Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.

A história da sustentabilidade e sua importância nas escolas

Juliana Maria Carvalho

Estamos vivendo um tempo em que o homem realmente parece ter acordado para o futuro do planeta. O termo sustentabilidade tem sido tão usado que é comum vê-lo associado aos mais diversos setores sociais. Ao abrir o jornal, é corriqueiro ver notícias ou anúncios de workshops, palestras, congressos fazendo referência ao tema: “Moda e sustentabilidade”; “Como tornar sua empresa mais sustentável”; “Prédios sustentáveis invadem o Centro do Rio” e por aí vai. É comum que nós, como educadores, abordemos alguns assuntos relacionados ao tema em nossas aulas. Mas e quanto à prática? Será que temos nos mobilizado para ensinar práticas educativas que garantam a preservação dos recursos naturais do planeta?

Na verdade, o número de pessoas que realmente adota hábitos sustentáveis no dia a dia ainda é pequeno. Como educadores, temos grande responsabilidade em nossas mãos. Promover o aprendizado de uma atitude sustentável, com hábitos de economia, reutilização e preservação ajudará a criar uma sociedade responsável socialmente, que contribua para que as gerações futuras não sofram com a falta de recursos.

Para que o professor desenvolva e inicie um trabalho com o tema em sala de aula, é necessário compreender como surgiu o termo sustentabilidade, de onde ele veio e por que hoje em dia falamos tanto nisso.

A questão ambiental começou a ser abordada no início dos anos 1950, a partir de um fato e de uma publicação: o fato foi a poluição por mercúrio de uma baía no Japão, em Nagata. O país ficou muito abalado, pois a população ainda estava sob o medo e as consequências da explosão das bombas atômicas, e menos de dez anos depois várias pessoas morreram, outras ficaram doentes e houve deformidades fetais. Na mesma época, foi lançado um livro que relatava um fenômeno ocorrido nos Estados Unidos. Naquele ano, na primavera, não nasceram flores em diversas cidades americanas. Em comum entre elas estava o uso de determinados inseticidas e pesticidas. Ao fenômeno deu-se o nome de “primavera silenciosa”, mesmo nome do livro de Rachel Carson.

Nos anos 1950, o mundo também via surgir o american way of life, o início do boom do consumo, já sob fortes críticas da população mundial. Nos anos 1960 teve início o movimento chamado contracultura; com ele surgem o pacifismo, a vida em comunidade, o cultivo de alimentos orgânicos e a produção de roupas orgânicas. Nos anos 1970, houve uma mudança de foco e a grande questão ambiental passou a ser a questão populacional. Pensamentos como “o mundo tem gente demais”, “isto vai explodir”, “não teremos mais recursos”, “não vai ter mais comida para muita gente” eram comuns na época. As pessoas começaram a lembrar dos eventos ocorridos na baía de Nagata e da “primavera silenciosa” nos Estados Unidos, dois processos muito difíceis que ainda não haviam cicatrizado totalmente na população. Na baía de Nagata havia já o consenso de que as tecnologias não estavam muito bem adequadas à produção.

Em resumo: a preocupação com a questão ambiental tinha foco na população e na produção. Ali, de certa forma, houve a percepção de alguma coisa errada; os olhares se voltaram para os meios de produção. Vale lembrar que naquela época eles achavam que nós éramos países de terceiro mundo (hoje em dia nos consideramos países do sul), que deveríamos ter menos filhos, que o controle estava conosco. Nós é que deveríamos diminuir, éramos os responsáveis pelas grandes mazelas. Em 1972, aconteceram duas convenções muito importantes: uma, em Roma, tratou dos limites do crescimento da população mundial, da produção agrícola, da poluição, consequentemente, e da exaustão dos recursos naturais. Na outra, da qual o Brasil participou, houve um consenso de que a crise ambiental estava ligada ao crescimento de tecnologias, à implementação de tecnologias que conduziam a uma má produção tecnológica e tecnologias de produção erradas. Teria que haver, de qualquer maneira, uma restrição não só populacional, mas também em termos de como o planeta poderia produzir melhor e como essa produção seria controlada, especialmente nos países do sul.

A culpa era toda nossa. Depois de sermos considerados culpados por ter muitos filhos e aumentar a população do planeta, teve repercussão o seguinte discurso: as tecnologias empregadas pelos países em desenvolvimento são tecnologias erradas, pois geram muita poluição, muita pobreza e destruição.

