A internet, alguns de seus termos e o professor
Máximo Luiz Veríssimo de Melo
Licenciado em História, especialista em História do Brasil República, mestre e doutorando em Ciências da Educação
A tecnologia moderna, que tem como objetivo trazer conforto para as pessoas, trouxe a internet, que é uma tecnologia muito presente em nosso cotidiano. Como disse Kenski (2012), a internet é algo que já faz parte de nossa vida, a ponto de não conseguirmos mais viver sem ela. Ela já está em tudo que fazemos, desde nos relacionarmos em sociedade, através das redes sociais, até comprar e vender, jogar etc. Para tudo, estamos fazendo uso dessa tecnologia.
Contudo, essa realidade em nossas vidas, hoje trazida pela tecnologia, fez surgir uma quantidade enorme de termos que têm como finalidade poder explicar ou conceituar as novas situações e realidades trazidas para a nossa vida, para o nosso cotidiano. E algumas práticas de professores em sala de aula podem ser definidas mediante ou de acordo com alguns desses termos, como globalização, aldeia global, nativos e imigrantes digitais, ciberespaço, hipertexto e outros, que estão presentes em nossa vida, fazendo parte de nosso linguajar, de nosso vocabulário, de nosso jeito de falar.
Diante dessa realidade é que se pretendeu escrever este artigo, procurando ver quais os principais termos que hoje estão presentes no nosso dia a dia, fazendo parte do nosso cotidiano e da nossa realidade, dos quais o professor deve se apropriar para se inserir nesse mundo. No entanto, aqui não se pretende esgotar esse tema, ou seja, não se pretende mostrar todos os termos que foram trazidos ou que surgiram da tecnologia moderna e que hoje fazem parte da nossa realidade.
Aqui se pretende apenas ver alguns desses termos, aqueles mais usuais e mais próximos de nós e que podem ser abraçados pelo professor e apropriados por ele, como profissional e pessoa, ser humano.
Para tanto, a metodologia aqui usada é de busca bibliográfica, onde foram consultadas algumas obras que tratam do tema e que, assim, trazem conceitos para os termos aqui tratados.
Portanto, este é um artigo que se encontra estruturado em apenas duas partes: a primeira trata dos conceitos de alguns termos e expressões, conceituados por alguns pesquisadores da área; a segunda procura falar como se encontra e como deve ser o professor e a sua prática, em função dessa nova realidade das relações cotidianas das pessoas em sociedade, mediante o advento das tecnologias modernas, traduzida pelos termos aqui mostrados e conceituados.
Definindo alguns termos e expressões
O avanço rápido das tecnologias no mundo e principalmente as mudanças que ele vem provocando na sociedade têm feito surgir alguns termos e expressões que estão se disseminando no nosso cotidiano e começando a fazer parte do nosso vocabulário. Vejamos alguns:
Globalização/Aldeia global – O termo globalização começou a circular no final dos anos 1980 para sugerir a ideia de unificação do mundo, como resultado dos três processos que marcaram o fim do “breve século XX” (Hobsbawm, 1995). MacLuhan (1977) é o responsável pela criação do termo “aldeia global”, que procura informar que, por causa do avanço da tecnologia, o mundo está passando a ser uma espécie de aldeia única, onde as fronteiras que separam ou dividem os países estão deixando de existir, onde as distâncias estão diminuindo, onde as noticias são mostradas de modo instantâneo, não importando onde estão acontecendo. Esse é o mundo globalizado, o mundo que está deixando de ser grande, enorme, para ser um mundo pequeno. E esse processo, como disse Bauman (1999), é hoje irreversível, é o destino irremediável da humanidade. No entanto, ele é muito criticado nas obras de Milton Santos (2000), já que para existir de fato uma aldeia global é necessário que haja interdependência em todos os aspectos, principalmente no financeiro, e é aí que reside a crítica desse autor, que afirma que o cidadão só é global se puder adquirir todo e qualquer produto tecnológico moderno, o que não ocorre com uma boa parcela da população mundial. Então, segundo ele, a desigualdade entre as pessoas e entre as nações só tem aumentado e o consumo exacerbado tem sido estimulado constante e cotidianamente.
