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Educação, política e sociedade: identidade nacional

Eduardo Beltrão de Lucena Córdula

Professor da rede municipal de Cabedelo; Pesquisador do GEPEC-GEPEA/CNPq do CE-UFPB

A educação nacional está, a cada dia, retrocedendo pedagogicamente, em virtude de uma fragilidade social que impede que flua o processo de ensino-aprendizagem no âmbito escolar, fazendo referência principalmente à escola pública, onde infelizmente surgem as adversidades mais gritantes, reflexos de nossa sociedade caótica (CÓRDULA, 2010c).

O sublime ato de ensinar, que não se reduz simplesmente aos conteúdos curriculares, mas sim a mostrar caminhos, possibilidades e a estimular as potencialidades das jovens mentes em preparação para percorrer o longo caminho da vida cidadã, requer do profissional do magistério, acima de tudo, sacrifícios, mesmo essa profissão não sendo um sacerdócio; porém, ela é ainda vista pela sociedade como tal, esquecendo que estamos nos referindo a um ser humano exercendo uma profissão como tantas outras e que, portanto, não deveria sofrer constantemente acusações infundadas de uma sociedade habituada a ser inquisidora, esquecendo-se da condição humana do professor(a) e, portanto, passível de erros, fragilidades, estresse e cansaço, sem contar a dose “homeopática” diária de conflitos, distúrbios, desvios de comportamento, faltas de educação doméstica, de respeito, de amabilidade, de perspectiva, de interesse, de abandono intelectual, social e familiar externalizados nas nossas salas de aula (CÓRDULA, 2010a; NOLTE; HARRIS, 2009). Para Capra (2006), problemas sociais como a violência e tantos outros são reflexo direto do modo de vida que construímos, baseado no usufruto do ambiente (capitalismo, consumismo, busca pelo poder etc.) em que este está diretamente relacionado à nossa qualidade de vida.

Há, portanto, um viés nesse caminho sempre em constante construção, que é colocar na balança do ato de ensinar a seguinte questão crucial: ao ensinar também se aprende (FREIRE, 1996), ou seja, estamos absorvendo o que nossos alunos absorvem em seus lares; portanto, somos também, reflexo de como estão sendo construídas as famílias, a comunidade e a sociedade, já que absorvemos suas virtudes e, principalmente, seus desvios, seus problemas e seus paradigmas e somos afetados como qualquer ser humano. Infelizmente, tudo isso é relatado dentro das instituições promotoras educacionais e fora delas, e continuamos a não ser escutados em tantas reuniões, colóquios, congressos, seminários ou demais encontros destinados à discussão intelectual desse grave e gritante problema que se mascara perante a omissão dos representantes políticos, que só proferem políticas públicas insustentáveis, inaplicáveis e cujos recursos, que são as molas mestras destinadas à sua aplicabilidade, acabam fluindo hemorragicamente durante o percurso até a destinação final, que seria a solução de tais problemas, mas que continuam a ressurgir ao longo do tempo em sociedade (CÓRDULA, 2010a).

A sociedade, por sua vez, também possui sua parcela de culpa, já que é eleitora, consciente, cidadã, e poderia acionar meios para solucionar tais questões seculares aqui elencadas e, ao invés de manter uma postura inquisidora perante o profissional do magistério e até mesmo da escola, passar a ser aliada às mudanças necessárias para seus próprios filhos se tornarem cidadãos em uma geração evoluída social e politicamente e humanitária. Mudando essa postura e a de muitos que pecam pela omissão, assume seu real papel dentro desse sistema humano social que está totalmente fragilizado e descaracterizado. Aliás, todos nós temos nossa parcela de culpa, em menor ou maior proporção, mas também temos nossas virtudes, potencialidades que podem ser despertadas para expandir o desenvolvimento desta nação, assim como outras outrora fizeram e, como a fênix, ressurgiram apenas das cinzas deixadas ao solo, a exemplo das guerras devastadoras (CÓRDULA, 2010b).

