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A busca por uma matriz energética sustentável por meio do biodiesel de algas: características, implicações e perspectivas
Bárbara de Fátima Rodrigues Silva
Licenciada em Ciências Biológicas
Pamela Cardoso Vilela
Bacharel em Geologia
Any Bernstein
Doutora em Biotecnologia, Professora da Fundação CECIERJ
Este artigo foi um dos selecionados no curso Sustentabilidade no Contexto das Ciências, oferecido pela Diretoria de Extensão da Fundação Cecierj. Refere-se à produção de biodiesel a partir de microalgas, uma fonte alternativa de energia limpa; consome CO2 atmosférico pela fotossíntese, com a vantagem de não necessitar ocupar vastas extensões de terra para sua produção.
A energia limpa
Atualmente é difícil pensar em eficiência energética sem associá-la à sustentabilidade; a palavra de ordem global é atingir metas de redução de consumo em recursos não renováveis sem contudo afetar o desenvolvimento econômico e social (Galindro, 2012). As questões energéticas se tornaram alvo das preocupações entre as nações, principalmente após a crise do petróleo de 1970, que gerou instabilidade política e econômica generalizada (Reis, 2011; Azeredo, 2012). Nas décadas de 1980 e 1990, a percepção quanto à finitude dos combustíveis fósseis, a alta dos preços do petróleo e os efeitos nocivos causados pelos gases emitidos pelo homem, apontados por pesquisas científicas, fortaleceram os estudos em busca de alternativas de energia sustentáveis, culminando no alerta dado à comunidade internacional por meio da Convenção sobre Mudança do Clima (Demirbars, 2010; Ministério da Ciência e Tecnologia, 2012; Souza et al, 2012).
Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), nessa convenção ficou acordado, apesar da resistência de alguns países desenvolvidos, que as mudanças basear-se-iam na responsabilidade comum, mas diferenciada: os países desenvolvidos deveriam ter os maiores compromissos, por serem os principais emissores de gases e terem a maior capacidade econômica de arcar com os custos da redução das emissões (Ipam, 2013). Passou-se a buscar fontes de energia alternativas que fossem eficientes, estáveis e confiáveis.
Vale aqui ressaltar que, segundo pesquisa realizada pelo órgão norte-americano Renewable Energy Policy Network for the 21st Century (REN21) publicada na revista Inovação Unicamp (jun. 2013), em 2012 os países desenvolvidos investiram em energias e combustíveis renováveis aproximadamente US$ 132 bilhões, enquanto os países em desenvolvimento investiram US$ 112 bilhões. Conclui-se, assim, que, em se tratando de investimento em energias alternativas, esses países podem ser considerados em nível de igualdade.
A economia mundial ainda hoje é sustentada pelos mercados de combustíveis fósseis (petróleo, gás natural, carvão etc.). Entretanto, em função das preocupações quanto aos passivos ambientais gerados em sua produção e do seu possível esgotamento em longo prazo, há um deslocamento de parte dos investimentos para o desenvolvimento de combustíveis alternativos, limpos ou renováveis.
Caracterização dos biocombustíveis
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, os biocombustíveis são definidos como
Qualquer combustível originado de espécies vegetais – isto é, que tem origem biológica, desde que não tenha passado por processo de fossilização. De acordo com a definição técnica da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, biocombustível é todo combustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão interna ou, conforme regulamento, para outro tipo de geração de energia que possa substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil (MMA, 2013).
Historicamente, os principais produtos a serem utilizados como matérias-primas para o desenvolvimento de biocombustíveis, chamados de “primeira geração”, eram aqueles derivados de culturas alimentares. Eticamente, o uso desse tipo de biomassa apresenta aspectos negativos, pois há utilização de produtos de consumo humano para produção de combustível. Então foram desenvolvidos os biocombustíveis de “segunda geração”, utilizando matéria-prima lignocelulósica; apesar de oferecerem vantagens econômicas, o espaço de plantio e os recursos empregados em sua produção ainda poderiam ser utilizados para produção de alimentos (Souza et al, 2012; Mota; Monteiro, 2013). Os biocombustíveis de “terceira geração”, nos quais se incluem algas e microalgas, não usam matéria-prima que sejam alimentos de uso humano; portanto, constituem alternativa promissora para substituir os combustíveis fósseis (Souza et al, 2012; Mota; Monteiro, 2013).
