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Não basta falar em construção do conhecimento, é preciso praticar

Alexandre Rodrigues Alves

Há quase vinte e cinco anos estou envolvido com Educação e há mais de dez com Educação a Distância. Minha monografia da pós-graduação – em Marketing – identifica ações para reduzir a evasão escolar; minha dissertação de mestrado trata da linguagem na chamada EaD.

Não me considero um profundo conhecedor das teorias educacionais – em Currículo, Educação Inclusiva, Psicopedagogia –, mas venho percebendo em artigos e em alguns trabalhos acadêmicos uma confusão quanto aos papéis e ao alcance da EaD no contexto atual.

Antes de qualquer coisa: as tecnologias de informação e comunicação (as famosas TIC) foram fundamentais para o desenvolvimento atual da educação a distância, mas não são fundadoras. Há quem afirme que as epístolas bíblicas (as cartas que os apóstolos enviaram às várias comunidades cristãs dos primeiros tempos) foram a primeira forma de educação a distância. Acho que há aí um certo exagero, mas tem lá sua lógica. Mais recentemente, em meados do século passado, os cursos por correspondência atendiam, a distância, ao interesse de formação de figurinistas, técnicos em eletrônica, telefonia, mecânica, eletricidade... O melhor exemplo certamente é o Instituto Universal Brasileiro.

As TIC são importantes para a EaD, mas são apenas ferramentas, como são ferramentas para a existência e o sucesso do Twitter, do Facebook, do Orkut, do Youtube, do Google, entre outros, porque facilita a comunicação entre as pessoas – fazendo em segundos o que antes era feito em semanas, necessitando de colagem de envelope, selagem, idas ao correio...

Sendo ferramentas, podem servir para o bem e para o mal. Podem enviar uma mensagem motivadora ou vender uma metralhadora, felicitar pelo sucesso num concurso ou marcar um encontro de gangues.

Do mesmo modo acontece com a Educação a Distância. Não é o fato de ser realizado na modalidade EaD que dá ao curso (em qualquer nível) a certeza de que será interativo, de que levará os alunos a aprender ou a construir seu conhecimento, a interagir com os colegas. O que leva um curso a provocar a interação entre os participantes, a dominar os conteúdos e ideias apresentadas a trocar experiências e opiniões a contribuir para o sucesso coletivo é o projeto pedagógico do curso, do professor ou da instituição – nunca a metodologia. É fácil deduzir que um trabalho em grupo presencial benfeito é uma excelente oportunidade de interação entre os estudantes – um chat ou um fórum de discussão nada mais são do que a reprodução eletrônica desse ambiente.

Mas não basta o projeto pedagógico falar em interação, construtivismo, participação. É preciso que realize isso na prática.

Há muitos cursos em EaD que fazem avaliações de que constam perguntas equivalentes a “quem descobriu o Brasil?” ou “qual a fórmula da água?”, que nada exigem do aluno em termos de elaboração daquilo que estudou.

Há muitos cursos em EaD que são simplesmente a transposição, para a tela, do discurso do professor (daquele tipo que nem olha para a cara do aluno, limita-se a falar, falar, falar daquilo que lhe interessa, sem contextualizar ou buscar provocar o interesse do aluno) – ou para o papel, em alguns casos.

Nas lides pedagógicas, usa-se muito a expressão “processo de ensino-aprendizagem”, como se fosse algo inevitável, atávico, ou seja: se houve ensino houve aprendizagem. Nem sempre. Daí que alguns educadores preferem a forma “processo de ensino e aprendizagem”, e frequentemente dão o exemplo da alfabetização: Uma coisa é ler, outra é escrever. Há quem leia bem e escreva mal, há quem escreva bem e tenha dificuldades para ler... São dois processos diversos que muitos consideram causa e consequência um do outro. Mas não dá nem pra saber quem vem primeiro!

Dando um exemplo bem pessoal: eu só fui entender as fórmulas de Mecânica (de movimento retilíneo uniforme, de movimento retilíneo uniformemente variado) quando aprendi a dirigir, pois aí é que passei a experimentar (ou experienciar, como gostam os pedagogos) a ideia de que, mantida uma velocidade constante por um determinado período, é só multiplicar um pelo outro para calcular a distância percorrida. E olha que nem fui para a recuperação em Física no Ensino Médio!

Foi no momento em que compreendi os cálculos feitos e sua lógica que passei a conhecer esse pouquinho de Cinemática. Claro que meus professores de Física têm grande mérito no meu processo de aprendizagem, mas ele já não estava tão diretamente ligado ao ensino que eles praticaram pelo menos três anos antes; estava mais próximo da minha atenção a um novo processo que eu passei a viver: ser sujeito dos meus deslocamentos.

Voltando à EaD: é possível levar o estudante a construir seu conhecimento num curso a distância? Claro que sim, desde que sejam dados a ele os recursos pedagógicos necessários – recursos esses, aliás, que podem estar disponíveis numa sala de aula presencial, incluindo petrechos eletrônicos, materiais impressos, objetos educativos etc. – e a possibilidade de refletir sobre aquilo que está estudando, incluindo aí contextualização e a interação com colegas e professores.

Ler alguns textos institucionais sobre isso traz algumas surpresas. É muito sintomático que, poucas linhas depois de usar frases como “construção do conhecimento pelo aluno”, “estudante sujeito da sua aprendizagem”, a instituição educacional (de qualquer nível) tira a “pele de cordeiro” e coloca em seu material de divulgação a expressão “transmissão do conhecimento”, como se conhecimento fosse transmitido. Todo mundo sabe que quem transmite é rádio e televisão, que dão informações. Não a escola, nem o professor; estes educam.

Em suma: não é porque é feito na modalidade EaD que o curso é bom ou moderno; nem é porque é presencial que um curso é retrógrado, tradicional, conservador ou só preocupado em “passar conteúdo”.

Publicado em 23 de outubro de 2012

Publicado em 23 de outubro de 2012

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