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Poluentes emergentes na água: megadesastre ecológico com endossulfan no Rio Paraíba do Sul, em Resende/RJ

José Domingos Pereira Júnior

Bacharel em Ciências Biológicas (UCristo Redentor) e pós-graduado em Análise Ambiental

Milena Rody de Souza

Licenciada em Ciências Biológicas e professora de Saneamento Ambiental (ICT - Volta Redonda)

Any Bernstein

Mestra em Bioquímica, doutora em Biotecnologia e professora da Fundação Cecierj

Este é o segundo estudo de caso selecionado entre os apresentados na disciplina Sustentabilidade no Contexto das Ciências, oferecida pela diretoria de Extensão da Fundação Cecierj em 2013/1; ele reúne dados sobre o derramamento de um inseticida altamente tóxico durante um acidente ocorrido há anos atras no RJ. Outros artigos virão nas próximas semanas. Pelos temas abordados e suas implicações, esses trabalhos podem ser discutidos nas aulas de disciplinas como Biologia, Ciências, Química, Educação Ambiental, entre outras, além de servir como sugestão para realização de trabalhos da turma em seu próprio meio ambiente.

Acidentes ambientais inesperados e indesejados têm ocorrido em todo território brasileiro, mas na Região Sudeste, devido a grande concentração de centros industriais, as estatísticas superam às outras regiões. Dependendo do caso as consequências desses eventos podem ser observadas em curto, médio e longo prazo, com impactos causados ao meio ambiente que influenciam profundamente a vida da população e o equilíbrio dos ecossistemas.

Durante muitas décadas, a análise de poluentes ambientais se concentrou nos poluentes orgânicos persistentes (POP), como os organoclorados. Entretanto, recentemente outras classes de contaminantes orgânicos têm despertado atenção da comunidade científica, devido aos impactos que causam ao meio ambiente e à saúde humana. Dentre eles destacam-se os poluentes orgânicos emergentes (POE), ou seja, qualquer composto químico presente numa variedade de produtos comerciais como medicamentos, produtos de uso veterinário, embalagens de alimentos, produtos de higiene, agrotóxicos etc. lançados diretamente nos corpos d'água ou na rede de esgotos.

Ao contrário dos POP, a entrada contínua desses compostos no meio ambiente – como efluentes de processos industriais, descarte de produtos comerciais ou por sua excreção na forma não totalmente metabolizada Ӣ causa efeitos negativos ao ecossistema. Pedroso (2007) define poluente emergente como aquele recém-identificado (ou anteriormente não reconhecido), aquele que não necessita persistir no meio ambiente para causar efeitos negativos, visto que suas altas taxas de transformação e remoção são compensadas pelas suas contínuas introduções no meio ambiente.

Em sua maioria, esses compostos não são degradados pelos métodos convencionais de tratamento (processos biológicos); sendo assim, mesmo após passagem pelas estações de tratamento, continuam livres no meio, podendo atingir as águas para abastecimento humano. Como risco potencial à saúde humana e ao meio ambiente, pode-se citar a disfunção no sistema endócrino e reprodutivo de seres humanos e dos animais, abortos espontâneos, distúrbios metabólicos e incidência de neoplasias malignas, além da indução de bactérias mais resistentes.

Segundo Pádua et al (2009), da segunda metade do século XIX à primeira metade do século XX o tratamento da água teve como objetivo central a clarificação e a remoção de organismos patogênicos, em torno do que foram se desenvolvendo as técnicas de coagulação, floculação, decantação e desinfecção. Porém, principalmente a partir dos anos 1960 e 1970, o desenvolvimento agrícola e industrial impôs intensa produção e uso de novas substâncias químicas, dentre as quais os agrotóxicos, fármacos e hormônios sintéticos, implicando necessidade de desenvolvimento e emprego de técnicas de tratamento mais específicas e/ou complexas.

