Conselho escolar de Educação em Direitos Humanos: uma proposta de mobilização

Marcos Roberto Gomes da Silva

Especialista em Educação em Direitos Humanos (UFPB)

Josué Barreto da Silva Júnior

Mestre em Recursos Naturais (UFCG)

Hélio de Oliveira Nascimento

Professor titular do Departamento de Geografia (UEPB)

Introdução

A implantação de um conselho escolar de Educação em Direitos Humanos (CEEDH) tem como propósito desenvolver estratégias de enfrentamento às diversas formas de violação dos direitos humanos na Escola. Sua aplicabilidade fundamenta-se em questões vivenciadas no espaço escolar: os repetitivos casos de violência observados, a cultura do desrespeito e a tolerância do corpo escolar com práticas que não contribuem para o desenvolvimento humano. Sua prática é coerente, pois se baseia na introdução de questões ligadas às discussões acerca dos Direitos Humanos que orientam a aprendizagem e contemplam a formação e a preparação do educador, a fim de que esses conceitos possam ser assimilados e aplicados à prática docente, estimulando a elaboração de estratégias de enfrentamento às violações dos Direitos Humanos.

A relação da educação em e para os Direitos Humanos com a prática docente alicerça-se na ótica da função imprescindível que o professor deve exercer, pois este deve se colocar como pessoa capaz de desenvolver habilidades, como um construtor de pontes que liguem a aprendizagem com a prática cotidiana, além de mediar conflitos e desenvolver possibilidades que o educando necessita. Para a formação de um ambiente escolar de respeito e estímulo ao desenvolvimento de uma cidadania proativa, a Educação em Direitos Humanos (EDB) tem papel fundamental, pois contribui para a construção da formação inicial do indivíduo, além de nortear a escola no exercício da sua prática educativa e construir uma pedagogia que possa privilegiar toda a natureza do desenvolvimento humano como ser social, assegurando ao educando a qualificação e o respeito às suas diversidades e pluralidades.

Desenvolvimento

A Educação é parte de uma cultura que se desenvolveu ao longo da história humana e que vem se perpetuando por meio de princípios orientados em fases históricas, a saber: a educação primitiva, a oriental, clássica, medieval, humanista, cristã-reformada, realista, naturalista e nacional. Nas emanadas reformas educacionais, surgiam novos paradigmas na educação.

A Educação em Direitos Humanos é parte desse processo histórico que norteia os princípios básicos na história da humanidade. Por ter como um dos princípios a democratização do pensamento humano, a Educação tem seu alicerce calcado nos ideais de liberdade e de expressividade. Por assim ser, a Educação representa em sua natureza própria a divindade de suas mechas produzidas ao longo de um período que perpassa fronteiras como a pressuposição de fatos humanitários e a universalização do ensino.

Tal fundamento prescreve a importância da escola na construção da cidadania e instrução social, sendo esta a garantia essencial da emancipação humana. A Educação em Direitos Humanos socializa uma concepção abrangente e de universalidade, daí a sua transversalidade (Silveira, 2007, p. 82).

Para que se possa desenvolver uma cultura dos Direitos Humanos na escola, é necessário que esta enxergue o ser humano como um ser de natureza essencialmente social, assegurando ao educando a qualificação e o respeito à sua dignidade. Nesse contexto, se faz necessária uma política voltada para os ideais humanitários, ideal que forma a base da Educação em Direitos Humanos.

Prática de atos violentos, intencionais e repetidos, contra uma pessoa indefesa, que podem causar danos físicos e psicológicos às vítimas. O termo surgiu a partir do inglês bully​, palavra que significa tirano, brigão ou valentão, na tradução para o português.

São inúmeros os casos de violência e de intolerância observados no ambiente escolar, como aqueles que constituem a ótica cotidiana: os casos de bullying, desrespeito por parte de alunos, de professores e de funcionários, violência física (com repressão policial), verbal e moral, os quais não se distinguem daqueles praticados em outras esferas da sociedade. A violência se conjectura em fatores de risco ao ser humano e tem sido alicerçada na maioria das vezes por fenômenos ideológicos. São alunos que agridem professores, de forma verbal e física, professores que, por não dissociar as mentalidades dos educandos, acabam por colocá-los em situação de confronto e de revolta, colegas reféns de colegas, por haver entre ambos uma ideologia que os põe em diferentes realidades.

