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Dando voz ao estudante

Alexandre Alves

Descrever a img desde que não seja apenas ilustração

Fim de ano é sempre período de avaliação. As pessoas fazem promessas e planos. Nas escolas brasileiras, é tempo de aprovação e reprovação – de alunos. Nas escolas particulares, muitas vezes é época de aprovação e reprovação também de professores.

Nas escolas públicas, especialmente naquelas em que não há canais de participação da comunidade, passa em branco um momento que poderia ser oportunidade de análise em busca de melhorias para o futuro.

Para não desperdiçar as vivências de meus alunos, que têm pontos de vista muitas vezes diferentes dos meus, aproveitei meu último dia de aula para pedir que comentassem aquilo que consideravam positivo e negativo na escola no ano de 2010 e o que eles mudariam em 2011.

Como eles já são grandinhos (o mais novo deve ter 16 anos), têm consciência do tempo que já perderam e do que esperam da escola.

Claro que há alguns aspectos específicos naquilo que eles citaram, mas há também comentários que podem se referir à realidade de qualquer escola – especialmente as públicas, estaduais, noturnas, no Rio de Janeiro.

Pra começar, uma surpresa: a professora que foi duramente criticada por uma turma do 6º ano recebeu elogios dos alunos do 7º ano. Isso só prova que não é possível agradar a todos e que nenhuma avaliação (ainda mais feita de maneira informal) é definitiva. Mas continuo acreditando que é positivo compartilhar outros resultados dessa pesquisa.

Numa das turmas, o primeiro comentário foi uma reclamação contundente contra um professor de Matemática: “ele é muito antipático!”, gritou uma aluna. No mesmo instante outra retrucou: “é, mas ele impõe respeito e a turma fica caladinha na aula dele”. E um rapaz no fundo da sala completou: “e ele explica melhor”. A primeira aluna defendeu seu ponto de vista: “eu estou com as pernas inchadas, por causa da gravidez; ele não poderia ter me mandado tirar os pés da cadeira da frente, muito menos do jeito que ele fez!”; a aluna mais velha da turma, cuja idade nem sempre impõe respeito, dessa vez foi conclusiva: “ele é um disciplinador exagerado”.

Outro comentário sobre práticas em sala de aula foi bastante interessante, porque serve para muitos de nós: “a professora de História poderia fazer mais questionários; ela explica bem, na hora a gente entende, mas a gente não guarda”. Independente de ser verdade o que o aluno diz, esse é um fator essencial para um bom trabalho, especialmente no Fundamental: ajudar o aluno a ordenar, sistematizar e hierarquizar aquilo que ele está estudando. A gente entope o aluno de informações, mas não contribui para que ele identifique o que é essencial e o que é supérfluo de tudo que se falou em aula. Anotações no quadro são importantes, muitas vezes funcionam, mas acredito que o uso do questionário seja mais proveitoso porque na hora de responder o aluno é sujeito, e não um simples objeto-copiador-de-matéria-do-quadro-negro.

Pra quem pensa que estudante quer mais é bagunça, a reclamação que mais uniu os colegas, em todas as turmas, foi quanto à disciplina: “nem todos os professores chamam a atenção dos alunos que ficam conversando”; “tem professor que deixa os alunos entrarem e saírem de sala à hora que quiserem”; “tem aluno que vem pra escola pra ficar passeando pelo corredor”; “tem que melhorar a disciplina também fora da sala”.

Em termos pedagógicos mais gerais, os alunos das turmas com quem conversei mais detidamente reclamaram de ter dois professores para algumas disciplinas, como Ciências e Matemática. Tentei explicar que isso acontece porque a Secretaria de Educação envia professores depois de as aulas começarem, sem preocupação de saber se o horário disponível do professor combina com o horário da escola, e aí ele entra nas turmas em que o horário encaixa. Comentei ainda que há professores que vão à escola para cumprir apenas dois tempos que têm sobrando dos 12 obrigatórios na sua escola de origem, e aí fica aquele “penduricalho” de tempo na escola, de uma pessoa que, por mais competente e comprometida que seja, não tem condições de se envolver com o contexto daquela escola.

Os alunos contra-argumentaram que “se com um professor só às vezes já é difícil de acompanhar, imagine com dois!”. Não pude tirar a razão deles, ainda mais quando há matérias em que a segmentação de conteúdos ou de atividades não é tão simples assim...

Surgiram ainda reclamações quanto a questões burocráticas, como cobrança de uniforme, confecção do RioCard (passe para transporte gratuito de alunos uniformizados), problemas de horário (tempos vagos)... No meio das lamentações, elogios a alguns professores.

Repassei essas informações a quem de direito, esperando que sejam usadas da forma mais adequada.

Foi a maneira que encontrei de dar voz a quem tem ficado em silêncio na escola, quando deve ter todo direito de se manifestar: o estudante.

08/02/2011

Publicado em 08 de fevereiro de 2011

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