Santos (2000, p. 9) diz que
a máquina ideológica que sustenta as ações preponderantes da atualidade é feita de peças que se alimentam mutuamente e põem em movimento os elementos essenciais à continuidade do sistema. Damos aqui alguns exemplos. Fala-se, por exemplo, em aldeia global para fazer crer que a difusão instantânea de notícias realmente informa as pessoas. A partir desse mito e do encurtamento das distâncias – para aqueles que realmente podem viajar – também se difunde a noção de tempo e espaço contraídos. É como se o mundo se houvesse tornado, para todos, ao alcance da mão. Um mercado avassalador dito global é apresentado como capaz de homogeneizar o planeta quando, na verdade, as diferenças locais são aprofundadas. Há uma busca de uniformidade, a serviço dos atores hegemônicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal. Enquanto isso, o culto ao consumo é estimulado.
Como visto nas palavras do Milton Santos, dezenove anos atrás, o que tem acontecido é o culto, o estímulo ao consumo, hoje cada vez mais observado; isso não traz nenhum tipo de diminuição das desigualdades sociais e econômicas no mundo, pelo contrário.
Ciberespaço – A palavra ciberespaço foi inventada por William Gibson em 1984, em sua obra Neuromante. Nela, um romance de ficção científica, ele descreve o ciberespaço como sendo um espaço em que o universo das redes digitais serve de palco para disputas entre as multinacionais, palco de conflitos mundiais, nova fronteira econômica e cultural. No romance, informações secretas são protegidas, dados se metamorfoseiam e são trocados em grande velocidade ao redor do planeta e heróis são capazes de entrar nele (no ciberespaço) e lá viver todo o tipo de aventura, segundo Lévy (1999).
Esse autor define o ciberespaço como: “espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores” (Lévy, 1999 p. 92). Para ele, essa definição inclui o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos as redes hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou destinadas à digitalização.
Santos (2003, p. 4) diz que
o ciberespaço é muito mais que um meio de comunicação ou mídia. Ele reúne, integra e redimensiona uma infinidade de mídias e interfaces... Nesse sentido, o ciberespaço, além de se estruturar como um ambiente virtual de aprendizagem universal que conecta redes sociotécnicas do mundo inteiro, permite que grupos/sujeitos possam formar comunidades virtuais fundadas para fins bem específicos, a exemplo das comunidades de e-learning.
O que esses dois autores definem como sendo o ciberespaço a cada dia se consolida mais ainda pela expansão das redes sociais.
Nativos digitais – Os chamados nativos digitais são os jovens de hoje, que nasceram em meio a todo esse avanço tecnológico vivenciado atualmente no mundo todo. São esses jovens que têm contato com jogos complexos, navegam pela internet, participam de comunidades, compartilham informações, enfim, estão completamente conectados com o mundo digital e que têm deixado os professores meio atônitos, sem saber o que fazer (Jordão, 2009, p. 10).
O número desses ditos nativos digitais vem aumentando a cada dia e a faixa etária vem se modificando, ou seja, vem diminuindo a cada dia. Hoje, crianças com menos de dois anos já têm acesso a fotos tiradas em câmeras digitais ou ao celular dos pais; aos quatro anos, já manipulam o mouse, olhando diretamente para a tela do computador; gostam de jogos, de movimento e cores; depois dessa idade, identificam os ícones e sabem o que clicar na tela, antes mesmo de aprender a ler e a escrever (Jordão, 2009, p. 10).
Para o educador e pesquisador Prensky (2001 apud Pescador, 2010, p. 2), esses jovens estão acostumados a obter informações de forma rápida e costumam recorrer primeiramente a fontes digitais e à web antes de procurar em livros ou na mídia impressa. Por causa desses comportamentos e atitudes e por entender a tecnologia digital como uma linguagem, Prensky os descreve como “nativos digitais”, uma vez que falam a linguagem digital desde que nasceram.
De modo semelhante, Palfrey e Gasser (2008, apud Pescador, 2010, p. 2) os descrevem como pessoas que possuem uma “persona online”, possível graças a recursos tecnológicos como aparelhos Blackberry ou iPhone e a redes de relacionamentos que lhes permitem levar uma vida online e offline durante todo o dia. Essa é uma das características que os tornam tão diferentes de seus pais e de outros adultos de gerações mais velhas. Enquanto estes últimos, em sua adolescência, escreviam seus pensamentos e segredos em pequenos cadernos, na forma de diários trancados com cadeado e a chave para que ninguém pudesse ler, os nativos digitais tornam essas informações públicas, descrevendo seus segredos e pensamentos em blogs nos quais compartilham listas com links que levam a outros blogs que o autor aprecia, de certa forma criando conexões entre pessoas que provavelmente nunca irão se encontrar pessoalmente.
