Juventude transviada e compartilhada
Mariana Cruz
Na época em que eu ainda era pré-adolescente, meados do anos 1980, ficava admirando as meninas mais descoladas da escola (hoje conhecidas como "populares"), que já aos 13, 14 anos fumavam no pátio. E olha que se tratava de uma escola privada e de freira, mas naquela época fumar era in. Não é à toa que por vezes me pego conversando com amigos da minha idade sobre as "bizarrices" daqueles tempos: ninguém usava cinto de segurança no banco da frente; a condução escolar muitas vezes era uma Caravan com um monte de crianças atulhadas no porta-malas sem a mínima segurança; todo mundo fumava em todos os lugares (ônibus, avião, restaurante com ar-condicionado, sala de aula); podia-se dirigir com latinha de cerveja na mão e outras coisas inimagináveis nos dias de hoje.
Nos anos 1980/90 os adolescentes frequentavam os baixos, bares e boates da cidade e bebiam cerveja livremente. Nem os estabelecimentos nem os pais eram punidos. Por outro lado, a cidade parecia ser menos violenta: eu, assim como vários amigos, já aos 10 anos voltávamos da escola sozinhos de ônibus. E lá pelos 12 já tínhamos conquistado a alforria para circular pela cidade de busão para onde bem entendêssemos. Hoje, nenhum de meus amigos daquela época deixa seus filhos pré-adolescentes pegar ônibus sozinhos. A gurizada só começa a ter certa liberdade lá pelos 14, 15 anos. Talvez isso se deva ao fato de os adolescentes terem mais objetos de valor do que outrora. Se antes as mochilas e tênis eram os alvos preferidos da pivetada, hoje acrescentamos celulares, tablets, iphones etc. Até mesmo o motivo para tais delitos ampliou-se: há vinte anos os trombadinhas queriam tais objetos para ostentar e parecer playboys, ou seja, para igualarem-se aos meninos da elite. Agora podem tanto utilizar o produto do roubo quanto vender ou trocar por drogas.
Apesar de hoje em dia os pais de jovens serem muito mais preocupados do que os pais de 20, 30 anos atrás (até porque hoje contam com celular, GPS e diversos outros aparelhos que auxiliam e intensificam o monitoramento dos filhos), alguma coisa parece escapar por entre os dedos. Como, por exemplo, quando pensamos na relação juventude & álcool da época atual. Mesmo com o excesso de proteção, a garotada está pegando tão ou mais pesado do que os jovens de antes. Muitos deles trocaram a tradicional cervejinha pela vodca com energético. Tal mistura aparenta ter inúmeras vantagens sobre a rival loira (dizem que não dá barriga, afasta o cansaço, é mais saborosa, a pessoa parece estar mais atenta), mas na realidade acredita-se que os efeitos são bem mais nocivos. O consumo excessivo dessa mistura pode causar arritmia, ansiedade, taquicardia e, em alguns casos mais extremos, até morte por parada cardíaca. Tais riscos, porém, parecem não preocupar nossos jovens, que continuam a curtir suas baladas como se não houvesse amanhã. Eles querem é se divertir e ficar bêbados – assim como os jovens das outras gerações. O problema é que, hoje, um mico que alguém pagou em poucos segundos pode ser compartilhado com milhares de pessoas. As mídias sociais não perdoam ninguém: encheu a cara? Deu vexame? Caiu? Passou mal? Sujou a roupa (isso sem falar das coisas bem mais graves)? Tudo cai na rede. Amigos, vizinhos, família e desconhecidos de todas as partes do mundo vão testemunhar involuntariamente aquela situação constrangedora. Dois simples cliques podem marcar profundamente a adolescência, quiçá a vida toda de uma pessoa.
Nem Warhol iria imaginar que os quinze minutos de fama seriam tão bizarros assim!
Publicado em 10 de fevereiro de 2015
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