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Brincar e aprender: o lúdico como metodologia de ensino

Eduardo Beltrão de Lucena Córdula

Especialista em Educação, licenciado em Biologia, Pesquisador (UFPB/CE-GEPEA), professor de Educação Básica de Cabedelo-PB

Segundo o Dicionário Aurélio, brincar é “divertir-se infantilmente”; lúdico é “relativo a jogos, brinquedos e divertimentos”; portanto, ao realizar uma atividade lúdica, estamos brincando e aprendendo, com o desenvolvimento do ser, juntamente com a felicidade; são fenômenos que ficarão marcados na essência do alunado (Santos, 2011).

O brincar direcionado para a aprendizagem – ludicidade – pode ser o meio tão almejado pelos educadores na busca da melhoria do ensino em sala de aula; com essa metodologia de formação do alunado, poderemos tanto sensibilizá-los, propiciando o ensino com apreensão, vivência e encantamento, quanto prepará-los para o futuro em sociedade (Sampaio, 2010; Santos, 2011)

Durante o processo de ensino pela ludicidade, temos o envolvimento tanto do professor como dos alunos, de forma mútua. Há uma interação intrínseca que normalmente não acontece pela pedagogia convencional, pois se quebra no momento do brincar para a aprendizagem, todas as formalidades impostas pelo ensino escolar, e ambos – professor e alunos – passam a atuar conjuntamente na construção do processo de aprendizagem. Ao mesmo tempo, os educadores sentem-se realizados e rompem todas as amarras que o sistema educacional pode provocar em suas vidas. Tanto alunos quanto os educadores envolvidos despertam para a afetividade, o encantamento, o aprendizado, estreitando o convívio social e as relações interpessoais (Andreola, 1998; Córdula, 2012b; Sampaio, 2010; Santos, 2011).

Para Sampaio (2010, p. 31), necessitamos, como professores e pesquisadores, encontrar caminhos para transformar a educação, resgatando a humanescência perdida, ou seja, “aprender a condição humana, aprendendo a aprender a ser”, rompendo a formação contemporânea, para buscar meios que atinjam a vida do educando, a partir da sua própria vivência e propiciando sua formação para a vida.

Portanto, o que caracteriza nossa humanidade é o nosso cuidar conosco e com os demais à nossa volta. O lúdico trazido à tona pela vivência do alunado é uma forma de cuidar de suas vidas, encantar o seu ser, já que, para Boff (1999), cuidar significa curar, pois traz amor e amizade para a vida dos envolvidos nesse processo de reconstrução da identidade humana do ser humano. E, ao mesmo tempo que a afetividade, o prazer e a felicidade estão juntos durante este processo, os conhecimentos necessários para o educando são repassados; brincando se aprende e aprendendo se constrói sua identidade como ser humano, como indivíduo histórico-cultural e como cidadão.

A expressão maior da ludicidade são as dinâmicas, que, sendo uma palavra de origem grega (dynamis), tem por significado força, energia e ação, que são a essência das crianças e adolescentes e precisam ser canalizadas para o processo de aprendizagem na escola e, principalmente, na sala de aula; caso contrário dispersão o foco e trarão caos ao ambiente escolar. Além dessa essência já citada, é inato ao educando a criatividade e a curiosidade, que juntas, fazem despertar para o aprender e para a busca do saber – razão pela qual são tão questionadoras do mundo à sua volta (Machado; Nunes, 2012).

Ao propiciar o aprendizado por meio das dinâmicas, os alunos produzem e reproduzem “emoções, possibilitando nomear e organizar um mundo de caos para um mundo de descobertas” (Machado; Nunes, 2012, p. 19), o que permite e facilita o contato direto com o seu universo cognitivo, permitindo um maior aprendizado e a perpetuação mnemônica do saber ao longo do tempo, já que também o lúdico é intencional, direcionado e contextualizado dentro do processo de ensino-aprendizagem do educando.

O tempo de uma aula às vezes é pouco para propiciar o momento lúdico de uma dinâmica, mas, adaptando-se, pode-se desenvolvê-la em duas aulas separadas no mesmo dia ou melhor ainda quando são duas aulas geminadas. Além disso, os educadores da escola podem começar a atividade lúdica, por exemplo, na primeira aula, que é de Ciências, e na aula seguinte, mesmo sendo de outra matéria, mas de forma transdisciplinar, dar continuidade e concluir a atividade.

