Inclusão e Ensino Técnico: estratégias pedagógicas no Ensino Médio Integrado
Tatiana Henrique Brives de Oliveira
Licenciada em História (UFRJ), mestre em Educação Agrícola (PPGEA/UFRRJ)
Jaqueline Silva da Fonseca
Graduada em Administração (UFJF), especialista em Gestão da Produção e Qualidade (UCAM/Prominas)
Este trabalho é resultado das atividades desenvolvidas por docentes e discentes do curso técnico em Qualidade da ETE Imbariê e foi construído a partir da implantação da dinâmica de trabalho em etapas delimitadas: elaboração do projeto, apresentação da proposta aos alunos, momento para abordar a questão da deficiência em sala de aula, adaptação dos instrumentos de medição no Laboratório de Metrologia e avaliação do projeto e sua aplicabilidade, com a participação de uma pessoa com deficiência visual. A proposta surgiu a partir da dinâmica realizada no Laboratório de Metrologia e se deu a partir do diálogo entre professores e alunos a respeito das necessidades educacionais de alunos com deficiência e das questões relativas a uma educação inclusiva, além da profissionalização desses indivíduos. Partimos da ideia de que a Educação Inclusiva tem por pressuposto a democratização da educação e da sociedade, buscando efetivar oportunidades de acesso à escola aos grupos que historicamente têm sido vítimas de segregação. Assim, pensamos na inclusão em todos os níveis e modalidades de ensino, inclusive na formação profissionalizante, e nos desafios relacionados a esse processo.
Diversos autores ressaltam a importância do laboratório didático no aprendizado das disciplinas do Ensino Médio; Pinto, Viana e Oliveira (2013) afirmam que os experimentos possuem papel central na qualidade do ensino. Para esses autores, um dos aspectos da inclusão social é a possibilidade de que cada brasileiro tenha a oportunidade de adquirir conhecimento básico sobre a ciência e que seu funcionamento lhe dê condições de entender seu entorno e ampliar suas oportunidades no mercado de trabalho (Pinto; Viana. Oliveira apud Moreira, 2006). Eles ressaltam que o uso de aulas práticas tem o intuito de desenvolver no discente a capacidade de observação, de análise e de argumentação, aspectos fundamentais para um indivíduo crítico e atuante na sociedade.
A formação de nível médio integrada à educação profissional busca, de acordo com Ciavatta (2005), a garantia do direito a uma formação completa para leitura do mundo e para atuação integrada à sua sociedade, ao seu país. Nesse sentido, essa formação supõe a compreensão das relações sociais subjacentes a todos os fenômenos. Assim, percebemos que essa formação deve ser ampla e diversificada, visto que a sociedade é formada por pessoas com as mais diversas condições, e o contato com a temática inclusiva ainda na formação de nível médio contribuirá para a formação de profissionais mais conscientes das questões sociais que fazem parte do seu cotidiano e que respeitem as diferenças.
O local da pesquisa
A pesquisa foi desenvolvida nas instalações da Faetec Duque de Caxias – Escola Técnica Estadual (ETE) Imbariê, a partir da parceria entre docentes do curso técnico em Qualidade e do Atendimento Educacional Especializado, da Sala de Recursos Multifuncionais. A ETE Imbariê foi inaugurada em 2012; oferece à comunidade dois cursos de Ensino Médio na modalidade integrada: os cursos técnicos em Qualidade e em Logística, com a formação técnica e a de nível médio juntas. Há ainda o curso técnico em Segurança do Trabalho, este na modalidade subsequente (para aqueles que já concluíram o Ensino Médio). Se considerarmos a Rede Faetec como um todo, há dezenas de outros cursos técnicos nas mais diversas áreas, todos eles estão disponíveis para matrícula de alunos com deficiência ou outra necessidade educativa especial. O ingresso na rede se dá através de prova ou sorteio. Os editais de seleção incluem a reserva de vagas de 5% para estudantes com deficiência.
Materiais e métodos
As etapas propostas nas atividades do projeto foram realizadas no Laboratório de Metrologia da Faetec-Imbariê e na Sala de Recursos Multifuncionais da unidade escolar. Os alunos do Ensino Médio Técnico em Qualidade assistem às aulas regularmente nesse laboratório e desenvolvem instrumentos de medição como fruto da necessidade de aprender os conceitos básicos de Metrologia . Os instrumentos são construídos como parte da avaliação dos alunos e para suprir a falta de materiais necessários ao desenvolvimento dessa prática.
