Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

Até onde os pais vão para garantir o melhor a seus filhos?

Tatiana Serra

Em um experimento que virou um clássico, o psicólogo Walter Mischel criou o seguinte cenário na Universidade Stanford no fim dos anos 1960: crianças de quatro anos de idade foram colocadas em uma sala pequena, que continha um marshmallow em uma mesa. O pesquisador explicava à criança que ele teria de sair, deixando-a sozinha na sala. Se, quando ele voltasse, a criança tivesse resistido à tentação de comer o doce, ela ganharia mais um marshmallow. Se capitulasse e o comesse, não ganharia mais nada.

Anos depois do experimento, Mischel foi acompanhando informalmente o progresso daquelas crianças e notou que havia uma correlação entre o tempo que elas conseguiram esperar antes de comer o marshmallow e vários indicadores de bem-estar. Quase vinte anos depois do estudo original, Mischel e colegas mediram objetiva e cuidadosamente suas características, e os resultados foram surpreendentes: vários dos atributos mais importantes para seu sucesso podiam ser previstos pelo tempo a que resistiram ao marshmallow aos quatro anos de idade.

Uso de drogas, peso corporal e até os resultados no SAT, o vestibular norte-americano, estavam significativamente associados ao autocontrole demonstrado diante das guloseimas. A capacidade de sacrificar um pequeno ganho presente (comer um doce) pela possibilidade de um ganho maior no futuro (dois doces) se relacionava com o bem-estar em dimensões bem mais sérias ao longo de toda a vida (Gustavo Ioschpe, na revista Veja).

Nesse texto, o economista e especialista em educação Gustavo Ioschpe afirma que grande parte dos problemas que o Brasil enfrenta se deve à nossa incapacidade de fazer sacrifícios presentes para colher ganhos futuros. Ele ressalta que desde o seu nascimento o brasileiro sai em desvantagem, pela impaciência de mães e médicos: nossa taxa de partos por cesariana (44% em 2011) é a mais alta do mundo, de acordo com dados do Unicef; e logo que as famílias saíram da pobreza e passaram a poder consumir um pouco o perfil nutricional do brasileiro passou da subnutrição diretamente para o sobrepeso e entre 1989 e 2009 a obesidade infantil mais do que quadruplicou.

As colocações de Ioschpe convidam a olhar para nossa vida privada e perguntar (sejamos pais ou não): o que faríamos pelo futuro dos nossos filhos? De acordo com as normas pelas quais a maioria de nós foi criada, a resposta seria: "eu faria de tudo pelo meu filho". Para outros, as repostas poderiam ter um “porém”, como: “eu faria tudo, desde que não atrapalhasse o meu estilo de vida". Pode ser duro, mas também pode ser apenas o reflexo de uma sociedade individualista ou mesmo realista. Afinal, entre poupar para garantir uma melhor educação aos filhos e trocar o carro usado por um zero km, qual seria a escolha de muitos de nós? E mais: quando se fala em tudo pelos filhos, a que “tudo” nos referimos?

Para a pedagoga e mãe Cláudia Canavarro, a relação entre pais e filhos é de pura doação, e as mães sabem bem como funciona, pois já começam a exercitar isso nos primeiros momentos de vida dos filhos. “Quando você amamenta, essa é uma situação de extrema doação, e você constata ali que aquele ser depende totalmente de você. Então a mãe tende a ter uma capacidade de doação muito maior do que o pai. Essa relação com os filhos nos leva à consciência de que é preciso dar subsídios para garantir a continuação da nossa espécie. Isso é instinto.”

Por outro lado, ela lembra que há pais que, por diferentes motivos, não veem dessa forma a relação com os filhos e encaram como puro sacrifício o que também pode ser muito prazeroso. É importante destacar ainda o radicalismo de outros “pais capazes de abrir mão da moral e de tudo que aprenderam como sendo correto pela ‘loucura’ de fazer tudo pelos filhos, a ponto de querer viver a vida deles. A partir do momento em que você faz tudo por eles, não dá autonomia. E que mãe quer ver um filho independente? Poucas”, garante a pedagoga.

Há crianças que resistirão ao marshmallow, há aquelas que não pensarão nem uma vez e se lambuzarão do doce e há outras que nem precisarão pedir, pois seus pais já terão comprado uma caixa da guloseima.

Publicado em 24 de julho de 2012

Publicado em 01 de fevereiro de 2012

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.