Dentre os combustíveis de terceira geração, o combustível feito por microalgas é promissor pelo grande potencial de produzir matéria graxa em grande quantidade e em áreas pequenas, a não necessidade de solo fértil, podendo utilizar terras marginais ou semiáridas (desde que haja alguma fonte de água) e não ocupa demasiado espaço de produção.
Nessa corrida pelo biocombustível mais eficiente e com o preço mais acessível, o Brasil larga na frente, com a primeira indústria de combustível feito de algas no país, em Pernambuco; ela recebeu, no último trimestre de 2013, a primeira planta de uma indústria de algas, conforme relatado na reportagem do Portal G1.
Neste artigo pretendemos analisar de forma crítica a produção de biodiesel a partir de algas, suas principais características, impactos na redução das emissões de gases no ambiente e as perspectivas para o Brasil.
O etanol é um biocombustível limpo?
O Brasil tem produzido em grande escala outro combustível na matriz energética sustentável: o etanol. O crescimento da produção de etanol aconteceu a partir de 1975, com a criação do Pró-Álcool, que utiliza como matéria-prima a cana-de-açúcar e tem como maior competidor nesse ramo os Estados Unidos, que produzem álcool a partir do milho (Ipea, 2009).
O etanol é um biocombustível obtido bioquimicamente, pela fermentação de biomassas sacaríneas ou após a hidrólise (veja Figura 1) de matérias-primas amiláceas e celulósicas (gaseificação da biomassa, veja Figura 2). O etanol, como combustível alternativo, apresenta vantagens em relação ao diesel: redução de emissão de partículas de motores, alta octanagem, maior velocidade de ignição e menor tempo de queima, entre outras características que o tornam muito atrativo (Souza et al, 2012).
Figura 1: Reação de hidrólise enzimática da sacarose, com a transformação dos açúcares simples em glicose e frutose (Souza et al, 2012).
Figura 2: Reação da conversão da glicose e da frutose em etanol por enzimas presentes nas leveduras no fermentador, com a liberação de gás carbônico (Souza et al, 2012).
No Brasil, o Pró-Álcool se propôs a substituir por álcool cerca de 30% da gasolina, assim como o diesel poderia ser substituído por óleos vegetais processados. Porém, com a queda do preço do petróleo no final da década de 1980, alguns estudos de fontes alternativas foram descontinuados. A partir do meio da década de 1990, novamente governos e sociedade voltaram a se preocupar com a segurança energética e as questões ambientais. Finalmente, com o aumento dos preços do petróleo em 2008, os investimentos em biocombustíveis se tornaram atrativos (Azeredo, 2012).
O etanol no Brasil é produzido majoritariamente de cana-de-açúcar; dados de 2008 indicam que 1,76% do PIB agrícola nacional foi desse setor. No entanto, o álcool não cumpre o esperado de uma energia no tocante a ser fonte de energia estável e confiável: a produção do etanol depende da disponibilidade de cana-de-açúcar, que está ligada ao consumo de açúcar no mundo. Logo, o aumento ou diminuição da demanda internacional por açúcar interfere na produção de etanol, como aconteceu em 2009. Esse é um dos principais motivos para buscar-se uma matéria-prima que não esteja ligada ao mercado internacional (Ipea, 2009). Além disso, Cardoso et al (2008) questionam a divulgação pela mídia de o etanol ser “combustível limpo”, pois produz vinhoto, que causa inúmeros impactos ambientais.
Biodiesel
Na vasta gama de potenciais matérias-primas para os biocombustíveis, merecem destaque os derivados de óleo e gorduras. Nesse contexto, o Brasil apresenta grande perspectiva de atuar competitivamente, usando óleos de sementes como dendê, mamona e soja, que podem substituir o diesel; são conhecidos como biodiesel.
