O albinismo e suas conexões com o ensino de Ciências Naturais: um relato na EJA

Thalyta Botelho Monteiro

Bolsista Capes (UFES)

Francisco José Figueiredo Coelho

Professor docente I (Seeduc/RJ), membro do Grupo Interdisciplinar de Educação, Eletroquímica, Saúde, Ambiente e Arte (Gieesaa/UFRJ)

A temática albinismo apresenta limitações científicas e educacionais, pois são escassos os estudos – principalmente que contemplem seres humanos. Há pesquisas em animais e atualmente em vegetais, mas pouco se tem discutido a ampliação do tema na escola. Sua inclusão nos parece um tanto tímida, sobretudo no Ensino de Ciências e Biologia. E, apesar de ser um assunto tratado pela genética escolar, por vezes o fenômeno é visto apenas como um “gene recessivo” atuante, sem levar em conta a devida preocupação com os aspectos sociais, culturais e, sobretudo, ligados à saúde (Monteiro, 2018). Essa constatação é obtida com base em revisão de literatura realizada nos campos de Ensino e Educação e na interação com grupos de pessoas albinas, resultante principalmente das experiências da primeira autora.

Nas escolas, não é incomum que crianças albinas sofram bullying. Afinal, a aparência física delas é bastante diferente das demais. Isso se coloca como um estigma em certas ocasiões ao se tornar uma marca objetiva que recebe valoração social negativa. Pela pele branca ou rosada e pelos descoloridos, pode gerar isolamento de outros colegas de classe. Ou seja, a falta de informação e esclarecimentos de ordem científica, inclusive, pode reproduzir equívocos e comportamentos de prejulgamento e discriminação.

No âmbito internacional, países como a França têm investido no estímulo e na formação de grupos albinos que se reúnem em prol de melhorias, diálogos e debates para que a temática seja mais veiculada e possibilite ações e políticas públicas. Em especial na França, a Genespoir (Association Française des Albinismes – Associação Francesa dos Albinismos), instituição de pesquisas genéticas em albinismo – é a mais atual em seus estudos e busca levar informações sobre o assunto a diversas partes do mundo, proporcionando parcerias e redes de diálogo para ampliar as informações e reduzir o índice de criminalidade em países africanos. Cabe lembrar que em alguns países da África, como Moçambique, são frequentes os episódios de albinos que são perseguidos por curandeiros, rejeitados pelas famílias e têm dificuldade em encontrar trabalho.

No Brasil, a parceria da Genespoir com o Programa Pró-Albino da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, desde 2018, tem por finalidade reduzir os anseios desse grupo e promover debates acerca da condição. Não há registros de criminalidade, como em países africanos. Contudo, o clima tropical e a ausência de políticas públicas de inclusão desse grupo são grandes obstáculos. Nesse sentido, a parceria é fundamental, pois busca promover e ampliar as pesquisas já realizadas na França e o vínculo com a instituição brasileira. A título de curiosidade, em julho de 2018 foram encaminhados para a França cinco materiais para diagnóstico molecular, de modo a fornecer informações precisas sobre o tipo de albinismo dos participantes brasileiros (Monteiro, 2018).

Um documento produzido pelo Unicef em 2011, intitulado Les enfants accusés de sorcellerie – Étude anthropologique des pratiques contemporaines relatives aux enfants en Afrique, traz uma visão antropológica dessas crianças e vislumbra que o maior quantitativo de albinos encontra-se naquele continente e como eles se concebem socialmente.

No artigo Promoting the educational inclusion of children with albinism in sub-Saharan Africa (em tradução livre, Promovendo a inclusão educacional de crianças com albinismo na África Subsaariana), Lund e Lynch (2013) abordam a Educação Inclusiva com crianças albinas africanas analisando estratégias para um ensino de qualidade. Os autores elaboraram um texto sobre as crianças albinas em Malauí e retratam seus aspectos psicológicos e problemas com a educação, além de mencionar as questões culturais envolvidas no processo.

Nesse contexto de estigmas e exclusões, instituições como a Genespoir buscam desmistificar o assunto e há muitos ativistas – tanto na África quanto na França – que lutam contra a discriminação da condição albina. Os documentos citados apenas revelam a dimensão de exclusão e discriminação que a população albina sofre em algumas partes do mundo.

Roberto Rillo Biscaro, pesquisador com albinismo, relata em seus escritos a importância da Apalba (Associação de Portadores com Albinismo da Bahia), instituição reconhecida no Brasil, específica para essa condição. Ele trata desde as explicações genéticas a questões de direitos e como a associação vem contribuindo para um início de visibilidade (Biscaro, 2012a). De forma complementar, Biscaro produziu uma autobiografia carregada de afetos, inquietações e resiliência de sua condição albina (Biscaro, 2012b) que permite refletir sobre as angústias, expectativas e anseios dos jovens que apresentam a condição albina em nossa geração.

