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Um projeto para ensinar Física para deficientes auditivos no Colégio Estadual Canadá

Adriana Oliveira Bernardes

Mestre em Ensino de Ciências (UENF)

Surpreendentemente, no ano de 2013 me deparei com três alunos com deficiência auditiva em sala de aula. Ensinar Física para alunos ditos normais pode ser considerado um grande desafio; como seria então para um aluno que não podia me ouvir? Que não fazia leitura labial efetiva e não conhecia o português como nós?

Definitivamente eu tinha um desafio muito maior em minhas mãos e não sabia se iria conseguir contornar os problemas. A formação do professor de Física, que hoje em dia abrange o estudo de Libras, não era focada na minha época, e a princípio me assustou o fato de serem tantas as dificuldades dos alunos ditos surdos. O texto escrito não seria eficaz, a linguagem que conheciam era a Libras. Vídeos legendados? Também não, novamente o idioma seria uma barreira. Então como resolver tal problema?

Trabalho no Colégio Estadual Canadá, de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, que no momento recebe cinco alunos com deficiência auditiva e enfrenta dificuldades para conseguir intérpretes para todas as turmas nas quais existem alunos com deficiência auditiva.


Figura 1 - Colégio Estadual Canadá, em Nova Friburgo-RJ.

A situação inicial

Os alunos com deficiência auditiva contavam com uma intérprete que conhecia Libras e lhes passava as informações de minhas aulas – que variavam, sendo expositivas com informações no quadro ou expositivas com auxílio de slides e datashow, mas sempre dialogadas; os intérpretes tentavam acompanhar e fazer com que compreendessem.

Após breve conversa com a intérprete, obtive algumas informações importantes: os DAs (deficientes auditivos) não sabiam português e, em sua maioria, tinham como linguagem a Libras; logo, o trabalho com textos no quadro ou em slides não teria grande eficácia e nem todas as palavras que eu utilizava tinham tradução para Libras. Lembro-me bem de que o termo astronáutica, por exemplo, era um deles.

Apesar da preocupação com a situação, segui meu curso, que deveria ter enfoque histórico-filosófico, segundo a orientação do Currículo Mínimo Estadual de Física. Eu percebia que, nesse momento, a comunicação entre aluno e intérprete aumentava bastante, discussões e dúvidas eram normais, pedido de mais informações sobre os cientistas, de como viviam, tentando interligar com o que conheciam de História, Filosofia e até mesmo Geografia.

Informações que contextualizem a disciplina são importantes, relações interdisciplinares nem se fala, colaboram bastante para o aprendizado do aluno. Sem dúvida, a contextualização era muito importante e bem-vinda naquele contexto.

Observei também que, quando o assunto envolvia fórmulas, a interação entre os alunos e a intérprete diminuía; era complicado para ela comunicar o que ela mesma, muitas vezes não compreendia. É... Tínhamos mesmo um grande desafio pela frente; na verdade, é bom deixar bem claro que ainda temos, apenas gostaríamos de mostrar que um cuidado especial do professor da disciplina com a questão da deficiência pode facilitar as coisas, pode ajudar quem precisa e deseja o entendimento da disciplina e trazer novas perspectivas para o seu ensino.

Diante de toda essa situação que se apresentava naquele momento pensei: o que fazer? O que sabia sobre o tema era bem limitado, mas surgiu aos poucos a ideia de trabalhar com imagens e pequenas frases e textos, já que, era possível a leitura de palavras, imagens e pequenas frases.

O ensino de Física para deficientes auditivos

Ainda que existam poucos materiais disponíveis da área de Física na escola para utilização junto ao aluno com deficiência auditiva, havia alguns trabalhos nos quais eram utilizados vídeos, outros centrados no trabalho com imagens.

Reconhecendo que haveria dificuldades no trabalho com vídeos legendados, devido às dificuldades com leitura, optamos por trabalhar com imagens e pequenos textos, disponibilizados nos programas PowerPoint e Prezi.

Compusemos uma equipe formada por mim, professora de Física da turma, uma aluna do Projeto PIBID, graduanda em Física, a intérprete dos alunos e um aluno com deficiência auditiva que, interessado no trabalho, se integrou à equipe e ficaria a cargo da avaliação do material.