De acordo com Defanti et al (2012), o consumo mundial de diesel está por volta de 684 milhões de toneladas, enquanto o biodiesel representa 0,035%, correspondendo a 2,4 milhões de toneladas. Segundo a ANP, em reportagem publicada na revista Biodieselbr, a produção de biodiesel no Brasil é de aproximadamente 176 milhões de litros anuais e deve aumentar nos próximos anos, com a construção de outras usinas especializadas.
Nesse cenário, o Brasil aparece como grande produtor de biodiesel e etanol. A sinergia entre o complexo oleaginoso e o setor de álcool combustível traz a necessidade do aumento da produção de álcool. A produção de biodiesel consome álcool etílico, na transesterificação das gorduras. Consequentemente, o projeto de biodiesel estimula também o desenvolvimento do setor sucroalcooleiro, gerando novos investimentos, emprego e renda. A biodiversidade encontrada no país e a capacidade que todo o território nacional apresenta para o cultivo agrícola são fatores que tornam a indústria brasileira competitiva na cadeia de biodiesel. Buscam-se alternativas de novas matérias-primas que diminuam a dependência atual de soja e sebo bovino no Brasil, de soja nos EUA e de canola na Europa. Encontramos no país diversas espécies vegetais que podem ser utilizadas na produção do biodiesel, como a soja, o girassol, o amendoim e o pinhão manso, dentre outras. O grande destaque que se é dado a este produto se deve ao desenvolvimento do Programa Nacional de Produção e Usos do Biodiesel (PNPB), lançado em 2004, pelo governo federal, resultando na produção de cerca de seis milhões de metros cúbicos de biodiesel. Um marco importante foi a adição de biodiesel ao diesel derivado de petróleo:
Art. 2o Fica introduzido o biodiesel na matriz energética brasileira, sendo fixado em 5% (cinco por cento), em volume, o percentual mínimo obrigatório de adição de biodiesel ao óleo diesel comercializado ao consumidor final, em qualquer parte do território nacional (Brasil, 2005).
Em janeiro de 2008, entrou em vigor a mistura obrigatória de 2%. Esse percentual foi ampliado sucessivamente até atingir 5% em janeiro de 2010, antecipando em três anos a meta estabelecida pela Lei nº 11.097/05 (Portal Brasil).
O Art. 2º da Resolução ANP nº 14/12 define biodiesel como “combustível composto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeia longa produzido a partir da transesterificação (Figura 3) e/ou esterificação de matérias graxas de gorduras de origem vegetal ou animal e que atenda à especificação contida no Regulamento Técnico nº 4/2012 (ANP, 2012).
Figura 3: Reação de transesterificação de um triglicerídeo (Defanti et al, 2010).
O processo de transesterificação desses alcoóis é feito com a utilização de etanol e do metanol (Figura 3). O metanol é o mais utilizado por ser mais reativo; entretanto, o etanol é menos tóxico, renovável e produz biodiesel com mais cetonas e lubricidade. A desvantagem é que promove maior dispersão da glicerina, dificultando sua separação (Cardoso et al, 2011; Novaes Junior et al, 2013). A extração é simples, podendo ser feita por esmagamento ou ultrassom usando solvente, de forma fluida supercrítica, enzimática, por choque osmótico e extração ultrassônica assistida.
As algas como matéria-prima para produção de biodiesel
Uma das razões para as algas serem cada vez mais exploradas como matéria-prima para produção de biodiesel é o elevado rendimento: chega a ter 30 vezes mais crescimento por hectare do que as culturas terrestres. No caso das microalgas, o crescimento é acelerado, e o teor de óleo chega a 80% e sob certas condições a 90%; se em condições ótimas, podem chegar a produzir até 137.000 litros por hectare por ano (Antunes e Silva, 2010; Cardoso et al, 2012). Além disto, a utilização de microalgas mostra-se eficiente para captura de CO2, objetivando a diminuição do efeito estufa, além de poderem ser usadas na remoção de nitrogênio e fósforo de efluentes, pois parte de sua nutrição depende desses nutrientes (Souza et al, 2012).
