Divulgação científica na escola: o Projeto Jovens Talentos da Ciência

Adriana Oliveira Bernardes

Mestre em Ensino de Ciências (UENF)

Introdução

O protagonismo do aluno do Ensino Médio é algo que pode e deve ser desenvolvido no contexto escolar, articulado a uma formação cidadã do aluno.

Com a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, é reforçada a importância de tal formação, e a escola poderá desenvolver habilidades e competências que propiciem ao aluno vivenciar a escola como um local onde se aprende e se constrói o conhecimento, no qual este é importante ator.

O pressuposto de uma formação cidadã implica mudanças no ambiente escolar, que deverá transformar-se em local no qual se discutem fatos sociais e sobre eles se atua. Devemos considerar também que a mídia influencia acentuadamente os alunos e que por ela os estudantes se aproximam de temas inicialmente distantes de sua realidade, porém de importância para sua visão de mundo e para o entendimento de como está inserido nele; tais temas trazem discussões para seu dia a dia. Dentro da ciência, podemos citar a Astronomia como plenamente inserida no argumento mencionado.

Assim, a ciência discutida em sala de aula, como qualquer outra disciplina, precisa estar contextualizada pelas vivências dos estudantes e com questões com as quais se deparam em seu cotidiano.

Nesse cenário, no qual almejamos um aluno participativo e ativo no processo de ensino e aprendizagem, os autores abordam a importância da criação de espaços participativos.

Educar para a participação é criar espaços para que o/a educando/a possa empreender, ele/a próprio/a , a construção de seu ser. Aqui, mais uma vez, as práticas e vivências são o melhor caminho, já que a docência, como está posta hoje, dificilmente dá conta das múltiplas dimensões envolvidas no ato de participar (Silva; Luz, 2009).

Acreditamos que em tais espaços os alunos possam protagonizar em prol do aprendizado, seu e do outro, no qual acreditamos que o professor atue apenas como mediador do conhecimento, incentivando descobertas e o interesse pela ciência.

Um trabalho realizado por projetos pode favorecer fortemente o intuito da formação do aluno protagonista. As orientações curriculares de Física discutem a importância da participação do jovem no contexto social no qual está inserido, bem como a difusão do conhecimento por ocasião de eventos científicos, por exemplo, explicitando isso no texto a seguir:

assim, será importante estimular a efetiva participação dos jovens na vida de seu bairro e cidade, conscientizando-os de sua responsabilidade social. Isso poderá ser feito através de projetos que envolvam intervenções na realidade em que vivem, incluindo desde ações de difusão de conhecimento, como por ocasião de eclipses, por exemplo, a levantamento de dados, como, por exemplo, em relação às formas de consumo da população e seus direitos como consumidores ou propondo ações para minimizar o consumo de água e energia ou monitorando fluxos de tráfego, poluição ambiental ou poluição sonora, acompanhando o impacto ambiental de indústrias, identificando os problemas da comunidade, sempre buscando intervenções significativas no bairro ou localidade. Ações dessa natureza podem fazer com que os jovens sintam-se de fato detentores de um saber significativo a serviço de uma comunidade, expressão de sua cidadania (Orientações Curriculares, 2006).

É bom lembrar que existem variados exemplos de eventos científicos além dos eclipses, como a passagem de asteroides, lua de sangue, discussão sobre remédios genéricos e doenças devidas a mosquitos, entre outros.
Sobre esse contexto no qual se discute a importância da ciência dentro da escola, podemos considerar que:

ter acesso à produção científica e ser reconhecido como produtor de saberes e conhecimentos são um direito de cidadania. Porém uma parcela significativa da população no mundo tem dificuldades de acesso à informação científica. Dessa forma, o papel central da escola é promover a educação científica e tecnológica, auxiliando o aluno na construção de conhecimentos, habilidades e valores necessários às tomadas de decisões sobre questões de ciência e tecnologia, além de atuar na solução de questões relacionadas à sociedade que o afetam. Isso exige ter acesso à informação e saber processá-la e ressignificá-la, ou seja, a formação possibilitando uma adequada apropriação da informação (Esperança; Filomeno, 2014).

Sabemos que existem dificuldades em relação ao acesso ao conhecimento científico, por isso é importante que a escola atue nesse sentido, levando não só o conhecimento como também reflexões que os levem a poder opinar sobre várias questões relacionadas à ciência na sociedade, como a construção de usinas nucleares, o consumo de transgênicos, efeitos dos agrotóxicos na saúde, entre outros.

É importante lembrar que, nos grandes centros, as parcerias entre escolas e instituições científicas são possíveis e viáveis, porém em cidades menores haveria dificuldade; nesse caso, é a própria escola que deve transformar-se em espaço de discussão científica, promovido por seus principais atores, que são seus professores e alunos.

Refletindo sobre todas essas questões, a equipe do Colégio Estadual Canadá, localizado em Nova Friburgo, região serrana do Estado do Rio de Janeiro, desenvolve desde 2015 o projeto Jovens Talentos da Ciência do Canadá.

Objetivos do projeto

Propiciar ao aluno um aprendizado de ciências ativo, no qual busca e constrói seu conhecimento de forma autônoma, formando assim um aluno protagonista, que se desenvolve através da pesquisa e de reflexões de temas científicos que são apresentados para a comunidade escolar.