Dentre as substâncias que, se descartadas incorretamente, podem constituir poluentes emergentes temos os defensivos agrícolas organoclorados, capazes de ser transportados por grandes distâncias pelo vento, pela água e outros meios, podendo acumular-se na cadeia alimentar, passando de plantas para animais. Os compostos organoclorados sofrem o processo de biomagnificação por meio da cadeia alimentar, e os predadores do topo da cadeia tornam-se mais susceptíveis à contaminação (Pádua et al, 2009). Quanto mais clorado, maior a lipossolubilidade, mais lenta mobilização na água e maior acumulo no tecido adiposo humano.

Uma pesquisa realizada pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) em 12 países da América Latina e Caribe mostrou que o envenenamento por produtos químicos, principalmente o chumbo e os pesticidas, representa 15% de todas as doenças profissionais notificadas. Esse índice parece pouco, entretanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que apenas 1/6 dos acidentes é oficialmente registrado e que 70% dos casos de intoxicação ocorrem em países do terceiro mundo; os inseticidas organofosforados são os responsáveis por 70% das intoxicações agudas. A ação das substâncias químicas no organismo humano pode ser lenta e demorar anos para se manifestar. O uso de agrotóxicos tem causado diversas vítimas fatais, além de abortos, fetos com má-formação, suicídios, cânceres, dermatoses e outras doenças. Segundo a OMS, há 20.000 óbitos/ano em consequência da manipulação, inalação e consumo indireto de pesticidas nos países em desenvolvimento, como o Brasil, que é um dos cinco maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Segundo Silva (2004), o Brasil possui longa tradição agrícola e, como tal, apresenta alto teor de pesticidas organoclorados no solo.

Endossulfan

O Endosulfan é um inseticida utilizado para o combate a pragas em lavouras de café, algodão, soja, cana-de-açúcar e alguns cítricos. É também um acaricida (contra ácaros) aplicado por meio de pulverizadores costais ou tratorizados. Assim como todos os produtos químicos, o Endosulfan exibe em sua bula e rótulo, os perigos e precauções relacionados à saúde humana e ao seu uso indevido. Dada a sua periculosidade, também pode provocar efeitos negativos em quem o manipula sem a devida proteção. Sua toxidez impõe respeito de um intervalo mínimo de 24 horas para entrada de pessoas nas culturas e áreas tratadas.

É classificado como “altamente perigoso para o meio ambiente” pelo Ibama, uma vez que apresenta elevada toxidez para os organismos aquáticos e pode causar, por período prolongado, efeitos adversos no meio aquático, sobretudo em corpos d´água com pouca capacidade de renovação.

É considerado pelo Ministério da Saúde um agrotóxico de classe I, extremamente tóxico, insolúvel na água e moderadamente solúvel na maioria dos solventes orgânicos; apresenta alto potencial de transporte associado ao sedimento (Menezes & Heller).

O Endosulfan é produzido no Brasil pela Basf e pela Agripec e envasado em Resende pela Servatis Agro e Fine Chemicals, que o distribui para agricultores de todo o país. Esse agrotóxico age sobre o sistema respiratório dos insetos. Contudo, sua ação não se restringe aos invertebrados, provocando a morte também de outros animais. Ele é especialmente tóxico para os peixes, nos quais provoca violentas hemorragias.

Nos seres humanos, atua no sistema nervoso central, pode provocar câncer, infertilidade e nascimento de bebês com más-formações congênitas. Uma pesquisa realizada em apenas 123 domicílios em Kerala, na Índia, uma região afetada pela contaminação por Endosulfan, revelou 49 casos de câncer, 43 casos psiquiátricos, 23 epilépticos, nove com anormalidades congênitas e 23 com retardamento mental. Na mesma região, 170 crianças expostas ao Endosulfan foram comparadas com 92 não expostas e encontrou-se grande diferença entre os grupos, incluindo pobre desempenho acadêmico, elevada predominância de abnormalidades congênitas, dificuldades de aprendizado, atraso na puberdade dos meninos e alto nível de desordens menstruais nas meninas. E isso apenas com o uso 'normal' do pesticida, ou seja, pulverização aérea de plantações.