Uma década e meia depois, foi organizada a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, sob o comando da primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, que esteve aqui em 2012, na Rio +20. Nesse encontro foi criada uma grande publicação, um relatório chamado Nosso futuro comum. Naquele momento, o grande foco era a poluição da pobreza. Acreditava-se que os problemas ambientais eram consequência da miséria em que os países não desenvolvidos estavam mergulhados. Nesse momento foi definido um termo que conceituou, de certa forma, o que é sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável. Eles definiram que os países do sul tinham que crescer, pois crescendo eles eliminam a pobreza, porque ela, sim, é a poluidora. É a geradora de iniquidade social, de um ambiente totalmente desgastado; ela é a geradora do que chamamos hoje em dia de poluição da pobreza. É daí que vem essa cobrança por parte dos países desenvolvidos, essa necessidade de crescimento que até hoje podemos ver na forma do nosso PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, mas na verdade a ideia era o desenvolvimento sustentável. A ideia de desenvolvimento sustentável era o crescimento econômico, a distribuição de riquezas e a proteção ambiental.

Essa ideia deveria crescer e desenvolver os países pobres. Os países ricos já tinham o desenvolvimento sustentável, não estavam mais na crise ambiental. Na verdade, em momento algum, no Brundtland, organizado no final da década de 1980, foi citado o estilo de vida e de consumo dos países do norte. Para eles o que importava é que nós, países do sul, estávamos produzindo, ainda com tecnologias não limpas, a roupa que eles estavam usando, os óculos que eles estavam usando, a soja que o gado deles estava comendo, a carne que os americanos estavam comendo – o que acontece até hoje. Dessa forma surgiu essa noção de pensar e diminuir a pobreza para que alcançássemos o desenvolvimento sustentável. Nós, do sul, é que tínhamos os problemas; eles, lá no norte, estavam muito bem, sem problema algum. A partir daí, houve um questionamento, por parte dos países do sul, no sentido de que, se existe produção, é porque existe demanda. Começou, então, a surgir uma ideia. O estilo de vida consumista está realmente relacionado à crise ambiental? À iniquidade social? Bom, naquela época, a causa da crise ambiental era a pobreza e as tecnologias poluidoras. E surgiram as soluções, que são válidas até hoje e muito importantes para quem atua na área.

O termo sustentabilidade surgiu nessa reunião, Brundtland, que aconteceu em 1987; está associado ao desenvolvimento sustentável e de maneira alguma pode ser dissociado de economia. Nem pode ser dissociado de consumo, pois consumo é inerente ao ser humano. Consumimos ar pra viver, consumimos comida, roupas...

Crescimento econômico para combater a pobreza. A ideia de sustentabilidade hoje, no Brasil, é sustentar a indústria, com tudo que há de mais moderno em termos sociais, ambientais e econômicos. Houve mudança nas formas produtivas e incorporação de procedimentos ambientais até então tratados como externalidades. As indústrias têm se tornado responsáveis pelo seu lixo, pela água que jogam fora e ainda deveriam ser responsáveis pelo produto que vendem e pelo que acontece com ele depois. Recentemente houve um grande avanço: a Lei Nacional dos Resíduos Sólidos, em que teoricamente a indústria é responsável pelos resíduos.

No início da década de 1990, surgiram quatro pontos bastante importantes: as regulamentações ambientais, as políticas de gestão ambiental, as certificações e normatizações – as ISO e as outras. Além disso, surgiu um conceito – ecodesign – que redefiniu toda a cadeia produtiva. Assim, na verdade, a sustentabilidade está intimamente ligada à economia, à preservação, à justiça social. Esses são três pontos muito importantes para um país como o nosso, que é a sexta economia mundial, cuja biodiversidade é uma das maiores do planeta, e um país onde realmente a iniquidade social é muito grande.

Consumo consciente e comércio justo são pontos que devem ser considerados nesse processo. A mudança dos padrões de consumo já ficou evidente na Rio-92, como uma proposta de trabalho, e agora, na Rio+20, aconteceram fóruns internacionais de consumo consciente, o que é muito interessante. Com isso, podemos dizer que a história já mudou. Desde o final da década de 1990 até agora, em 2013, há todo um novo discurso. Não somente um novo discurso, mas também uma nova preocupação dentro do pensamento ambientalista hegemônico, ou seja, dos países ricos, dos países do norte.

Nossos padrões e hábitos cotidianos de consumo, nosso estilo de vida são completamente diferentes do europeu. Na Europa, uma camiseta de algodão gasta muito menos energia e promove menos impacto na fabricação do que durante o uso, pois o europeu lava com água quente, seca com energia elétrica, usa uma série de detergentes; isso causa bastante impacto ambiental. Para nós é o contrário. A camiseta de algodão é lavada com água fria, seca no varal e geralmente não precisa ser passada. No Brasil, o impacto ambiental é no cultivo do algodão convencional, que é muito impactante para o solo. E agora, que estamos começando a escolher nossa alimentação também pela forma de produção, precisamos ter esse cuidado em relação às roupas. É preciso passar isso para as novas gerações. Os europeus valorizam muito produtos desenvolvidos de forma sustentável, e é importante valorizar isso aqui também.

