Metodologia de Projetos no ensino básico e tecnológico: uma educação emancipadora

Ricardo Bussons da Silva

Mestrando em Educação (Universidade Federal de Rondônia)

Suelene da Silva Batista

Mestranda em Educação (Universidade Federal de Rondônia)

Marinaldo Felipe da Silva

Doutor, professor do Mestrado Profissional em Educação (Universidade Federal de Rondônia)

Introdução

A fim de aplicar a Metodologia de Projetos na disciplina de Automação Predial do curso integrado em Eletrotécnica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia (IFRO)/Campus Porto Velho – Calama, com o objetivo de garantir aos alunos o direito a uma educação emancipadora, propôs-se a eles o desenvolvimento de um protótipo de sistema de automação predial de sua escolha, no qual eles determinariam como e quando desenvolveriam as etapas do projeto. Como consequência disso, ocorreu uma alteração do papel do professor, que deixou de ser o detentor do saber e tornou-se um orientador, responsável por auxiliar os alunos ao longo de suas pesquisas. Dessa forma, observou-se que a adoção da Metodologia de Projetos contribuiu para uma aprendizagem significativa do conteúdo abordado, reunindo conhecimentos da formação profissional e humana dos alunos, rompendo com os paradigmas da alienação que muitas vezes rondam o ensino técnico.

A questão da alienação ocupou grande espaço nas ideias de Karl Marx (1818-1883). Conforme Mészarós (2006) aponta, a alienação é mais uma maneira que o sistema capitalista tem de convencer as pessoas a aceitar os paradigmas do capitalismo.

Desde os estudos de Marx, muitos pesquisadores vêm buscando uma solução para alcançar uma educação que se distancie da alienação e se aproxime de um modelo em que não sejam formados apenas trabalhadores, mas também pessoas politizadas, conscientes de suas ações. Um desses modelos é a Metodologia de Projeto, que sozinha soluciona praticamente todos os problemas da educação alienada apontada por Marx.

Neste artigo, será apresentada uma breve análise sobre alienação e Metodologia de Projetos, seguida de um estudo realizado com alunos do 3º ano do ensino técnico integrado em Eletrotécnica do IFRO, em que se utilizou essa metodologia em uma das disciplinas do eixo técnico do curso.

Revisão bibliográfica

Nesta seção serão apresentados os aspectos teóricos diretamente relacionados com o trabalho desenvolvido, detalhando os assuntos principais do estudo em questão e baseando-se nas diferentes abordagens pesquisadas na literatura.

Crise na educação

É indiscutível que a educação se encontra em crise. Prova disso é a grande quantidade de estudos sobre do tema (Mészarós, 2006, p. 272). Para Marx, esse problema estende-se além dos muros das instituições de ensino. Segundo ele, o papel assumido pela educação está intimamente relacionado aos preceitos característicos de uma sociedade capitalista; nesse sentido, a educação tornou-se um novo mecanismo de interiorização do capitalismo e de alienação humana e tem condicionado educandos a buscar conhecimentos cada vez mais específicos acerca das necessidades do mercado.

A diferença básica entre homens e animais não é a sua capacidade de pensar propriamente dita. De acordo com Paro (2006), a principal diferença entre o animal homem e outros animais é a necessitar do supérfluo que o primeiro possui. Enquanto os animais adaptam suas necessidades ao meio onde vivem, o homem adapta o meio onde vive às suas necessidades, e, à medida que ele modifica o meio, sua liberdade aumenta diante da natureza; consequentemente, melhor é o seu viver.

Podemos distinguir o homem dos animais pela consciência, pela religião ou por qualquer coisa que se queira. Porém o homem se diferencia propriamente dos animais a partir do momento em que começa a produzir seus meios de vida, passo este que se encontra condicionado por sua organização corporal. Ao produzir seus meios de vida, o homem produz indiretamente sua própria vida material (Marx; Engels, 1974, p. 19).

Ora, o ato de interferir sobre a natureza, adequando-a em função de suas necessidades humanas é que se tem como trabalho.

A essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou natural, não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico (Saviani, 2007, p. 154).

