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As etapas da implementação do Plano Ceibal em quatro escolas da área metropolitana de Montevidéu, Uruguai.

Ana Rivoir, Susana Lamschtein

ObservaTIC, Universidad de la República, Uruguai

Introdução

As TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação) são parte dos grandes avanços tecnológicos da humanidade nas últimas décadas. Têm transformado diversos âmbitos da economia, da cultura, da política e possibilitaram grandes mudanças na sociedade. A estrutura social se modificou. É assim que a sociedade da informação e do conhecimento se torna a sociedade rede (SR) veiculada pela internet (Castells, 2000).

Essa transformação não é homogênea nem linear e implica desigualdades. A principal delas é a desigualdade de acesso digital. Essa desigualdade específica da SR é multidimensional e não se define, de forma dicotômica, entre os que têm e os que não têm acesso. Está em interação com outras desigualdades – como as econômicas e sociais (Norris, 2001; Mística, 2003; Hargittai, 2004; Sassi, 2005).

O acesso e a conexão constituem variáveis básicas que devem complementar-se com o seu efetivo uso. Vários autores apontam a importância de que o uso das TIC seja feito com significado e sentido e direcionado ao desenvolvimento humano. Que permita uma "apropriação social", contribuindo para o desenvolvimento humano (Mística, 2003; Sassi, 2005; Gascó et al 2007; Mansell, 2002).

Essa visão mais complexa da desigualdade digital implica levar em conta a diversidade das dimensões da política. Em particular, as iniciativas e políticas de inclusão digital ou aquelas que procuram contribuir para o desenvolvimento humano. Implica um processo no qual o usuário se apropria das TIC, incorpora-as na vida cotidiana e a partir delas produz novas ações e práticas que redundam em mudanças nas condições de vida no sentido desejado, suprindo as dificuldades e resolvendo problemas (Martínez, 2001; Warschauer, 2003; Selwyn, 2004). O usuário deve ser pensado não só como consumidor de TIC, mas como produtor de conteúdos e conhecimentos (Araya, 2003).

Esse processo acontece em um contexto social e cultural específico. As culturas locais, as mudanças nos sistemas simbólicos e de circulação do conhecimento para a apropriação devem ser consideradas (Bonilla; Cliche, 2001; Cortes; Dubois, 2005). Finalmente, as capacidades para a apropriação também devem ser geradas (Mansell, 2002). É nesse campo que se inscrevem as várias políticas e ações para o uso das TIC nos diversos âmbitos. A educação é um dos setores pioneiros da política na elaboração de iniciativas para o uso da TIC.

O uso específico das TIC no âmbito educativo pode ser classificado em três níveis: o do centro educativo; o pedagógico, possibilitando mudanças por meio dos recursos digitais e com métodos mais centrados no trabalho ativo dos estudantes; o do currículo, como complementar a aprendizagem com as habilidades e competências vinculadas ao uso significativo das TIC que facilitem a integração social e econômica futura do estudante (Claro et al, 2011).

Essas possibilidades de uso e apropriação das TIC têm como base a qualidade do acesso (condições de conectividade, disponibilidade de equipes, entre outros). O sentido relativo à educação reside na apropriação das TIC como oportunidade nova aos estudantes e que, em particular, ainda resultem como benefício em nível educativo. Essa diferença é chamada por Hargittai, Robinson e DiMaggio (2003) de "fosso digital" e se refere a capacidades desiguais da população para aproveitar as TIC.

O caso de Ceibal, no Uruguai, assume características peculiares, pois, apesar de se tratar de uma iniciativa no âmbito educativo, não se propõe, em princípio, fins educativos, mas objetivos de inclusão social. Quando o programa esteve mais consolidado é que ampliou seus objetivos para transformações educativas. Aqui procuramos discutir em que medida as ações implementadas contribuíram para a redução das desigualdades digitais mediante usos mais complexos e pondo ênfase na educação.

O Plano Ceibal

O Plano Ceibal, criado pelo presidente do Uruguai pelo Decreto nº 144, de 18 de abril de 2007, foi formado por uma Comissão Diretora integrada por delegados de diversos órgãos do Estado: Laboratorio Tecnológico del Uruguay (LATU); Administración Nacional de Educación Pública (ANEP); Consejo Directivo Central (CODICEN); Consejo de Educación Primaria (CEP); Ministerio de Educación y Cultura (MEC); Agencia para el Desarrollo del Gobierno de Gestión Electrónica y la Sociedad de la Información y del Conocimiento (AGESIC); Agencia Nacional de Investigación y Innovación (ANII); e Administración Nacional de Telecomunicaciones (ANTEL)

O decreto de criação do Ceibal é o primeiro documento público em que se listam as principais motivações estatais para a formulação dessa política. Ele afirma que a criação do Plano é baseada na necessidade de avançar para uma sociedade de informação e conhecimento a partir de uma perspectiva social e educativa. Ao afirmar-se como política educativa voltada para a educação pública, representou a opção nessa direção em uma perspectiva pedagógica. A opção para que a escola seja o eixo promoveu um sentido maior em termos de equidade social, pois a escola como instituição atua como símbolo da inclusão social no Uruguai.

