Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

Escher

Alexandre Amorim e Gordeeff

Maurits Cornelis Escher (1898-1972) foi o quarto filho em uma abastada família holandesa. Depois de fracassar nas provas de ensino superior, seu pai, engenheiro civil, esperava que seu filho ao menos se tornasse arquiteto. Escher, então, entrou para a Escola de Arquitetura e Artes Decorativas em Haarlem, onde teve contato com um artista gráfico renomado na Holanda, Samuel Jessurun de Mesquita. Percebendo o talento do aluno, Mesquita o encorajou a seguir da carreira de artista gráfico. Mesmo com todo o receio da reprovação familiar, Escher seguiu sua vocação.

Ele tentou seguir a profissão do pai, mas ficou conhecido por suas obras artísticas, em que mostrava modos novos de observar a perspectiva e o estudo matemático. Em suas biografias, é comum encontrar uma citação dele próprio afirmando que “continua sendo uma questão sem resposta se meu trabalho pertence ao campo da matemática ou da arte”. Talvez sua maior contribuição tenha sido justamente ensinar como arte e ciência podem caminhar de mãos dadas.

Depois de formado, foi para a Itália, onde viveu os melhores anos de sua vida, só partindo de lá durante o governo fascista de Mussolini. Como detestava o frio, na Itália Escher se encontrou, enquanto artista, realizando xilos e litogravuras realistas de refinado detalhamento. Ele não se importava em desenhar várias vezes a mesma paisagem. Estava apaixonado pelo litoral, pelo colorido, pela vegetação e pelo mar italianos, que estão presentes em toda a sua obra. Lá também conheceu Jetta Umiker, com quem se casou em 1924 e foi sua companheira por quase toda a vida, inclusive ajudando em suas pesquisas gráficas.

Foi ainda na Itália que começou a desenvolver o que foi seu maior interesse enquanto artista: a beleza do plano e as ligações entre as formas. Seu interesse pelo plano e sua divisões foi despertado quando visitou Alhambra, um castelo mourisco em Granada (Espanha) em 1922. A partir daí começou a ter contato com matemáticos da época, que se encantavam com seus trabalhos, pois apresentavam graficamente o que eles faziam com números e fórmulas. Mas o interesse de Escher é outro, e em 1931 desenvolveu sua famosa obra-prima, a série Metamorphosis.

Com o tempo, passou a reproduzir o impossível e os espaços, como Queda d’água. Obrigado a voltar para climas mais frios, durante a Guerra (Suíça) Escher se tornou mais concentrado em seu trabalho, o que, com o passar dos anos resultou em sua separação de Jetta. Em sua vida, Escher fez 448 litogravuras, xilogravuras e entalhes em madeira e mais de 2.000 desenhos e esboços. Seguiu a linhagem dos Países Baixos, de Dürer, Holbein e Bosch.

Escher e sua interessante questão devem mexer com a cabeça dos professores, sejam eles de matemática, arte, desenho geométrico ou qualquer matéria: com esse material tão rico na mão, como utilizá-lo em sala de aula?

Seria interessante deixar os alunos se deparar com a distorção lógica que o pintor fornece ao desestruturar as leis da perspectiva em vários de seus quadros. As escadas que descem e sobem ao mesmo tempo, por exemplo, dariam pano para manga aos alunos. De redações sobre aqueles “soldadinhos” que sobem para descer e descem para subir até uma tentativa matemática de explicar a razão de uma rainha estar olhando para o mesmo local para o qual um rei está olhando quando cada um está em uma janela diferente e oposta. E como esses alunos reagiriam ao ver que quedas d’água na verdade estão caindo para cima?

Como os alunos expressariam a novidade de ver uma mão que desenha a outra e vice-versa? Qual a sensação de sorver essas obras pela primeira vez? Até mesmo a inocente brincadeira de se retratar desenhando esse mesmo retrato leva qualquer pessoa com um mínimo de criatividade a inventar uma história. Um outro que vive no desenho? Além desse que vive no desenho existe um terceiro que vive dentro do espelho retratado no desenho? A interpretação dos alunos pode levar a redações bem mais criativas e entusiasmadas do que a velha ideia de contar como foram suas férias.

Além da magia matemática das perspectivas, Escher experimentou e desenvolveu artisticamente a técnica de “tecelagem”, em que formas geométricas são transformadas em peixes, pássaros ou corpos humanos e se encaixam, criando uma espécie de mosaico perfeito, desenhados de maneira que não sobre espaço além dessas formas. As formas de Escher são muito mais do que meras formas – são ferramentas usadas para significar algo.

Por isso, é fundamental ver a obra de Escher com o espírito crítico da interpretação. Nem sempre serão desenhos bonitos, apesar de harmoniosos e matematicamente equilibrados. Nem sempre suas obras terão sentido imediato. Por que misturar peixes e pássaros? Por que desenhar uma torre com escadas que não cumprem seu papel?

Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, M. C. Escher não é um mago ou um artista de livres traços. Se sua questão renitente é descobrir quanto de seu trabalho é arte e quanto dele é matemática, devemos entender que sua filosofia se baseia na harmonização dessas naturezas. Suas formas são exatas, sua ilusão de ótica é estudada – sua arte é científica e sua ciência é artística.

O artista é sempre um observador da natureza. Seja da natureza humana, seja da natureza dos elementos. E se existe filosofia por trás dos trabalhos de Escher é a de que a investigação da natureza deve ser feita de forma harmônica – régua e tinta, compasso e sensações, técnica e arte. O mistério da natureza vai aos poucos sendo desvendado pela ciência, mas também é apontado e reconhecido pela arte.

Combinar essas duas formas de investigação de modo tão harmônico é coisa para gênios. Escher é um deles.

Referência

Site Oficial: http://www.mcescher.com/

O CCBB – Rio de Janeiro (Rua 1º de Março, 66 – Centro) exibe obras de Escher até 27 de março 2011. É grátis e traz um acervo desde suas primeiras obras.

O passeio é quase um dever de casa para alunos e professores que se importam em desenvolver espírito crítico.

Ficha técnica da exposição:

  • Título: O Mundo Mágico de Escher
  • Curador: Luiz Ferrer

Publicado em 15/02/2011

Publicado em 15 de fevereiro de 2011

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.