Diante disso, pode-se entender que o homem não nasce homem; ele se torna homem, uma vez que não nasce sabendo se produzir como homem. O fenômeno (trabalho) que o torna homem deve ser aprendido. Ou seja, a produção do homem é, ao mesmo tempo, a formação do homem, isto é, um processo educativo (Saviani, 2007). Sendo assim, torna-se difícil a plena separação entre trabalho e educação, tanto que a relação entre esses termos tem estado cada vez mais estreita, sobretudo no Ensino Médio regular ou profissionalizante, como nos casos dos institutos federais.

No Ensino Médio técnico, a pressão imposta pela sociedade se mostra cada vez mais intensa. O aluno direciona praticamente todos os seus estudos para temas relacionados ao trabalho, visando ao ingresso no Ensino Superior via processos seletivos, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), ou mesmo diretamente no mercado de trabalho, e consequentemente abre mão dos saberes produzidos pelas Ciências Humanas, Filosofia, Sociologia, entre outras, de modo que os valores humanos, tão importantes para a vida em sociedade, são deixados de lado.

Marx argumenta que é da natureza do homem produzir objetos nos quais ele se reflete, porém esses objetos lhe são tomados pela lógica da produção vigente. O homem, desde a sua formação, tem o desejo natural de produzir; no entanto, a instituição lhe impõe um tipo de produção avesso às suas necessidades, de maneira análoga àquela feita pelo mercado de trabalho. Essa relação contraditória entre o produtor e o produto é o que Marx denomina alienação. O homem, movido por sua necessidade de trabalho, aliena-se e passa a produzir bens cada vez mais distanciados dele mesmo.

O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador torna-se uma mercadoria tanto mais barata quanto maior número de bens produz. Com a valorização do mundo das coisas, aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens. O trabalho não produz apenas mercadoria; produz-se também a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria, e justamente na mesma proporção com que produz “bens” (Marx, 2002, p. 111).

No trabalho alienado, o produto do homem existe fora dele, como algo alheio que se torna um poder em si mesmo, que o enfrenta. O aluno não tem controle sobre o que ele faz ou o que é feito do produto. O "conhecimento" cresce em poder na medida em que os alunos gastam o que dele dispõem e até adquire qualidades, devidamente modificadas, que o estudante perde. Os alunos podem perder confiança e se considerar simples "apêndices" de seus produtos; assim, gradualmente, o "conhecimento" começa a controlar os produtores (Silva, 2005).

Metodologia de Projetos

A palavra projeto aparece em campos diferentes como expressões múltiplas, bem características de nossa época: projeto de pesquisa, projeto de vida, projeto da instituição, projeto pedagógico da escola, projeto de instalação profissional, entre outros.

Para Huber (1999), a Metodologia de Projetos dos alunos começa a se delinear na obra de Jean-Jacques Rousseau, quando ele deseja que sua personagem Emile não aprenda com os livros, mas por meio das coisas, tudo aquilo que é preciso saber, sugerindo que uma hora de trabalho vale mais que um dia de explicações. Ainda segundo o autor, a estruturação do conceito de projeto passa também por Karl Marx e a importância da práxis sublinhada por este autor, pelos mentores da escola ativa alemã, como Kerchensteiner, pelo filósofo e psicólogo americano John Dewey, pelo educador francês Celestin Freinet, pelos pesquisadores Henri Wallon e Jean Piaget, até chegar ao educador brasileiro Paulo Freire, que deu dimensão de emancipação social ao aprendizado.

Segundo Prado (2011), a Metodologia de Projetos surgiu com a Escola Nova, movimento ocorrido no final do século XIX na Europa e na década de 1930 no Brasil, como reação à educação tradicional, baseada no instrucionismo, imobilismo, e conteudismo descontextualizados, que provocavam uma defasagem cada vez maior entre vida e escola.

O trabalho com projetos representa uma nova mentalidade e abertura da escola frente a um mundo movido por novos motores e modelos. São planejamentos de trabalhos que partem de um tema ou de um problema, que exigem pesquisa, trabalho em equipe, ações e tarefas ou de um problema, que podem proporcionar uma rica aprendizagem em tempo real dentro e fora dos muros escolares, fazendo emergir autonomia, autodisciplina, criatividade, iniciativa, tornando, enfim, o processo de aprendizagem dinâmico, significativo e interessante, bem mais atraente que as exaustivas aulas expositivas nas quais conteúdos fragmentados são impostos (Prado, 2011, p. 11).