A estrutura e as características institucionais do Plano têm mudado ao longo dos anos, assim como a especificação de seus objetivos. Inicialmente, seu objetivo foi gerar a inclusão social. A partir da Lei do Orçamento Nacional (Art. 842 do ano 2010), ao Centro Ceibal compete: promover, coordenar e desenvolver planos e programas em apoio às políticas educativas para crianças e adolescentes elaboradas pelos órgãos responsáveis, contribuir para o exercício do direito à educação e à inclusão social mediante ações que permitam a igualdade de acesso ao conhecimento; desenvolver programas educativos não formais para toda a população diretamente relacionada com os beneficiários das atividades do Centro, de acordo com o desenho adotado, no marco das normas vigentes.

Quanto à fundamentação educativa do Plano, a integração das TIC nas aulas não é um fim em si mesmo, ela pretende ir sendo construída em função de uma proposta pedagógica. Para o Plano, a mediação docente entre o objeto do conhecimento e a elaboração ativa dos significados por parte dos estudantes é fundamental para a construção de conhecimentos (Rivoir; Lamschtein, 2012b).

A implementação do Plano Ceibal significou pôr em andamento uma importante estrutura organizacional e um sistema de logística. A partir de uma experiência piloto no interior do país, em 2007, o Plano foi se estendendo geograficamente até completar o território nacional em 2010. Nesse mesmo ano atingiu os três primeiros anos da educação secundária.

Em março de 2013, tinham sido distribuídos cerca de 600 mil laptops aos estudantes e docentes, 2.790 escolas estavam conectadas à internet, o que representava 99% dos estudantes. Também foram instalados 7.014 acessos sem fio. Metade do total de estudantes contava com a internet a menos de 300m de sua casa. 30 mil professores haviam sido capacitados, 723 espaços públicos e 332 bairros de nível socioeconômico baixo contavam com o sinal da internet.

Foram realizadas aços de formação diretas dirigidas aos docentes, por meio de cursos optativos ou oficinas realizadas com apoio de redes de voluntários. Foi criada a figura do professor dinamizador para fomentar a experiência educativa com o manejo mais efetivo do laptop entre os discentes e as crianças. O Professor Ceibal, em 2009, atingiu mais de 400 pessoas para colaborar e acompanhar seus colegas, que, por sua vez, promoveram propostas educativas que integram o uso dos laptops (Rivoir; Lamschtein, 2012b).

Foram desenvolvidos recursos digitais para sua utilização no ensino e sua interação com a comunidade acadêmica. Foi criado o Portal Educativo para apoiar e promover o uso educativo do computador portátil e para fomentar o uso crítico da informação. Também foi criado o Portal Institucional, onde podemos encontrar informações sobre o Plano, com notícias, serviços, contatos etc. Por último, criou-se o Canal Ceibal no YouTube, que logo foi transmitido pela televisão aberta e paga. Também é transmitido pela rádio; ali os ouvintes contam com a possibilidade de dirimir suas dúvidas sobre problemas técnicos e sobre suas aplicações (Rivoir; Lamschtein, 2012a).

Existe também um ônibus que percorre a capital do país consertando os equipamentos antes do início das aulas e fazendo oficinas lúdicas, educativas e recreativas para crianças e adolescentes que participam do Plano. Para a manutenção e reparação dos laptops se descentralizou o serviço entre empresas locais e foi criada uma linha gratuita de telefone. São resolvidos gratuitamente problemas de software e hardware que não foram gerados pelo seu mau uso; é prestada assessoria ao usuário com atenção personalizada e, em alguns casos, são resolvidos problemas de conexão.

Enfim, o Ceibal desenvolve diversas ações relacionadas à distribuição dos laptops e sua infraestrutura e manutenção, à criação de conteúdos digitais educativos e a atividades de formação de professores, entre outras. Para isso, como se tem afirmado (Garibaldi; Ibarra, 2011), a diferença de outras propostas no dia a dia é que não se trata só de um Plano de distribuição de computadores.

Neste artigo analisaremos se essas diversas atividades contribuem para a inclusão social dos beneficiários mais desfavorecidos, pela inclusão digital.

Metodologia

O objetivo da pesquisa é mostrar até que ponto o Plano Ceibal tem contribuído para melhorar a educação com a redução da desigualdade digital – dos estudantes e de suas famílias.

O objetivo foi conhecer os efeitos desse Plano sobre a desigualdade digital e a inclusão social e, em particular, o seu uso educativo. A pergunta chave é: a implementação do Ceibal favoreceu a inclusão social pela redução da desigualdade digital e o uso educativo do laptop?

Para responder a essa questão foram pesquisadas as opiniões dos atores educativos dessas escolas. Optamos por uma combinação de técnicas qualitativas e quantitativas. As técnicas quantitativas se processaram nas pesquisas domiciliares entre 2001 e 2011, com o objetivo de saber a redução da desigualdade de acesso e sua relação com outras variáveis. Quanto às técnicas qualitativas, usamos a pesquisa em profundidade para obter informação sobre a execução e os processos nos centros educativos. Foram realizadas 22 entrevistas com os atores educativos das escolas selecionadas (cerca de cinco profissionais por escola: quatro diretoras, doze professoras, quatro auxiliares de apoio ao Ceibal, uma professora comunitária e os dois inspetores correspondentes à região das escolas).

