Paródias e videoclipes como recurso didático na aprendizagem significativa do conteúdo da tabela periódica

Karla Jeane Vilela de Oliveira

Especialista em Ensino de Biologia (UPE) e professora da rede pública estadual de Pernambuco

Introdução

A música está presente em nossa vida de forma tão acessível que não há como dizer que não escuta, pois está nos celulares, no aparelho de som, no carro, na TV e até no carro de propaganda que passa na rua. Então ouvimos música mesmo que não tenhamos tempo de apreciá-la. Brito (2003, p. 31) diz que

é difícil encontrar alguém que não se relacione com a música [...]: escutando, cantando, dançando, tocando um instrumento, em diferentes momentos e por diversas razões. [...] Surpreendemo-nos cantando aquela canção que parece ter “cola” e que não sai da nossa cabeça e não resistimos a, pelo menos, mexer os pés, reagindo a um ritmo envolvente [...].

Considerando esse recurso, pode-se empregá-lo na assimilação de conteúdos disciplinares dinamizando a aula e trabalhando de forma prazerosa, levando o aluno a uma aprendizagem significativa, que ocorre quando um novo saber é adquirido mediante mobilização em relacionar o que se sabe de acordo com suas vivências e a nova informação (Ausubel et al., 1980). A proposta de usar a música como estratégia de aprendizagem revela envolvimento na elaboração da atividade, tornando a relação afetiva e cognitiva necessária para um bom desempenho. Pela música o aluno pode demonstrar diferentes habilidades, como propõe Howard Gardner com a Teoria das Inteligências Múltiplas: ele concluiu que há sete tipos de inteligência: a lógico-matemática, a linguística, a espacial, a físico-cinestésica, a interpessoal, a intrapessoal e a musical.

O que se observa é que o aluno pode trazer várias habilidades consigo, mas ainda inertes por não terem sido estimuladas. A música, em suas inúmeras formas, quando utilizada em sala de aula desenvolve diferentes habilidades, como o raciocínio e a criatividade; e promove a autodisciplina, além de desenvolver a linguagem oral, a afetividade, a percepção corporal e a socialização.

Trabalhando com paródias como recurso didático, pode-se contemplar as diversas inteligências propostas por Gardner. Além disso, a criação de paródias e de videoclipes também pode ser vista como instrumento de avaliação. Há alunos que desenvolvem melhor suas habilidades quando o instrumento de avaliação não é a prova; então professor e aluno passam a ter atividades divertidas e ao mesmo tempo didáticas e de cunho avaliativo, considerando a metodologia utilizada.

Os alunos sempre sentem dificuldade em estudar a tabela periódica, por causa da forma tradicional de ensiná-la; sendo assim, é positivo buscar alternativas que dinamizem e mobilizem os aprendentes a um processo de aprendizagem significativa com uma atividade que os fascine, como a criação de paródias e videoclipes contemplando várias habilidades e despertando maior interessante pela disciplina de Química e seus conteúdos.

Diante do exposto, este estudo teve por objetivo analisar o uso da música, na forma de paródia, como estratégia pedagógica nas aulas de Química para a aprendizagem do conteúdo tabela periódica.

As dificuldades que alguns professores apresentam com o ensino da Química envolvem o desinteresse, por parte dos alunos, por não saberem como relacionar os conteúdos vistos em aula com o cotidiano. Diante dessa problemática, fazem-se necessárias modificações na metodologia aplicada.

As propostas mais inerentes para o ensino de Química têm como um dos pressupostos a necessidade do envolvimento ativo dos alunos nas aulas, em um processo interativo professor-aluno, em que as concepções pessoais dos alunos sejam contempladas. Isso significa criar oportunidades para que eles expressem como veem o mundo, como entendem os conceitos, quais são as suas dificuldades (Santos et al., 2004).

O professor, como mediador do conhecimento, deve buscar alternativas para viabilizar a aprendizagem de modo que o aluno construa conceitos fundamentados no que assimila na sala de aula e onde estão empregados no cotidiano. O uso da música na educação vem desde cedo, quando consideramos as canções que ouvimos dos nossos pais, avós, tias e da professora da Educação Infantil. A música estabelece um vínculo afetivo, desperta emoções, estimula a criatividade. Segundo Felix et al. (2014, p. 18), muitos estudos na atualidade mostram como a música tem se tornado uma ferramenta de ensino nos diferentes graus da educação.

