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Avaliações: entre o coletivo e o individual

Alexandre Alves

No último conselho de classe, quando os professores foram analisando turma a turma e aluno a aluno (incluindo as alunas, para não ser cobrado pelas patrulheiras de gênero), fiz questão de mencionar o Eduardo.

Por quê? Porque o Eduardo (vamos chamá-lo assim) é um aluno que parece sofrer algum tipo de comprometimento mental; tem dislalia e outras coisas mais. Só que não recebemos qualquer informação da Secretaria de Educação, da coordenadoria ou da direção da escola sobre isso, sobre como lidar com a condição dele... Tanto que nenhum professor da escola sabe exatamente qual é o problema dele, como resolvê-lo ou como lidar com essa diferença. Certamente as autoridades querem que a gente adivinhe o que é e como fazer... Porque, encastelados nos gabinetes, mergulhados em números e estatísticas, também não sabem o que deve ser feito.

Comecei falando do Eduardo porque ele fez uma excelente prova de interpretação (da música e do filme Faroeste Caboclo) e foi mal na prova de gramática. Que avaliação se pode fazer desse fato? Que eu sou um péssimo professor? É possível, mas as boas provas de outros alunos (de outras alunas, para não contrariar as patrulhas de gênero) de certa forma desmentem essa afirmação. Podemos concluir que gramática é desnecessária? Talvez até seja, em alguns casos (vou ganhar mais algumas pedradas, aqui), mas fiz questão de não preparar uma prova tão aprofundada nas regras ou fora da realidade deles.

Podemos também concluir que o Eduardo é mais afeito a entender os sentidos de um texto e menos da sua estruturação, sem entrar em fatores externos como brigou com a namorada, seu time perdeu, não recebeu o salário...

Conclusão da história: ainda que esse aluno tenha duas avaliações tão discrepantes, no fim das contas e no boletim da Secretaria de Educação ele tem uma nota igual ou muito parecida com a grande maioria de seus colegas de turma – que não fizeram provas tão boas ou tão ruins quanto ele. OK, muita gente vai dizer que esses números servem apenas como referência para as estatísticas e para a definição de sua situação no final do ano (aprovado ou reprovado), mas essa situação especial do Eduardo não constará do seu histórico escolar. Da mesma forma, considerar a nota média de uma turma esconde “os topos e vales” das notas individuais.

De certo modo, é isso que as secretarias de educação (e até o MEC) levam em consideração ao avaliar se uma escola está tendo sucesso em sua atuação. Idem ibidem para as escolas em relação aos professores. Ao abandonar as situações individualizadas, certamente as análises ficam mais pobres e mais afastadas da realidade.

Lembro-me de estranhar as falas dos locutores dos telejornais quando anunciavam o valor do câmbio do dólar ou do euro. Eles dizem “hoje o dólar foi negociado a...”, como se todas as casas de câmbio, bancos e instituições congêneres (legais ou não) do país fossem obrigadas a ter uma tabela unificada. Tanto não era único o valor que inúmeras vezes ele variava de emissora para emissora, e até de jornal para jornal.

As notas não são como o dólar – mas têm em comum o risco de disfarçar a realidade com o emprego genérico de números.

Indo mais fundo: o fato de uma determinada escola ter ótimas notas num sistema de avaliação (Saerj, Saresp, Saeb, Enem, Enade e outros) não é garantia de que ela tem qualidade ou que seja a escola adequada para um estudante (uma estudante, para evitar as patrulhas etc. e tal), pois mais importante do que essa avaliação geral é a adequação do temperamento e estilo da pessoa ao modelo da escola.

Ainda bem que existem os conselhos de classe para podermos individualizar um pouco uma relação que não pode ser coletiva – ainda que as instâncias mais elevadas tentem forçar para que se tornem assim.

Publicado em 16 de julho de 2013

Publicado em 16 de julho de 2013

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