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Ascensão e declínio social da humanidade: uma questão de altruísmo

Eduardo Beltrão de Lucena Córdula

Pesquisador do GPEA/UFPB; especialista em Educação; biólogo

Ser humano: Homo sapiens sapiens

O ser humano, espécie altamente adaptável e considerada entidade mais evoluída do planeta, pois criou formas de propiciar sua sobrevivência nos diferentes ambientes, pois transforma tudo à sua volta, construindo e reconstruindo artificialmente os ambientes, não conseguiu ainda projetar na atualidade as consequências desses atos e os custos dessa adaptabilidade no futuro (CÓRDULA, 2010). Mesmo tendo um telencéfalo altamente desenvolvido, ainda sim, preocupa-se apenas com o agora, com as necessidades imediatistas, e deixa de pensar na coletividade, no futuro e no planeta (CÓRDULA, 1999).

Nós, seres humanos, evoluímos biologicamente e conseguimos psicologicamente desenvolver sentimentos como o amor, e não só externalizando esse fenômeno afetivo, mas inúmeros outros, que são fatores que nos distinguem dos demais seres vivos do planeta.

Criamos, recriamos, ditamos, modificamos e mesmo assim continuamos presos a questões primitivas que há milênios existiam em nossos ancestrais, mas que continuam a se manifestar: superioridade pela força bruta, desejos de conquista, de inveja, de posse e de cobiça. Precisamos, portanto, acordar e sair do estado de ter e despertar para o estado sublime de ser (CÓRDULA, 2012).

Sociedade humana

Alguns grupos de animais possuem comportamento social na natureza, a exemplo de insetos (cupins, abelhas etc.) e mamíferos. Em Biologia, a designação “animal social” tem por definição um organismo que interage com outros membros da sua espécie para benefício do grupo, garantindo assim a sobrevivência da coletividade no ambiente; as espécies sociais representam 3% do total de animais do planeta, porém possuem 50% de sua biomasssa total (COSTA, 2012). Nós, seres humanos, somos animais, mamíferos da ordem primata, somos, portanto, animais sociais (FACURE, 1998); para Osborne (2012, p. 44), socialização é o “processo pelo qual ao longo da vida a pessoa humana aprende e interioriza os elementos socioculturais do seu meio, integrando-os à estrutura da sua personalidade sob a influência de experiências de agentes sociais significativos, adaptando-se assim ao ambiente social em que deve viver”. Sociedade é a “estrutura formada pelos grupos principais, ligados entre si, considerados como uma unidade e participando todos de uma cultura comum”.

Segundo Costa (2012), a evolução dos seres vivos, pela teoria de Darwin, foi interpretada erroneamente pelo filósofo Herbert Spence no início do Século XX; ele considerava que os mais fortes sobreviveriam às mudanças ambientais e garantiriam a sobrevivência das espécies ao longo do tempo. Essa interpretação perpetuou-se por mais de um século na sociedade científica e adentrou a formação educacional dos cidadãos, ratificando o individualismo entre nós, seres humanos. Dawkins (2007), em seus estudos sobre o DNA, acabou acirrando ainda mais a controvérsia da individualidade e da luta do mais forte para sobreviver, com sua obra sobre o gene egoísta. “Para ele, nós e todos os animais somos maquinas criadas pelos nossos genes. Nossos genes sobreviveram num ambiente altamente competitivo. Ao esperar que esses genes tenham algumas qualidades, a qualidade predominante de um gene bem-sucedido tem que ser o egoísmo implacável” (FELIPE, 2009, p. 4). Porém estudos recentes do sociobiologista americano Edward Wilson mostram, à luz do evolucionismo de Darwin, que a generosidade, a fraternidade, o companheirismo são inerentes à condição humana e são fatores determinantes do sucesso e do alto desenvolvimento das sociedades.

O processo evolutivo é mais bem-sucedido em sociedades nas quais os indivíduos colaboram uns com os outros para um objetivo comum. Assim, grupos de pessoas, empresas e até países que agem pensando em benefício dos outros e de forma coletiva, alcançam mais sucesso (COSTA, 2012, p. 81).

É o altruísmo que está presente na condição humana do ser humano; segundo Ferreira (2000, p. 35), altruísmo é o “sentimento de quem põe o interesse alheio acima do seu próprio”. O egoísmo ainda está presente na evolução individual, enquanto o altruísmo o eleva evolutivamente por envolver a coletividade, o que não fora previsto por Darwin, já que sua teoria focava a evolução do corpo dos seres vivos, e não considerava o mesmo processo para a psique e os pensamentos – consciência (COSTA, 2012).