A periculosidade do Endosulfan é conhecida em todo o mundo. Esse produto foi banido no Camboja, Filipinas e na União Europeia, e atualmente há uma campanha mundial pelo seu banimento nos demais países, lutando pela substituição do produto por alternativas menos agressivas. Ademais, o Convênio de Estocolmo sobre Contaminantes Orgânicos Persistentes (COPs) estuda sua proibição em todos os países que fazem parte desse acordo internacional (RAP-AL, on line).

Esse agrotóxico está proibido pela Anvisa desde 2010, e o Brasil já tem uma série de produtos que servem como substitutos e seu banimento total está previsto para 2013. Essa decisão foi tomada no dia 14 de julho de 2010 pela comissão formada pelo Ibama, Ministério da Agricultura (Mapa) e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)

O desastre ecológico

O Rio Paraíba do Sul nasce na Serra da Bocaina, no Estado de São Paulo, percorrendo 1.120km até chegar à sua foz em Atafona, no Norte Fluminense. Possui uma bacia que é considerada, em termos de superfície, uma das três maiores bacias hidrográficas secundárias do Brasil, estendendo-se pelos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, abrangendo uma área de 57.000km2 aproximadamente. No Estado do Rio de Janeiro, possui uma extensão que ocupa quase a metade do território, 500km, e percorre 37 municípios.

Para essa população, o rio apresenta uma importância estratégica, pois é a única fonte de água para mais de 12 milhões de pessoas, incluindo 85% dos habitantes da Região Metropolitana, que são beneficiados pela captação direta do Rio Guandu que recebe o desvio das águas do Rio Paraíba para aproveitamento hidrelétrico.

O trecho fluminense do rio apresenta diversas indústrias; sua região mais crítica se localiza entre os municípios de Resende, Barra Mansa e Volta Redonda, onde se encontram indústrias químicas, alimentícias e siderúrgicas, sujeitando a bacia do Rio Paraíba do Sul a acidentes por despejo de dejetos. Uma das mais recentes agressões ao Rio Paraíba do Sul ocorreu em 18 de novembro de 2008, quando um caminhão-tanque a serviço da Servatis Agro e Fine Chemicals teria despejado cerca de oito mil litros do agrotóxico Endosulfan nas águas do Rio Paraitinga, na altura de Resende, provocando a morte de milhares de toneladas de peixes, deixando mais de 700.000 pessoas sem abastecimento de água e mais de 20.000 pescadores sem poder trabalhar.

O acidente ocorreu motivado pelo rompimento de um mangote durante a operação de descarregamento do Endosulfan para o tanque de estocagem do produto. Conforme relatado, o sistema de proteção, constituído por um dique de contenção, encontrava-se sobrecarregado pela água de chuva e não teve capacidade para conter o material derramado. Além disso, o dreno do tanque de contenção encontrava-se parcialmente aberto, por falhas na operação, e a mangueira que o conectava ao terminal da fábrica teria se soltado; tal válvula fazia o despejo de água da chuva no sistema pluvial. Naquele dia, ao invés de despejar água, a válvula defeituosa permitiu o despejo do agrotóxico e o afluxo do Endosulfan para as águas do Rio Pirapetinga (em Resende), afluente do Paraíba do Sul, que é a única fonte de água para 37 municípios do Estado do Rio de Janeiro. O acidente interrompeu o abastecimento em seis cidades do Médio Paraíba e a transposição das águas do Paraíba do Sul para o Guandu. A maré tóxica percorreu 400km até a foz do Paraíba do Sul, no Norte Fluminense. A mancha tóxica, contaminando as águas, colocou em risco em torno de 12 milhões de pessoas. Em cidades como Campos, Cambuci, Itaocara, Volta Redonda, Barra Mansa, Porto Real, Barra do Piraí, Pinheiral e Quatis o abastecimento de água para a população foi suspenso durante vários dias. Cerca de 74 mil pessoas foram diretamente prejudicadas e oito mil estudantes ficaram sem aulas. Foram proibidos a pesca e o consumo de peixe.

