Pane emocional
Claudia Nunes
Oi, tudo bem? Mais um texto e mais uma preocupação: o mundo está carregado de emoções tóxicas, que estão transformando os comportamentos de maneira rápida e violenta. As gerações mais jovens estão confusas, iludidas, perdidas e ansiosas demais. E, mesmo assim, o mundo exige deles responsabilidade social, coerência emocional, habilidades diversas e um enorme poder de resiliência. Nesse processo, a maturidade emocional se perde, se desgoverna, e o jeito é se colocar (os mais jovens) em risco atabalhoadamente, sem sequer ter a oportunidade de aprender a refletir. Tenso!
Mas, antes de compreender esse ponto das emoções, é preciso saber o que seja emoção, ou seja, é preciso saber do que estamos falando quando mencionamos a palavra emoção nas múltiplas relações construídas pelas gerações mais jovens. Então, para o contexto deste artigo, utilizarei a conceituação do prof. Robert Lent (2008): “do ponto de vista biológico, a emoção pode ser definida como um conjunto de reações químicas e neurais subjacentes à organização de certas respostas comportamentais básicas e necessárias à sobrevivência dos animais” (p. 254).
Nossas gerações mais jovens estão respondendo às suas experiências e necessidades, além das exigências alheias, acreditando estar aumentando suas chances de sobrevivência no cotidiano. Impressionante é que, cada vez mais, são as faixas etárias que inauguram os novos comportamentos, e não a maturidade emocional adquirida junto às experiências ou à memória delas. Nossas gerações mais jovens, além de ansiosas, estão muito solitárias em seus desenvolvimentos cognitivo, emocional e físico; por isso, talvez, sejam tão reativas, impulsivas, agitadas, tensas quando se deparam/lidam com determinados problemas, como limites e regras em geral.
Para sobreviver, é preciso (se) dar uma resposta todos os dias. O sentir e o dominar as emoções para a permanência no ‘aprender a conviver’ com poucos obstáculos são parte da integralização no social. Só que os excessos são imperdoáveis e negativos. Emoções positivas demais causam indiferença, soberba e alienação; emoções negativas diárias sugam as energias, roubam o futuro e cegam a visão criativa. E nossas gerações mais jovens crescendo... E nossas gerações mais jovens livres demais...
Hoje quero ‘conversar’ sobre as emoções negativas (ou tóxicas).
De antemão, alguns conselhos de Stamateas (2010, p.07-08):
se foi roubado, que sinta raiva, mas não que saia quebrando tudo; se foi traído, que sinta decepção, mas não que nunca mais confie em ninguém; se foi humilhado, que sinta vergonha, mas não que deixe de correr riscos; se alguém mentiu, que sinta desconfiança, mas não que sinta ressentimento; se foi intimidado, que sinta medo, mas não que fique parado; se não foi amado, que sinta rejeição, mas não que procure ser rejeitado; se perdeu ou se frustrou com alguma coisa, que sinta tristeza, mas não que permaneça chateado.
Ou seja, para emoções tóxicas, equilíbrio emocional, crença em si mesmo e intensa escuta sensível.
As emoções negativas podem favorecer revisões de comportamento e a instalação de um crescente esforço para se superar em outra oportunidade. Ou seja, “sistemas neurais mais elaborados permitem respostas bastante variadas, facilitando a adaptação do ambiente” (Lent, 2008, p. 254). Mas, de outra forma, também podem evaporar a qualidade dessas respostas porque, no caso dos nossos jovens, há forte contexto repressivo dos seus sonhos, desejos e fantasias. Ou seja, eles não se conhecem, eles apenas refletem o alheio.
De acordo com o que venho observando em minhas salas de aula do Ensino Médio noturno, as gerações mais jovens (de 15 a 23 anos) são grandes corpos-esconderijos de emoções cujo ponto final são as confusões em que se metem, as apatias em relação a quase tudo, a descrença em sua própria potencialidade, a superficialidade dos projetos pessoais e, principalmente, a imensa reprodutibilidade do status quo de onde emergem e crescem. E, como corpos-esconderijos, são seres ansiosos sem tempo para emoções positivas.