Dentro das atividades lúdicas, utilizamos também recursos didáticos, o que conecta ludicidade e aprendizado – estimulando o intelecto do público para a apreensão de uma mensagem ou conteúdo (Smole, 1999): artes gráficas (desenho, pintura) para estimular o processo de externalização da vivência do público-alvo (Van Koleck, 1968; Méredieu, 1997); comunicação oral e escrita para desenvolver nos alunos o ato de ler, pois a leitura quebra mitos, desvela suposições e retira a opacidade das mentes quanto a uma realidade imposta e à escrita como produção textual (Freire, 1998); diálogo coletivo, por meio de temas centrais estimularemos o debate de conhecimentos, gerando o diálogo da coletividade envolvida, com base na bagagem ambiental individual dos integrantes (Oliveira, 1998).

Empregaram-se também neste sentido recursos audiovisuais para aumentar a eficiência da mensagem passada ao público-alvo e público envolvido (Polito, 1997), como cartazes, painéis, cartilhas, textos e vídeos educativos que tratem da temática ambiental (Branco, 2003). Estes são recursos que trazem a reflexão e concretizam o aprendizado do aluno.

Höeffel et al (1998) afirmam que os conceitos são cruciais para direcionar e intencionar a atividade de sensibilização e aprendizagem dentro do contexto educativo, devendo estar vinculados em níveis biológico, cultural, social, tecnológico e científico. Além disso, devem ser trabalhados tomando por base os “5 Es”: ecologia, economia, espiritualidade, ética e educação.

Os conceitos são de fundamental importância, sendo levados em consideração os temas transversais: contidos nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) como guia para trabalhar com o público-alvo, sem fugir da ótica educacional (Brasil, 1998): ética e cidadania; pluralidade cultural; meio ambiente; trabalho e consumo. Devem ser considerados também conceitos específicos da temática do meio ambiente, voltados para apreensão da complexa e frágil estrutura ambiental (Dias, 1998): ecologia; sociedade; ambiente urbano e natural; problemas ambientais.

Qualquer atividade em que se tenha motricidade com desenvolvimento psicomotor, gerando aprendizado (cognição) e momentos prazerosos de felicidade junto ao alunado, é uma atividade lúdica. Os jogos e as dinâmicas são um repretório que enriquecem as aulas e contextualizam o processo de ensino.

Temos como exemplo a dinâmica da ecossocialização (Córdula, 2011a), que foi desenvolvida com alunos do Ensino Fundamental II, do 6° ao 9° ano. Para realizar a dinâmica aqui sugerida, realizamos a remoção dos objetos que impedem a locomoção dos participantes no ambiente, deixando um amplo espaço livre. Para cada aluno entregamos uma bola de festa (de látex) vazia, mas com um pedaço de papel em seu interior colocado com antecedência com uma palavra-chave, que pode ser adaptada para qualquer temática. No caso em questão, o tema foi meio ambiente; utilizamos palavras como: reciclagem, lixo, poluição, esgoto, ser humano, natureza, floresta, fauna, flora, consciência etc., pois cada palavra empregada geraria posteriormente um debate com todos os alunos, já que nossa posição nessa dinâmica é de facilitador. Quando os alunos chegaram à sala, formamos um círculo, que representa a união indivisível entre todos, colocando-nos em igualdade. Distribuímos uma bola para cada aluno e cada um a encheu. Colocamos uma música vinculada à temática e pedimos que jogassem os balões para o alto mas não os deixassem tocar o chão. Passados alguns segundos, pedimos que cada aluno segurasse um balão e formasse novamente o circulo. Nesse momento é explicitada a questão da responsabilidade individual por cada balão e coletiva de não tê-los deixados cair, valorizando os alunos pelos seus papéis na atividade. Cada aluno pôde, nesse ponto, estourar o balão que estava segurando e pegar o papel que estava dentro. Foi feita a leitura da palavra e individualmente foram falando o que pensavam sobre ela; os demais poderiam interferir e somar conhecimentos, gerando assim o debate. Fez-se o mesmo com as demais palavras. Ao final, houve um debate com jogo de perguntas e respostas com os alunos, para que internalizassem suas opiniões e seus desejos sobre a temática em questão (meio ambiente).