O acidente teve um agravante por ter ocorrido em plena época de piracema, quando a pesca já estava proibida pelo Ibama, por meio da Instrução Normativa no195, de 2 de outubro de 2008, no período de 01 de novembro de 2008 a 28 de fevereiro de 2009 (Brasil, 2008). Em um único dia foram recolhidas cinco toneladas de peixes mortos. Segundo a Feema, levando em conta os danos causados ao Rio Paraíba do Sul, o derrame havia sido bem maior que o estimado inicialmente.

A espuma leitosa formada pela emulsificação de Endosulfan em contato com a água demorou dez dias para ir do ponto do despejo até a foz, entre os municípios de São João da Barra e São Francisco de Itabapoana, e os cardumes encontrados pelo caminho foram quase completamente dizimados. Entre eles, milhares de fêmeas repletas de ovas, prontas para a desova anual. Até mesmo nas praias de São Francisco de Itabapoana foram encontrados milhares de peixes mortos, o que sugere que parte do ecossistema marinho também pode ter sido afetada. Pelo menos 80 espécies teriam sido atingidas pelo acidente.

“Pela quantidade de peixes e animais mortos, pode-se dizer que serão necessários uns dez anos ou mais para que toda essa vida volte ao que era antes. O produto químico Endosulfan, usado na fabricação de inseticidas, é usado pela empresa que fica em Resende. O acidente gerou ainda mais transtornos, pois o serviço de água e esgoto suspendeu a captação de água por uns dias, deixando a população em alerta.

Agora, depois da tristeza de ver milhares de peixes e capivaras mortas, o que resta é recolher o que restou. Desde sábado (22/11) as prefeituras de Volta Redonda e Barra Mansa estão num trabalho ininterrupto de recolhimento dos peixes, que já estavam causando forte mau cheiro.”


Capivara morta, foto tirada pelo professor de Engenharia Ambiental Ricardo Terra, do blog do Roberto Morais

Análises laboratoriais e descontaminação

A detecção de agrotóxicos em água tem sido muito limitada ao atendimento da legislação pertinente no que se refere ao monitoramento dos corpos de água por parte dos responsáveis pela operação dos sistemas de abastecimento. Sua inclusão em outros planos de monitoramento não é comum, principalmente em virtude do custo elevado de detecção e da necessidade de pessoal especializado. Existe uma busca por técnicas de preparo de amostra rápidas e de baixo custo para a determinação desses poluentes emergentes nos recursos hídricos. Segundo Caldas et al (2011), as análises de resíduos de agrotóxicos em água por meio da cromatografia líquida são difíceis de serem executadas, uma vez que esses compostos possuem diferentes pro­priedades físico-químicas e ocorrem em concentrações extremamente baixas na presença de altas concentrações de compostos interferentes.

Prates et al (2011) menciona que a cromatografia gasosa com a utilização do detector por captura de elétrons ou acoplado à espectrometria de massas é relatada como uma técnica bem definida para análise de organoclorados, porém a exatidão e a precisão na análise de pesticidas dependem do preparo da amostra (extração e pré-concentração) e da performance do instrumento. Silva (2010) também menciona a cromatografia gasosa como forma de detectar a presença de resíduos de agrotóxicos na água; para ele, ela se destaca pela gama de detectores que possui permitindo a determinação destes em diversas matrizes, além de geralmente serem mais rápidas, possibilitando quantificar um grande número de agrotóxicos simultaneamente.

Com base nos resultados obtidos por meio das análises laboratoriais, associados aos estudos de dispersão e diluição do poluente, estima-se que o volume derramado tenha atingido aproximada de 8.000 litros de Endosulfan diluído em xileno na proporção de 20%, o que equivale a 1.600 litros de Endosulfan puro.

Para cobrir toda a área afetada pelo acidente, foi executado o monitoramento emergencial ao longo de aproximadamente 400km do Rio Paraíba do Sul, compreendendo os seguintes trechos: Resende-Barra do Pirai (Santa Cecília), Barra do Piraí-Itaocara e Itaocara-São João da Barra (foz).