Figura 4: Cultivo de N. oculata realizado em cilindros de 120L, com condições ambientais controladas para maior rendimento na produção de biomassa (Galindro, 2012).
A literatura cita algumas microalgas que se destacam na produção de bioetanol por apresentarem altas concentrações de amido e glicogênio em sua composição e uma assimilação eficiente da celulose: Chlorella, Dunaliella, Chlamydomonas, Scenedesmus e Spirulina (Souza et al, 2012). Antes da fermentação, os lipídios precisam ser removidos por solvente ou mecanicamente, visando tornar disponíveis os carboidratos na membrana celular e no meio intracelular para a fermentação, para maior rendimento (Harun et al, 2009).
Entretanto, a produção de etanol por microalgas continua sendo um processo caro, com tecnologia em desenvolvimento, e sua obtenção se dá por meio do mesmo processo de obtenção do etanol a partir de biomassas amiláceas e celulósicas (Cardoso et al, 2011). Porém, em comparação com a produção por macroalgas, que necessitam de maior espaço para cultivo e de difícil manutenção dos parâmetros físico-químicos, a utilização de microalgas parece ser o caminho mais econômico (Antunes e Silva, 2010; Cardoso et al, 2011).
Vantagens da produção de biodiesel e de bioetanol: algas como matéria-prima
Analisando a produção de biodiesel no Brasil, podemos observar que a produção brasileira se restringe a algumas matérias-primas, como o óleo de soja, que representa 72,36% da produção nacional, a gordura bovina, que corresponde a 20,68% e o óleo de algodão, com 2,83%. Produzimos também biodiesel a partir de outros materiais graxos, que representam somente 2,81% desse total, além da gordura de frango, da de porco e do óleo de fritura, que contribuem com 1,33% (ANP, 2013).
Segundo a revista Biodieselbr (2007), a soja se estabeleceu de forma preponderante na economia nacional, mesmo com o país apresentando óleos vegetais com maior capacidade de produção, como o dendê, que chega a apresentar uma produção de óleo dez vezes maior que a soja. De acordo com a revista, a soja obteve esse sucesso na produção “porque não se produz soja para obter o óleo”; o plantio seria consequência do aumento da pecuária, da avicultura e da suinocultura, pois o maior aporte desses alimentos para consumo pelas classes baixas causou aumento expressivo na produção de farelo proteico, que é utilizado na produção da ração que alimenta esses animais. De acordo com Mendes e Costa (2009), as críticas a essa produção são devidas à baixa produção de óleo derivado da soja em relação à área plantada.
Tanto o mercado do biodiesel derivado da soja quanto o do etanol derivado da cana possuem uma semelhança marcante que poderá interferir futuramente: ambas são matérias-primas alimentícias. O etanol hoje já sofre com a competição de preços com o mercado exterior, com a perda de matéria-prima para a exportação e com a falta de matéria-prima local; considerando esse ponto de vista, o biodiesel poderá seguir o mesmo caminho (Ipea, 2009).
O Brasil hoje aposta no mercado de algas, que se resume basicamente em prensar o material, fazer alterações químicas e misturá-lo; essa matéria-prima apresenta diversas vantagens: as algas podem contribuir para a redução do dióxido de carbono na atmosfera, utilizando somente água e luz solar, pois realizam fotossíntese como as árvores, transformando CO2 em glicose e oxigênio; a produção de biodiesel por meio de algas tem baixo custo; o processo é relativamente simples, se comparado à produção com soja; as algas têm grande capacidade de reprodução, não necessitam de muitos recursos, podendo ser cultivadas, por exemplo, em água salobra; uma das principais vantagens é o grande potencial energético (Defanti et al, 2010).