Educação é desenvolvimento, é qualidade de vida, é futuro. O desenvolvimento de uma nação se mede pelo seu nível educacional, já que este está diretamente relacionado ao desenvolvimento científico, tecnológico, econômico e, consequentemente, político e social (BRASIL, 2006). E onde isso está ocorrendo?

O que corre, como um hábito quase cultural, é a manutenção do status quo do analfabetismo funcional, de subempregos, de uma demanda constante de carências e necessidades que nunca são sanadas. Apenas surgem soluções paliativas, enquanto nada se faz no âmago da prevenção da problemática e de sua definitiva solução, até porque, mantendo-se esse filão de mazelas fluindo, revertem-se em ponto foco de campanhas políticas e em discursos de promessas que servem de escada para saltar para uma efetivação eleitoral. E, como em tudo neste país “se dá um jeitinho”, o jeitinho é logo dado para esquecer sua responsabilidade política na representação da parcela da população que o elegeu como voz, pensamento e mão que nos representa no cenário político local e nacional, para, em tese, tomar as decisões corretas e necessárias para que as tão almejadas mudanças ocorram. No entanto, a realidade histórica mostra que ficamos à mercê de suas débeis decisões, e a cada período de tempo, continuando a sonhar esperançosos por mudanças reais que ainda tardam a acontecer, já que o aumento do nível de instrução, de conhecimento e de intelecto da população se refletiria diretamente no cenário político nacional; por isso, a educação nacional continua andando a passos letárgicos (CÓRDULA, 2010c; FREIRE, 1986).

Há, contudo, grandes desafios a serem enfrentados na Educação Básica no país. É preciso am­pliar o acesso à Educação Infantil (atribuição prioritária dos municípios) e ao Ensino Médio (atribui­ção prioritária dos estados). A taxa líquida de matrícula nesses níveis de ensino é, respectivamente, de 34% e 43%. É necessário também trabalharmos para a urgente melhoria da qualidade do ensino ofertado em nossas escolas. Os indicadores de aprendizagem do SAEB para o Ensino Fundamental em Língua Portuguesa e Matemática apontam índices críticos, com resultados piores no Nordeste brasileiro. Desse modo, embora as desigualdades tenham sido reduzidas em relação ao acesso ao Ensino Fundamental, dados dos sistemas de ensino mostram que ainda persistem desigualdades quanto aos resultados educacionais alcançados por diferentes segmen­tos da população, comprometendo assim a universalização do Ensino Fundamental, uma vez que nem todos concluem esse nível de ensino.

A garantia do direito à educação não se resume à provisão de matrícula. Deve-se assegurar meios capazes de proporcionar aos alunos condições de permanência, aprendizagem e con­clusão, conduzindo assim ao aumento do nível de escolarização da população. Nessa direção, apontam os objetivos do Plano Nacional de Educação, quando destacam a melhoria da quali­dade do ensino em todos os níveis; a redução das desigualdades sociais e regionais quanto ao acesso, à permanência e ao sucesso escolar; a democratização da gestão do ensino público; e o aumento da escolaridade da população como desafios da educação nacional. As políticas edu­cacionais no nível municipal desempenham um papel fundamental para fazer avançar o País em direção a esses objetivos. Os dirigentes municipais de educação nesse contexto assumem uma função de destaque, sendo os responsáveis pela gestão da oferta, qualidade e equidade da edu­cação para cerca de 25 milhões de crianças, jovens e adultos nos diferentes níveis e modalidades de ensino, correspondendo a 45% das matrículas de Educação Básica no Brasil (BRASIL, 2006, p. 9).