O ensino de Ciências, nesse caso, tem fator integrante e fundamental para o conhecimento do albinismo, pois é na escola que diversas culturas e etnias se encontram e podem dialogar. Assim, sua responsabilidade é ampliada, pois com os conteúdos o professor tem condições de explicar cientificamente conceitos e contextos, desvinculando ocorrências do senso comum que a colocam como contagiosa, além das relações estigmatizadas. Ou seja, é possível ensinar Ciências centrado na formação de estudantes ativos na sociedade e que saibam ponderar de forma consciente em relação a temas sociocientíficos (Levinson, 2010), como é o caso do assunto albinismo.

Embora seja de amplo conhecimento a necessidade de cuidados redobrados para os albinos – sobretudo em função do alto índice de câncer de pele –, no âmbito educativo o tema é pouco explorado. Debates ocorridos no encontro do Dia Mundial de Conscientização do Albinismo em 2018 revelaram que o acesso à informação, mesmo que ainda incipiente, tem garantido a diminuição na taxa de mortalidade de pessoas albinas em fase adulta. Muitos chegam à velhice sem visão por falta de acesso e cuidados oftalmológicos. A taxa de mortalidade ainda é alta devido ao câncer de pele. A ausência de melanina impede que essas pessoas fiquem expostas ao sol; a exposição deve ocorrer apenas em situações extremas e com proteção. 

Nesse caminho, a escola, como espaço coletivo e de inclusão, tem grande responsabilidade para que se amplie o repertório de informações e se crie uma rede de auxílios. Partindo dessa premissa, além da introdução, este artigo é estruturado em mais três seções: bases teóricas e conceituais para a discussão do albinismo em sala de aula; descrição de uma experiência com o tema albinismo e seu potencial integrador com outras ciências e considerações acerca do assunto associadas aos conteúdos de Ciências da Natureza e projeções pedagógicas.

Bases teóricas e conceituais do albinismo

Cavalcante (2012) lembra que o termo albinismo é originário do latim Albus, que significa alvo, branco; pode se empregar igualmente a palavra hipopigmentação (pouco pigmento) para se referir a ele. Trata-se de um distúrbio genético de herança autossômica recessiva. Ou seja, o pai e a mãe têm que carregar o alelo recessivo - gene que se expressa somente aos pares, representado por aa. No entanto, pode não se manifestar numa geração em que o indivíduo produz a Tirosina – aminoácido que compõe a melanina e que tem como função distribuir a cor pelo corpo e proteger a pele – representada pelo A, quando esta é normal, e afetada pelo a (Cavalcante, 2012).

A pessoa albina não possui melanina, uma condição genética que garante pigmento na pele, nos olhos e nos pelos. Essa disfunção genética faz com que o portador de albinismo tenha uma pele branca-rosada e lhe falte proteção aos raios solares e a ambientes quentes de modo geral, principalmente aos índices de radiação. Em sua maioria, os albinos possuem visão subnormal, tendo menos de 30% de acuidade visual (Leal, s.d).

A pele clara (quase branca) e a baixa visão são fatores que chamam a atenção de outras pessoas com pigmentação normal. Esse estranhamento pode ser causado pelo baixo índice de albinos no país (entre 10 e 12 mil pessoas) de acordo com pesquisa realizada pela Folha de S. Paulo em 2014. No mundo, uma em cada 17 mil pessoas apresenta algum tipo de albinismo. Não há pesquisas específicas que apontem de fato o quantitativo de albinos no Brasil; são estimativas que necessitam aprofundamento, pois essa disfunção dificulta o atendimento médico, tornando o albinismo um problema de saúde pública, visto que a falta de pigmentação aumenta os índices de câncer de pele e de cegueira pela ausência de tratamentos dermatológicos e oftalmológicos, respectivamente (Folha de S. Paulo, 2014).

Segundo Rocha e Moreira (2007), biologicamente podemos classificar o albinismo em três categorias: ocular, quando a falta da melanina afeta somente os olhos; parcial, em que a melanina é produzida apenas em algumas partes do corpo; oculocutâneo, quando a ausência de melanina acontece em todas as células pigmentares. Sobretudo no último caso, os autores enfatizam que há variações morfológicas variadas. Por isso, é possível distinguir quatro grupos de albinos, considerando genes específicos que interferem na síntese de melanina.