As algas são capazes de crescer e se reproduzir em diversos ambientes, como na presença de nitrogênio e de grande luminosidade; essa luminosidade permite que algumas espécies apresentem a capacidade de realizar fotossíntese, como as fotoautotróficas e as mixotróficas (Azeredo, 2012). Esse é um dos fatores que incentivou a primeira indústria do Brasil a produzir biocombustível a partir de algas, em Pernambuco, que pretende produzir biodiesel e bioetanol.
Diferentemente das algas, a soja, a matéria-prima mais utilizada no Brasil para produzir biodiesel, tem restrições para o seu plantio. A disponibilidade de água é fator determinante para a produção de soja, principalmente nos períodos de germinação-emergência e floração-enchimento de grãos. A necessidade de água aumenta conforme seu crescimento. Além do fator hídrico, outro fator importante para o desenvolvimento da soja é o térmico. A temperatura do ar ideal para o seu desenvolvimento é de 30oC; do solo é de 20ºC; se exposta a temperaturas mais baixas, o crescimento pode ser menor ou até nulo; com temperaturas acima desses valores podem ocorrer distúrbios na floração e diminuição da capacidade de retenção de vagens. A temperatura, aliada à pequena disponibilidade de água, pode causar maturação acelerada e predispõe a semente a danos mecânicos durante a colheita; a temperatura incorreta, aliada a mudanças de umidade, pode provocar atraso na data de colheita, bem como haste verde e retenção foliar (Embrapa, 2004).
Além desses fatores restritivos, a soja é considerada uma planta fotoperiódica; logo, cada cultivar possui um fotoperíodo crítico, fazendo com que a adaptatividade de cada cultivar varie com pequenas mudanças de direção, não havendo assim um padrão a ser seguido (Embrapa, 2004).
Como mostram Antunes e Silva (2010), é possível, e muito viável, a produção de etanol após a extração lipídica para a produção do biodiesel, utilizando o hidrato de carbono restante no bolo vegetal como substrato para a fermentação (Figura 4). O CO2 produzido na reação é empregado para alimentar a produção de nova biomassa, criando um sistema fechado e evitando a poluição atmosférica no processo (Antunes e Silva, 2010).
Figura 5: Produção combinada de biodiesel e bioetanol (Antunes e Silva, 2010).
Tanto a soja quanto a cana, com a ampliação de sua produção devido à demanda do mercado, acarretarão a alocação exclusiva de grandes extensões de terra para produção de combustível, algo que seria inviável se pensar na produção, também em ascensão, dos alimentos. A utilização das algas em substituição aos biocombustíveis de primeira geração poderia diminuir a disputa dos combustíveis com os alimentos na busca por terras aráveis para a sua produção (Antunes e Silva, 2010).
Outra vantagem das microalgas é o seu crescimento acelerado: algumas delas completam seu ciclo de crescimento em apenas dois dias (Antunes e Silva, 2010), enquanto a soja brasileira varia entre 70 e 160 dias (Biodieselbr).
Percebemos que as algas apresentam inúmeras vantagens, podendo assim se estabelecer na nossa matriz energética; todavia, a que mais se destaca é a sua capacidade de produção, que pode chegar a gerar até 30 vezes mais óleo por hectare do que a soja; além de ter grande produção de óleo, em ótimas condições podem produzir 137.000 litros de óleo por hectare anualmente (Antunes e Silva, 2010).
Perspectivas da produção brasileira de biocombustíveis a partir de algas
De acordo com Azeredo (2012), o Brasil é um dos maiores produtores de etanol e biodiesel e tem utilizado vegetais oleaginosos, como a soja, e ricos em carboidrato, como a cana-de-açúcar, para produzi-los. Esses biocombustíveis surgiram como opção aos combustíveis fosseis devido às questões ambientais, que impossibitavam a contínua utilização destes. Na busca de um combustível mais completo, o país centraliza suas atenções em produtos que substituam os vegetais superiores, que na maioria das vezes necessitam de grandes extensões de terra para seu plantio e não apresentam a eficiência necessária para suprir as necessidades de consumo da população. As politicas públicas nacionais têm permitido que o Brasil inicie intensa pesquisa pelo biocombustível derivado das algas.