Tais fatos necessitam de uma ruptura da realidade almejada dentro da escola. É necessário que o aluno, dentro de seu ambiente de aprendizagem, se sinta seguro, compreendido e respeitado, a partir da política de gestão democrática, revisão e reflexão acerca das práticas didático-pedagógicas construídas pela própria instituição de ensino. Um fator concomitante – e por sinal o mais importante, que delineia tais causas – está na construção da política pedagógica, ou seja, o projeto político-pedagógico (PPP) da escola que não contempla o desenvolvimento de uma política educacional capaz de traçar metas, princípios, objetivos e ações práticas que possam mudar a realidade escolar e que traga em seu currículo a temática dos Direitos Humanos.

O PPP é um norte, um instrumento que tem em sua essência atender, organizar e refletir, apontando a tomada de decisões do processo educativo. Inclui os questionamentos essenciais acerca do projeto de escola a ser construída: Que ser humano queremos formar? Qual sociedade queremos construir? Qual o papel da Educação na manutenção/transformação social? (Amorin, 2014, p. 292).

Diante desse cenário, percebe-se que a escola não possui uma postura transversal que possa em seu currículo oferecer aos seus educandos um clima de respeito, de tolerância e de participação, que possa abolir os fatores simétricos da violência escolar e fortalecer uma cultura voltada para os Direitos Humanos.

Para tanto, se faz necessária uma intervenção, um plano de ação capaz de modificar a realidade escolar, um projeto que tenha como princípio assegurar a função social e a formação do educando, a começar com a reestruturação do projeto político-pedagógico.

Verifica-se que, no contexto escolar, é necessária a criação de uma política educacional que interfira nas ações registradas nesse espaço para que delas sejam construídos os valores éticos e morais ligados à diversidade e a pluralidade dos educandos e combater os casos de violação dos direitos humanos. Segundo Silveira (2014, p. 84),

se a escola e o seu corpo docente tiverem consciência de sua centralidade no processo de socialização cultural, para a formação de sujeitos participativos, de dignidade, autonomia, reflexividade crítica; se a escola e o corpo docente tiverem consciência do muito que podem fazer, em parceria com a comunidade, nessa direção serão valorizados e se autovalorizam. E causarão temor a muitos, sem empunhar uma única arma, exceto a do conhecimento e inteligência.

A criação de um CEEDH constitui-se em elo entre comunidade e escola; proposta em nosso Plano de Educação em Direitos Humanos, seria a soma de um conjunto de ações pedagógicas que porventura não se fazem presentes na realidade escolar. Seu esboço constitui uma política de articulação em prol da conscientização, formação social, combate, inclusão e respeito. O CEEDH terá em sua formação uma equipe constituída por professores, alunos, representante do conselho tutelar, representante das igrejas, representante de pais, os quais terão a incumbência de orientar, oferecer palestras, oficinas que terão em sua finalidade combater os casos de violência, garantindo ao educando o direito de estar protegido dentro do seu espaço escolar.

A Educação em Direitos Humanos no espaço escolar representa a manifestação do pleno exercício do direito do ser humano, pois a formação social e cultural dos sujeitos requer a valorização do diálogo, a articulação da inteligibilidade e sensibilidade e a garantia e preservação dos direitos, os quais integram as diretrizes da Educação em Direitos Humanos. Esse pensamento corrobora com a descrição do Art., 206, incisos I, II e III da Constituição Federal, os quais dispõem:

O ensino será ministrado baseando-se nos princípios constitucionais de: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; liberdade de aprender [...]; ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber [...]; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino (Brasil, 1988).

Essa constatação fortalece a emergente discussão acerca da EDH no currículo escolar, pois ela representa a proposição de novos caminhos a serem percorridos, uma nova forma de enxergar o mundo e de produzir uma cultura de reflexão e de respeito. A educação tem como uma de suas belezas a capacidade de ensinar a ver; ou melhor, mostrar outras formas de ver o mundo, além da que já possuímos (Calissi, 2014, p.110). Compreende-se assim que o debate acerca da Educação em e para os Direitos Humanos é de caráter sensitivo. A escola precisa avançar, acompanhar as mudanças por que passam seus sujeitos, buscar aproximação do aluno com a realidade, considerando este como coautor da construção do conhecimento.