Metodologia

No Colégio Estadual Canadá todos os bimestres são abertas inscrições para a apresentação Jovens Talentos da Ciência.

Para participar, o aluno deverá:

  • Escolher um tema científico que pertença ao currículo escolar do Ensino Médio;
  • Ter sua inscrição aceita;
  • Pesquisar o tema e obter orientação do professor responsável;
  • Preparar sua apresentação por meio de um software de apresentações;
  • Apresentar um resumo de seu trabalho.

Para cada bimestre são escolhidos de 4 a 6 trabalhos e a apresentação é feita no auditório da escola para alunos pertencentes às séries para as quais o tema é relevante e para professores com interesse em participar do projeto, juntamente com sua turma.
Após a apresentação são realizados debates, dos quais participam não só os alunos como também os professores das turmas partícipes.


Figura 1: Colégio Estadual Canadá.

Resultados

Temos notado crescente interesse na área de ciências, com a participação cada vez maior dos alunos nos eventos científicos escolares.

Na maioria das vezes, os alunos que se apresentam no projeto prosseguem os estudos realizando uma iniciação científica em nível de Ensino Médio, participando de eventos externos de instituições de Ensino Básico e Superior particulares, federais, estaduais e municipais.

Do projeto realizado, já participaram alunos apresentando temas como:

  • Planetas do Sistema Solar;
  • A história da campainha;
  • A história das fibras ópticas;
  • A máquina de Heron;
  • O acidente de Goiânia;
  • A tragédia de Nova Friburgo;
  • A influência da Escola Pitagórica no trabalho de Eudoxo de Cnido;
  • Planetas extrassolares, relatividade e Astrobiologia;
  • A importância de alimentos saudáveis na escola;
  • Casos de depressão na escola;
  • Avaliação da saúde dos alunos do Ensino Médio em relação a pressão arterial e diabetes;
  • Percentual de alunos da comunidade escolar que participam de baladas;
  • Como funciona o telégrafo.


Figura 2: Apresentações de “jovens talentos” no Colégio Estadual Canadá.

Análise dos temas selecionados

Em sua maioria, os temas desenvolvidos são da área de Física, Tecnologia e Astronomia, havendo orientação para uma preocupação com a abordagem dos aspectos históricos e sociais nos quais se deu a descoberta ou ocorreu o fenômeno estudado.

Consideramos para isso o que sugere o Currículo Mínimo Estadual de Física (2012), que ressalta a importância da “compreensão do conhecimento científico como resultado de uma construção humana, inserido em um processo histórico e social”.

Considerações finais

A realização de tais projetos em escolas públicas não é fácil, e o convencimento de sua importância para a comunidade é algo que deve ser trabalhado; a colaboração de gestores, professores e alunos é importante e necessária.

Recursos tecnológicos como datashow, notebook e acesso à internet são extremamente necessários à inclusão do aluno e ao desenvolvimento de projetos na escola; não menos importante é que tais projetos constem no projeto político-pedagógico escolar (PPP) e que as datas desses eventos façam parte do calendário escolar, de maneira a realmente beneficiar toda a comunidade.

Outro fator importante é que a gestão estimule o desenvolvimento de projetos por todos os professores, auxiliando no convencimento de sua importância e mobilizando uma equipe que realmente tenha interesse em construir uma escola melhor e de qualidade, apesar de todas as dificuldades que a educação vivencia hoje no Brasil e particularmente no Estado do Rio de Janeiro.

Nesse contexto, o aluno tem a oportunidade de participar de um processo inclusivo, a chance de vivenciar os quatro pilares da educação mencionados por Delors (2003): ”aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a viver junto”.

É necessário então estimular o aluno a ser ativo no processo de ensino e aprendizagem e encorajá-lo no sentido de buscar uma melhor formação na escola pública, tendo em mente que quem faz a escola é a comunidade em que ela está inserida. Assim, todos os seus atores são responsáveis pela qualidade da educação oferecida.


Figura 3: Aluna participante do projeto Jovens Talentos recebe prêmio da UFF de Nova Friburgo com a apresentação do projeto Herschel: do Cientista ao Telescópio.

Referências

BRASIL. PCN+ para o Ensino de Ciências e Matemática. Brasília: Ministério da Educação, 2002.

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf. Acesso em 23 nov. 2014.

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 2ª ed. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC/Unesco, 2003.

RIO DE JANEIRO. Secretaria de Estado de Educação. Currículo Mínimo Estadual de Física. Rio de Janeiro: Seeduc, 2012.

SILVA, Thais Gama da; LUZ, Araci A. Protagonismo juvenil na escola: limitações e possibilidades enquanto prática pedagógica na disciplina Biologia. Disponível em: http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1362-8.pdf. Acesso em 23 nov. 2016.

ESPERANÇA, Thamires C. R. B.; FILOMENO, Carlos Eduardo S.; LAGE, Débora de Aguiar. Divulgação científica no ambiente escolar: uma proposta a partir do uso de mídias digitais. Disponível em: http://www.sbenbio.org.br/wordpress/wp-content/uploads/2014/11/R0859-1.pdf. Acesso em 23 nov. 2016.

Publicado em 21 de março de 2017

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