A atividade visa oferecer aos alunos o contato prático com os conteúdos da disciplina e o aprendizado ao alcance de todos, tendo em vista o baixo custo dos materiais propostos. Os alunos são apresentados aos principais instrumentos de medição linear: régua, trena, paquímetro; posteriormente, a balanças de medição . Como não há material disponível para todos, os alunos são desafiados a construir seus próprios instrumentos a partir do uso de garrafas PET, barbante, cabides. Depois da elaboração do instrumento e da avaliação acerca da precisão pretendida, passou-se a considerar a questão das pessoas com deficiência inseridas nesse contexto. Os alunos foram levados a pensar a respeito das necessidades de um aluno com algum tipo de deficiência sensorial ou física naquele ambiente e passaram a contribuir com sugestões para a acessibilidade aos conteúdos que estavam sendo tratados. Tendo em vista o pouco contato prévio com a temática, foi estabelecido um segundo momento no qual lhes foram apresentados conceitos sobre as deficiências e, mais especificamente, a respeito da deficiência visual.
A partir daí, eles começaram a traçar possibilidades de adaptação dos instrumentos já construídos. As balanças foram escolhidas para realizar a adaptação e passou-se a avaliar quais estratégias seriam utilizadas para que as pessoas com deficiência visual pudessem ter acesso. Os alunos propuseram a inclusão de uma legenda em braile e a demarcação de pontos em relevo que pudessem ser tocados. A mudança no modo de fazer a leitura da medição, que deixa de ser apenas visual para ser tátil, na prática se apresentou como uma adaptação que facilita a compreensão do assunto tratado pela pessoa com deficiência visual. O segundo instrumento adaptado foi a régua, que ganhou pontos em relevo e legenda em braile.
Resultados e discussão
Os resultados alcançados mostraram que houve contribuição no processo de ensino-aprendizagem com base na utilização de recursos de baixo custo , bem como a possibilidade de o aluno com deficiência poder seguir nos seus estudos no nível técnico e trabalhar no mercado, desde que haja instrumentos que contenham as adaptações necessárias . Verificamos ainda que há falta de informações no mercado a respeito desse tipo de instrumento e percebemos a necessidade de continuidade das pesquisas nesse tema.
A relevância desta pesquisa se mostra a partir da necessidade de adaptação de materiais para pessoas com deficiência no curso técnico em Qualidade. Percebeu-se que ainda há carência de estudos e pesquisas que abordem essa temática, assim como faltam materiais disponíveis para pessoas com deficiência visual no aprendizado dos conteúdos técnicos relacionados ao curso de Qualidade e à área de Metrologia. Assim, buscou-se inserir na dinâmica das atividades práticas realizadas no Laboratório de Metrologia a questão da inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho e suas condições de acessibilidade nos espaços de aprendizagem.
Diante de todo o exposto, concluímos que é possível ensinar a todos com qualidade, promovendo algumas adaptações e a interação entre pessoas com e sem deficiência no cotidiano de produção de conhecimento, incentivando nos alunos a prática da pesquisa das necessidades do público e agregando inovações na criação de um produto que atenda às necessidades das pessoas com deficiência visual.
Referências
CIAVATTA, Maria. A formação integrada: a escola e o trabalho como lugares de memória e de identidade. In: FRIGOTTO, G.; CIAVATTA, M.; RAMOS, M. (Orgs.). Ensino Médio Integrado: concepção e contradições. São Paulo: Cortez, 2005.
NOGUEIRA, S. R. A.; MACHADO, B. C.; ALVES, O. C.; SOARES, J. R.; CASTRO, H. C.; ALMEIDA, I. O. Laboratório multidisciplinar no Ensino Médio – um modelo para CIEP. XV Encontro Nacional de Ensino de Química (XV ENEQ). Brasília, julho de 2010.
OLIVEIRA, T H B. Os desafios da inclusão: uma experiência no Ensino Médio Técnico na Rede Faetec/RJ. I Simpósio Internacional de Estudos sobre a Deficiência. SEDPcD/Diversitas/USP Legal. São Paulo, junho de 2013.
PINTO, V. F.; VIANA, A. P.; OLIVEIRA, A. E. Impacto do laboratório didático na melhoria do ensino de Ciências e Biologia em uma escola pública de Campos dos Goytacazes/RJ. Revista Conexão UEPG, v. 9, n. 1, p. 84-93, 2013.
Publicado em 28 de agosto de 2018
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