A Metodologia de Projetos apontada por Prado (2011) recebe diferentes nomes, segundo ele: Projeto de aprendizagem baseado em problemas; Metodologia por pesquisa; Desenvolvimento de projeto; Tecnologia de projetos, além de outros, que pretendem nomear uma forma de aprendizagem que consiste em desviar o aluno das costumeiras atividades em sala de aula, dando-lhe autonomia para pesquisar o tema e/ou problema, envolvendo, se possível, outras classes, professores de duas ou mais disciplinas, semelhantemente à Pedagogia da Autonomia, trazida por Paulo Freire (2002). Essa nova maneira de ensino busca prover conhecimentos significativos ao aluno sem que para isso ele necessite se sujeitar à alienação educacional apontada por Karl Marx (Mészarós, 2006), uma vez que o próprio aluno é o centro do processo de produção, pois será ele a decidir o que, como e quando construir, tendo em vista os prazos letivos estipulados pelos educadores e/ou instituição de ensino.

Nesse sentido, observa-se uma alteração no papel do educando e no do educador. No modelo de ensino tradicional, o aluno atua de forma análoga a um aparelho de rádio: recebe as informações de um transmissor e as replica. O problema principal disso é que, como Freire (2002) aponta, “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. Essa célebre frase descreve exatamente a Metodologia de Projetos. Nesse modelo, nem o professor e nem o aluno são os detentores plenos do conhecimento, pois enquanto fica a cargo do aluno buscar o conhecimento por meio das mais variadas formas, fica a cargo do professor guiá-lo ao longo dessa jornada, de maneira análoga à da robótica educacional.

Segundo Almeida e Prado (2003), para fazer a mediação pedagógica o professor precisa acompanhar o processo de aprendizagem do aluno, ou seja, entender seu caminho, seu universo cognitivo e afetivo, bem como sua cultura, história e contexto de vida. Além disso, é fundamental que o professor tenha clareza da sua intencionalidade pedagógica para saber intervir no processo de aprendizagem do aluno, garantindo que os conceitos utilizados, intuitivamente ou não, na realização do projeto sejam compreendidos, sistematizados e formalizados pelo aluno.

Desafios e atividades podem ser dosados, planejados, acompanhados e avaliados com apoio de tecnologias. Os desafios bem planejados contribuem para mobilizar as competências desejadas – intelectuais, emocionais, pessoais e comunicacionais. Eles exigem pesquisar, avaliar situações, pontos de vista diferentes, fazer escolhas, assumir riscos, aprender pela descoberta e caminhar do simples para o complexo. Nas etapas de formação, os alunos precisam de acompanhamento de profissionais mais experientes para levá-los a tornar conscientes os processos, a estabelecer conexões não percebidas, a superar etapas mais rapidamente e a confrontá-los com novas possibilidades.

Os professores que agem dessa forma são chamados “facilitadores da autonomia”, conforme Boruchovitch e Bzuneck (2001). Os educadores que agem dessa forma nutrem as necessidades psicológicas básicas de autodeterminação, de competência e de segurança de seus alunos. Para que isso ocorra, eles oferecem oportunidades de escolha e de feedback significativos, reconhecem e apoiam os interesses dos alunos, fortalecem sua autorregulação autônoma e buscam alternativas para levá-los a valorizar a educação; em suma, tornam o ambiente de sala de aula agradável e principalmente informativo, onde os alunos se sintam motivados a aprender, pois é na sala de aula que grande parte do processo de ensino e aprendizagem ocorre (Cunha, 2011).

As pesquisas nas áreas da Psicologia mostram a importância da motivação na aprendizagem. Sem motivação não há aprendizagem escolar. Dado que o aprendizado, pelo menos o explícito e intencional, requer continuidade, prática e esforço, é necessário ter motivos para se esforçar, é necessário (na etimologia da palavra motivação) mobilizar-se para o aprendizado (Pozo; Crespo, 2009).

Em detrimento das metodologias tradicionais, a Metodologia de Projeto preserva a identidade do aluno. Segundo Dubar (1991), a “identidade” seria o resultado, ao mesmo tempo estável e provisório, individual e coletivo, subjetivo e objetivo, biográfico e estrutural, dos processos de socialização que conjuntamente constroem os indivíduos.