O Brasil ainda encontra alguns obstáculos para que o biocombustível de algas alcance lugar de destaque entre as matérias-primas utilizadas ultimamente. Azeredo (2012) e Antunes e Silva (2010) acreditam que um dos pontos fracos desse combustível seja o custo de produção elevado, quando comparado ao produto mais utilizado atualmente no mercado. Assim, um dos maiores desafios encontrados pelo Brasil é reduzir os custos para tornar viável economicamente as microalgas e poder competir com outras matérias-primas (Antunes e Silva, 2010; Azeredo, 2012).
Um obstáculo já contornado foi o perigo existente no cultivo das algas em lagoas abertas, pois necessita de temperatura exata para que ocorra o crescimento correto, bombeamento de dióxido de carbono com frequência na lagoa, além de esse tipo de cultivo propiciar a contaminação por bactérias e outros agentes externos (Defanti et al, 2012). O Brasil venceu esse obstáculo no plano de instalação da primeira indústria de biocombustível de algas, que pretende cultivá-las em módulos fechados, evitando assim os efeitos indesejáveis no cultivo com algas expostas.
Figura 6: O sistema de iluminação da fazenda de algas concentra a luz do sol e a transmite por fibras óticas até reatores fechados onde as algas realizam a fotossíntese (Foto: See Algae Technology).
Outro ponto que ainda carece de pesquisas é o funcionamento desse combustível em carros. Não existem pesquisas que analisem o funcionamento do motor, a eliminação de gases e outros pontos necessários para caracterizarmos a utilização real desse biocombustível (Defanti et al, 2012).
A indústria de algas no Brasil é resultado da parceria entre o grupo JB, do setor sucroalcooleiro, e empresa austríaca SAT – See Algae Technology. Aquele país se destacou por ser o primeiro projeto no mundo de produção, em larga escala, de biocombustíveis derivados de algas; até então, a tecnologia era voltada somente para a área de pesquisa (Exame, 2012). Esse plano de instalação destaca a principal vantagem da utilização das algas: a grande capacidade de produção em pequena área, pois essa indústria terá a capacidade de produzir 1,2 milhão de litros de biodiesel ou 2,2 milhões de litros de etanol utilizando um hectare de algas plantadas (G1, 2012).
O objetivo principal da utilização das algas é promover a substituição dos biocombustíveis utilizados hoje e dos combustíveis fósseis, porém essa empresa brasileira tem objetivos secundários; por exemplo, existe a possibilidade de aproveitar o ácido graxo ômega 3 produzido como resultado do processamento das algas. Esse ácido graxo atualmente tem como principal fonte óleos vegetais e de peixes; logo, a comercialização de ômega 3 a partir das algas diminuiria aquela sobre a pesca.
A previsão é de que indústria comece a operar em 2014 (Exame, 2012); no momento, os organizadores do projeto aguardam a aprovação e a validação do biocombustível derivado de algas pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Figura 7: Mapa com o potencial brasileiro em biodiesel (A). Fonte: Biodieselbr.com. Bioquímicos de algas geneticamente modificadas ajudam a reduzir as emissões de carbono para a atmosfera, que serão produzidos em larga escala em um projeto pioneiro na região do estado de Pernambuco. (B) Fonte: Divulgação/See Algae Technology – G1 Natureza, jul. 2012.
Como lembram Mendes (2009) e Costa (2009), o Brasil não tem um longo histórico quanto à produção e desenvolvimento de biodiesel, porém em pouco tempo alcançou grandes resultados em parte devido à variedade de matérias-primas utilizadas para a produção de biocombustível. Podemos observar esse avanço quando o país alcançou as metas da Lei no 11.097/05 antes do período estipulado; todavia, algumas consequências acompanharam esse acelerado processo, fazendo com que nossa produção fosse muito menor do que a capacidade do nosso campo industrial. Logo, um dos objetivos do mercado brasileiro de combustíveis é aumentar o percentual da mistura dos biocombustíveis que se mostraram eficientes e economicamente viáveis, aumentando assim nossa capacidade de produção. Mas o grande desafio desse mercado que hoje já começa a ser resolvido é a dependência brasileira da soja; uma das opções mais cotadas para substituir esse vegetal, apresentando características que poderiam fazer com que o biodiesel vegetal possa substituir o biodiesel mineral é o biocombustível derivado das algas.
