Por que nossos alunos não gostam de ler?
Maria Vilani Soares
Professora da UFPI
Este texto é um exemplo do que sentem alguns professores de Português quando se encontram diante de um dos maiores desafios que precisam enfrentar na sala de aula: o desestímulo dos alunos para a leitura.
Quando se fala em ler, geralmente a reação dos alunos do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental costuma ser de repúdio e descaso. Acostumados com a obrigatoriedade de ler um livro por bimestre para preencher fichas de leitura e posteriormente fazer provas e testes, os alunos associam os livros a tarefas repetitivas e maçantes. Assim, o professor que pretenda estimular os alunos a ler precisa deixar a angústia de lado e se rebelar contra as práticas comuns no trabalho com os textos.
O problema começa muito cedo, pois se considera que a criança entra em contato com a leitura apenas quando chega à escola... A família não tem o hábito de ler... Livros não são considerados presente, muito menos nos aniversários! Então se remete ao professor, e somente ao professor, a tarefa de ensinar a ler. Assim, deixa-se de lado o que ensina Paulo Freire ao dizer que a leitura como percepção do mundo precede a leitura da palavra. Portanto, ler é conferir significação ao que nos é apresentado, o que qualquer criança faz, ainda que o texto não seja escrito.
Essa concepção de leitura não é enfatizada na escola, onde atividades com textos geralmente são mecânicas e desprezam a participação crítica do aluno. Nas aulas de Português, texto ainda é sinônimo de ampliação de vocabulário, exercício de ortografia, cópia e questões de compreensão que não avaliam mais do que a capacidade do aluno de retornar ao texto e repetir o que está escrito. Com isso, o aluno convive na escola – e jamais fora dela – com esse tratamento superficial dado à leitura: o nosso aluno não consegue ir além do texto, fazer inferências, observar as entrelinhas, perceber as intenções do autor e a estrutura do texto. Atrevo-me ainda a dizer que o aluno não consegue perceber nem suas próprias intenções; estas estão emudecidas pelas próprias “intenções” do professor. O nosso aluno está desaprendendo a ler, está desaprendendo a falar; e há ainda uma das piores constatações: “o nosso professor está desaprendendo a ensinar”. Assim, a leitura deixa de ser comunicação para transformar-se em repetição das idéias do autor. Ao contrário, a preocupação da escola deve ser a formação do leitor, geralmente, porém, na sala de aula não há espaço para esse adentramento crítico, e o leitor é relegado a segundo plano. Ocorre, pois, uma descaracterização do texto como elemento comunicativo, pois o aluno não sabe por que leu, desconhece quem escreveu, não tem ideia da finalidade da leitura e não percebe sua importância como coautor do texto, ou seja, inexiste a interação texto-leitor imprescindível para o entendimento da mensagem. Os livros com os quais os alunos têm contato passam a ser apenas material de trabalho nas aulas de Português, e sua leitura será avaliada, invariavelmente, por meio de provas e testes.
O desinteresse dos alunos diante do livro acontece devido à automatização da leitura expressa nas questões objetivas e repetitivas presentes nas avaliações. Como exemplo, temos as chamadas "fichas de leitura", que acompanham os livros paradidáticos, que são definidas por editoras e alguns professores como guias ou roteiros. Encontram-se nesses encartes exercícios referentes a personagens, enredo, clímax, desfecho, ambiente e época em que se passa a narrativa – enfim, questões que podem ser preenchidas por qualquer pessoa que tenha feito uma leitura superficial, lido um resumo ou perguntado a alguém como é a história; no caso dos alunos, comprova a experiência de anos de magistério, isso é o que mais ocorre! No entanto, avaliações desse tipo continuam a ser feitas e ainda se estranha o fato de os alunos afirmarem que detestam ler...
Na moderna sociedade multimídia, leitura e cultura costumam vir associadas, e muito se cobra do professor de Português no que concerne à elaboração de atividades de leitura e produção de textos. No entanto, ele se vê diante de uma situação nada alentadora e acaba por repetir fórmulas antigas – criando o "clima de campo de concentração" – e nem sempre tem coragem de "ousar" propor uma nova metodologia. Alternativas metodológicas na análise de textos precisam deixar de ser "terreno inexplorado".
Publicado em 24 de março de 2015
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