Desabafo de um educador

José Luis Monteiro da Conceição

Professor; mestre e doutorando em Educação

Segundo Brandão, ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar. Para saber, para fazer ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Partindo dessa concepção, percebe-se o quanto é importante na vida individual e coletiva dos seres humanos. Constrói-se um elo entre o homem e o saber. Mas o que está acontecendo com a nossa educação? O que estão fazendo?

Atualmente vivo muito angustiado com o descaso pela educação brasileira, principalmente no que diz respeito ao tratamento que se tem dado ao professor, aos nossos estudantes e demais profissionais da área. Sou apenas mais um brasileiro, que infelizmente desiste do ato de educar nossos queridos e estimáveis estudantes. Não sou um fraco por tomar essa decisão. Estou convicto de que a sala de aula não é o meu lugar. Não quero nem posso fazer enrolação. Estou totalmente desestimulado. Não há energético que me anime nem antídoto que transforme o meu pensamento, pois eu vivo essa experiência e hoje sei a dor de ser professor com situações grotescas.

Quanto ganha um professor? Essa pergunta não é preciso nem responder, pois tenho até vergonha de revelar em linhas escritas o paupérrimo salário de uma pessoa que luta pelos seus ideais, passa quatro anos na faculdade, procura qualificar-se e quando chega o final do mês tem que receber uma remuneração incompatível com o que tem feito dia a dia na sala de aula.

Por receber tão pouco, muitos optam trabalhar em vários lugares e chegam a ultrapassar às 44 horas de jornada de trabalho. Como suportar essa situação? E os estados físico e psicológico? O corpo não aguenta, a voz se cala homeopaticamente. A água e o pão nossos de cada dia nos mantêm vivos, até chegar um dia em que não poderemos mais suportar tanto peso. Precisamos estar bem, viver bem, sorrir bem, ganhar muito, muito e muito bem, para que não possamos mais arriscar as nossas vidas com idas e vindas aos vários lugares onde compartilhamos nosso conhecimento. Se isso não acontecer, estaremos cavando nossa própria cova.

Se Deus é por nós, quem então será contra nós, professores? Essa pergunta tem resposta. São aqueles benditos corruptos que não concordam com as nossas greves. São aqueles que pensam que o salário do professor está excelente. São aqueles que não dão a mínima condição necessária para o profissional que até tira do seu bolso para comprar um apagador, um quadro branco e caneta piloto. São aqueles que dizem que a educação se faz só com papel e lápis. Quero muito mais que isso. Quero respeito e atenção para a classe dos professores. Esse, sim, é o verdadeiro político da educação, que faz e reconstrói histórias. Que muda a realidade das nossas crianças. É esse professor que é médico, psicólogo, pai, mãe, fisioterapeuta; é simplesmente tudo dentro da sala de aula.

Fico revoltado quando se juntam vereadores para votar se aprovam ou não aumento do nosso salário. Não tem que votar. Isso é uma obrigação que já deve ser automática. É um dever a ser cumprido. Agora, precisamos votar sim, em pessoas que sabem da nossa luta para sobreviver em um mundo injusto e não tão igualitário.

Ainda não podemos esquecer os funcionários de serviços gerais, que trabalham 40 horas e recebem um salário mínimo. Que horror! Lavam, passam, varrem, fazem comida, distribuem merenda, servem cafezinho e ainda aturam muitas outras coisas. Suor, cansaço, desgaste, tudo faz parte de uma vida tão difícil... Poderiam também receber um salário digno.

Imagino ainda as nossas crianças; muitas delas não têm o que comer em casa e esperam a hora do recreio para receber a merenda escolar. Esse é outro problema que enfrentamos na educação: a alimentação, em sua maioria, não traz valores nutritivos, não oferece as proteínas necessárias para o bem-estar. Alguns alimentos passam da validade, colocando em risco a saúde das crianças. Maçã, pera, uva, batata, iogurte, frango assado, macarrão, peixe, salada de frutas e outros cardápios estão distantes da realidade escolar.

Quando é que a educação terá prioridade neste país? Ou melhor, quando é que a nossa educação um dia poderá ser uma partida de copa do mundo? Pelo menos teria altos investimentos e o mundo estaria voltado para ela. Assim como os estádios passam por reestruturação, as escolas com certeza também passariam. Assim como os principais líderes da CBF se reúnem para decidir o futuro do futebol com tanta responsabilidade e empenho, os representantes políticos poderiam fazer com a educação. Assim como os jogadores são tão valorizados, os professores poderiam ser. Assim como os passes de jogadores são de milhões de reais, pelo menos os dos professores poderiam passar da casa dos R$ 985,00 por 20 horas de trabalho. Assim como os jogadores ganham chuteiras de ouro e medalhas de honra ao mérito, os professores poderiam receber pelo menos caneta, caderno, lápis, borracha para trabalhar, ao invés de tirar do seu próprio e paupérrimo salário.

Infelizmente, a realidade é esta e não poderá jamais ser camuflada, disfarçada. Coitada da educação, pois é tratada com muita picaretagem. Sofremos a cada minuto com situações constrangedoras que nos dão vergonha de entrar na sala de aula.

Referência

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é Educação (33ª ed.). São Paulo: Brasiliense, 1995 (Coleção Primeiros Passos).

Publicado em 21 de julho de 2015

Novidades por e-mail

Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing

Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário

Deixe seu comentário

Este artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.