O Brasil, ao buscar novas matérias-primas para produzir energia, tem o objetivo de que o biodiesel e o etanol deixem de ser somente um pequeno complemento ao combustível mineral e se tornem possíveis substitutos, uma vez que os combustíveis fósseis podem cair no desuso ou se extinguir.
Conclusão
A utilização de biocombustíveis desponta como meio harmonioso de transição entre a matriz energética atual, alicerçada nos combustíveis fósseis, e uma matriz energética sustentável. No entanto, com o aumento populacional e o aumento da demanda energética em curto e médio prazo, os combustíveis fósseis ainda são necessários para o suprimento energético mundial. Mas a tendência é a diminuição em longo prazo, com a substituição por produtos sustentáveis, em função da possibilidade de depleção das reservas atuais e da necessidade de conter ou neutralizar as emissões de gases nocivos na atmosfera.
Objetivando a produção de combustíveis ecológicos, é importante que se busquem matérias-primas e processos cada vez mais eficientes, que não afetem a produção de alimentos, além de oferecer alta produtividade. No Brasil, houve grande desenvolvimento em biocombustíveis baseados em vegetais superiores; há que se questionar que, por se tratar de biocombustíveis em geral de primeira e segunda gerações, necessitam de grandes áreas de solo férteis para o seu plantio, comprometendo assim o plantio de alimentos. Além disso, a produção dos combustíveis ecológicos desses vegetais não oferece o retorno energético necessário, sendo assim incapaz de interferir no atual mercado energético. O biodiesel e o etanol produzidos a partir de algas surgem como fonte de energia ilustre nesse cenário.
As algas, como matérias-primas, apresentam características singulares; seu cultivo pode ser feito em áreas hostis de pequeno potencial agrícola, cessando assim a disputa de terras com o plantio de alimentos; esses vegetais ainda são capazes de ser cultivados em água salobra, que normalmente possui aplicabilidade limitada. Além desse fator as algas possuem uma relação entre área cultivada e produção de combustível maior que os outros vegetais em uso hoje. Além desses fatores, elas ainda apresentam outras características apreciáveis, como a simplicidade na produção, a assimilação de dióxido de carbono durante sua fotossíntese, reprodução e crescimento rápidos, capacidade de produzir mais de um tipo de combustível e até o resíduo dessa produção pode ser aproveitado, afinal é rico em ômega 3.
As algas possuem implicações diversas; elas se estabeleceram no tratamento de efluentes e na indústria alimentícia e hoje tentam ganhar espaço no mercado energético mundial. Diversos países já apresentam pesquisas nesse campo, como o Brasil, que, por apresentar condições que propiciam o desenvolvimento desse combustível, como a disponibilidade de terras e a temperatura adequada, além de politicas públicas que estimulam o desenvolvimento de diversos estudos nessa área, chega a 2013 com um plano de instalação e operação de uma indústria de biocombustíveis de algas que traz inúmeras expectativas para os mercados nacional e internacional.
Ainda existem barreiras para que as algas alcancem toda a sua capacidade de produção, e seu custo é ainda elevado defronte aos seus concorrentes, porém a contínua pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias prometem excelentes resultados futuramente. Analisando a cadeia de combustíveis que hoje movimenta o mundo, percebemos que ela necessitava de um personagem novo; as algas tendem a ocupar esse espaço, e o Brasil vem, a passos largos, avançando na busca de uma energia completa, economicamente viável e harmoniosa com o meio ambiente.
Referências
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Publicado em 17 de dezembro de 2013
Publicado em 17 de dezembro de 2013
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