Ilustração

As lavouras de algodão não são um problema apenas no Brasil. Um exemplo gritante de destruição é aquela causada pelo plantio do algodão e totalmente ignorada por nós é o do Mar Aral, que fica no território do Cazaquistão, na Ásia Central, fronteira das ex-repúblicas soviéticas. Durante 40 anos, o Mar Aral foi circundado por lavouras de algodão convencional e era feito o desvio da água do mar para irrigar essas lavouras. As imagens mostram a evolução da destruição. O mar praticamente desapareceu. Hoje o Mar Aral é um deserto de navios e morreu não só a lavoura de algodão em torno; morreram também os pescadores, que não têm mais de onde tirar seu sustento; enfim é um desastre ambiental de proporções incríveis e é relativamente pouco falado aqui. Mas é importante divulgar, para que não aconteça o mesmo aqui no Brasil, ou em outros países onde há grandes lavouras de algodão.

A destruição do planeta provocada pelo homem é cada vez pior, e reverter essa situação é uma garantia para que as gerações futuras, e mesmo a nossa, não sofram com a falta de recursos. Mesmo com todo esse quadro, percebemos que as escolas ainda não estão voltadas para o ensino de hábitos sustentáveis. A maioria apenas se lembra da sustentabilidade uma vez por ano apenas, quando acontece uma semana dedicada às ciências ou ao meio ambiente. Nessa semana geralmente são apresentados trabalhos maravilhosos, palestras e debates e gincanas. Infelizmente a participação termina aí.

De posse dessa grande quantidade de informações sobre sustentabilidade, podemos criar vários trabalhos com temas diferentes e a intenção de criar hábitos sustentáveis. O primeiro deles é aprender a aproveitar materiais descartáveis. Precisamos mostrar que há algumas gerações não havia essa fartura de embalagens que existe hoje e que, em breve, não haverá mais espaço para colocar tudo que é descartado pelo homem. Aprender a reaproveitar caixas de leite, copos de plástico, caixotes e latas de alumínio ajuda o meio ambiente e pode garantir renda extra para quem faz os trabalhos. Que tal montar uma minifábrica de brinquedos? No Google e no Youtube há várias técnicas para começar a reciclar.

Outra ideia capaz de enriquecer o cotidiano dos alunos é montar uma horta na escola. Se houver bastante espaço, podem ser ensinadas técnicas de plantio de vegetais orgânicos, livres de pesticidas e agrotóxicos. Para as escolas com menos espaço, o cultivo de hortaliças como hortelã e manjericão em vasinhos pode se estender da escola para a casa, aumentando a qualidade das refeições. Nas escolas rurais, o que for plantado pode ser dividido entre as famílias de todos os alunos.

Essas são boas ideias, mas o trabalho com a sustentabilidade começa com gestos simples como ensinar as crianças a não jogar lixo no chão. Ao abrir uma bala, elas devem saber que aquele papelzinho, quando junta-se no chão a outros, entope os bueiros e é capaz de provocar enchentes com inúmeras perdas e proliferação de doenças. A pesquisa Investimento em Educação e Desenvolvimento Econômico, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou que os bons hábitos de saúde, higiene e alimentação são capazes de aumentar a vida do indivíduo em até 20%. Além disso, é necessário desafogar o Sistema Único de Saúde das doenças causadas pelo lixo ou por maus hábitos de higiene.

“Quando eu mudo, o mundo muda”. Vivemos tentando mudar o mundo, o marido, o filho, as pessoas à volta, o chefe. Mas pensamos muito pouco no que podemos fazer pra mudar, pra ajudar a mudar o mundo. Para começar a mudar, pensei em uma lista com algumas atitudes que podem ser tomadas na escola para ajudar o planeta. Você pode incrementar essa lista com hábitos que devem ser desenvolvidos na sua comunidade:

  1. Enquanto lavam as mãos e escovam os dentes, as crianças devem aprender desde cedo a fechar a torneira;
  2. É muito importante que a escola tenha coletores para cada tipo de lixo. As crianças devem aprender a separar os materiais e, se possível, conhecer o produto da reciclagem;
  3. As crianças devem aprender a consumir menos e a escolher seus produtos pelo pouco impacto que causam ao planeta;
  4. A cantina deve oferecer opções saudáveis. Se a criança aprender a se alimentar bem na escola, ela levará esses hábitos para casa e influenciará a família;
  5. É interessante criar uma cozinha experimental na escola para ensinar a fazer receitas que aproveitem frutas antes desperdiçadas. Isso pode ajudar na geração de renda também;
  6. Precisamos mostrar que fazer a nossa parte é importante para ajudar o planeta e a nossa comunidade. Se as tarefas forem divididas e cada um fizer a sua parte, teremos muito mais qualidade em nossos objetivos e conseguiremos transformar a sociedade, não importa qual seja o tamanho do grupo.

Publicado em 5 de março de 2013

Publicado em 05 de março de 2013

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.