Assim, Ventura (2002, p. 38) afirma que a identidade humana se constrói e se reconstrói ao longo da vida, como produto de socializações sucessivas a partir de dois processos:

  • o processo biográfico, em que os indivíduos constroem suas atividades sociais e profissionais ao longo do tempo em suas relações institucionais (família, escola, empresas, entre outros);
  • o processo relacional, em que os indivíduos exprimem suas identidades associadas aos conhecimentos, competências e imagens de si mesmos, em busca do reconhecimento, num dado momento e num determinado local.

Ventura entende que a Metodologia de Projetos pode oferecer uma estratégia de construção de identidades, uma vez que o aluno percebe que o projeto será uma ocasião de conquistar maior reconhecimento social, o que afeta positivamente sua identidade.

Cabe ressaltar que os conceitos que norteiam a Metodologia de Projetos estão fortemente ligados à Educação Científica, não só por instigar a criatividade e a busca por novos conhecimentos, mas também por fazer com que o aluno se aproprie deles por meio das aplicações práticas em seu cotidiano, favorecendo a compreensão dos conceitos científicos e metodológicos que os rodeiam. Segundo Moraes (2007),

o conceito de educar pela pesquisa é uma abordagem que exige mudanças radicais na organização das atividades de aula, envolvendo perguntas e respostas capazes de desafiar continuamente conhecimentos já construídos. Educar pela pesquisa é aqui defendido como participar do processo da ciência, conjunto de ações concretizado na linguagem, com intenso envolvimento da fala, da leitura e da escrita. Assumindo-se as verdades como em permanente movimento de reconstrução, argumenta-se que pesquisar na sala de aula propicia espaços para a emergência de sujeitos históricos, com capacidade para intervir nas transformações sociais dos contextos em que vivem. A pesquisa na sala de aula, na abordagem deste texto, pode ser uma atitude do professor de Química, assim como dos professores das demais áreas.

A principal fragilidade dessa metodologia está centrada na forma de avaliar o desempenho do aluno. Na Metodologia de Projetos, deve-se aferir competências e habilidades. Afere-se o que se sabe fazer, algo ou resultado (produto escrito, oral, virtual e outros) palpável e visível que finaliza com o projeto, porém sem se esquecer de que o produto final foi planejado e pensado anteriormente e muitas vezes repensado, corrigido e reformulado ao longo do processo.

Por outro lado, a avaliação deve contemplar conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, tendo em vista as diferentes aptidões históricas de vida, repertório e capacidades de cada ator envolvido. Dessa maneira, pode-se concluir que a avaliação deve ser processual, pois mais importante que o produto final é o seu processo de elaboração, a maneira como cada autor se comportou, se dedicou e evoluiu durante a resolução do problema, tendo sido ele solucionado ou não.

Automação predial

Automação consiste em uma forma de tecnologia em que processos operacionais em fábricas, estabelecimentos comerciais, hospitais, telecomunicações e até mesmo em residências são controlados e executados por dispositivos mecânicos ou eletrônicos, substituindo o trabalho humano (Dorf; Bishop, 2001).

O termo automação surgiu no final da década de 1960 e início da de 1970 como forma de evolução dos meios de produção em fábricas automobilísticas (Parede; Gomes, 2011). Na época, qualquer alteração no processo de fabricação de automóveis, como cor e modelo, entre outros, era trabalhosa e demorada. Com o advento da automação, esses processos puderam ser agilizados, uma vez que grande parte do trabalho passou a ser realizada por sistemas eletromecânicos, ao invés de mão de obra humana, que muitas vezes tinha sua saúde física e mental prejudicada pelo excesso de atividades repetitivas e monótonas.

Posteriormente, no final da década de 1970, iniciou-se nos Estados Unidos uma grande onda de soluções voltadas não tanto a indústria, mas sim às residências, em especial para atender as necessidades de deficientes físicos, proporcionando maior conforto, mobilidade e segurança (Finder Componentes, 2011, p. 5).

Dentre os principais sistemas de automação predial/residencial destacam-se: sistemas de segurança (CFTV, cerca elétrica, alarme de incêndio, cancela de acesso, fechadura eletrônica), sistemas de refrigeração ambiente (centrais de ar, chillers), iluminação, sonorização e comunicação, entre outros.

Metodologia

O estudo aqui proposto teve como universo alunos do 3° ano do curso técnico integrado em Eletrotécnica matriculados na disciplina Automação Predial, ofertada no IFRO, no Campus Porto Velho – Calama.

