Reflexões sobre a formação de professores
Anderson Cezar Lobato
Mestre em Educação (UFMG)
Diante do mundo de informações na atualidade, consideramos desejável que o ensino contribua para que o estudante seja crítico e reflexivo, tenha capacidade de julgamento das informações provindas da mídia, da própria escola, de informações do cotidiano e exercite seu papel de cidadão, sendo capaz de tomar decisões autonomamente. Redimensionar o ensino passou a ocupar as discussões e estudos de professores em todas as áreas do conhecimento; “o que é ensinado” e “como é ensinado” são foco nas discussões.
Pesquisas relacionadas ao ensino, entre elas as desenvolvidas por Bireaud (1995), Maldaner (2000), Trevisan e Martins (2006) e Rosa (2003) indicam que ainda prevalecem práticas em que o professor utiliza em sala de aula, na grande maioria das vezes, métodos de ensino e técnicas que priorizam aulas expositivas, nas quais o professor transmite as informações e o aluno as recebe passivamente e, em seguida, realiza atividades propostas na forma de exercícios.
Várias pesquisas apontam que na formação inicial “não há lugar para a reconstrução criativa do conhecimento, ciência, ensino, aprendizagem, papel do professor, papel do aluno, aula, programa de ensino” (Maldaner, 2000, p. 389). Fortes críticas têm sido feitas à pouca relação entre saberes teóricos e saberes práticos dentro dos cursos de formação de professores, conforme mostra Schnetzler ao afirmar que “os currículos de formação profissional tendem a separar o mundo acadêmico do mundo da prática” (2002, p. 16-17). Segundo Macedo (2011), é importante que os licenciandos compreendam que os conhecimentos teóricos estudados no curso não estão “desconectados dos desafios existentes no âmbito do sistema escolar, tendo em vista que servirão como eixos auxiliadores para o docente compreender o seu trabalho pedagógico” (Macedo, 2011, p. 3). É necessário, então, que seja criado o espaço de reflexão sobre o papel do professor.
A formação do professor, inicial ou continuada, deve ter atenção maior no campo educacional, uma vez que ele é um dos elementos chave para dar apoio às reformas na escola. Para que o trabalho do professor produza resultados efetivos, é preciso que ele acredite no que faz, no que fala e principalmente reflita sua própria prática. Nessa perspectiva, “a reflexão é um processo que ocorre antes, durante e depois da ação do professor, constituindo um processo de reflexão na ação e sobre a ação” (Miranda, 2006). A compreensão das diferentes teorias de aprendizagem e da sua inserção nas instituições de ensino é importante para os educadores. Um melhor entendimento dessas teorias de aprendizagem pode contribuir na atuação dos professores em sala de aula.
Há consenso entre os pesquisadores em educação de que a construção do conhecimento é um processo de intensa negociação de significados entre alunos e professores. Em sala de aula, quando os conceitos científicos formais são explicados por meio de palavras, as abstrações passam a figurar na mente de quem aprende. Vygotsky trata do processo de “negociação” de significados e, nesse sentido, a sala de aula é entendida como um espaço/tempo privilegiado para que essa negociação aconteça.
Sendo assim, cabe ao professor facilitar esse complexo processo de ensino argumentativo. É desejável que os professores atuem na superação do paradigma educacional da “transmissão”, por um paradigma de mediação que privilegie a aprendizagem. Para tanto, buscando alcançar os objetivos escolares, o professor precisa ser esclarecido quanto ao papel e a importância das interações sociais para o conhecimento e para a sala de aula, para que ele seja capaz de compreender e exercer melhor sua tarefa, que é orientar os alunos a se apropriar do saber escolar, interagindo com eles e favorecendo as interações entre eles (Davis et al., 1989). O uso de estratégias de aprendizagem e o planejamento das aulas podem auxiliar o professor na condução desse processo.