Imigrantes digitais – Aqueles de uma geração anterior, que acompanharam a evolução das tecnologias digitais, são os chamados “imigrantes digitais”, ou seja, aqueles que precisam se adaptar à nova realidade. Mesmo que aprendam a ser fluentes no uso da linguagem digital, eles ainda manifestam certo “sotaque” que pode ser observado no modo como usam a mesma tecnologia e os recursos digitais que os nativos em seu dia a dia. Para ilustrar essa interferência da primeira língua (analógica), podemos citar a necessidade que alguns imigrantes digitais têm de imprimir suas mensagens de email para poderem lê-las; alguns podem mesmo sentir necessidade de escrever seus textos à mão usando papel e caneta antes de digitá-los em um editor de texto em seu computador. Os imigrantes digitais tendem a buscar informações primeiramente em livros e outras formas de mídia impressa, coisas que são impensáveis para os nativos digitais (Prensky, 2001 apud Pescador, 2010, p. 3).
Hipertexto – A palavra ou termo “hipertexto” se refere ao computador, aos textos escritos na tela do computador, que são bem diferentes dos textos escritos no papel. O texto na tela – o hipertexto – geralmente não obedece a uma sequência, pois pode conter links que nos dirigem a outras definições e não estabelecem uma ordem predefinida. Começa onde o usuário determina geralmente com um clique e termina quando o usuário se dá por satisfeito e informado e fecha a tela apenas com um clique. Lévy (1999, p. 56), define hipertexto como “um texto móvel, caleidoscópico, que apresenta suas facetas, gira, dobra-se e desdobra-se à vontade frente ao leitor”.
Lévy (1993, p. 40-41) compara da seguinte forma a leitura do texto na página à leitura do hipertexto:
quando um leitor se desloca na rede de microtextos e imagens de uma enciclopédia, deve traçar fisicamente seu caminho nela, manipulando volumes, virando páginas, percorrendo com seus olhos as colunas tendo em mente a ordem alfabética. [...] O hipertexto é dinâmico, está perpetuamente em movimento. Com um ou dois cliques, obedecendo por assim dizer ao dedo e ao olho, ele mostra ao leitor uma de suas faces, depois outra, um certo detalhe ampliado, uma estrutura complexa esquematizada. Ele se redobra, desdobra à vontade, muda de forma, se multiplica, se corta e se cola outra vez de outra forma. Não é apenas uma rede de microtextos, mas sim um grande metatexto de geometria variável, com gavetas, com dobras. Um parágrafo pode aparecer ou desaparecer sob uma palavra, três capítulos sob uma palavra ou parágrafo, um pequeno ensaio sob uma das palavras desses capítulos, regular da página se sucede o movimento perpétuo de dobramento e desdobramento de um texto caleidoscópico.
Kenski (2012, p. 32) afirma que o hipertexto é uma evolução do texto linear na forma como o conhecemos. Se no meio desse encadeamento de textos houver outras mídias – fotos, vídeos, sons etc. –, o que se tem é um documento multimídia ou, como é mais conhecido, uma hipermídia.
Realidade virtual – Santos (2003) diz que a realidade virtual é a origem de um mundo criado artificialmente, podendo envolver todos os sentidos, permitindo que nesse mundo “se possa sofrer, amar, sonhar, além de pensar”. Tudo ocorre devido ao fantástico desenvolvimento da tecnologia. É como se nosso velho mundo atual estivesse sendo progressivamente abandonado em troca do mundo da realidade virtual.
Homo Zappiens – Essa expressão foi tecida por Wim Veen e Ben Vrakking (2009), no livro Homo Zappiens: educando na era digital. Para esses autores, a expressão “Homo Zappiens” se refere à nova geração de pessoas que vivem em meio a tanta tecnologia. Para exemplificar a denominação e levar o leitor à reflexão, os autores propõem uma narrativa ficcional cuja personagem é denominada Jack. A figura dramática de Jack, ambientada numa situação cotidiana, se vê num cenário tecnológico em que os objetos que o circundam conduzem sua vida. Nesse cenário, encontram-se aparelhos que se tornaram íntimos demais para nos desvencilharmos de seus objetivos, ou seja, aquilo que há três mil anos era algo impulsionado pelo músculo-força-cinética hoje o é pela tecno-mecânico-elétrica.