Os principais tópicos das entrevistas foram: características da experiência de implantação do Plano Ceibal na escola, sua contribuição para o desenvolvimento das crianças; quais os principais facilitadores e os principais obstáculos para trabalhar com o Ceibal; as mudanças na aprendizagem das crianças a partir da implementação do Ceibal (professores); se favoreceu as famílias; quais as mudanças notadas nos vínculos com o domicílio; as mudanças no desempenho, nas habilidades e na autonomia das crianças; atividades que mais incentivaram as crianças; se as famílias se beneficiaram do Plano; se o Ceibal na escola favoreceu a inclusão social; se as experiências e práticas educativas tiveram êxito com a implantação do Plano; como foi implementada a política nessa escola; o que funcionou e o que não; principais obstáculos e problemas de execução do Plano; principais obstáculos e problemas para que o Plano contribua para a inclusão social das crianças e outros habitantes da região.

Foram realizadas pesquisas em quatro escolas, consideradas em "contexto crítico". Foram escolhidas porque não fizeram parte das experiências piloto do Ceibal nem tiveram apoios adicionais que complementassem os recursos extraordinários para a implementação do Ceibal. Foram consideradas "escolas padrão" similares a outras com as mesmas características.

As quatro escolas estão localizadas em áreas com população de baixo nível socioeconômico na área metropolitana de Montevidéu. A partir de uma pesquisa prévia e consulta às autoridades, foram incluídas no estudo as escolas nº 163, 191 e 245, de Ciudad de la Paz, e nº 180, de Progresso.

O trabalho de campo foi realizado no mês de outubro de 2011; as entrevistas duraram entre 30 minutos e uma hora. Aconteceram na sala da direção da escola ou em um salão com condições para fazer as gravações, que foram transcritas para posterior análise.

A desigualdade digital a partir do Ceibal

Para analisar se o Ceibal produziu mudanças quanto à desigualdade digital, apresentamos a seguir uma análise dos dados das Pesquisas domiciliares permanentes do Instituto Nacional de Estatísticas (INE). No Gráfico 1 vê-se como a percentagem da população com acesso ao computador e à internet começa a crescer mais fortemente a partir de 2006. Isso corresponde basicamente à difusão das TIC via mercado, pois coincide com a recuperação econômica. Sem dúvida, os domicílios mais pobres não experimentaram essa melhora no acesso até o início do Plano Ceibal.

O Gráfico 1 mostra como, com o Plano Ceibal, a posse de computadores se distribui mais equitativamente nos domicílios do país. O item 1 corresponde aos domicílios com menor quantidade e o item 5 aos com maior quantidade de computadores. Chama a atenção que o item 1 apresenta percentagem mais alta que os itens 2, 3 e 4. Isso se deve ao fato de existir mais crianças em idade escolar nas casas do item 1 que no resto dos domicílios. De 2001 a 2005 as pesquisas permanentes de domicílios do INE são representativas somente do país urbano, incluindo-se na amostra as localidades maiores a 5.000 habitantes. A partir de 2006, as amostras se ampliaram para localidades pequenas e zonas rurais, pois são representativas na totalidade do país.

Gráfico 1: Percentagem de domicílios com microcomputadores, segundo itens de renda total dos domicílios per capita, incluindo localidades pequenas e zonas rurais, em 2006 e 2010


Fonte: Pesquisa permanente de domicílios do INE

A comparação entre os domicílios da capital Montevidéu e do interior do país mostra que a distância de acesso a computador e internet em domicílio persiste ao longo da década, mas os aumentos aconteceram em ambas as áreas geográficas, como se observa no Gráfico 2. Os domicílios do interior, de localidades com mais de 5.000 habitantes, não mostram atraso importante, se comparado com a capital, em relação à posse do microcomputador. Esse é um efeito do Plano Ceibal. Sem dúvida, o atraso é mais grave no interior em relação à conectividade.

Gráfico 2: Percentagem de domicílios com computador e internet segundo as grandes áreas (Montevidéu, interior) de 2001 a 2010 para áreas urbanas (mais de 5.000 habitantes)


Fonte: Pesquisa Permanente de domicílios do INE

A partir de 2006, foram introduzida nas pesquisas permanentes de domicílio perguntas relativas ao uso das TIC. Dessa forma, não só foi possível medir a desigualdade digital a partir da posse de TIC no domicílio como também a partir do seu uso efetivo pela população. Esses indicadores captam não só aqueles que têm computador e internet, mas também aqueles que fazem uso deles apesar de não contarem com a tecnologia no domicílio, além dos que, apesar de ter a tecnologia no domicílios, não fazem uso dela. Estritamente, o indicador nos diversos anos não é completamente comparável, já que muda a referência de tempo de um ano para outro. Por exemplo: em 2006, a pergunta era sobre o uso de computador e internet nos últimos seis meses, enquanto em 2010 se perguntava pelo uso no último mês.

Com os indicadores de uso é possível ver a desigualdade de uso da TIC. O uso segundo grupos de idade mostra que os mais jovens apresentam porcentagens mais elevadas de uso, e essas percentagens caem com pessoas de mais idade (as pessoas de idade mais avançada são majoritariamente mais reticentes com as novas tecnologias). Mesmo assim, todos os grupos etários mostram redução quanto à desigualdade digital. Também é possível observar o impacto do Plano Ceibal no grupo de ensino primário ( 6 a 11 anos), com o incremento de aproximadamente 25 pontos percentuais entre 2008 e 2009.