Cabe ao professor cuidar de sua formação. Segundo Alarcão (1996), quando pensamos na formação de professores, essa reflexão está diretamente relacionada ao diálogo: o diálogo consigo próprio e com os outros. Esse “outros” inclui os que, antes de nós, construíram conhecimento que hoje usamos como referência. Donald Schön e Antônio Nóvoa são referências na formação de professores e de professores reflexivos. Schön (1983, 1987, 1995) representa um marco no entendimento que hoje se tem sobre a reflexão, com ideias que influenciaram e influenciam o campo da educação, principalmente na formação de professores. Nóvoa defende que essas instituições sejam um lugar de reflexão sobre as práticas, propiciando aos professores em formação se entender como profissionais produtores de saber e de saber fazer.
Para que o professor tenha como prática a reflexão sobre aquilo que faz e aquilo que acontece em sala de aula, é necessário que não só faça o exercício individual de reflexão como também que os cursos de formação inicial o preparem para tal.
Estudos como os realizados por Quadros et al. (2005) e Nóvoa (1997) colaboram para a ideia de que o desenvolvimento de concepções sobre ser professor é um processo que ocorre ao longo da vida, por um longo caminho que vai das primeiras experiências escolares, passa pelos mestres que fizeram parte desse percurso e pelo curso de licenciatura. Portanto, os momentos de reflexão sobre a prática podem fazer com que sejam identificadas as concepções do papel do professor, do estudante e de tudo o mais que circunda o ambiente de ensino.
Referências
ALARCÃO, I. Professores reflexivos em uma escola reflexiva. 7ª ed. São Paulo: Cortez, 2010.
ALARCÃO, I. (org.). Formação reflexiva de professores – estratégias de supervisão. Porto: Porto Editora, 1996.
BIREAUD, A. Os métodos pedagógicos no ensino superior. Porto: Porto Editora, 1995.
DAVIS, C.; SILVA, S. S. A. M.; ESPÓSITO, Y. Papel e valor das interações sociais. Caderno de Pesquisa, v. 71, p. 49- 59, 1989.
MACEDO, Valcinete Pepino de. Formação de professores do contexto das mudanças educativas. 25º Simpósio Brasileiro e 2º Congresso Ibero-Americano de Políticas e
Administração da Educação, 2011. São Paulo: Anpae, 2011.
MALDANER, O. A. A formação inicial e continuada de professores de química. Ijuí: Editora Unijuí, 2000.
MIRANDA, Marília G. de. O professor pesquisador e sua pretensão de resolver a relação entre a teoria e a prática na formação de professores. In: ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de (org.). O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores. Campinas: Papirus, 2006. p. 129-143.
NÓVOA, A. (coord.). Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1997.
QUADROS, A. L.; CARVALHO, E; COELHO, F. S.; SALVIANO, L.; GOMES, M. F. P. A.; MENDONÇA, P. C.; BARBOSA, R. K. Os professores que tivemos e a formação de nossa identidade como docentes: um encontro com nossa memória. Ensaio, Belo Horizonte, v. 7, n. 1, p. 9-18, 2005.
SCHNETZLER, Roseli Pacheco. A pesquisa em ensino de Química no Brasil: conquistas e perspectivas. Química Nova, São Paulo, v. 25 , p. 14-24, maio 2002.
SCHÖN, D. The reflective practitioner. London: Basic Books, 1983.
______. Educating the reflective practioner. San Francisco: Jossey-Bass, 1987.
______. Formar professores como profissionais reflexivos. In: NOVOA, Antonio (coord.). Os professores e sua formação. 2ª ed. Lisboa: Dom Quixote, 1995. p. 77-92.
TREVISAN, T. S.; MARTINS, P. L. O. A prática pedagógica do professor de Química: possibilidades e limites. UNIRevista, v. 1, n. 2, abr. 2006.
VIGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. (org. Cole et al.) Trad. José Cipolla Neto, Luis Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
______. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
Publicado em 26 de abril de 2016
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