Em minha escola, estamos no período de provas, organização de notas e conselhos de classe. É o período de maior agitação entre as turmas. Mesmo com grande infrequência, é o período em que mais alunos aparecem pelos corredores à procura do seu resultado. Eles sofrem. A ansiedade é quase palpável. Não interessa neste artigo se eles realizaram ou não todas as atividades ao ponto de se reconhecerem em suas notas baixas ou não. Importante aqui é entender outra inquietude: a inquietude inatural, aquela que reflete uma crescente aculturação de nossos jovens e das suas emoções, hoje, muito fora do foco: a própria aprendizagem. É uma pena...
Mente e corpo estão fora do prumo. É o período de dor de cabeça, mal-estar, suores fora de hora etc. Mas também, em muitos grupos, é apenas mais um momento sem gosto ou sem cor: emoções tóxicas também são paralisantes. E elas me preocupam. Cada vez mais a ansiedade se transforma em preguiça mental/emocional. Os alunos assumem, talvez como defesa inconsciente, a descrença em/de si mesmo e, por outro lado, procuram avidamente ferramentas, exemplos e heróis de toda sorte. Como no Pacman, eles estão ávidos e famintos, só não sabem do que ou por quê. Sem perceber, comprometem o próprio futuro e favorecem o crescimento de diferentes transtornos que incluem pânico, obsessão-compulsão e diferentes tipos de fobias etc. e/ou transtornos mentais, ou seja, alterações mórbidas do comportamento associadas a angústia expressiva e/ou deterioração do funcionamento psíquico global.
Pane emocional total!
Diante de emoções negativas contínuas, o organismo reage em cascata. As emoções não são apenas elementos imateriais, elas têm correspondência bioquímica. Ao irrigarmos o corpo com determinados elementos negativos (cortisol), há adoecimento físico e mental, mudança de comportamento e desordem emocional. Desta feita, a escolha será sempre pela sobrevivência, de novo, mesmo não sendo os mais fortes. O cérebro primitivo falará mais alto e forte! E aí surgem as indisciplinas, as agressividades, as falas inconsequentes, as malandragens (tentativas constantes de burlar as regras ou acordos) e, em outro viés, a falta de atenção, de concentração e de foco.
Parece-me que, inconscientemente, esses jovens estão em processo de desligamento emocional, tal a força da pane eletroquímica (emocional) envolvida em seu crescimento. As descargas atencionais giram em torno de outros interesses, como ganhar dinheiro rápido, sexo constante, participação em baladas (noitadas), mundo tecnológico atualizado e mais interativo, visual descolado, dentre outros. O que fazer?
Bom, se há pane emocional, a perspectiva é de manutenção preventiva; daí é preciso aconselhar mudança de comportamento para professores e pais:
Para professores
- Revisitação das formas de ensinar;
- Compreensão de como esse aluno aprende;
- Entendimento das mudanças emocionais;
- Introdução de desafios contextualizados;
- Incentivo à proatividade e à criatividade;
- Inserção do contexto de interesse dos alunos nas atividades;
- Presença real de uma escuta sensível (diálogo);
- Cumprimento dos acordos pedagógicos.
Para pais
- Percepção real de que os filhos cresceram;
- Valorização das descobertas e experiências, principalmente as emocionais;
- Aceitação das diferenças de pensamento com paciência e respeito;
- Presença, proximidade e diálogo constante;
- Adequação e pertinência em relação às cobranças e/ou aos limites;
- Afeto, carinho, humor: escuta mais sensível;
- Liberdade e confiança, de acordo com a faixa etária e a maturidade;
- Maior entendimento em determinadas crises/momentos;
- Hierarquização das relações de forma clara.
A geração mais jovem precisa de espaço, compreensão e descanso, tempo de descanso, para reorganização (neuroplasticidade) das informações e construção da memória de longo prazo. Talvez ai o cotidiano se desvele e haja reações diferenciadas aos acontecimentos da escola e da vida, além da compreensão de que aprender gera mais liberdade do que a própria liberdade.
Referências
LENT, Robert. Processamento emocional do cérebro.In: ______. Neurociência da mente e do comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008, p. 254-269.
STAMATEAS, Bernard. Emoções tóxicas: como se livrar dos sentimentos que fazem mal a você. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2010.
Publicado em 30 de agosto de 2016
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