Cultura e oralidade nos contos tradicionais

Eduardo Beltrão de Lucena Córdula

Mestrando (Prodema/UFPB), presidente da ONG Mar, de Lucena/PB

Maria Ernestina Cornélio do Nascimento

Licenciada em Letras (UFPB), Secretaria de Cultura de Lucena/PB

Glória Cristina Cornélio do Nascimento

Doutoranda e mestra (Prodema/UFPB)

A oralidade é calcada e caracterizada pelo seu caráter; por meio de convívios e crenças próprias na comunidade, ela adquire características e intenções próprias, dependendo de como e do meio como foi difundida dentro da comunidade. Uma das principais características são as lendas e os contos, que possuem conotação poética muito importante no que se refere ao caráter sonoro.

O estudo da linguagem na transmissão do conhecimento está relacionado à cultura e à ideologia nos signos constituídos nos processos de interação social das sociedades de tradição exclusivamente oral (Geraldi, 2000). A história humana retrata que todos os povos sempre contaram histórias; mesmo quando ainda não havia a escrita, havia a palavra e a memória (Sisto, 2010). A memória sempre reflete um conhecimento anterior. "Grande parte dos saberes da cultura popular é transmitida por meio da oralidade, uma vez que não há registros escritos dos mesmos" (Moraes, 2000, p. 98). Esse processo ocorre de pessoa a pessoa, de pai para filho, de um grupo para outro, de geração para geração.

Nessa forma de comunicação, a memória social exerce papel fundamental, pois a preservação e a continuidade das tradições dos grupos dependem das lembranças dos seus membros (Figura 1). A transmissão dos valores culturais e da tradição ocorre por meio da memória social dos grupos que compartilham tempo e espaço geográfico (Moraes, 2000, p. 99).

Segundo esse autor (p. 95), "as memórias coexistem de fato em nova cultura [...] justapondo, integrando ou lutando, numa "rede de mosaico" conceitual, aspectos de distintas e contraditórias expressões na pratica e nas representações dos indivíduos e grupos". Na transmissão da tradição de geração a geração, a construção que o presente faz do passado passa a ser importante na medida em que a memória — considerada em sentido plural — é a expressão de um sentimento e de um modo de compreender e se relacionar no mundo.


Figura 1: Processos de perpetuação das características intraespecíficas das comunidades tradicionais
Fonte: Os autores, 2014.

Desse modo, para manter a sobrevivência e a integridade dos grupos, temos que valorizar a memória coletiva dentro de um contexto afetivo que surge dos compartilhamentos e interações de experiências entre as comunidades. Assim, supervalorizar essas memórias por via de sua transmissão nos coloca responsáveis por nossa história e por nossa formação (Nascimento, 2013).

É por meio das variações composicionais da oralidade que as lendas vão adquirindo novas cores, novas vestimentas, criando assim um produto coletivo de uma cultura baseada num só conto, fortalecendo suas histórias e imaginações, que são transferidas posteriormente a outras gerações com uma caracterização histórica, é a função principal do relato por meio da oralidade (Fernandes, 2011).

Portanto, cabe à sociedade resgatar esses conhecimentos que constituem a cultura popular, o folclore, e que permeiam a vida de todos nas comunidades, para trazer tal conhecimento à escola e, dessa forma, propagá-lo para que não seja riscado da memória da população e, assim, seja preservado pelas gerações presentes e futuras.

Referências

FERNANDES, Renata Beloni de Arruda. A movência como fator de adaptação das poéticas orais. Boitatá — Revista do GT de Literatura Oral e Popular da Anpoll, Londrina, n. 11, jan./jul. 2011, p. 37-46.

GERALDI, João Wanderley. Culturas orais em sociedades letradas. Educação & Sociedade, Campinas, ano XXI, n° 73, p.100-108, dez. 2000.

MORAES, Nilson Alves de. Memória e mundialização. In: LEMOS, Maria Teresa Toríbio Brittes; MORAES, Nilson Alves de (orgs.). Memória, identidade e representação. Rio de Janeiro: 7Lettras, 2000.

NASCIMENTO, Maria Ernestina Cornélio. A oralidade como veículo na transmissão dos saberes tradicionais. In: CANANEA, F. A. Sentidos de leitura: sociedade e educação. João Pessoa: Imprell, 2013, p.113-123.

SISTO, Celso. O conto popular africano: a oralidade que atravessa o tempo, atravessa o mundo, atravessa o homem. O Tabuleiro das Letras, Salvador, Edição Especial, dez. 2010. Disponível em: http://www.tabuleirodeletras.uneb.br/secun/numero_especial/pdf/artigo_nespecial_01.pdf. Acesso em: 17 ago. 2012.

Publicado em 03 de junho de 2014

Como citar este artigo (ABNT)

CÓRDULA, Eduardo Beltrão de Lucena; NASCIMENTO, Maria Ernestina Cornélio do; NASCIMENTO, Glória Cristina Cornélio do. Cultura e oralidade nos contos tradicionais. Revista Educação Pública, Rio de Janeiro, v. 14, nº 20, 3 de junho de 2014. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/14/20/cultura-e-oralidade-nos-contos-tradicionais

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