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Escolas da violência
Lúcio Alves de Barros
Doutor em Ciências Humanas (UFMG); professor da Faculdade de Educação (UEMG)
É chegar o final do ano e do segundo semestre escolar que se inicia o ciclo da violência contra os professores. O problema é sério e nada é feito nos campos pedagógico e administrativo. A Constituição de 1988 tratou de deixar clara a importância da gestão democrática. O mesmo fez a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. Essa democracia de tolos, entretanto, continua uma falácia, pois na maioria das escolas inexiste um plano pedagógico de respeito, conselhos de classe, participação e muito menos a observância da comunidade – que, sejamos francos, não está nem aí para os rumos da educação.
Os casos de violência, um fenômeno nada novo e que na verdade já foi banalizado, têm o que revelar nesse contexto. Já não existe o escândalo e a vergonha social em relação aos professores que estão levando socos e chutes pelo corpo afora. Parece aceitável alunos e alunas sabotando professores em sala de aula, nos corredores, na rua ou em redes sociais. O mesmo pode-se dizer de telefonemas anônimos, vinganças e ameaças. Na escola, e nela a educação para a violência, nada é latente. Tornou-se manifesto estudantes colocando em xeque a autoridade e a disciplina escolar. Professores já estão lutando contra o medo com o uso de ansiolíticos e a possibilidade de vitimização. Diante do poderoso estudante, uma das saídas tem sido o lugar escuro do da covardia. Sem forças físicas e emocionais, os docentes deixam as coisas como estão. Esperam que o aluno passe para outra série ou que mude de escola. O medo é um poderoso mecanismo de paralisação das atividades físicas e mentais. Não há economia psíquica que resista.
Estou para ver conselhos, comunidades, pais e professores discutindo a violência dos estudantes e entre os estudantes em sala de aula. A ideia de uma gestão democrática, normativamente delineada na Constituição e na LDB, é uma mentira de mau gosto. E vamos à veracidade dos fatos. Poucos são os pais preocupados com os filhos, principalmente nas escolas públicas, que se tornaram creches para marmanjos e locais de “educação integral” para evitar que a criança e o adolescente fiquem em casa ou na rua em contato com possíveis marginais.
Outrora a escola servia para formar gente que pensa e a palavra do professor era lei. Contava-se com o apoio dos responsáveis em relação a determinados limites e atitudes que fazem parte do adolescer e da juventude repleta de hormônios. Atualmente, os pais são – no mínimo – coniventes com a conjuntura hodierna. Em relação à comunidade e à denominada “comunidade escolar”, a verdade também é clara: ela não participa das decisões e da solução dos problemas da escola. Na realidade, nem se sabe o que é uma comunidade. As famílias estão preocupadas é com o famigerado consumo, o que vale é a roupa da moda, o último computador, a banda larga, o celular que serve para tudo e qual será a novidade que o mercado vai soltar no mês que se aproxima. A educação já não faz parte das noites tranquilas da primavera e do verão. O livro virou peça de museu e a sociabilidade do lar é pouca ou chata para o mundo tirânico da juventude hedonista e sem freios.
Longe dos limites da família, distantes e recalcitrantes dos limites na escola, é claro que se pode esperar conflito e violência de toda ordem. E esta violência não é gratuita; é uma linguagem, não nasce do nada, ela quer dizer alguma coisa. Ainda não sabemos o que, mas é certo que a ideia de uma escola democrática não caminha de mãos atadas com a violência. Para a democracia, é inquestionável a negociação. Relações violentas são paradoxais em gestões democráticas. Logo, ela inexiste sem o professor e o apoio dos pais. Escolas são sagradas, são lugares de conhecimento e de relações sociais seguras. Os casos de agressões em fim de semestre, entretanto, revelam o contrário. A educação tornou-se campo minado e conflituoso; transformou-se em um acerto tácito de contas que se alimenta de uma pedagogia para a violência e, tal como a polícia, docentes, alunos e pais procuram um inimigo. Um inimigo que está encarcerado em salas lotadas e distante da tal “comunidade”. Somam-se a essa conjuntura as péssimas condições de trabalho, a precariedade da profissão docente, o despreparo dos alunos no que toca aos requisitos mínimos de civilização, os baixos e vergonhosos salários e o desrespeito governamental em relação ao trabalho docente e ao local onde se desenvolve esse trabalho. É impossível acreditar em mudanças significativas em curto ou médio prazo; até lá, resta aos professores a “cultura escolar do medo”, da suspeição e da incerteza diária de relações que, devido a uma péssima nota, podem sair do controle.
Publicado em 16 de outubro de 2012
Publicado em 16 de outubro de 2012
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