Com a disfunção, podem surgir diversos problemas; o principal deles é a baixa visão, que varia dependendo do tipo de albinismo e da quantidade de pigmento presente na íris. Além disso, são muito frequentes os problemas de pele causados pelo sol como, por exemplo, o eritema solar (queimaduras na pele causadas por exposição ao sol), o fotoenvelhecimento (causado por fatores ambientais e principalmente a exposição aos raios ultravioleta) e, em casos mais graves, lesões pré-malignas e malignas, capazes de ocorrer desde a infância (Moreira et al., 2007; Monteiro, 2018).

O cenário de pessoas sem pigmentação com baixa visão não é o único empecilho para o sujeito albino. A ausência de melanina o priva de atividades em parques abertos, empregos que necessitem de exposição aos raios ultravioleta (especificamente UVA e UVB), que, somados à baixa visão, provocam muitas limitações ao acesso a esses locais, mesmo com o uso de produtos com fatoração solar.

Em período escolar, essas limitações se agravam em função do esforço que ele deve fazer para que haja desenvolvimento, visto que, mesmo sentado nas primeiras carteiras, isso não significa a visualização do que está no quadro e nos livros. A falta de informação de alguns familiares não permite o reconhecimento de alguns direitos, inclusive pela inserção do albino com acuidade visual inferior a 30% no grupo de deficientes visuais. Todavia, dermatologicamente, não há políticas públicas que garantam cuidados com a pele nem oftalmológicos (Monteiro, 2016; Monteiro, 2018).

A maior parte das pesquisas sobre albinismo ocorre nas Ciências Biológicas e na Medicina, com a utilização de animais e plantas ou como disfunção genética ou dermatológica, mas neste último ainda de forma rasa. Embora essas questões de saúde possam ser contempladas por todas as disciplinas (considerando que o tema saúde é de ordem transversal), a Biologia é uma das disciplinas escolares que mais se aproxima de conteúdos científicos do campo da Genética. Contudo, é possível discutir a temática não apenas nas aulas de Biologia, mas inclusive em ocasiões do ensino de Química e de Física. Radiações ionizantes, raios UV e protetores solares são temas capazes de integrar todas as disciplinas de Ciências da Natureza.

Seguindo a premissa anterior, de forma geral o tema albinismo, tendenciosamente sugestivo ao ensino de Ciências e Biologia, pode ser articulado com conhecimentos de outras ciências parceiras, sendo enriquecido de discussões de ordem social (estigmas, segregações, descriminações e racismo) e que estimulem pensamentos de cidadania frente a temas científicos (Levinson, 2010). Na perspectiva de Soares e Guimarães (2014), uma reflexão sobre o albinismo baseada em questões de saúde pode esclarecer e ampliar o diálogo acerca das políticas públicas. Os autores entendem que, com base nos conhecimentos clínicos e nas bases biológicas, é possível promover debates amplos que sensibilizem e forneçam subsídios para repensar a saúde dos sujeitos nessa condição.

No Brasil, os fatores de saúde tangem o âmbito físico e o psicológico. O físico, por questões dermatológicas, ocorre pela vivência em um país tropical, sem políticas públicas de prevenção, sem acompanhamentos especializados e sem tratamentos oftalmológicos apropriados, pois não pode ser dado como problema visual comum em função das especificidades quanto à ausência da mácula e da presença de nistagmo (movimentos oculares oscilatórios, rítmicos e repetitivos), características frequentes do albinismo. A saúde psíquica também é fator preocupante, afinal muitos desses sujeitos vivem isolados, em pequenas comunidades ou, quando possuem vida social, se tornam dependentes de parentes para executar suas atividades. São raros os casos de albinos que, mesmo com as questões dermatológicas e visuais, interagem socialmente e são independentes. Esses sujeitos tornam-se autônomos, criam estratégias “contra” o sol, a luminosidade e a baixa visão (Carvalho; 1998; Soares; Guimarães, 2014; Monteiro, 2018).

Conceituar e discutir a inserção do tema nas aulas de Ciências Naturais (não necessariamente nas aulas de Biologia) traz dois ganhos pedagógicos: o potencial de interdisciplinarizar as ciências escolares, aproximando conceitos de uma ciência com a outra, e o desenvolvimento de uma educação inclusiva que mostre um outro olhar para a condição albina, preparando jovens para o exercício do respeito à diversidade. Afinal, a condição albina pode acontecer com pessoas próximas e futuramente com seus filhos; isso pode deixar marcas importantes nesses jovens de uma escola preocupada em formar seres humanos acolhedores das diferenças.