Gráfico 3: Percentagem de pessoas que usam computador e internet segundo grupos etários, incluindo localidades pequenas e zonas rurais, de 2006 a 2009


Fonte: Pesquisa Permanente de domicílios do INE

Sem levar em conta a idade e excetuando as crianças entre 6 e 11 anos, são muito poucas as pessoas que só utilizam o computador (as barras da esquerda que em quase todos os grupos e anos são menores). As pessoas que usam computador usam também a internet em sua grande maioria, o que indica que muitas pessoas acessam a internet fora do domicílio. Neste estudo, em particular, interessa o que ocorre com o grupo de jovens.

Gráfico 4: Percentagem de crianças de 6 a 11 anos e de 12 a 19 anos com conexão no domicílio e que usaram a internet, incluindo pequenas localidades e zonas rurais, em 2006 e 2010


Fonte: Pesquisa Permanente de domicílios do INE

Vemos no Gráfico 4 como aumenta a quantidade de crianças que usaram a internet com conexão no domicílio e a proporção das que usaram fora. Da pesquisa se conclui que é mais usada nos centros escolares e menos nos cibercafés, que era o lugar preferido dos adolescentes em 2006.

Enfim se confirma o aporte do Ceibal para a redução da desigualdade digital nas dimensões de acesso e conectividade nos domicílios; fundamentalmente as características de mobilidade do laptop limitam a medição de acesso à internet.

Visão dos atores educativos sobre o Plano Ceibal em suas escolas

As entrevistas realizadas com os atores educativos em quatro escolas de situação social crítica revelaram a opinião sobre a execução do Plano no centro educativo, suas principais dificuldades e sua contribuição para a inclusão social. Conhecemos a opinião dos atores educativos sobre os objetivos do Plano Ceibal e as ações que foram levadas adiante na escola. Essa visão dos atores sobre o Plano nos brindou com a avaliação acerca do alcance da redução da desigualdade digital e de que forma a inclusão digital está favorecendo a inclusão nessas escolas. Foram revelados tanto os sucessos como as dificuldades.

Opinião dos atores sobre a contribuição do Plano na inclusão digital

Nas entrevistas foi analisada a opinião dos professores sobre a contribuição do Ceibal para a inclusão social.

Na Escola A, a visão da diretoria e das professoras é de que o Plano Ceibal contribui para reduzir as desigualdades de acesso às novas tecnologias. Acredita-se que essas últimas são ferramentas com grande potencial para desenvolver um projeto pedagógico que poderia impactar significativamente a aprendizagem das crianças. Também está presente, de forma geral, a versão de que as TIC são uma ferramenta para a sua futura inserção no trabalho.

No entanto, nessa escola avaliam que o Plano não está favorecendo a inclusão social. Afirmam que os laptops foram bem recebidos no bairro e considerados um elemento de modernidade, mas que os computadores não são usados com o cuidado necessário. A maioria das crianças tem seus computadores bastante deteriorados. Quebram, são reparados e voltam a quebrar. Os pais não se sentem responsáveis, segundo eles, e os cuidados estão sob o encargo das crianças e da escola.

Na Escola B, na visão da diretoria e dos professores, o Plano torna possível um acesso à cultura sem precedentes. Isso potencializa algumas aprendizagens e dá oportunidades para que os alunos as desfrutem. Avaliam que o acesso a essas fontes culturais, tanto de instrução como de lazer, estão incluindo socialmente os alunos. No entanto, não há consenso sobre se as capacidades que estão adquirindo os tornarão mais eficientes e competentes no futuro. Nesse sentido, acreditam que essas crianças não poderiam saltar o desnível de aprendizagem em relação a outras crianças com melhores condições socioeconômicas. Acreditam que o acesso melhorou, mas não a apropriação. Segundo entendem, o indicador mais decisivo seria que as crianças conseguissem manter os seus computadores funcionando.

Na Escola C, a avaliação dos diretores e professores é de que o acesso à internet abriu para as crianças e suas famílias outro mundo, ainda que seja usada só para jogar e comunicar-se. Acreditam que essas atividades ajudam a inclusão social. No entanto, a falta de cuidado com os computadores se repete, ainda que em proporção menor que as outras escolas.

Na Escola D, a avaliação dos diretores e professores sobre o Plano é de que está favorecendo a inclusão das crianças e das famílias, apesar da deterioração de muitos computadores.

O uso do computador para a integração nacional

Outro aspecto avaliado foi em que medida os computadores do Ceibal serviam ou eram usados com o fim de integração social.

Na Escola A, todas as atividades quinzenais favorecem a inclusão. Buscam criar identidade coletiva pelo sentido de pertencimento não só da escola, mas de uma comunidade. Os computadores têm servido a esse propósito, pois foi criado um blog em que as crianças compartilham e se dão a conhecer. Produzem vários tipos de conteúdos sobre a sua e outras escolas. Segundo os professores e a diretora, isso também favorece a autoestima das crianças.

Na Escola B, as crianças maiores criaram um blog da escola que se tornou uma experiência de integração muito positiva para a dinâmica da relação com outras escolas e com a comunidade. Outra experiência muito positiva, pontual, mas fora das fronteiras da escola são as feiras junto com outras escolas do Ceibal das atividades realizadas com os computadores nas salas de aula.

Na Escola C, foram feitas atividades pontuais que favoreceram a integração social de maneira importante. No dia da educação pública foi montada uma exposição com os trabalhos feitos com o computador, da qual participaram muitos pais. Tiveram o apoio de mestra dinamizadora para participar da Feira Ceibal. Eles sentem que têm a possibilidade de formular projetos para os quais o Ceibal poderia canalizar recursos. Nessa escola não foi feito um blog porque nenhum professor é capacitado para tal.