Com o objetivo de mitigar os impactos do acidente, acelerando o processo de dispersão da pluma de contaminação, foi estabelecida a abertura das comportas da Represa de Funil, localizada em Itatiaia, aumentando a vazão do Rio Paraíba do Sul, a fim de colaborar na diluição do contaminante. Após ser comprovado que as concentrações do Endosulfan encontravam-se abaixo dos limites estabelecidos pela Portaria 518 do Ministério da Saúde, foi liberada a transposição em Santa Cecília, restabelecendo as condições de vazão do Rio Guandu.

O processo de monitoramento intensivo envolveu a coleta de aproximadamente 200 amostras, o que permitiu avaliar os níveis de concentração do Endosulfan nas águas, nos sedimentos e na biota (peixes). As avaliações relativas à contaminação dos sedimentos foram efetuadas com base nas 20 amostras de sedimentos superficiais em áreas mais prováveis de sedimentação no trecho entre Resende e Floriano, imediatamente a jusante do local do acidente. Dessa forma, do total de amostras, apenas cinco revelaram a presença do Endosulfan, todas coletadas nas proximidades do acidente (entre Resende e Porto Real).

A água analisada após o acidente continha 70µg de Endosulfan por litro, em circunstâncias em que o limite máximo permitido para peixes é de apenas 0,2µg/L, enquanto para os seres humanos é de 20µg/L. Isso explicava a mortandade de peixes.

Dois dias após o ocorrido, as comportas da Represa do Funil foram abertas para ajudar na diluição do Endosulfan. Foi elaborado um programa de monitoramento intensivo com base nos pontos de captação e das estações do monitoramento sistemático do Inea, o que permitiu subsidiar a tomada de decisão quanto ao restabelecimento do abastecimento nas cidades afetadas.

Dias depois, a Feema informou à população que o nível de resíduos na água no interior do Rio de Janeiro era aceitável e que se podia consumir sem prejuízo para a saúde. O Inea interditou a sede da Servatis, e a empresa foi multada em R$ 33 milhões pela Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca). Os peixes mortos coletados foram encaminhados para a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e incinerados.

No entanto, investigações posteriores alertaram sobre maiores consequências do derramamento, que alguns qualificam como um “megadesastre ecológico”.

Discussão

Apesar de sua importância estratégica para a manutenção das condições de vida, o Rio Paraíba do Sul tem sofrido com a poluição provocada pela expansão demográfica e consequente despejo de esgoto residencial sem tratamento, além dos efluentes industriais, o que tem se refletido na qualidade de suas águas. Além disso, o rio sofre com acidentes em sua bacia. O Inea definiu o vazamento de Endosulfan das dependências da Servatis como o pior acidente da história do Rio Paraíba do Sul. Foi um acidente extremamente grave. Várias matrizes de espécies de peixe terão simplesmente que ser reintroduzidas no rio. Houve uma ruptura monstruosa na ictiofauna; é preciso ação para que as espécies não sejam extintas, o que pode ser feito por meio do repeixamento, com manejo das espécies nativas. Além disso, milhares de pessoas foram afetadas, pela falta d’água e pela proibição da pesca e consumo de peixes.

A decisão de combater o uso do inseticida Endosulfan na agricultura traz consigo o desafio de encontrar substitutos que sejam menos tóxicos, dada a atual situação de prevalência dos pesticidas químicos. Incertezas quanto aos resultados de métodos isentos de produtos químicos dificultam a agricultura totalmente sem pesticidas nas próximas décadas. No entanto, atualmente várias práticas e métodos permitem controlar pragas e doenças sem o uso de produtos tóxicos: o uso de variedades de plantas resistentes a pragas; a rotação de cultura; a distribuição de resíduos de colheitas; a adubação adequada e outras boas práticas agrícolas. Os principais métodos recomendados são: utilização de inimigos naturais das pragas (controle biológico), controle físico (calor, frio e umidade) e uso de armadilhas e barreiras.