Esta pesquisa possuiu enfoque qualitativo; não houve aqui preocupação com representatividades numéricas, mas, sim, com o aprofundamento da compreensão de determinado grupo social sobre o tema automação predial. Esse tipo de pesquisa apresenta o ambiente natural como fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento, como afirma Bogdan e Biklen (1994).

Iniciou-se com uma aula referente ao tema automação – tanto predial quanto industrial –, seu advento, suas vantagens, mercado de trabalho, sistemas autônomos simples e sofisticados, entre outros, com o objetivo de familiarizar os discentes com o assunto, além de aguçar seu interesse e curiosidade, para então propor à classe o desenvolvimento de trabalhos em grupo.

Cada grupo, composto por no máximo cinco componentes, recebeu a tarefa de pesquisar atividades comuns realizadas em sistemas prediais/residências, como acender e apagar luzes, regar jardim, ativar alarmes com sensor de presença, entre outros, e em seguida escolher uma dessas situações para que, em conjunto com o professor da disciplina, desenvolver um projeto de automação capaz de realizar ou auxiliar as pessoas na execução da atividade escolhida.

Em grande parte, as atividades do trabalho foram realizadas extraclasse. Entretanto, as aulas expositivas, tradicionalmente planejadas de acordo com a ementa do curso, foram mescladas aos temas de cada grupo, de modo a auxiliá-los no desenvolvimento de seus projetos sem impedir sua autonomia.

Resultados e discussões

Em comum à construção de cada um dos protótipos desenvolvidos pelos alunos, observou-se a reunião de conceitos encontrados nas disciplinas de Física, Eletrônica e Automação Predial, o que denota potencialização do aprendizado por meio de interdisciplinaridade. Em paralelo, pode-se verificar outras questões pedagógicas implícitas da Metodologia de Projetos: trabalho em equipe, desenvolvimento do senso crítico, responsabilidade, criatividade e outros.

A Figura 1 mostra o primeiro projeto desenvolvido, intitulado Varal Inteligente. Os alunos observaram que, ao iniciar a chuva, corriqueiramente as pessoas precisavam se deslocar com urgência ao quintal de suas casas para recolher as roupas postas para secar. Segundo eles, isso, além de desconfortável, era de certa maneira perigoso, pois as pessoas podem se machucar ao longo do trajeto, se levarmos em consideração que muitas vezes são surpreendidas pela chuva.

Os alunos projetaram e construíram um sistema capaz recolher ou estender o varal de acordo com as condições climáticas. Durante um dia ensolarado, o varal se mantinha estendido; caso começasse a chover ou anoitecesse, o varal era recolhido automaticamente.

(a) (b) (c)

Figura 1: Varal Inteligente. (a) placa de circuito impresso para alimentação e comandos; (b) maquete; (c) painel de controle automático/manual a relé Zelio
Fonte: Os autores

Na Figura 2 pode-se observar o projeto SmartRoof (teto inteligente), desenvolvido pelo segundo grupo. Nesse projeto, o intuito foi automatizar a abertura e o fechamento da cobertura da varanda de uma residência, de modo a aproveitar a luz natural para iluminar o ambiente interno e, com isso, economizar energia.

O funcionamento é semelhante ao do projeto anterior, inclusive com a utilização de praticamente os mesmos componentes. As diferenças estão centradas no projeto do circuito e sua aplicação.

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(c) (d)

Figura 2: SmartRoof: (a) vista lateral direita; (b) placa de circuito impresso para alimentação e comandos; (c) vista lateral esquerda; (d) painel de controle automático/manual a relé Zelio
Fonte: Os autores

Na Figura 3 apresenta-se o projeto Alimentador Automático para Cães, elaborado pelo terceiro grupo. A ideia é auxiliar pessoas mais atarefadas a alimentar seus animais de estimação. O projeto atenderia não apenas a esse público, mas também àqueles que costumam viajar em férias ou a trabalho e precisam deixar seus cães sozinhos neste período.

(a) (b) (c)

Figura 3: Alimentador Automático para Cães: (a) painel de controle a relé Zelio; (b) vista frontal com tampas fechadas; (c) vista frontal com tampas abertas
Fonte: Os autores

O último projeto foi a automatização de uma cortina do tipo persiana. O projeto recebeu o nome Cortina Inteligente e tinha como objetivo abrir e fechar a persiana de acordo com o nível de luminosidade do ambiente interno, economizando, assim, possíveis gastos desnecessários com iluminação artificial.