A Escola D tem atividades que dinamizam o Plano e ao mesmo tempo favorecem a integração social. No festival da escola foram apresentados livros eletrônicos produzidos em Etoys. Foram realizadas outras exposições com os trabalhos feitos no computador, de que participaram os pais e onde eles conheceram como se pode usar esse recurso. A Feira Ceibal é outro local onde as crianças têm experimentado e participado de atividades no computador com alunos de outras escolas.

A escola tem um blog, mas as professoras disseram que as crianças têm pouco interesse nele. Parece mais um recurso que passou de moda, se comparado com as redes sociais. O pessoal da escola percebe que o uso dessas redes é muito mais atraente para as crianças, mas frequentemente é uma fonte de problemas, discussões e brigas. O uso das redes não é visto como produtivo.

Não obstante, nessas quatro escolas quase todas as professoras, com algumas exceções, mostraram estar muito motivadas para utilizar as TIC, apesar dos problemas mencionados. Isso ocorre porque as crianças são as que estão mais motivadas para usá-las. Para as crianças é mais atraente trabalhar com o computador do que da maneira tradicional.

As dificuldades encontradas pelos atores e as ações empreendidas para superá-las

Foi perguntado, nas entrevistas, sobre as principais dificuldades encontradas na execução do Plano nas escolas.

Na Escola A, o argumento usado pela totalidade das professoras é a dificuldade de trabalhar porque são muitos alunos que não levam os seus computadores para a escola. A razão é que muitos estão quebrados, outros estão sem carga e eles não têm carregador ou simplesmente não levam porque são muito pesados.

A Escola A e o Plano Ceibal realizam com a professora de apoio Ceibal um trabalho dirigido aos pais sobre o uso do computador. Isso tem bons resultados, mas não o suficiente para as dimensões e o alcance do problema. Segundo o relato, esse trabalho é bem recebido pelos pais, mas ele é feito por uma só docente, em um só dia da semana, em um só turno da escola, cuja prioridade é o trabalho das professoras com os alunos.

Para resolver a falta de computadores em classe, o uso é feito em grupo. Dependendo da classe, há um computador para cada duas ou quatro crianças. Esse é um problema sem solução para os deveres de casa. Apesar disso, as professoras o usam e dizem que é benéfico para as crianças que compartilhem as máquinas; também assinalam que acontecem situações nada desejáveis, como a raiva e a frustração que desvirtuam a classe.

Uma das professoras da escola afirma: "Não podemos ser tão negativos a ponto de, por falta de computadores, não usemos os disponíveis. E isso é uma forma para que o outro, que não teve cuidado, tome consciência e se integre". Isso reflete a vontade das professoras de aproveitar o recurso em si e como elemento de aprendizagem em geral.

Na Escola B, os docentes também recorrem ao trabalho em equipe na sala de aula. Aqui o problema é atribuído à falta de cuidado em casa. A diferença que se apresenta nessa área é que parece haver mais pais preocupados com os cuidados a respeito do computador. Nessa escola, se destacou a necessidade do trabalho com os pais para a consciência dos cuidados. Foram feitas oficinas a respeito do tema, mas foi avaliado que se deve insistir nessa linha porque os pais não estão preparados para receber essa ferramenta. Os atores educativos dessa escola dizem que há pais que rejeitam a tecnologia. Consideram que os filhos ficam muito tempo no computador e, em casa, os guardam fora do alcance da criança. Também se opõem ao uso do computador na escola porque pensam que a criança está usando a internet e não que o está usando para aprender.

Na Escola C, constatamos que há uma situação melhor em relação às outras escolas. Ao menos a metade das crianças tem computador na sala de aula. Os professores observam que os pais que não se responsabilizam pelo computador são os mesmos que descuidam de outros aspectos de seus filhos, inclusive com a relação à escola. As crianças menores são as que mais conservam os computadores e os levam com carga para a escola. Os maiores não cumprem essa responsabilidade. Nessa escola o computador é muito usado e isso se evidencia por problemas com a conexão, devido ao uso simultâneo.

São realizadas aulas demonstrativas para os pais sobre o que as crianças fazem com o computador, a cargo da Professora dinamizadora Ceibal. Afirmam que essas aulas têm resultados muito positivos. Não obstante, essas atividades não se organizam para os pais de todas as crianças, mas por classe, e dependem, portanto, da iniciativa da professora da classe.

"Creio que desde o momento da implementação faltou justamente esse esclarecimento; no dia em que entregaram os computadores pela primeira vez, devia ter havido uma reunião com os pais, com um panfleto com três palavrinhas. Palavrinhas sobre não deixar cair, não deixar ao sol… Coisas que os pais não sabem porque nunca tinham tido computadores. Faltou um processo no meio que agora, que os alunos estão com os computadores,         se nota. Mas creio que faltou um processo no meio."

Segundo afirma uma professora, é provável que tenha faltado um passo intermediário nas ações: usar os computadores da escola e, uma vez instalado certo nível de aprendizagem com todos, então, sim, entregar um computador para cada criança.

Na Escola D, as entrevistadas afirmam que grande porcentagem dos pais mostra falta de atenção para com as dúvidas de seus filhos. No momento da entrega dos computadores há uma grande expectativa, porém isso se dilui e se evidencia na grande quantidade de máquinas quebradas e/ou seriamente danificadas. Segundo afirmam, as classes têm entre 40 e 50% de máquinas sem funcionar.