Quadro 1 – Plano de aula da dinâmica de ecossocialização
Material utilizado Balões de aniversário (de látex) – um para cada participante; aparelho de som, CD com músicas ligadas ao tema, pedaços de papel retangulares com palavras-chave inscritas neles.
Público atendido Alunos da Educação Básica e qualquer público inerente à faixa etária
Objetivo Desenvolver a socialização, o trabalho em grupo, a desinibição e o debate sobre temas diversificados
Temática trabalhada Sociedade, ser humano, convivência, responsabilidade, união, construção do conhecimento
Tema específico Meio ambiente; subtemas: reciclagem, compostagem, reduzir, reaproveitar, natureza, fauna, flora, ação antrópica, poluição, desmatamento, caça predatória, biopirataria, biodiversidade, reflorestamento, esgoto, lixo, agentes patológicos fitossanitários, consciência etc.
Técnica Lúdico-socializadora para desenvolvimento da consciência ambiental
Sugestão Como sugestão, podemos ainda trabalhar ao final a música que foi utilizada, com leitura da letra e o acompanhamento da música, para gerar outros tipos de oficinas: interpretação textual com criação de novo texto (releitura), produção de painéis temáticos e montagem de apresentações teatrais (esquetes)

Fonte: Córdula, 2011a.

Foto 1 – Alunos do 6° ao 9° ano em momento lúdico, na oficina de vivência realizada na Escola Municipal Major Adolfo Pereira Maia, Cabedelo-PB
Foto 1 – Alunos do 6° ao 9° ano em momento lúdico, na oficina de vivência realizada na Escola Municipal Major Adolfo Pereira Maia, Cabedelo-PB

Conclusão

A ludicidade traz à sala de aula uma nova metodologia na condução do processo de ensino-aprendizagem por parte do professor, que interage positivamente com o alunado, o que garante maior apreensão do conteúdo a ser ministrado. Além disso, temos quebra da rotina da sala de aula padronizada em fileiras indianas, em que os alunos, sentados de frente para o professor assimilam o conteúdo ministrado de forma quase tradicional. Portanto, o lúdico na sala de aula é um meio viável para o profissional do magistério contextualizar os conteúdos curriculares, adotando também os temas transversais tão necessários aos atuais paradigmas socioambientais emergentes na sociedade contemporânea.

Referências

ANDREOLA, B. A. Dinâmica de grupo: jogo da vida e didática do futuro. 15ª ed. Petrópolis: Vozes, 1998.

BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela Terra. 16ª ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

BRANCO, S. Educação Ambiental: metodologia e prática de ensino. . Rio de Janeiro: Dunya, 2003.

BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais - terceiro e quarto ciclos: apresentação dos temas transversais. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CÓRDULA, Eduardo B. L. Dinâmica da ecossocialização compartilhada. Educação Ambiental em Ação, Novo Hamburgo, ano IX, n° 35, março-maio, 2011a. Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=978&class=02. Acesso em 14 mar. 2011.

CÓRDULA, Eduardo B. L. Homo sapiens affectus: em busca do futuro da humanidade. Cabedelo: EBLC, 2012.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: princípios e práticas. 5ª ed. São Paulo: Gaia, 1998.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XX Escolar: o minidicionário da língua portuguesa. 4ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler em três artigos que se completam. 36ª ed. São Paulo: Cortez, 1998 (Coleção Questões de Nossa Época: v. 13).

HÖELFFEL, J. L.; VIANA, R. M. & PADUA, S. M. A consciência ambiental e os 5 “Es”. In: SÃO PAULO (Estado). Educação Ambiental, meio ambiente e cidadania: reflexões e experiências. São Paulo: SMA/CEAM, 1998. p. 23-26.

MACHADO, José Ricardo Martins; NUNES, Marcus Vinicius da Silva. 120 Dinâmicas de grupo: para viver, conviver e se envolver. Rio de Janeiro: Wak, 2012.

MÈREDIEU, F. O desenho infantil. Trad. Álvaro Lorencini e Sandra M. Nitrini. São Paulo: Cultrix, 1997.

OLIVEIRA, E. M. Educação Ambiental: uma possível abordagem. Brasília: Ibama, 1998.

POLITO, R. Recursos audiovisuais: nas apresentações de sucesso. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1997.

SAMPAIO, Ana Tânia Lopes. Pedagogia vivencial humanescente: educação para o sentipensar a condição humana. In: CAVALCANTI, Kátia Brandão (Org.). Pedagogia vivencial humanescente: para sentipensar os sete saberes na educação. Curitiba: CRV, 2010, p.

SANTOS, Santa Marli Pires dos. O brincar na escola: metodologia lúdico-vivencial, coletânea de jogos, brinquedos e dinâmicas. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2011.

SMOLE, K. C. S. Múltiplas inteligências na prática escolar. Brasília: MEC, 1999.

VAN KOLECK, O. L. Interpretação psicológica de desenhos: três estudos. São Paulo: Pioneira, 1968.

Publicado em 19 de fevereiro de 2013

Publicado em 19 de fevereiro de 2013

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