Por meio de Jack, podemos perceber que, com o desenvolvimento tecnológico, aquilo que no passado era usufruto de alguns hoje se massifica transcendendo fronteiras, tempo e espaço. Os autores exemplificam essa facilidade de comunicação colocando Jack numa situação corriqueira: a personagem encontra-se atrasada para o trabalho e parada no trânsito, a metros de distância de seu local de trabalho. Jack, então, se comunica por meio de um celular com sua secretária e, logo em seguida, atende um cliente, tudo isso por meio de um clique.
Ou seja, o Homo Zappiens é o homem que vive em meio a tanta tecnologia que consegue fazer tudo, resolver tudo a partir de um simples clique. O Homo Zappiens é um homem mais sábio, atualizado, antenado, zap. É um homem que não consegue mais se desvencilhar da tecnologia. Ele já tem a tecnologia como parte dele. O Homo Zappiens se revela como um ser tecnologizado, cujo cotidiano faz dele alguém renovável, flexível.
Sociedade em rede/redes sociais – Em Castels (2005, p. 20), temos este conceito para sociedade em rede:
a sociedade em rede, em termos simples, é uma estrutura social baseada em redes operadas por tecnologias de comunicação e informação fundamentadas na microelectrónica e em redes digitais de computadores que geram, processam e distribuem informação a partir de conhecimento acumulado nos nós dessas redes. A rede é a estrutura formal (vide Monge; Contractor, 2004). É um sistema de nós interligados. E os nós são, em linguagem formal, os pontos onde a curva se intersecta a si própria. As redes são estruturas abertas que evoluem acrescentando ou removendo nós de acordo com as mudanças necessárias dos programas que conseguem atingir os objectivos de performance para a rede.
Para Castels, as redes sociais são estruturas operadas por tecnologias modernas, que acumulam informações, e estas são comungadas e transferidas pelas pessoas que estão inseridas nelas. As redes sociais, segundo Marteleto (2001, p. 72 apud Tomaél; Alcará; Di Chiara, 2005), representam “um conjunto de participantes autônomos, unindo ideias e recursos em torno de valores e interesses compartilhados”. Elas falam ainda que a rede, que é uma estrutura não linear, descentralizada, flexível, dinâmica, sem limites definidos e auto-organizável, estabelece-se por relações horizontais de cooperação.
Recuero (2009) chama a atenção para a importância das redes sociais ao dizer que elas são ferramentas que mobilizam pessoas, agregam informações, criam campanhas e protagonizam uma linha de frente de apoio para certas situações, como campanhas eleitorais, catástrofes naturais etc. Essa autora citou duas situações ou fenômenos em que as redes sociais foram fundamentais: a primeira foi a campanha presidencial de Barack Obama, nos Estados Unidos; a segunda foi nas enchentes de Santa Catarina; ambos os acontecimentos ocorreram em 2008.
Kohn e Moraes (2007, p. 5) falam que “a rede é, portanto, formadora de laços sociais. Faz parte do contexto de comunicação das organizações e seu uso tornou-se indispensável”. E ainda afirmam que,
com o uso do computador, os serviços foram agilizados e facilitados, houve uma redução da mão de obra em ocupações que substituíram o trabalho humano, mas que abriram portas para novas ocupações especializadas no ramo da informática (programadores, webdesigners, administradores de rede) e das comunicações (marketeiros e jornalistas virtuais).
Ou seja, para essas autoras, as redes sociais, além de serem formadoras de laços sociais, são também responsáveis por mudanças nos serviços, agilizando e facilitando, e trouxeram novas ocupações especializadas, ao mesmo tempo que substituíram a mão de obra humana.
Letramento digital – Freire e Donaldo (1990, p. 66) definem letramento da seguinte forma:
o ato de ler e escrever deve começar a partir de uma compreensão muito abrangente do ato de ler o mundo, coisa que os seres humanos fazem antes de ler a palavra. Até mesmo historicamente, os seres humanos primeiro mudaram o mundo, depois revelaram o mundo e a seguir escreveram as palavras.
Soares (1998) diz que, na verdade, a palavra letramento é uma tradução para o português da palavra inglesa literacy; que em latim littera quer dizer letra e cy quer dizer qualidade, condição, estado. Então, traduzindo a definição acima, literacy é "a condição de ser letrado", dando à palavra letrado sentido diferente daquele que vem tendo em português.