A professora de apoio Ceibal colaborou neste ano na entrega das máquinas, instruindo os pais nos cuidados e funcionamento básicos; isso parece ser uma tarefa que tem que continuar. Por outro lado, as precárias condições de vida dificultam a situação. Por exemplo, pode ser que na casa desses alunos só exista uma tomada elétrica e não é sensato pedir à família que mantenha o computador carregado.

Os problemas vinculados às máquinas consomem muito tempo pedagógico e constituem um incômodo para as professoras. No caso das professoras menos capacitadas, essas questões são fortemente desestimulantes, porque são problemas que se somam à sua insegurança a respeito da tecnologia. Isso tem consequências na frequência do uso e na sua qualidade. As professoras mais capacitadas exploram muito melhor o recurso e tendem a estimular melhor as crianças para que tenham os computadores em condições, ainda que nem sempre consigam.

O uso educativo dos computadores

O uso educativo se revelou a partir das perguntas formuladas às professoras sobre a frequência e o tipo de uso em classe. Foi perguntado sobre os benefícios educativos do uso e pela aquisição de capacidades digitais tanto delas como das crianças. Também foram selecionadas, das respostas, as principais dificuldades apresentadas na classe.

Na Escola A foi dito que, muitas vezes, o problema da quantidade de máquinas em condições efetivas de uso em classe e os problemas de conexão ou sua lentidão fazem com que não seja possível cumprir o programa ou que se consuma tempo demasiado.

O que se usa são os programas para melhorar a expressão escrita. Também se usam programas para aprender Matemática. E é bastante utilizado um programa para fazer mapas semânticos. Nas classes mais adiantadas, é frequente o uso da internet para pesquisar informações sobre os temas de estudo. Uma das professoras faz fotomontagens com diversas atividades da escola. O computador também é usado para fazer as avaliações online.

As professoras dizem que usam o que conhecem. Se os alunos conhecem mais um programa, essa é uma situação incômoda para elas, mas só até certo ponto.

"Tem montes de coisas que são mais claras para eles do que para mim. Tiro minhas dúvidas com eles, estão continuamente revisando, buscando. É uma maneira de aprender."

Até hoje as professoras não notaram uma melhora substancial no rendimento escolar, mas apreciam as capacidades digitais que as crianças estão adquirindo. Um tipo de uso que as crianças rapidamente estão incorporando é a busca de notícias e a comunicação pelo chat e Facebook.

Foi dito que as buscas pela internet com fins educativos só são feitas a pedido dos professores e que a compreensão dos conceitos é assistida. Também falaram que o que fazem principalmente, fora da classe, é jogar. É reconhecido que jogando as crianças exploram avidamente o computador e certamente estão adquirindo capacidades digitais que superam as dos professores.

As professoras dizem que as crianças estão mais motivadas a aprender quando usam o computador e isso é um estímulo para usá-lo. Mas isso não é consenso. Algumas só programam trabalhos com o computador quando está presente a professora de apoio Ceibal, porque não se sentem suficientemente capacitadas para conduzir sozinhas a classe usando as TIC. Apesar disso, permitem que as crianças joguem um pouco com o computador em classe.

Os professores em geral têm pouca frequência nos cursos por causa da distância do lugar onde são ministrados. É por isso que, hoje, apesar da grande oferta de cursos, eles não são bem aproveitados. Acham também que os cursos não são satisfatórios, pois não são suficientemente práticos ou supõem um nível de conhecimento prévio que elas não têm.

A professora de apoio Ceibal é uma professora que se integra à classe de uma colega e apoia as atividades com os computadores dentro da programação normal do dia. Isso não foi assim desde o início. No primeiro ano, ela tinha o encargo de ensinar o uso do computador em sala de aula, e a professora titular não participava. Foi constatado que, dessa forma, as professoras não aprimoravam sua capacidade. A partir de 2010, decidiu-se que o trabalho deveria se realizar com as duas professoras em classe e tendo como direção o programa do dia.

Na Escola B, todas as professoras trabalham com o computador em sala de aula mesmo que nem todas as crianças tenham um. Os computadores são compartilhados, mas nem todas as crianças conseguem trabalhar com eles, o que é frustrante para as professoras. Além disso, são frequentes os problemas entre as crianças quando têm que dividir a máquina.

Os computadores são usados em sala de aula ao menos três vezes por mês e, no máximo, duas ou três vezes por semana. Uma professora trabalha as atividades do computador… no caderno. A incerteza sobre quantas máquinas vão estar disponíveis para a classe afeta a programação, reduzindo as atividades que iriam ser realizadas com o computador. Nos dias de chuva, o plano de usar o computador é frustrado porque nesses dias as crianças não levam as máquinas.

Apesar desses problemas, para as professoras o trabalho é muito melhor agora do que antes, sem os computadores. Segundo elas, é muito estimulante para as crianças. De 2009 até agora as professoras receberam formação da dinamizadora Ceibal em alguns sábados, que é o dia em que não há aula. Têm tido também assistência da professora de apoio Ceibal para trabalhar com o computador junto com elas em classe, mas somente nos turnos vespertinos da escola. As professoras da manhã não têm esse apoio. Em 2011 a professora de apoio passou a cumprir a função de professora comunitária. Seguiu sendo uma pessoa de apoio, porém de maneira informal. Já não dá apoio em classe.