(a) (b)
(c) (d)

Figura 4: Cortina Inteligente: (a) montagem em protoboard; (b) projeto montado na placa de circuito impresso; (c) maquete de janela para demonstração de funcionamento da cortina; (d) janela com cortina
Fonte: Os autores

Este último projeto, do ponto de vista técnico, não obteve pleno êxito em sua construção. O grupo responsável por sua criação apresentou-se excessivamente confiante de que concluiria os serviços sem grandes dificuldades e por isso procrastinou várias etapas da construção. Como consequência, o protótipo não funcionou como deveria, e o grupo se decepcionou com o resultado. Apesar de tecnicamente isso ser considerado um fracasso, o sentimento de insatisfação mostrado pelo grupo os impulsionou a investir ainda mais em seu projeto, mesmo sem um possível reajuste na nota que recebera. Do ponto de vista pedagógico, isso foi extremamente enriquecedor, pois a partir de então a necessidade de se construir o sistema, e de certa maneira aprender mais, não era uma exigência do sistema educacional e sim um desejo pessoal dos indivíduos que compunham o grupo.

Considerações finais

Frente ao exposto, pode-se verificar como a Metodologia de Projetos tem potencial para romper os paradigmas de uma educação alienada. Afinal, apesar de ter sido aplicada em disciplina de um curso voltado ao mercado de trabalho, essa metodologia, que reúne a autonomia de Paulo Freire, o construtivismo de Piaget a preservação da identidade de Dubar, entre outros grandes estudiosos, fornece ao indivíduo a oportunidade de produzir-se como ser humano.

Durante a apresentação dos trabalhos, pelo menos um integrante de cada grupo mencionou: “Aprendi mais com este projeto do que aprendi nas disciplinas de Física, Eletrônica e Eletricidade Básica”. Segundo os mesmos alunos, na época que cursaram as disciplinas as aulas eram demasiadamente monótonas e, assim, muitas vezes não conseguiam ou mesmo não queriam acompanhar os assuntos; as notas eram o objetivo e o aprendizado era superficial, típico do ensino alienado.

A aplicação dessa metodologia não se restringe às matérias técnicas ou exatas; pelo contrário, cada docente pode adequar essa metodologia à sua disciplina e, assim, contribuir de forma mais expressiva para a formação profissional e principalmente humana dos educandos.

Referências

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BORUCHOVITCH, Evely; BZUNECK, J. A. A motivação do aluno: contribuições da psicologia contemporânea. 3ª ed. Petrópolis: Vozes, 2001.

DORF, Richard C.; BISHOP, Robert. H. Sistemas de controle modernos. 8ª ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 2001.

DUBAR, Claude. La socialisation-construction des identités sociales et professionnelles. Paris: A. Collin, 1991.

FINDER COMPONENTES. Pré-automação residencial. 3ª ed. São Paulo, 2011.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

HUBER, Michel. Apprendre en projets: la pédagogie du projet-élèves. Lyon: Chronique Sociale, 1999.

MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2002.

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MÉSZÁROS, István. A Teoria da Alienação em Marx. São Paulo: Boitempo, 2006.

PAREDE, Ismael Moura; GOMES, Luiz Eduardo Lemes. Eletrônica – Automação industrial. São Paulo: Fundação Padre Anchieta, 2011.

PARO, Vitor Henrique et al. A Teoria do Valor em Marx e a educação. São Paulo: Cortez, 2006.

PRADO, Fernando Leme. Metodologia de Projetos. São Paulo: Saraiva, 2011.

SAVIANI, Dermeval. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 12, nº 34, p. 152-180, jan./abr. 2007.

SILVA, João Carlos. Educação e alienação em Marx: contribuições teórico-metodológicas para pensar a História da Educação. Revista HISTEDBR on-line, nº 19, p. 101-110, set, 2005.

VENTURA, Paulo Cesar Santos. Por uma pedagogia de projetos: uma síntese introdutória. Revista Educ. Tecnol., Belo Horizonte, v. 7, nº 1, p. 36-41, jan./jun. 2002.

Publicado em 12 de dezembro de 2017

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