Portanto, vemos a importância de o professor rever suas práticas, utilizando meios lúdicos, como a elaboração de paródias, e como elas podem ser um recurso de formação construtivista. O construtivismo é defendido por muitos estudiosos, como Piaget, Vygotsky, Paulo Freire, que relatam o aluno como responsável pela construção do seu conhecimento; é ele quem determina quando, como e o que aprender de forma singular, respeitando seu tempo e seu potencial. Porém a figura do professor como facilitador dessa construção é de fundamental importância no cerne do ensino-aprendizagem. Para Antunes (2008, p. 2), o professor como mediador “proporcionará um momento em que suas relações produzirão resultados significativos para a aprendizagem, deixando o ensino mais proveitoso, estimulante e, por que não, de fácil compreensão”.
Nesse contexto, o professor, fazendo uso de paródias como estratégia de ensino, ressalta a socialização, a correlação do evento com o cotidiano e o exposto em sala de aula como conteúdo programático. A contextualização, dando a letras de músicas já existentes conceitos químicos voltados ao conteúdo de tabela periódica, requer abordagem sistêmica do assunto, pesquisa e relação delas com a letra da música original e sua melodia. Além das várias habilidades que a construção da paródia implica, é também um fator de ordem cultural, quando há socialização dos mais variados estilos musicais, o que valoriza o caráter social do aprendente e suas relações intra e interpessoais na construção do saber. “Toda relação de saber se dá a partir da interação do sujeito com os objetos de conhecimento, da relação com os outros e da relação consigo próprio” (Charlot, 2000, p. 46).

Da mesma forma que a paródia, o uso de recursos audiovisuais mobiliza o estudante à aprendizagem, pois apresentam imagens concretas que prendem a atenção daqueles que visualizam e ouvem, sendo também uma estratégia didática para expor conteúdos. Quando podem ser produzidos pelos próprios alunos, esses recursos desenvolvem outras habilidades.

O que colabora para a aprendizagem não são apenas as ferramentas diversificadas, mas os objetivos que se pretende alcançar. De nada adianta a mudança das situações didáticas se os objetivos não forem estabelecidos, pois, apesar de serem recursos divertidos e dinâmicos, têm uma práxis educativa, mesmo com caráter de descontração o que os implicam também como instrumentos de avaliação, pois se verifica a aprendizagem de forma qualitativa e objetiva numa formação integral. De acordo com Correia e Chambel,

o vídeo tem sido utilizado em contextos educativos de diversas formas: para motivação; ilustração de conceitos ou experiências; como simulações realistas de processos não observáveis na realidade ou difíceis de descrever verbalmente; como veículo principal da informação, por exemplo através de documentários ou apresentando professores conceituados; ou ainda como ferramenta para apoiar experiências em processos de aprendizagem (Correia, Chambel, 2004).

Os videoclipes no lócus em estudo vislumbram a interação do educando com a tecnologia, quando ele reflete, cria, dirige e edita os vídeos, que auxiliam a aprendizagem, numa perspectiva sociointeracionista, inserindo a tecnologia no meio educacional, tendo em vista novos métodos que contemplem objetos tecnológicos para uma aprendizagem significativa.

Para tanto, levando em consideração o que há nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM), há necessidade de superação da visão conteudista do ensino de Química; então um dos direcionamentos para essa mudança está nas novas metodologias e sua relação com o cotidiano, mobilizando um saber químico fundamentado e colocado em prática de acordo com as relações estabelecidas no processo educacional.

Esta pesquisa de caráter descritivo e qualitativo tem como propósito colaborar com a disseminação de metodologias diferenciadas no ensino-aprendizagem de Química. Baseia-se numa prática sobre essa problemática vivenciada em turmas de primeiro ano na Escola de Referência em Ensino Médio Deolinda Amaral, no município de Lajedo/PE. A princípio, os alunos assistiram a aulas com o conteúdo de tabela periódica, abordando desde a história até as propriedades periódicas, dando destaque para a importância dos elementos químicos no cotidiano. A exposição foi realizada por meio de slides, considerando exemplificações em meio a explicações. Após tal procedimento da práxis educativa, os alunos foram divididos em grupo; cada um recebeu uma família da tabela para a realização de pesquisa seguindo estes critérios: características da família, elementos, símbolos e relevância deles no cotidiano.

Ao realizar a pesquisa os alunos foram direcionados a criar uma paródia integrando os aspectos pesquisados e a música da escolha do grupo. Um dos parâmetros para avaliar a paródia, já que também foi usada como instrumento avaliativo, foi a contextualização das aplicações dos elementos químicos na letra da música selecionada.

As paródias foram apresentadas na sala de aula; cada grupo apresentou sua paródia e entregou uma cópia para cada aluno. Posteriormente, como complementação da situação relatada, mas não deixando de ser uma nova situação didática, os alunos criaram videoclipes nos quais eles aparecem cantando a paródia e realizando coreografias com cenários e figurinos.

As imagens a seguir indicam cada momento do processo, desde a elaboração até a culminância da atividade exitosa. As Figuras 1 e 2 mostram os alunos construindo as paródias; nas Figuras 3 e 4 está a exposição na sala de aula; a Figura 5 retrata a participação da turma na apresentação; e na Figura 6 há a imagem da abertura de um dos videoclipes.


Figura 1: Construção das paródias
Fonte: A autora.

Figura 2: Construção das paródias
Fonte: A autora.


Figura 3: Apresentação de paródias
Fonte: A autora.


Figura 4: Apresentação de paródias
Fonte: A autora.


Figura 5: Participação da turma nas apresentações
Fonte: A autora.