Para algumas professoras, um aspecto negativo do Plano foi que a capacitação chegou depois das máquinas. Isso é visto como uma desvalorização dos professores. Acham que, se a capacitação tivesse sido feita desde o início do processo, o resultado teria sido melhor. Algumas professoras entrevistadas pensam que um aspecto fundamental para melhorar o Plano é insistir com a capacitação dos professores e com o trabalho com as famílias. E a capacitação dos professores deveria ser mais específica, com uma articulação clara com os conteúdos programáticos.

Para alguns professores, o ensino da leitura e da escrita tem melhorado e acelerado. Outras não veem melhoras substanciais.

O acesso à internet tornou possíveis atividades mais criativas com as crianças e fez com que as atividades tradicionais se tornassem mais criativas e estimulantes para a aprendizagem. Utiliza-se bastante o programa que faz mapas conceituais (Laberinto), a calculadora e o TuxPaint, para fazer desenhos. Fazem fotomontagens. Também é utilizado o programa Dr. Geo para Geometria.

As crianças são fascinadas por tudo que tem a ver com comunicação. Algumas classes têm blog, mas não se registrou o uso de redes sociais e do correio eletrônico no trabalho de sala de aula.

Foi dito que algumas crianças recorriam à internet para tudo que precisam, têm presente que na internet pode-se encontrar tudo. As professoras também afirmam que há crianças com dificuldade em fazer sozinhas as buscas na internet: se é um assunto desconhecido para elas, não sabem nem que palavras usar. Para muitas crianças, é difícil avaliar se o que encontram na internet é adequado ou não para o trabalho solicitado pela professora.

Foi dito que as crianças ganham autonomia porque exploram por si mesmas tanto as aplicações como os conteúdos da internet. Aprendem a fazer escolhas, a tomar decisões quanto ao uso das TIC. Trabalham os programas sozinhas ou com seus colegas. Algumas professoras disseram que há professoras que trabalham melhor que elas com os computadores.

Na Escola C, as professoras pedem às crianças que levem os computadores todos os dias, como recomenda o Plano. Mas algumas não levam e, se levam, estão sem carga. As professoras dizem que, ao compartilhar o computador, fazem um trabalho em grupo que, em certo sentido, lhes favorece. Sem dúvida, como em outras escolas, compartilhar a máquina é uma fonte de desavenças e nem todos chegam a usar o computador.

Como nas outras escolas, algumas professoras criticam o Plano por a capacitação ter sido implantada depois da entrega dos computadores às crianças. Levaram tempo para incorporar a ferramenta e ainda lhes falta conhecimento para poder enriquecer a experiência em sala de aula. A professora de apoio da Ceibal ajuda a resolver uma série de questões práticas que as professoras não sabem.

As atividades mais frequentes são: busca de informações pela internet, Etoys, que é um programa para fazer animações (com ele se fazem pequenas histórias e se trabalha a criatividade); Laberinto, que é um programa com o qual podem ser feitos mapas conceituais; TuxPaint para desenhar; Dr. Geo para Geometria e Memorise para exercitar a memória. Menos frequente é usar os microscópios e os laboratórios virtuais.

Para a maioria das professoras dessa escola, o grande impacto é na leitura e produção de textos. A busca de informações exige mais esforço na leitura. Organizar e reunir informações com uma ferramenta como o Laberinto é mais divertido e atraente para as crianças. Quanto à escrita, o computador está acelerando a aprendizagem dos menores, pelo uso de um programa que se chama Falar com Sara, no qual uma voz vai falando o que vai sendo escrito. As professoras dos maiores não perceberam melhoras evidentes na escrita.

As professoras contam que muitas crianças manejam o computador sozinhas, mas nem sempre. Colaboram entre elas e necessitam de um adulto. A cooperação entre as crianças foi vista como uma boa coisa. As crianças menores, as do primeiro ano, necessitam muito da ajuda de um adulto para aprender a usar o computador.

As professoras constatam que as TIC contribuem para que as crianças ganhem maior autonomia. Por meio da busca de informações em diversos sites, como os portais educativos, Wikipedia, Youtube, gradualmente melhoram sua capacidade de avaliar a informação, de incorporar critérios sobre o que é relevante no que encontram na internet. Por essa razão, se percebe que as crianças têm mais autonomia.

Na Escola D, todas as professoras trabalham com o computador em sala de aula; algumas, quase todos os dias; outras, duas vezes por semana ou menos. Trabalham em grupos de dois ou três alunos por máquina.

Como nas outras escolas, foi dito que a primeira fase da implantação deveria ter sido a capacitação dos docentes e ter havido um tempo em rede para compartilhar e ver conteúdos no portal, como fazem hoje.

Foi dito que essa crítica não tem a ver com que o professor tenha que saber mais que os alunos. O que ocorre é que as crianças têm efetivamente perguntas que implicam saber manejar o recurso para poder lhes dar respostas.

As professoras pensam que, se estivessem mais capacitadas, poderiam tirar mais proveito das TIC para a aprendizagem. Mas trabalham dois turnos e não têm muitas possibilidades de participar de um curso fora do horário de trabalho.

Os usos mais frequentes do computador são a realização de histórias e livros eletrônicos com Etoys ou com o Fototun, desenhar com TuxPaint, fotografar e filmar. Com os menores se usa o Memorize, um jogo para desenvolver a memória. Com os maiores, as buscas na internet, pautadas pela professora, são mais intensivas.

