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A Classe C vai ao paraíso... Mas se endivida com a viagem

Mariana Cruz

– Alô, por favor, Dona Maria dos Santos?

– Ela não está: trabalha aqui às terças e quintas; quem deseja falar com ela?

– É da Losango (ou da Ibi, da Leader etc.).

À medida que o poder aquisitivo da classe C foi aumentando, a quantidade de telefonemas de financeiras e lojas de departamentos para a casa de minha mãe foi crescendo também. Maria, a moça que trabalha lá, está muito melhor financeiramente do que há dez anos. Realizou o “sonho da casa própria” e está comprando outra, os filhos cresceram e ficaram independentes. Ela gosta de comprar, sempre gostou, mas antes o dinheiro só dava para o necessário, hoje ela consegue comprar bem mais. Esse é o problema: ela se enrola, pede dinheiro emprestado e, quando quita as dívidas – depois de pagar os juros do juros –, começa a comprar de novo! A última aquisição foi um fogão novo.

– Maria, você não comprou um fogão zerado no ano passado?

– Ah, mas aquele só tinha quatro bocas, eu queria um de seis.

E, quem diria, outro dia estava danada da vida com a filha – solteira, sem filhos e morando sozinha – porque abandonou a faculdade. A jovem era a primeira integrante da família a entrar para o ensino superior, mas teve largar porque não estava conseguindo pagar a mensalidade. Assim como a mãe, a menina é gastadeira. Além de uma moto, comprou uma geladeira de “R$ 1.800,00”. Por isso, Maria estava chateada com a filha: “fica comprando besteira e não sobra para os estudos!”.

Cenas como essas se tornaram possíveis graças a algumas modificações ocorridas na pirâmide socioeconômica do nosso país, que, aliás, tem sido um dos assuntos em voga nos últimos anos: o crescimento da renda da classe C aqui na terrinha. Estamos indo em direção oposta ao resto do mundo: enquanto Europa e Estados Unidos passam por uma crise em sua economia, o Brasil está em ascensão e tem a “classe C” como maior beneficiada. Em uma matéria para o Portal IG, o presidente da CSN e vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Steinbruch, afirma que “o Brasil nunca esteve tão bem e as grandes potências econômicas nunca estiveram tão mal”. Uma rápida analisada nas novelas da TV Globo já fica evidente a mudança de foco. Agora o núcleo “pobre” virou protagonista, com suas empreguetes, empregadas e suburbanos, os componentes da nova classe média. Foi-se a época dos emergentes da Barra com seus carros importados, viagens para Miami e cachorrinhos a tiracolo. Hoje a classe C tem a força.

Penso, porém, que essa maré boa pela qual a economia de nosso país está passando poderia ser mais bem aproveitada se ampliássemos não só nosso consumo como também nossa cultura; afinal, uma máquina de lavar de última geração dificilmente vai tornar alguém mais crítico, consciente e reflexivo. Vai, no máximo, despertar a inveja do vizinho. É inegável o lado positivo de ter mais variedade de comida à mesa, mas não devemos esquecer que o alimento intelectual também se faz premente. Quem sabe assim perceberíamos que ter TVs de LCD em todos os cômodos e carros do ano não são algo de extrema necessidade? Quem sabe não veremos que a luta para a melhora dos bens coletivos pode trazer mais benefícios para a sociedade? Como bem disse Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá: “cidade avançada não é aquela onde os pobres andam de carro, mas sim aquela onde os ricos andam no transporte público”.

Penso que tal momento de ascensão pode ser uma chance de lutar por mudanças sociais, de buscar um ensino melhor para nossos filhos, cursos, livros, filmes de qualidade. É uma oportunidade para nos instruirmos e nos conscientizarmos de nossos direitos e deveres, fazer com que sejamos mais éticos e pensemos mais na coletividade. Isso tudo pode mudar a cabeça de uma pessoa. Uma pessoa mais informada não irá votar em um candidato porque é um artista muito engraçado nem em uma moça porque canta funk e rebola até o chão. Claro que todos têm direito de votar em quem quiser pelas razões que bem entender, mas votar porque confia em seu candidato e porque acha que ele irá trazer melhorias para a sociedade parece ser uma razão mais forte do que o fato de ser bonitão.

É muito positivo que as classes menos favorecidas agora possam comprar mais, viajar e “navegar por mares nunca antes navegados”; só que elas têm que se preocupar em não se afogar nessas águas desconhecidas!

Sites pesquisados

http://economia.ig.com.br/brasil-esta-melhor-na-crise-mas-precisa-exercer-lideranca-com-sabedoria/n1597240676266.html

http://blogs.estadao.com.br/fernando-dantas/2012/03/21/como-o-brasil-virou-o-pais-da-classe-c/

Publicado em 9 de outubro de 2012

Publicado em 09 de outubro de 2012

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