Uma experiência com o tema albinismo: integrando conhecimentos científicos plurais

Para enriquecer este texto, trazemos nessa seção uma breve experiência ocorrida em uma aula de Física I na Educação de Jovens e Adultos (EJA), com 18 alunos do módulo II. Esse relato fornece elementos para refletir como o albinismo pode estar associado a diferentes assuntos das Ciências Naturais. O fato ocorreu no início de novembro de 2018, em uma segunda-feira, das 19 às 21 horas, no Colégio Estadual Professora Antonieta Palmeira, localizada no bairro do Colubandê, São Gonçalo/RJ. Foi mediada pelo professor da disciplina, segundo autor deste trabalho.

Inicialmente, a aula foi planejada para discutir ondas eletromagnéticas. Após exemplificar algumas dessas ondas e destacar os raios ultravioleta (UV) como radiações ionizantes, foram colocadas algumas questões para os alunos, na busca de integrar conhecimentos das três ciências naturais (Física, Biologia e Química). Surgiram outras questões ao longo da aula. Entretanto, descreveremos apenas as questões norteadoras dimensionadas pelo professor da disciplina.

Foram propostas as seguintes questões:

  1. Todas as pessoas estão igualmente protegidas pelos raios ultravioleta?
  2. A proteção dos filtros solares funciona igualmente para todos?
  3. A maior agressão vem de onde: do sol ou da sociedade?

Para tais questões foi requisitada uma explicação baseada nas experiências dos estudantes. Embora centrada no contexto da discussão das radiações UV, as três questões buscaram as diferenças físicas e as influências sociais na vida das pessoas, tangendo a proteção da pele como cenário para discutir o albinismo. As três questões transitavam entre si e – intencionalmente – permitiram ao professor que atingisse o tema albinismo.

Em relação à primeira questão, foi unanimidade que as pessoas não estão protegidas da mesma forma. Brancos e negros apresentam proteções diferentes. E, como era de se supor, declararam que a pele negra estava um pouco mais protegida. Contudo, apenas dois alunos lembravam do nome melanina. A maioria, entretanto, reconhecia seus mecanismos dérmicos de proteção. Alguns confundiam a melanina com nomes de outras substâncias, como queratina e vaselina, mas identificavam que esse pigmento não estaria restrito à pele, uma vez que, para eles, era um pigmento de proteção. Poucos mencionaram a presença do pigmento nos cabelos, olhos e outras partes do corpo. À medida que as discussões sobre a pele negra estar mais protegida que a branca avançavam, o professor indagava sobre a pele branca e a pele muito branca. Nessa ocasião, foi identificado que a maior parte dos estudantes conhecia a condição albina, mas relataram não terem conhecidos albinos próximos. Sabiam descrever traços de pele, cabelo e a necessidade intensa de proteção, entretanto desconheciam o mecanismo genético recessivo e demais consequências.

No que tange à segunda questão, foi unanimidade que os filtros solares apresentam fatores de proteção distintos e cada tipo de pele (muito clara, clara, mulata, negra e – inclusive – albina) deveria ter fatores de proteção diferentes. Nessa ocasião, pareceram já compreender que a melanina tem grande influência na coloração da pele. Segundo alguns estudantes, mesmo a pele negra deveria se proteger contra o excesso de radiações. Nesse contexto, alguns alunos trouxeram experiências de pessoas com pele escura que desenvolveram melanomas dérmicos. E, embora alguns tivessem a falsa impressão de que a pele branca seria alvo de tumores, os demais colegas mais experientes os convenceram de que por esse motivo existem fatores baixos e pequenos de proteção, o que induziria à necessidade de uso de proteção solar para todos, especialmente no Rio de Janeiro.

De forma complementar a essa questão, o professor questionou que tipo de proteção deveria ser utilizada especialmente pelo albino. A maioria desconhecia vestimentas com proteção UV, mas relataram que certamente o protetor deveria ter fator de proteção muito alto, visto que eles não tinham a tal da melanina na pele. Nessa ocasião, foram esclarecidos de que existem categorias de albinismo e que nem todas as condições são geneticamente iguais. Especialmente nessa segunda questão pareceram revelar maior sensibilidade às pessoas com pele muito alva. Alguns alunos se questionaram sobre a dificuldade que pais com condições economicamente menos favorecidas teriam para oferecer qualidade de vida para seus filhos, tendo em vista que as roupas com proteção deveriam ser mais caras.

