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Internet e o consciente coletivo

Mariana Cruz

Em 2007 escrevi uma matéria sobre a semelhança entre o Google e o Aleph ­– um dos mais famosos contos de Borges. Agora, anos depois, o cenário da internet tornou-se ainda mais amplo: os poderes de suas redes sociais ultrapassaram as dimensões alephianas. Tais mídias, antes dominadas pelo Orkut (que viveu seu período áureo entre 2004 e 2008), foram ofuscadas pelo Facebook, que, devido à sua abrangência internacional (o que não acontecia com o Orkut), vem ganhando mais adeptos a cada dia.

Tais redes, somadas ao Google, acabaram transformando a internet numa espécie de banco de ideias da humanidade. Um lugar onde os pensamentos se encontram e se somam. Por ser um reflexo do espírito humano, também é um ambiente propício para a proliferação de nossos sentimentos mais vis. Plágios, difamações, invejas, assédios e mentiras têm amplo espaço na rede. Muitas pessoas aproveitam-se do anonimato para disseminar seu ódio a quem quer que seja. Aquela lenda urbana que povoou a infância dos nascidos entre as décadas de 1970/80 sobre os baleiros de porta de escola que atraíam as crianças com seus doces para apresentarem-nas ao mundo das drogas ou assediá-las sexualmente na era virtual ganhou contornos reais. O aliciador não mais aparece na figura de um simples vendedor de doces, agora utiliza as mídias sociais e escolhe as características ideais para melhor atrair suas vítimas para uma arapuca que, infelizmente, nada tem de virtual.

A internet é o lugar onde os pensamentos dos homens são compartilhados e uns servem de degrau para outros. Um dia, discutindo sobre as grandes mudanças que a internet e as mídias sociais trouxeram para a vida de grande parte das pessoas, uma amiga, artista plástica, disse-me que tem a impressão de que a internet reflete uma espécie de telepatia, pois diversas vezes, quando acessa seu Facebook, vê que alguém postou algo que ela estava pensando. Talvez “telepatia” não seja o termo apropriado; quem sabe possamos pegar emprestado o termo cunhado por Jung, “inconsciente coletivo”? A internet transforma o inconsciente e torna-o consciente. Pelos sites, pelas mídias sociais e salas de bate-papo, as ideias publicadas são imediatamente compartilhadas por diversas pessoas. Antes da existência dessa rede centralizadora de pensamento, muitas vezes as ideias dissipavam-se com o vento. Hoje, pensa-se algo, tira-se uma foto, tem-se uma ideia e pode-se, imediatamente, compartilhá-la nas mídias sociais. Com data e hora gravadas. Ao mesmo tempo, alguém no outro canto do mundo vê aquilo em tempo real. É um mundo de troca de ideias, saberes que se cruzam, se encontram, se chocam a todo instante. Quem é o dono da ideia? Será que é algo absolutamente original ou algo que já foi pensado antes? Basta jogar no Google. Se não tiver lá, há uma grande possibilidade de ser uma ideia inédita.

É claro que tais “telepatias” sempre existiram. Daí polêmicas sobre descobertas concomitantes perdurarem até hoje, como a invenção do avião (se foi Santos Dumont – como acham os brasileiros – ou se foram os irmãos Wright – como pensam os norte-americanos) ou a invenção do cálculo infinitesimal (se o mérito é de Newton ou de Leibniz). Nos dias de hoje, temos muito mais instrumentos para apontar a paternidade de uma invenção. Mas essa ampla acessibilidade ao que o homem produz gera alguns efeitos negativos, como nos mostra uma matéria da Folha sobre o aumento de trabalhos acadêmicos copiados e as despublicações decorrentes disso.

Pode-se dizer, assim, que na internet muito se cria, algo se copia e tudo se transforma.

Publicado em 26 de fevereiro de 2013.

Publicado em 26 de fevereiro de 2013

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