Por ter consciência, a pessoa é capaz de julgar se irá agir a favor ou contra o outro, podendo, inclusive, basear essa decisão em atos que esse mesmo sujeito praticou no passado. Alguém que sempre age de modo egoísta, por exemplo, pode ser rejeitado pelo restante do grupo (COSTA, 2012, p. 83).

Para Costa (2012, p. 83), o altruísmo se dá de forma diferenciada nas sociedades que têm como fator influenciador o ambiente e suas condições. Estudos recentes da neurociência mostram que as condições do ambiente onde se manifestam ações altruístas ativam áreas específicas do cérebro – sistema dopaminérgico mesolímbico – e a glândula pituitária, que libera ocitocina (neurotransmissor), quando essas ações ocorrem, sendo considerado o hormônio da união, do amor e manifesto no corpo durante o contato físico nas relações interpessoais (SORG, 2011). Esses estudos acabam pondo por terra a máxima capitalista da competição como trampolim para o sucesso e o desenvolvimento pessoal e profissional, pois isso já é observado até mesmo em empresas: “num ambiente em que não há espaço para a competição e as despesas são divididas, o negócio cresce” (COSTA, 2012, p. 84).

A bondade, enquanto sentimento moral, é a disposição geral para praticar o bem. Associa-se estreitamente à compaixão, que é a necessidade de aliviar o sofrimento dos outros, e ao altruísmo, que é a emoção social que dela deriva. Esses sentimentos estão na base de comportamentos pró-sociais e pró-ambientais importantes, que implicam a cooperação e a confiança nos outros (LENCASTRE, 2010, p. 114).

Portanto, o altruísmo é inerente à nossa espécie; pode e deve ser estimulado para o pleno convívio social, o aumento da qualidade de vida e do bem-estar das relações interpessoais, cabendo vislumbrar esse fenômeno do ser, para transformarmos o nosso modo de educar nossas crianças e jovens no mundo contemporâneo para uma nova era planetária.

REFERÊNCIAS

CÓRDULA, E. B. L. Eu! In: GUERRA, R.A.T. [Org.]. Educação ambiental: textos de apoio. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 1999, p. 48-49.

CÓRDULA, E. B. L. Ser Humano, Meio Ambiente e Aquecimento Global. Revista Eletrônica Educação Ambiental em Ação, n° 34, Ano IX, dez/2010-fev/2011. Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=922&class=02. Acesso em: 10 dez. 2010.

CÓRDULA, E. B. L. Homo sapiens affectus: em busca do futuro da humanidade. Cabedelo: EBLC, 2012.

COSTA, Rachel. O Poder da Generosidade. Revista Isto É, São Paulo, Ano 36, n° 2218, 16 mai. 2012, p. 80-87.

DAWKINS, Richard. O gene egoísta. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

FACURE, Nubor Orlando. As transformações sociais. Jornal Mundo Espírita, out. 1998. Disponível em: http://www.espirito.org.br/portal/artigos/mundo-espirita/as-transformacoes-sociais.html. Acesso em: 27 jul. 2012.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI Escolar: o minidicionário da língua portuguesa. 4ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

FILIPE, Carlos Henrique de Oliveira. Resenha de O gene egoísta, de Richard Dawkins. WebArtigos.com, 11 jul. 2009. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/o-gene-egoista-richard-dawkins-resenha/21269/. Acesso em: 27 jul. 2012.

OSBORNE, Richard. Dicionário de Sociologia. Disponível em: http://www.cmrj.ensino.eb.br/ensino/notas_aula/2bim2012/8HIS04.pdf. Acesso em: 27 jul. 2012.

LENCASTRE, Marina Pietro Afonso. Bondade, Altruísmo e Cooperação: considerações evolutivas para a educação e a ética ambiental. Revista Lusófona de Educação, Portugal, n° 15, 2010, p. 113-124. Disponível em: http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/rle/n15/n15a08.pdf. Aceso em: 27 jul. 2012.

SORG, Letícia. Casais recorrem a hormônio para melhorar a relação – sem o aval da ciência. Revista Época, São Paulo, 11 out. 2011, Mulher 7x7. Disponível em: http://colunas.revistaepoca.globo.com/mulher7por7/2011/10/11/casais-recorrem-a-hormonio-para-melhorar-a-relacao-%e2%80%93-sem-o-aval-da-ciencia/. Acesso em: 27 jul. 2012.

Publicado em 28 de agosto de 2012

Publicado em 28 de agosto de 2012

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