Produção de carta pessoal, expressando afetividade e gratidão

Letícia Miranda Medeiros

Professora da Rede Pública do Estado do Rio de Janeiro, mestranda em Educação (FFP-UERJ)

Introdução

A escrita de carta pessoal é um recurso antigo, que já caiu em desuso e foi substituído pelas mensagens eletrônicas (e-mail, aplicativos de celular como WhatsApp e Messenger, entre outros). Com o intuito de cumprir o conteúdo da disciplina Produção Textual proposto pelo Currículo Mínimo do Estado do Rio de Janeiro para o 9º Ano no primeiro bimestre, foi proposta uma atividade para que a turma 901 do Colégio Estadual Mullulo da Veiga se envolvesse na escrita de uma carta pessoal.

Após a apresentação da estrutura do gênero, do nível de formalidade da sua linguagem e da leitura de exemplos de cartas pessoais, foi feita uma proposta de avaliação: a escrita de uma carta pessoal para um professor querido. Como os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa ressaltam (Brasil, 1996, p. 32),

no processo de ensino-aprendizagem dos diferentes ciclos do Ensino Fundamental, espera-se que o aluno amplie o domínio ativo do discurso nas diversas situações comunicativas, sobretudo nas instâncias públicas de uso da linguagem, de modo a possibilitar sua inserção efetiva no mundo da escrita, ampliando suas possibilidades de participação social no exercício da cidadania.

Ao mostrar seus textos, a maior parte dos alunos dizia: “professora, amei essa atividade!”. A escrita da carta trouxe significado e a proposta foi bem aceita. Como salienta Vigotski (2001, p. 139),

se fazemos alguma coisa com alegria, as reações emocionais de alegria não significam nada senão que vamos continuar tentando fazer a mesma coisa. Se fazemos algo com repulsa, isso significa que no futuro procuraremos por todos os meios interromper essas ocupações. Por outras palavras, o novo momento que as emoções inserem no comportamento consiste inteiramente na regulagem das reações pelo organismo.

A segunda parte da atividade foi o preenchimento dos envelopes pelos alunos com o endereço da própria escola (tanto do destinatário quanto do remetente) e posterior postagem das cartas pela professora nos Correios da cidade.

Após algumas semanas, era visível a alegria e a surpresa de alguns professores por terem recebido uma carta. Alguns alunos também foram surpreendidos e ficaram muito emocionados ao receber uma carta resposta de seus professores queridos.

Segundo Freire, “o educador que escuta aprende a difícil lição de transformar o seu discurso, às vezes necessário, ao aluno, em uma fala com ele” (Freire, 1996, p. 113). A atividade da escrita de uma carta pessoal surtiu efeitos tão positivos que os próprios estudantes pediram para repetir a proposta.

Para Leite (2004, p. 137), ensinar envolve escutar o aluno, atender suas necessidades mais urgentes e a partir daí planejar ações significativas. Então, já no segundo semestre, foi proposto à coordenação pedagógica do Colégio que todos os professores de Produção Textual da escola se envolvessem no Projeto Carta de Gratidão.

Com o aceite da proposta, todas as turmas começaram a se envolver na escrita de cartas pessoais. Porém, dessa vez, todos os sujeitos da comunidade escolar poderiam ser contemplados com uma carta pessoal. O projeto, então, ganhou vida e começou a caminhar.

Justificativa

Aproveitando as datas especiais de outubro, mês em que é comemorado o dia do professor (dia 15) e do funcionário público (dia 28), a produção de uma carta pessoal foi proposta a todos os alunos do colégio para incentivar a escrita e promover a valorização do profissional da Educação, desde o porteiro, passando pelos funcionários da limpeza e da cozinha até a direção, coordenação e professores, além de criar laços de afetividade e gratidão entre os sujeitos da comunidade escolar.

Objetivo geral

O objetivo deste projeto foi levar os alunos de todas as turmas da escola a escolher uma pessoa da comunidade escolar que tenha marcado sua história e escrever pelo menos uma carta pessoal agradecendo pelos serviços prestados.

Objetivos específicos

  • Apresentar a estrutura textual do gênero carta pessoal.
  • Incentivar a produção textual deste gênero.
  • Ensinar e promover a produção do preenchimento do envelope de carta.
  • Promover gestos de afetividade entre toda a comunidade escolar.
  • Encorajar a escrita e a troca de cartas.

Material necessário

  • Papel, caneta e envelope para cada aluno da escola.
  • Caixa de papelão grande, papel pardo, cola e cartolina para a confecção da caixa dos “Correios”.

Metodologia

Para a realização dos objetivos propostos, cada professor de Produção Textual do Colégio realizou uma aula expositiva sobre esse gênero textual e como se dá o preenchimento de um envelope. Em um segundo momento, os alunos foram levados a escolher um funcionário da escola querido por eles e incentivados a escrever uma carta como agradecimento pelo serviço e dedicação.

Após a escrita da carta, cada aluno foi orientado a preencher o envelope apenas com o nome do destinatário (nome do funcionário e função) e do remetente (nome do aluno e turma), pois a coordenação da escola já havia confeccionado uma caixa de papelão escrita “Correios” e disponibilizou-a ao lado da entrada da sala dos professores para que os alunos pudessem postar suas correspondências.

Na semana seguinte ao dia do funcionário público, a caixa dos “Correios” foi aberta e as cartas foram entregues. Os relatos dos professores e demais membros da comunidade que foram contemplados com uma ou mais cartas foram de surpresa, alegria e de comprometimento com o serviço público que estavam prestando. Como diz Almeida (1999), as relações humanas são de extrema importância para o crescimento do indivíduo e da própria sociedade.

Passado o primeiro momento de emoção, os funcionários e professores que receberam as cartas foram incentivados a respondê-las, promovendo assim maior integração de todos os sujeitos envolvidos.

Considerações finais

Este projeto, que envolveu toda a escola, foi muito bem recebido por todos os participantes. Os funcionários e professores sentiram-se mais valorizados e a integração foi constatada até entre os mais tímidos, por meio da troca de abraços e palavras de agradecimento.

O objetivo de incentivo à escrita foi atingido com sucesso, pois alguns alunos pediram para escrever mais de uma carta. Aliás, foi possível observar também que conseguimos incentivar a cidadania e a reflexão a partir dos sujeitos da escola, pois tanto os alunos quanto os funcionários perceberam-se integrantes e agentes transformadores do ambiente em que vivem.

Ao repetir a atividade da escrita da carta pessoal e ao ampliá-la para que toda a comunidade escolar participasse, este projeto nasceu e se desenvolveu, e frutos de afetividade, gratidão e comprometimento foram colhidos – e a doçura dessa boa safra tem sido degustada até hoje.

Referências

ALMEIDA, Ana Rita Silva. A emoção na sala de aula. Campinas: Papirus, 1999. (Coleção Papirus Educação)

BRASIL. MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais - língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

LEITE, Sérgio Antonio da S. et al. A afetividade em sala de aula: as condições de ensino e a mediação do professor. Campinas: Papirus, 2004.

VIGOTSKI, L. S. Psicologia pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

Publicado em 19 de julho de 2016

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