amigos – ficarão muito felizes ao ver seus avanços nos estudos.

As condições materiais são, portanto, necessárias para o desenvolvimento do pensamento humano em todas as épocas. Como já apontamos, as viagens marítimas colocaram em contato intenso as culturas orientais e ocidentais. Como resultado, as ideias místicas que os ocidentais tinham dos homens e das terras do Oriente se perderam. As explicações sobre essas regiões e os fenômenos em suas próprias terras não conseguiam mais ser explicados pelos mitos.

Os comerciantes que enriqueciam com as rotas que levavam e traziam produtos e culturas de longe logo substituíram as verdades absolutas dos poetas-rapsodos, que por muitas vezes atendiam aos interesses apenas das famílias aristocráticas que viviam no meio rural, por reflexões lógicas que poderiam ser constatadas na prática do dia a dia, e que os colocavam em pé de igualdade com qualquer outro homem da cidade. Esses comerciantes se tornaram fortes com a invenção da moeda, que lhes permitiu acumular riquezas com o desenvolvimento da vida urbana, em contraste com as poderosas famílias que mantinham seu poder baseado nas terras.

Com a invenção da escrita alfabética, os poetas, que tinham a verdade absoluta, baseada em sua oralidade, sofreram o duro golpe da disseminação do conhecimento feita pelos escritos, que tendiam à uniformização do saber. Ficou mais difícil aumentar um ponto ao contar um conto. Com a Filosofia, os textos produzidos deixaram de ser narrativos, como é característica de um mito, e passam a ser argumentativos, preocupados em mostrar racionalmente o conhecimento adquirido. A figura de autoridade dos poetas, caracterizada por ser dogmática, declina em importância frente aos primeiros filósofos, que tentarão explicar o mundo agora com base na natureza.
O golpe derradeiro foi a invenção da política, de onde vieram algumas noções como as de leis, cidadão e participação coletiva. Esse período de transição do eixo econômico do rural para o urbano foi vivenciado pelos filósofos pré-socráticos, sendo mais tarde, no esplendor do desenvolvimento grego, vivenciado por filósofos de influência socrática.

Publicado em 13/12/2011

Publicado em 13 de dezembro de 2011

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