Figura 6: Imagem de abertura de um dos videoclipes
Fonte: A autora.

Os Quadros 1 e 2 apresentam a letra algumas paródias, com o nome da música original; percebe-se nos dois a diferença no gosto musical e a apropriação da letra para contextualizá-la, de acordo com o tema proposto a cada grupo.

Quadro 1: Paródia da família 4A com a música Ele é o bom, de Roberto Carlos.

Quadro 2: Paródia da família 2ª, com a música original Lepo, lepo, da banda Psirico.

Resultados

O levantamento de referenciais teóricos e a pesquisa de campo, considerando a prática profissional, serviram de embasamento para o objeto de estudo, considerando a necessidade de contextualização de conteúdos vivenciados na sala de aula no ensino de Química. Buscar estratégias que estimulem o mobilizar, o dinamizar e a diversão sem perder o foco nos objetivos direcionados ao conteúdo programático traz um novo significado para ferramentas como as paródias e a produção videoclipes no estudo de conteúdos taxados como enfadonhos.

Pode-se observar que trabalhar com o lúdico proporciona uma mudança na visão do aluno e do professor, no que tange às relações estabelecidas, no processo de socialização e no desenvolvimento de competências e habilidades, destacando uma forma prazerosa de aprendizagem. Nesse contexto, o professor reformula sua metodologia e o aluno desperta sua vontade de aprender, pois vê uma valorização de habilidades talvez antes desconhecidas. “Nascer é ingressar em um mundo no qual se está submetido à obrigação de aprender. Ninguém pode escapar dessa obrigação, pois o sujeito só pode ‘tornar-se’ apropriando-se do mundo” (Charlot, 2000, p. 59). E quando esse “apropriar-se do mundo” for trabalhado de maneira lúdica no processo educativo, haverá mais aprendizagem significativa, mais interesse pela disciplina e pelo assunto. São notáveis o empenho e a euforia por serem atividades em que o aluno aprende com diversão. Constata-se que estes recursos facilitam a mediação do docente e a construção do conhecimento por parte do discente.

Considerações finais

O presente artigo trouxe uma experiência de abordagem de conteúdo de forma dinâmica e contextualizada, mostrando mudança na prática pedagógica, considerando os objetivos propostos e a mobilidade do educando e a mediação do professor na construção do saber.
A vivência de práticas de produção de sentido e a experiência com diferentes formas e possibilidades de produção do conhecimento qualificam a formação do estudante para buscar uma interface com o mundo do trabalho na sociedade contemporânea. As atividades desenvolvidas contribuem para a expansão da abordagem do conteúdo, despertando no educando o seu lado criativo, artístico e interacionista, significando sua atuação no âmbito educacional e social, expandindo seu protagonismo e ressaltando as reflexões que o mediador (professor) pode fazer para sua práxis no que se refere a questões metodológicas, refazendo seu planejamento, incluindo atividades inovadoras que modificam o cenário de atuação docente precisamente no ensino de Química.

Redirecionar a prática pedagógica influi diretamente na formação dos aprendentes, instigando a pesquisa, o raciocínio, recriando concepções e o interesse em aprender conteúdos programáticos com novos métodos que transformam a sala de aula em um espaço mais acolhedor, por desenvolver a afetividade e com isso, estimular o gosto pelo aprender.

O uso de paródias e criação de videoclipes demonstra como esses recursos podem cooperar para uma aprendizagem significativa e novas perspectivas na prática profissional, coligando fatores internos e externos do contexto escolar e contribuindo satisfatoriamente na formação integral e qualitativa do processo educacional.

Referências

ANTUNES, Simone Fraga Freitas. O papel do professor e as dificuldades de ensinagem. 2011.

AUSUBEL, D. P. et al. Psicologia educacional. Rio de Janeiro: Interamericana, 1980.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília: MEC/Semtec, 1999.

BRITO, Teca Alencar de. Música na educação infantil: proposta para a formação integral da criança. 2ª ed. São Paulo: Peirópolis, 2003.

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Trad. Bruno Magne. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

CORREIA, Nuno, CHAMBEL, Teresa. Integração multimédia em meios e ambientes aumentados nos contextos educativos e culturais. Arte e Ciência, nº 2, maio 2004. Disponível em: http://www.multiciencia.rei.unicamp.br/artigos_02/a_02_.pdf. Acesso em: 21 ago. 2008.

GARDNER, H. Estruturas da mente – a teoria das inteligências múltiplas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.

FÉLIX, Geisa Ferreira Ribeiro. A música como recurso didático na construção do conhecimento. Disponível em: http://www.cairu.br/revista/arquivos/artigos/2014_2/02_A_MUSICA_RECURSO_DIDATICO.pdf. Acesso em 17 jun. 2016.

SANTOS, Daniel de O.; SANTANA, Rafael de Jesus; ANDRADE, Djalma; LIMA, Patrícia S. de. Experimentação: contribuições para o processo de ensino aprendizagem do conteúdo de Cinética Química. 30ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química: 2004.

Publicado em 19 de setembro de 2017

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