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Xochipilli e Cuauhtémoc - o México no Rio de Janeiro

Cláudia Sampaio

Em passagem pelo Rio de Janeiro na década de 1930, o poeta Alfonso Reyes, que esteve por aqui em missão diplomática e se tornou um dos personagens mais significativos da relação cultural entre México e Brasil, elegeu a flor amapola silvestre como símbolo da amizade entre os dois países.

A estátua da deusa Xochipilli, no Jardim Botânico, e a de Cuauhtémoc, na Praça de mesmo nome, no Flamengo, são também ícones importantes das tentativas de estabelecermos elos com um país que, apesar das afinidades que parecem existir (a alegria, o gosto pelas festas, a herança indígena), ainda nos é tão desconhecido.

Não foram poucos os ensaios de laços entre os dois países; contudo, seguimos com dificuldades de estabelecer aproximação. Há a questão da distância geográfica, a barreira do idioma e o que suponho ser um complicador para esta relação: a sensação de que há algo familiar entre mexicanos e brasileiros. Assim, quando não reconhecemos a diferença que há entre os mais íntimos, perdemos o interesse em avançar por diálogos mais profundos. Talvez seja esse um dos motivos pelos quais as relações culturais e intelectuais entre México e Brasil se resumam à história de suas relações diplomáticas, como mostra a professora Regina Aída Crespo, brasileira que vive na Cidade do México, onde dá aulas de Literatura Brasileira no Centro de Investigações sobre a América Latina e o Caribe, na Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM).

A Praça Cuauhtémoc, chamada “praça do índio”, fica bem no encontro da Praia do Flamengo com as Avenidas Oswaldo Cruz e Rui Barbosa. No passado, antes de existir o Aterro do Flamengo, o lugar era conhecido como “curva da amendoeira”. O monumento, uma estátua de bronze, réplica da obra de Miguel Noreña inaugurada na Cidade do México em 1887, chegou ao Rio por ocasião das comemorações do centenário da Independência do Brasil, em 1922. Cuauhtémoc foi o último imperador asteca, preso e torturado por Hernan Cortez, representante da coroa espanhola que quando chegou ao México, no século XVI, deparou-se com a imponente civilização asteca. Os espanhóis tiveram grandes dificuldades para dominar Tenochtitlán (atual Cidade do México, que na época era a capital do império asteca). Cuauhtémoc é cultuado no México como ícone da bravura e resistência indígena. A praça é um dos belos lugares do Rio de Janeiro; em breve ali será inaugurada uma academia ao ar livre para a terceira idade.

No Jardim Botânico do Rio de Janeiro encontramos Xochipilli; a estátua foi um presente de Alfonso Reyes à cidade. Quem conta essa história é o próprio Reyes na carta que ele escreveu ao então diretor do Jardim Botânico, Dr. Campos Porto, que integra a coletânea de ensaios Norte y Sur, onde lemos também alguns textos que ele escreveu sobre o Brasil, como “La amapola silvestre, símbolo da amizade entre México e Brasil” e “O Brasil é uma castanha”. Traduzimos aqui um trecho da carta em que o poeta fala do significado desse presente e da oferta que fez à estátua brasileira de Cuauhtémoc.

Oferenda ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro, 2 de outubro de 1935
Exmo. Sr. Dr. Campos Porto,
Diretor do Jardim Botânico

(...) Seu nome, Xochipilli, quer dizer “as cinco flores”; por onde – fazendo como fazem todos os mitólogos – temos direito de supor que simboliza igualmente a flor e a mão, com seus cinco dedos. A mão e a flor: o útil e o doce; a natureza que produz e o homem que colhe; o Brasil que derrama suas flores e o Jardim Botânico que as organiza, classifica e conserva. Verdadeiramente Xochipilli, aqui, está em sua casa, está em seu recinto natural. E que seja por muitos anos, para o bem da ciência e da beleza, para o bem da simpatia entre México e Brasil que esse ídolo significa.

Nosso imperador Cuauhtémoc, que já é carioca honorário desde que, em 1922, o trouxe a estas praias a Missão Mexicana, tem em sua praça, há não muito tempo, uma coberta de cactos mexicanos que, em vossa companhia, senhor diretor, fomos plantar em uma manhã aos pés de seu monumento, com a ideia de dar-lhe um adereço vegetal apropriado. O imperador finalmente encontrou um companheiro com quem comentar largamente os sabores da hospitalidade brasileira. As plantas que daqui por diante o Jardim Botânico lhe envie serão fomentadas sob a amorosa tutela de Xochipilli.

De V. E. cordial admirador e amigo.
R
Monterrey, Rio de Janeiro, VI-1933.

Referências:

Diálogos poéticos: Alfonso Reyes
http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/literatura/0040_16.html

Contrastes e confluências: relações culturais e intelectuais entre o México e o Brasil durante as décadas de 1920 e 1930
http://www.anphlac.org/periodicos/anais/encontro7/regina_crespo.pdf

Cultura e política: José Vasconcelos e Alfonso Reyes no Brasil (1922-1938)
http://www.scielo.br/pdf/rbh/v23n45/16525.pdf

Poemas de Alfonso Reyes
http://www.los-poetas.com/PICTOS/rey1.htm

REYES, Alfonso. Norte y sur. In: REYES, Alfonso. Obras completas. Vol. IX. México, D.F.: Letras mexicanas. Fondo de Cultura Económica, 1996.

Publicado em 01 de fevereiro de 2011

Publicado em 01 de fevereiro de 2011

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