As professoras disseram que o computador favorece a aprendizagem, mesmo considerando o uso limitado por falta de máquinas. Foi falado na aquisição, pelas crianças, da capacidade digital. Também estão mais estimuladas a incorporar hábitos de leitura, e os maiores estão incorporando capacidades de pesquisar, entender e avaliar informações. O uso da atividade Laberinto também os ajuda a organizar as informações em mapas conceituais. No entanto, as professoras não notaram melhora na escrita. São mais evidentes as melhoras nas crianças que têm computador do que nas que não têm.

Nas quatro escolas se constata que a incorporação das TIC favoreceu a aprendizagem das crianças com dificuldades. As crianças com dificuldades motoras e psicomotoras foram ajudadas particularmente na expressão escrita e simbólica, por meio de desenho, pois a tarefa de refazer não é tediosa (isso foi constatado mais na Escola D do que nas outras). As crianças com déficit de atenção se concentram melhor e conseguem terminar as tarefas quando trabalham com computador. Quando trabalham no caderno, não conseguem (isso foi constatado nas quatro escolas).

Em diversas oportunidades, nas quatro escolas, as professoras disseram que não foram capacitadas antes da entrega dos computadores o que não lhes permitiu explorar todas as possibilidades do recurso desde o início. Mas, em maior ou menor grau, todas as professoras estavam familiarizadas com as TIC antes do Plano.

Os problemas vinculados às máquinas consomem bastante tempo pedagógico e constituem uma dor de cabeça para as professoras. No caso das professoras menos capacitadas, são um desestímulo consideravelmente grande, porque são problemas que se somam à sua insegurança a respeito da tecnologia. Isso tem consequências na frequência e na qualidade do uso. As professoras mais capacitadas exploram muito mais o recurso e sabem estimular melhor as crianças para que tenham as máquinas em condições, ainda que nem sempre o consigam.

Conclusões

Em primeiro lugar, podemos afirmar que o Plano Ceibal, no Uruguai, como passo a passo de uma política universal com objetivo de inclusão social e implementada no sistema educativo, não constitui unicamente um plano de distribuição de computadores. São claros os diversos tipos de atividades vinculadas à formação de docentes, à produção e difusão de conteúdos digitais, combinação com outras mídias e atividades presenciais.

Em segundo lugar, constatamos que a redução da desigualdade digital de acesso é uma consequência da implementação do Plano Ceibal, fundamentalmente a redução da desigualdade de acesso nas residências. Já o acesso à internet tem defasagem menos pronunciada e mais difícil de relacionar com o Plano Ceibal.

Em terceiro lugar, a partir da análise qualitativa da execução do Plano em quatro escolas de baixo nível socioeconômico em Montevidéu, foi confirmado que o acesso aos computadores tem efeitos positivos sobre as crianças em termos de inclusão social. Os elementos que dão conta disso são: o uso educativo desses recursos, o desenvolvimento das capacidades digitais por parte das crianças e dos docentes e a contribuição em alguns desempenhos curriculares (leitura e escrita), assim como motivação e inclusão de crianças com dificuldades de aprendizagem.

Sem dúvida, as melhoras gerais que se tornam evidentes na redução da desigualdade ainda escondem grandes desigualdades no interior desses dados. Mesmo assim, as contribuições à inclusão aqui mencionadas não são homogêneas entre as escolas e no interior delas.

Constatamos como as desigualdades sociais existentes incidem na capacidade de apropriação das crianças de forma diferenciada. Um indicador disso é se a criança mantém ou não o computador em condições de trabalho, pois se trata de um fator que a exclui imediatamente das atividades e, portanto, das oportunidades que esse recurso traz. Esse fator está relacionado ao interesse e à importância que os pais dão a ele, o que, por sua vez, podemos relacionar a seu nível sociocultural e a seu interesse pela educação de seus filhos em geral.

A informação quantitativa das fontes secundárias a que nos referimos na introdução não dá conta do problema das máquinas quebradas de forma temporária ou permanente. Os dados secundários também não trazem a informação sobre o uso efetivo dos computadores. Em três das quatro escolas há problemas de conexão que restringem o acesso à internet; em todas, cerca da metade dos estudantes não tem suas máquinas em condições de uso. Isso interfere nas atividades de sala de aula e não facilita o uso educativo e o aproveitamento da mesma.

A formação das professoras para explorar esse recurso e para resolver os problemas que surgem é limitada. Elas demoram para se dar conta das condições para um uso permanente para a aprendizagem. Algumas iniciativas são positivas para o estímulo da apropriação e uso educativo, como as intervenções das professoras de apoio Ceibal ou da dinamizadora Ceibal, o presente gratuito das máquinas e as oficinas com os pais.

Em suma, esses elementos recorrentes evidenciam que, para garantir o aproveitamento das TIC em contextos socioeconômicos muito desfavoráveis, são necessárias ações mais específicas que resolvam problemas que, num contexto mais favorecido, não apareceriam. O Plano Ceibal, como política universal, não previu essa diferença desde o início. Essa defasagem se reflete no aproveitamento dos recursos para cada aluno segundo suas condições de vida (como o nível sociocultural de sua casa).

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Publicado em 8 de abril de 2014

Publicado em 08 de abril de 2014

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