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A poesia e Educação Ambiental em Manoel de Barros

Rodrigo da Costa Araujo

Professor universitário, doutorando em Literatura Comparada (UFF) e Coordenador Pedagógico de Língua Portuguesa da Secretaria Municipal de Educação de Macaé

Poema

A poesia está guardada nas palavras - é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado.
Sou fraco para elogios.

Manoel de Barros. Poesia Completa.

Dentro da ciência dos signos (Semiologia; Semiótica), semiose foi o termo introduzido por Charles Sanders Peirce para designar o processo de significação, a produção de significados.

A Educação Ambiental & Manoel de Barros: diálogos poéticos (2012), de Elizabete Oliveira, é um exercício criativo de leitura que aproxima, como o próprio título paratextual indica, a poesia de Manoel de Barros e a Educação Ambiental. Os diálogos, pelo viés da educação comparada, pretendem constituir fricções, semioses, saberes distintos que primam por novas perspectivas de aprendizagens.

A obra apresenta, pela matriz da fenomenologia e do surrealismo, as conexões entre Educação Ambiental e poesia como uma das vias possíveis para a criação de uma possibilidade sensível contra os poderes hegemônicos. Com essas premissas, acredita-se que a fenomenologia do imaginário contribui para a compreensão de que a poética de Manoel de Barros faz emergir uma ciranda de saberes, em movimentada dinâmica sinestésica, que pressupõe novos olhares e sentidos às redes e enredos cotidianos.

Poesia e educação, nesse caso, estimulam pensar esse cotidiano, dentro e fora do espaço escolar, dos quais fazem parte não só os seres humanos, mas tudo o que ele compõe e dinamiza das vidas e não vidas do cosmo. A Educação Ambiental e a poética, por vias da fenomenologia, vai desbravando trilhas que melhor condizem com as expectativas humanas, segundo Elizabete Oliveira.

No primeiro capítulo – O nascimento da palavra –, a autora revela sua trajetória com a arte, com a poesia de Manoel de Barros e percepções relevantes da infância. Nesse contexto, misturam-se, além desse recorte, a Educação Ambiental e o encontro com a poesia do poeta mato-grossense, traçando algumas relações entre ambos.

Rabiscos e desenhos da palavra, o segundo capítulo da obra, apresenta percepções sobre a Educação Ambiental que acolhe os diferentes, estabelecendo um diálogo com autores que também ressaltam a necessidade da busca pela sensibilidade, num mundo que prima pelos bens tecnicistas. Esses estudiosos sustentam, de certa forma, o recorte da pesquisa e leituras que estabelecem diálogos entre Educação e poesia sobre a perspectiva fenomenológica, de Gaston Bachelard.

O terceiro capítulo, Construindo Linguagens, aborda o cenário híbrido da pesquisa, com base nos diálogos bibliográfico e fenomenológico, demarcadores da opção teórico-metodológica, que apresentam outros olhares sobre o recorte estudado e coisas do mundo. O capítulo lança várias indagações que efetivam o diálogo educação-poesia, ancoradas na abordagem de estudiosos que ressaltam a importância da literatura e da fenomenologia no mundo contemporâneo.

Tessituras de sentidos, o penúltimo capítulo, descreve as características do ciclo das águas do pantanal, a fim de buscar sentidos e proximidades com a poética de Manoel de Barros e contribuir com a discussão ecológica. Esse olhar para a poesia de Barros, segundo Elizabete, aproxima-se da liberdade de Paulo Freire: poesia e educação irrompem muitas fronteiras em busca de “inéditos viáveis”. Tal compreensão permite perceber a urgência da busca por elementos sensíveis que contribuam para a superação de conceitos que nos foram imputados por décadas no que se refere no trato com a natureza. Pela/com a poesia, acredita a estudiosa, pode-se acionar os dispositivos sensoriais para colaborar com uma visão menos utilitarista da natureza e evidenciar, assim, percepções que podem contribuir com uma aprendizagem mais efetiva no cuidado com o sujeito e com as coisas do mundo.

No quinto e último capítulo, Projetando sonhos, a autora projeta esperanças para o campo da educação formal. Esse momento da pesquisa aponta considerações sobre o recorte utilizado e tenciona alçar voos que ressignifiquem o processo ensino-aprendizagem, na percepção de que a poesia pautada na visão surrealista privilegia a criação e, independentemente de sentidos, propicia múltiplas concepções do fazer pedagógico.

A Educação Ambiental, intrínseca na trajetória da obra, tal qual a poética de Manoel de Barros, não percebe o ser humano desvinculado do meio ambiente e considera, portanto, uma educação que contemple os anseios coletivos, sociais. Dessa forma, os diálogos poesia-educação que contemplam a obra despertam a possibilidade de perceber que há uma rede de sentidos possíveis que se pode criar acerca do fenômeno. Tais percepções devem ser agregadas à complementação do conhecimento e à superação das barreiras impostas ao ser humano, principalmente no que se refere ao bem-estar do indivíduo na sociedade de consumo.

Esses diálogos poéticos, fricções ou aproximações são exercícios de pensar, por meio da poesia, ações pedagógicas significativas no que dizem respeito à Educação Ambiental. Eles privilegiam o olhar inebriado sobre educação comparada, brincadeiras de bem-fazer e encontro, depositório de razões, reflexões, práticas pedagógicas que transgridem a sala de aula. O ensaio de Elisabete Oliveira exercita-se para a difusão da poesia, para dar a conhecer sobre a Educação Ambiental, pois prefere por meio dela e dos afetos promover o encontro humano com a literatura, com o cotidiano que ela proporciona.

A Educação Ambiental & Manoel de Barros: diálogos poéticos, além de exaltar a poética de Manoel de Barros, ressalta que o ambiente natural não é composto apenas de seres humanos, mas envolve outros elementos que igualmente participam do cosmo e que podem ser lidos de outro jeito, dentro e fora da escola. A vida percebida por esse prisma, portanto, envolve fatos e atos, que se imbricam com a natureza de forma natural.

Referências bibliográficas

BARROS, Manoel. Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010.

OLIVEIRA, Elizabete. A Educação Ambiental & Manoel de Barros: diálogos poéticos. São Paulo: Paulinas, 2012.

Publicado em 12 de agosto de 2014

Publicado em 12 de agosto de 2014

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