Elaboração de material didático no PowerPoint e no Prezi

O material foi elaborado para o 2º ano do Ensino Médio, especificamente para o 3º bimestre, com os conteúdos do Currículo Mínimo Estadual de Física, que trabalha as seguintes habilidades e competências (Currículo Mínimo Estadual de Física):

  • Compreender fenômenos naturais ou sistemas tecnológicos, identificando e relacionando as grandezas envolvidas;
  • Compreender o funcionamento de usinas termelétricas e hidrelétricas, destacando suas capacidades de geração de energia, os processos de produção e seus impactos locais, tanto sociais como ambientais;
  • Identificar etapas em processos de obtenção, transformação, utilização ou reciclagem de recursos naturais, energéticos ou de matérias-primas, considerando os processos físicos envolvidos neles;
  • Compreender as diferentes manifestações da energia mecânica na natureza;
  • Identificar transformações de energia e a conservação que dá sentido a essas transformações, quantificando-as quando necessário. Identificar também formas de dissipação de energia e as limitações quanto aos tipos de transformações possíveis impostas pela existência, na natureza, de processos irreversíveis;
  • Analisar, argumentar e posicionar-se criticamente em relação a temas de ciência, tecnologia e sociedade;
  • Avaliar as vantagens e desvantagens dos usos das energias hidrelétricas e termelétricas, dimensionando a eficiência dos processos e custos de operação envolvidos;
  • Compreender que a construção de uma usina envolve conhecimentos sobre recursos naturais, opções de geração e transformação de energia, além dos impactos sociais causados pela sua instalação em uma região.

Uma vez preparado, o material em PowerPoint e Prezi, foi apresentado ao aluno que fazia parte do projeto que avaliou o que seria útil para sua aprendizagem.

Participação na FECTI (Feira Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação)

O trabalho foi apresentado no Museu da República (Rio de Janeiro-RJ) em novembro de 2013, na categoria interdisciplinar, tendo sido apresentado pelo aluno Douglas da Silva Knupp com a ajuda da intérprete Fernanda Venturino e pela aluna graduanda em Física do projeto PIBID Adriana Ferreira de Souza.
Na Figura 2 estão Douglas Knupp, Fernanda Venturino e Adriana Ferreira de Souza.


Figura 2 - Recursos didáticos para deficientes auditivos, sendo apresentados na VII FECTI.

A apresentação do projeto foi de extrema importância tanto para o aluno, que participou de um projeto relacionado à sua deficiência, como para a aluna de graduação em Física, que teve oportunidade de ter contato com essa questão ainda na graduação.


Figura 3 - Recursos Didáticos para deficientes auditivos: mais que um projeto de inclusão, um projeto de discussão da deficiência na escola.

A elaboração dos materiais foi benéfica para todos os alunos, tanto os que apresentavam deficiência auditiva quanto os que participavam do projeto PIBID e faziam graduação em Física, e aproximou a questão da deficiência da sala de aula.

Os materiais elaborados passarão por reformulação este ano e serão aplicados em sala de aula, com a obtenção do resultado.

A participação na FECTI trouxe grande experiência ao grupo e fez com que os participantes entrassem em contato com professores, alunos de outras escolas e pessoas em geral que se interessavam pelo tema.

O material ajudava na aprendizagem devido ao trabalho com imagens e pequenos textos. Chegamos à conclusão de que o Prezi superava o PowerPoint, devido à maior amplitude de seus recursos.

O material gerado era motivante para o aprendizado em relação ao livro e aulas expositivas, pois era um material a mais e direcionado a pessoas que enfrentavam as mesmas dificuldades que ele; a partir do momento em que for finalizado, o material será disponibilizado na internet.

O aluno Douglas Knupp, participante do projeto, interessou-se em participar este ano da elaboração de outro trabalho, envolvendo Astrofotografia, que será futuramente apresentado aqui.

Referências

BRASIL. MEC. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais – Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/CNE, 1998.

BRASIL. MEC. Secretaria de Educação Básica. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC/SEB, 2006.

BRASIL. MEC. Secretaria de Educação Básica. Necessidades especiais. Brasília: MEC/CNE, 1998.

RIO DE JANEIRO. SEEDUC. Currículo Mínimo Estadual de Física.

Publicado em 10 de junho de 2014.

Publicado em 10 de junho de 2014

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