O problema da contaminação por organoclorados tem se agravado e adquirido proporções dramáticas, tanto pela sua intensificação quanto pela sua extensão geográfica. Como os compostos organoclorados são muito lipossolúveis e se acumulam nas gorduras dos organismos, eles percorrem rapidamente a cadeia alimentar, com resultados desastrosos para várias espécies, incluindo o homem, que ocupa o topo dessa cadeia (Flores et al, 2004).

Sabendo-se que o Endosulfan é um produto altamente tóxico, ultrapassado, cujo emprego seguro não pode ser garantido e que é um produto químico persistente, que bioacumula em organismos expostos, seria lógico que as autoridades estaduais banissem imediatamente a produção, venda e aplicação do Endosulfan e outros produtos agrotóxicos de natureza similar.

A discussão do problema não passa somente da tragédia em seu ápice, mas sim durante um longo tempo e se resíduos de Endosulfan não continuaram a chegar às águas e se existe e são aplicadas formas de ser detectado o poluente emergente na água. Cabe às autoridades responsáveis punir e multar a empresa responsável pelo acidente e reverter o valor obtido no estudo e emprego de novos métodos que controlem as pragas na agricultura sem afetar a qualidade de vida dos seres humanos e das espécies que não se deseja atingir.

Embora no caso abordado o abastecimento de água tenha sido cortado para evitar a contaminação da população naquele momento, fica o questionamento sobre a real situação depois de passada a fase mais crítica. No caso estudado, a contaminação resultou em grande mortandade de peixes e outros animais que entraram em contato com a água; dentre outras adversidades, a contaminação pode causar problemas neurológicos, dor de cabeça, irritação na pele, vertigem, irritação nos olhos e no trato respiratório, além de problemas no fígado e nos rins (Fiperj, on line).

Conclusão

Os poluentes emergentes estão cada vez mais presentes no nosso dia a dia, apesar de somente em acidentes de grande repercussão, como o mencionado no texto, ganharem destaque devido ao seu alto potencial de destruição. Contudo, a persistência e a disseminação desses compostos pelo ambiente, mesmo em menor escala e de maneira mais discreta, também causam diversos danos às mais variadas formas de vida. Medidas cautelares e urgentes para a preservação da vida estão sendo proteladas ou negligenciadas no planejamento urbano.

Embora exista metodologia capaz de identificar contaminantes emergentes, o processo nem sempre é empregado devido à sofisticação técnica. A análise desses poluentes nas águas nas estações de tratamento devera ser realizada pelos prestadores de serviço de abastecimento de água e laboratórios de saúde pública no país de maneira rotineira e em larga escala para que a população possa consumir uma água realmente potável e segura, garantido a todos uma vida saudável e um ambiente sustentável.

A avaliação de contaminantes emergentes nas águas, por meio de analises eficientes, permitirá que a população tenha realmente acesso a uma água potável livre de contaminantes emergentes. A legislação que controla esses contaminantes também deve ser revista, de forma a garantir a proteção dos ecossistemas.

Cabe a nós, professores, contribuir com a disseminação do saber, do respeito ao meio ambiente, do zelo pelos recursos finitos do planeta, que são os objetivos a serem alcançados com Educação Ambiental. Somos parte do processo de conscientização de agricultores e produtores rurais quanto ao uso de agrotóxicos, principalmente da população jovem, para que assim eles adotem medidas mais seguras em futuro próximo.

Referências

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Publicado em 23 de julho de 2013.

Publicado em 23 de julho de 2013

Como citar este artigo (ABNT)

PEREIRA JÚNIOR, José Domingos; SOUZA, Milena Rody de; BERNSTEIN, Any. Poluentes emergentes na água: megadesastre ecológico com endossulfan no Rio Paraíba do Sul, em Resende/RJ. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 13, nº 27, 23 de julho de 2013. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/13/27/poluentes-emergentes-na-agua-megadesastre-ecologico-com-endossulfan-no-rio-paraiba-do-sul-em-resenderj

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