Para tanto, é necessário o debate de como a escola está preparada para cultivar esse pensamento. Calissi (2014, p. 12) afirma que “para educar é necessário estudar”, ou seja, o corpo docente precisa de formação voltada para os Direitos Humanos. É necessário o desenvolvimento de competências para estar preparado para o debate, para a mediação de conflitos, na “capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiado em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles” (Perrenoud, 1999, p. 7).

Outro aspecto a considerar é que o projeto político-pedagógico (PPP), a gestão democrática escolar e os princípios que as norteiam fazem partem da ótica escolar: que seres humanos queremos formar? Qual sociedade queremos construir? Qual o papel da educação na manutenção/transformação social? (Amorim, 2014, p. 292).

O PPP nos expõe diante dessa reflexão e discussão relativas às intencionalidades da escola. Sua elaboração deve ser pautada no propósito que a escola tem para seus indivíduos, para a sociedade. Ele caracteriza o eixo de articulações da gestão democrática escolar, ou seja, reafirma as necessidades da escola como protagonista dos saberes e articulação deles na aprendizagem de cada indivíduo. Seu andamento requer principalmente um núcleo teórico de diagnóstico do espaço escolar.

A inserção da Educação em Direitos Humanos no PPP representa uma dimensão coletiva de finalidades: o desenvolvimento social do ser humano, a prática da cidadania e sua qualificação pessoal, como asseguradas na Constituição Federal (1988). Assim, entendemos que a Educação em Direitos Humanos constitui uma soma de fatores necessários, entre eles o direito à Educação para a formação da vida e exercício da cidadania, sendo compreendida como uma exigência diante da finalidade da educação, o que faz necessária a organização escolar para prática e garantia de seu desenvolvimento.

Considerações finais

Abordar a temática da Educação em e para os Direitos Humanos constitui uma significativa experiência docente, uma nova forma de enxergar o verdadeiro sentido da Educação. Descreve a importância de meditar acerca da pedagogia trabalhada na escola e observar as necessidades de aperfeiçoamento da prática educativa. Identificar e combater as diversas manifestações de violações de direitos na escola. É um instrumento de apoio à política pedagógica da escola. Sua construção possibilitou a aprendizagem e compreensão de fenômenos não observados na atmosfera escolar, além de um desafio que se deve superar.

Por considerar a Educação em e para os Direitos Humanos um fator indissociável da prática educativa, espera-se que esse plano seja abraçado pela comunidade escolar, pois está alicerçado em múltiplos elementos que constituem a ótica do desenvolvimento humano, sua formação social, sua compreensão da realidade. Dentre os vários elementos que contribuem para o seu desenvolvimento, podemos considerar a tecnologia como fator indispensável para sua planificação. Por causar aproximação social e maior amplitude de informações, as quais podem ser captadas e discutidas dentro de cada contexto, ela tem sido grande aliada na construção da aprendizagem e socialização do saber. Portanto, representa um progresso da Educação em Direitos Humanos.

Referências

AMORIM, Ana Luísa. O projeto político-pedagógico e a Gestão Democrática da Escola. In: FLORES, E. C.; FERREIRA, L. de F. G.; MELO, V. L. B. (orgs.). Educação em Direitos Humanos & Educação para os Direitos Humanos. João Pessoa: Editora da UFPB, 2014.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

BRASIL, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Educação em Direitos Humanos: diretrizes nacionais. Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos, Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013.

CALISSI, Luciana. A escola como espaço de formação/transformação: estratégias metodológicas para educação em/para os Direitos Humanos. In: FLORES, E. C.; FERREIRA, L. de F. G.; MELO, V. L. B. (orgs.). Educação em Direitos Humanos & Educação para os Direitos Humanos. João Pessoa: Editora da UFPB, 2014.

PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

SILVEIRA, Rosa Maria Godoy. Ambiente escolar e Direitos Humanos. In: FLORES, E. C.; FERREIRA, L. de F. G.; MELO, V. L. B. (orgs.). Educação em Direitos Humanos & Educação para os Direitos Humanos. João Pessoa: Editora da UFPB, 2014.

Publicado em 29 de setembro de 2015

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