Em face à terceira questão, a maioria enfatizou que a proteção contra o excesso de sol seria uma medida de proteção física, mas que, ao mesmo tempo, a sociedade e seus preconceitos também traziam danos à saúde das pessoas. Lembraram com propriedade dos casos de racismo e discriminação social, questionando não apenas o governo como as pessoas em geral. Segundo alguns alunos, para a sociedade ser mais justa, deveria dar igual oportunidade a todos. O sol, segundo eles, parecia ser mais justo nesse sentido, considerando que todos recebiam a mesma parcela de radiação e, de alguma forma, tenderiam a receber o mesmo dano das radiações. Uma aluna enfatizou que, no caso dos albinos, tanto o sol quanto a sociedade seriam maléficos. Nessa ocasião, emergiram novas discussões sobre racismo e preconceito contra as pessoas de cor diferente. Ainda que a maioria julgasse que a discriminação contra os negros era maior que com os albinos (pois ainda assim seriam brancos), foi notado que alguns estudantes se sensibilizaram com a condição albina e pareceram reconhecer certo isolamento social com as pessoas que eram diferentes de um grupo, seja um indígena, uma pessoa em situação de rua ou um albino.

O que notamos da busca dessa integração é que das discussões inicialmente centradas no aspecto científico de diferentes ciências emergiam discussões de ordem social (na maioria das vezes intencional) alimentadas não apenas pelo professor da disciplina, mas também pelos alunos. As discussões em torno da discriminação e do racismo face às pessoas de cor negra foram enfatizadas pelos estudantes. O albinismo foi pouco mencionado. A partir das indagações do professor, os estudantes começaram a perceber aspectos de fragilidade e hipersensibilidade dos albinos e a repensar a importância desse segmento para a sociedade. Em verdade, poucos alunos tinham contato com pessoas albinas. Em nosso entendimento, essa não familiaridade impede que os estudantes contextualizem e vejam de perto as condições de cuidado físico e social desses sujeitos.

Essa prática revelou como discussões sobre albinismo são necessárias e não precisam ser centralizadas nos conteúdos da Genética. Podem emergir de outros assuntos das Ciências Biológicas, da Química e da Física, como demonstrado. Podem ser disparadores de situações de aprendizagem em que os conteúdos da ciência se agregam a discussões sociais mais amplas, como os estigmas sociais e questões de racismo e injúria racial.

Considerações finais

Um ensino de ciências a partir de situações reais – sendo aqui o albinismo um exemplo – auxilia no crescimento humano, na educação do olhar, no respeito ao outro e na construção de um conhecimento coletivo e mútuo. Assim, independentemente de nossas deficiências, teremos um aprendizado com base na inclusão, na promoção do ser e na sensibilização de outrem e, quiçá, em novas mídias que veiculem outros olhares sobre os albinos, outras criações de personagens e uma desconstrução dos padrões estéticos ditados.

As pesquisas sobre albinismo são poucas, se comparadas a outros campos da educação. Em suma, é tratado na Biologia ou na Medicina ou inserido nas deficiências visuais de forma generalizada. Além disso, são escassas as políticas públicas que deem visibilidade a ele. Nesse viés, a concepção de albinismo não deve ser reducionista e centralizar o debate apenas no âmbito genético, mas redimensionar-se no que socialmente acarreta, como fatores de integração social e de saúde física e psicológica, o que não deve ser negligenciado por nós, educadores.

Embora falar sobre o albinismo não seja atribuição apenas das Ciências, haja vista seu caráter transversal na diversidade, na pluralidade de culturas e no eixo saúde, encontra ali um espaço mais propício, pois o ensino de Ciências e Biologia dialoga com os conteúdos da Genética e da biodiversidade. Não exclui, contudo, que seja discutido nas aulas de Química ou de Física, ao dialogar com assuntos como radiações eletromagnéticas, energia solar e protetores solares. Sempre há possibilidade de articular e integrar temas distintos da ciência, enriquecendo-os com discussões de ordem social que ajudem a desconstruir estigmas, conceitos equivocados, comportamentos discriminatórios e práticas de racismo. Embora nem a escola nem o ensino das Ciências Naturais possa assegurar isso, são alternativas para repensar uma educação mais acolhedora e preocupada com o bem-estar alheio.

Referências

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UNICEF. Bureau Afrique de l’Ouest et du Centre (Braoc). Les enfants accusés de sorcellerieÉtude anthropologique des pratiques contemporaines relatives aux enfants em Afrique. Dakar: Unicef, 2011.

Publicado em 28 de maio de 2019

Como citar este artigo (ABNT)

MONTEIRO, Thalyta Botelho; COELHO, Francisco José Figueiredo. O albinismo e suas conexões com o ensino de Ciências Naturais: um relato na EJA. Revista Educação Pública, v. 19, nº 10, 28 de maio de 2019. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/10/o-albinismo-e-suas-conexoes-com-o-ensino-de-ciencias-naturais-um-relato-na-eja

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