Como se pode constatar no texto trazido pelo MEC aos dirigentes públicos como orientação aos para melhoria na qualidade da educação, não há preocupação da política educacional nacional; porém, se contradiz na realidade dos investimentos que ainda são poucos; e não é só formação humana, que muitas vezes é totalmente desvirtuada da realidade vivenciada em sala de aula e, portanto, não forma nada e, sem forma alguma, não tem aplicabilidade, ou seja, gasto público necessário, com uma equipe de formadores desnecessária (CÓRDULA, 2009c). Infelizmente, o MEC ainda vislumbra apenas números que não refletem a realidade, já que a avaliação quantitativa de um determinado questionamento só mostra uma só vertente, ao contrário da avaliação qualitativa que mostra não só o problema, mas tenta entender sua origem e traçar soluções para revertê-lo em um processo a curto, médio e longo prazos (CÓRDULA, 2009a).

“Não adianta lutar contra a maré” seria a frase célebre dos pessimistas, comodistas e opositores das mudanças do paradigma atual. Mas há, sim, uma real necessidade de não nos deixarmos abater, de sermos otimistas, esperançosos, sonhadores e de termos fé na utopia de que tudo um dia irá mudar, e, para tanto, unindo forças entre nós mesmos, magísteres, conquistando aliados conscientes nas famílias de nossos alunos, conseguiremos ter uma geração de cidadãos capazes de dar um novo rosto a esta nação, já que somos responsáveis pela formação de nossos filhos e por termos o brado retumbante em nossas vozes e o poder de trazer a informação e a beleza ao caos que prolifera ao nosso redor: este é o verdadeiro poder do educador (CÓRDULA, 2009b).

Sonhar faz parte do ser humano. Ele precisa constantemente erguer-se em seu mundo particular, onde seus segredos são desvendados. Sem os sonhos, o mundo não estaria no atual estágio de avanço. Foi através de sonhos que se incorporaram à nossa realidade, que o homem conseguiu ganhar asas e conquistar os céus. Melhor que isso, levou-o a sonhar mais alto e buscar o quase impossível, chegar à Lua (CÓRDULA, 1999, p. 69).

Amar, lutar, se envolver, sofrer, aprender, ensinar, mudar e fazer acontecer são condições adquiridas pelo ser humano que abraça a educação pública, não só como profissão para sustentáculo de sua família, mas como condição básica para quem deseja mudar esta nação (FREIRE, 2011; CÓRDULA, 2012).

REFERÊNCIAS

BRASIL. Programa de Apoio aos Dirigentes Municipais de Educação. Brasília: MEC, 2006. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Pradime/cader_tex_1.pdf. Acesso em: 28 jan. 2012.

CAPRA, F. O Ponto de Mutação. 26ª reimp. Trad. Álvaro Cabral. São Paulo: Cultrix, 2006.

CÓRDULA, E. B. L. Aprendiz de Sonhador. In: GUERRA, R. A. T. (Org.). Educação Ambiental: textos de apoio. João Pessoa: Editora da UFPB, 1999. p. 69-70.

______. A educação pelos olhos do professor. Jornal da Paraíba. João Pessoa, Cidades, 26 nov. 2009a, p. 6.

______. Construtores do amanhã. Jornal O Norte. João Pessoa, Opinião, 03 dez. 2009b, p. 14.

______. Carta ao Professor(a). Jornal da Paraíba. João Pessoa, Cidades, 16 dez. 2009c , p. 5.

______. Educação e sociedade. Jornal O Norte. João Pessoa, Cidades, 17 nov. 2010a, p. 5.

______. Política, cidadania e eleições. Jornal da Paraíba. João Pessoa, Cidades, 20 jan. 2010b, p. 5.

______. Ser Professor! Educação Pública. Rio de Janeiro, n° 12, 6 abr. 2010. Disponível em: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/suavoz/0135.html. Acesso em: 7 abr. 2010.

______. O papel da escola na neogênese da afetividade humana. Educação Pública. Rio de Janeiro, n° 4, 21 jan. 2012. Disponível em: http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/educacao/0314.html. Acesso em: 21 jan. 2012.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.

______. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia da Esperança – um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. 17ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

NOLTE, D. L.; HARRIS, R. As crianças aprendem o que vivenciam. Rio de Janeiro: Sextante, 2009.

Publicado em 3 de abril de 2012.

Publicado em 03 de abril de 2012

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