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Linguagens, leitura e diversidade temático-textual no universo escolar: a Literatura de Cordel como suporte didático nos processos de ensino e de aprendizagem

Silvio Profirio da Silva

Graduando em Letras (UFRPE)

Durante décadas, o ensino fornecido pelas instituições de ensino brasileiras centrou-se predominantemente em perspectivas puramente mecanicistas, tecnicistas e tradicionais (SANTOS, 2002). Com isso, as práticas pedagógicas concediam primazia ao uso exclusivo dos livros didáticos. Excluía-se, assim, uma gama de recursos didáticos e de múltiplas linguagens. Consoante Albuquerque (2006) e Albuquerque et al (2008), nos anos 1980 teve início uma série de estudos e pesquisas de inúmeros campos de investigação – das Ciências da Educação [Pedagogia], das Ciências da Linguagem [Linguística], das Ciências Psicológicas [Psicologia, Psicologia Cognitiva e Psicolinguística], da Filosofia e da Sociologia.

Tendo como pano de fundo esse contexto paradigmático, eclodiu uma nova concepção de ensino sociointeracionista, que prima por uma nova perspectiva de aprendizagem, focando sobretudo na produção de sentido (KOCH & ELIAS, 2006) e elaboração de significados/significação. Rompe-se, assim, com os modelos teóricos que preconizavam a transmissão e a recepção de conteúdos, dando ao aluno um papel passivo que se limitava à reprodução, como demonstram Koch & Elias (2006). Destaca-se principalmente o fato de surgir uma série de mudanças didáticas nos processos de ensino e de aprendizagem, buscando romper com práticas tradicionais de escolarização, conforme evidencia Albuquerque (2006).

A busca de uma nova prática pedagógica, fundamentada numa visão sociointeracionista de linguagem, iniciou-se já na década de 80, quando começaram a surgir no país, nas Secretarias de Educação dos Estados, propostas curriculares, planos ou programas bastante inovadores, de certa forma como resposta ao trabalho pioneiro de alguns pesquisadores e especialistas de algumas universidades do país (CARDOSO, 2003, p. 27).

Uma dessas mudanças diz respeito à inserção de múltiplas linguagens nos processos de ensino e de aprendizagem, isto é, novos recursos didáticos e novos suportes de texto que subsidiam práticas pedagógicas inovadoras e diferenciadas. É nesse cenário que se fala em linguagens alternativas. Esse conceito, levantado por Gomes e Nascimento Neto (2009), refere-se às múltiplas formas de expor um conteúdo a partir de diversos suportes textuais, como charges, cinema, histórias em quadrinhos [HQs], jogos, jornais, redes sociais [Facebook, MSN, Orkut etc.], revistas, tirinhas etc. Dentre esses suportes destaca-se, nesta escrita, a Literatura de Cordel, abordando seus subsídios para novas iniciativas didáticas e pedagógicas, rompendo/quebrando padrões tradicionais rumo a novas formas de construção social do conhecimento. Dito de outra forma: rompe-se, desse modo, a postura tradicional que esteve durante décadas nas unidades escolares brasileiras, alçando o ensino à condição de "prática educativa em si mesma" (FREIRE, 1996, p. 21) e o aluno à condição de receptor/reprodutor.

A Literatura de Cordel pode ser definida como uma poesia de cunho/teor popular, que inicialmente era realizada apenas por intermédio da linguagem. Contudo, após alguns anos, passou a ser realizada de forma escrita, por intermédio da linguagem escrita e da impressão em folhetos (FONSÊCA & FONSÊCA, 2008). Segundo esses autores, um dos traços marcantes desse tipo de literatura diz respeito aos seus versos escritos a partir da utilização de rimas e, algumas vezes, com ilustrações, que são hoje chamadas xilogravuras.

Ao contrário do que muitos pensam, a Literatura de Cordel não é uma criação/produção desvinculada da realidade e das práticas sociais. Em outras palavras, esse tipo de literatura não se limita a histórias fictícias e distanciadas da realidade circundante. Pelo contrário: por intermédio dos seus versos e da sua linguagem, a Literatura de Cordel reflete sobre diversas temáticas de cunho social, englobando a cultura material e imaterial da espécie humana.

Com isso, ela leva para a escola temas de interesse público e extremamente relevantes para a formação dos discentes brasileiros (BENTES, 2004), transportando para o universo escolar novas possibilidades de cunho metodológico relacionadas à leitura e à diversidade temático-textual. Ou seja, essa literatura propicia um trabalho inovador, tratando a questão da leitura em um perspectiva de ampliação da visão de mundo, de conscientização, de reflexão e de criticidade. Ao mesmo tempo, promove a inserção da diversidade textual e temática no âmbito educacional. Nesse sentido, a Literatura de Cordel propicia novas didáticas e novas iniciativas pedagógicas para o ensino a partir da inserção de múltiplas linguagens nos processos de ensino e de aprendizagem, o que, por conseguinte, ocasiona novos caminhos e horizontes para a construção social do conhecimento do aluno.

Referências

ALBUQUERQUE, E. B. C. Mudanças didáticas e pedagógicas no ensino da língua portuguesa: apropriações de professores. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.

ALBUQUERQUE, E. B. C.; MORAIS, A. G.; FERREIRA, A. T. B. As práticas cotidianas de alfabetização: o que fazem as professoras? Revista Brasileira de Educação, v. 13, p. 252-264, 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/v13n38/05.pdf. Acesso em: 21 out. 2011.

BECKER, F. Educação e construção do conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001.

BENTES, A. C. Linguagem: práticas de leitura e escrita. São Paulo: Global/Ação Educativa Assessoria, Pesquisa e Informação, 2004.

CARDOSO, S. H. B. Discurso e ensino. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

FONSÊCA, A. V. L.; FONSÊCA, K. S. B. Contribuições da literatura de cordel para o ensino da cartografia. Revista Geografia, v. 17, n. 2, Londrina, 2008. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/geografia/article/view/2357. Acesso em: 22 fev. 2012.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

GOMES, G. M. S.; NASCIMENTO NETO, L. D. A cultura Afro-Brasileira no saber escolar contemporâneo: articulando histórias, linguagens, memórias e identidades. Revista Encontros de Vista, v. 2, p. 13-24, Recife, 2009. Disponível em: http://www.encontrosdevista.com.br/Artigos/A_CULTURA_AFRO_BRASILEIRA_NO_SABER_ESCOLAR_CONTEMPORANEO_ARTICU.pdf. Acesso em: 11 dez. 2011.

KOCH, I. G. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2006.

SANTOS, C. F. O ensino da leitura e a formação em serviço do professor. Revista Teias, Rio de Janeiro, ano 3, v. 5, n. jan/jun, p. 29-34, 2002. Disponível em: http://www.periodicos.proped.pro.br/index.php?journal=revistateias&page=article&op=view&path%5B%5D=95.

_____. A formação em serviço do professor e as mudanças no ensino de Língua Portuguesa. Revista Educação Temática Digital (ETD), Campinas, v. 3, nº 2, p. 27-37, jun. 2002. Disponível em: http://www.fe.unicamp.br/revista/index.php/etd/article/viewArticle/1794. Acesso em: 10 jan. 2010.

_____. Letramento e ensino de História: os gêneros textuais no livro didático de História. In: Anais do 4º Simpósio Internacional de Estudos de Gêneros Textuais – Universidade do Sul de Santa Catarina. Tubarão, Santa Catarina, 2007. Disponível em: http://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/cd/Port/33.pdf. Acesso em: 10 jan. 2010.

Publicado em 27 de março de 2012

Publicado em 27 de março de 2012

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