Em inglês, o sentido de literate é: educated; especially able to read and write (educado; especificamente, que tem a habilidade de ler e escrever). Literate é, pois, o adjetivo que caracteriza a pessoa que domina a leitura e a escrita, e literacy designa o estado ou condição daquele que é literate, daquele que não só sabe ler e escrever como também faz uso competente e frequente da leitura e da escrita.
Por letramento digital compreende-se a capacidade que o indivíduo tem de responder adequadamente às demandas sociais que envolvem a utilização dos recursos tecnológicos e da escrita no meio digital. O letramento digital é mais que o conhecimento técnico. Ele inclui ainda, segundo Carmo (2003),
habilidades para construir sentido a partir de textos multimodais, isto é, textos que mesclam palavras, elementos pictóricos e sonoros numa mesma superfície. Inclui também a capacidade para localizar, filtrar e avaliar criticamente informações disponibilizadas eletronicamente.
É a capacidade de manusear naturalmente com agilidade as regras da comunicação em ambiente digital. Xavier (2007, p. 4) diz que “a principal condição para a apropriação do letramento digital é o domínio do letramento alfabético pelo indivíduo”. Isso quer dizer que um indivíduo só pode utilizar plenamente as vantagens da era digital à sua necessidade se tiver aprendido a escrever, a compreender o lido, se tiver dominado o sistema alfabético a ponto de ter alcançado grau elevado das convenções ortográficas que “orientam o funcionamento da modalidade escrita de uma língua”. Em síntese, apenas o letrado alfabético tem a qualificação para se apropriar totalmente do letramento digital.
Pós-humano ou homem pós-moderno – Felinto e Carvalho (2005, p. 3-4) dizem que o “pós-humano é precisamente aquele ser ou indivíduo que faz pleno uso do imenso potencial das ‘novas tecnologias’ a seu dispor”. Ele é o explorador por excelência dos novos territórios da cibercultura, criatura da conectividade, navegador do ciberespaço, híbrido artificial-orgânico capaz de abrir mão das certezas da condição humana em benefício das ainda incertas aventuras proporcionadas pela prazerosa “confusão de fronteiras” (Haraway, 2000, p. 42). Nesse sentido, ele parece constituir um vértice em torno do qual transitam as principais imagens, símbolos e representações do mundo cibercultural.
A internet, seus termos e o professor
Os professores, em sua maioria, fazem parte do grupo “imigrantes digitais”, ou seja, aqueles que precisam se adaptar às tecnologias digitais; existem muitos que evitam fazer uso delas, tornando-se profissionais ultrapassados, retrógrados, obsoletos e velhos, como falou Dado Shinaider em uma palestra em Campina Grande/PB, em 2014.
São profissionais que precisam estar sempre atualizados e buscando mais e mais conhecimentos e se qualificando constantemente; isso inclui o uso das tecnologias modernas, que hoje são uma realidade, como bem defendem vários teóricos, entre eles Freire (1990), ao falar em professor curioso, que busca estar aberto ao novo; e tantos outros, ao falar e defender a formação docente para o uso das tecnologias (Kenski, 2013; Barreto, 2002; Jordão, 2009) etc.,
No entanto, ainda se veem muitas resistências de professores frente ao uso das tecnologias; não é difícil encontrar professores resistindo ou falando ter dificuldade em fazer uso de um diário de classe digital ou eletrônico; também é grande o número de professores que não têm participado de cursos de formação ou capacitações para atuar com as mídias, como mostra Melo (2018), que somente 29% do público de professores de uma rede pública de ensino do Fundamental II dizem ter participado de cursos de capacitações e formações, e os 71% que não participaram alegaram para isso, entre outras coisas, a falta de tempo, o que não deixa de ser uma verdade.
Essa realidade mostrada, de pouca participação desses profissionais em cursos de capacitação, também é mostrada por várias outras pesquisas com resultados semelhantes, inclusive os motivos dessa pouca participação. Como Kenski (2013) afirma, a internet (ou seja, as TIC ou mídias), já é uma realidade, e faz parte de nosso cotidiano; vivemos hoje rodeado por ela, tudo que fazemos é com ela – trabalhar, comprar, conversar etc., usando um computador ou um aparelho de celular, a ponto de muitos ficarem desnorteados se chegam a um lugar que não disponha de uma rede de wifi; o professor não pode negar isso e procurar ficar alheio a essa realidade, evitando não fazer uso dela em seu dia a dia, seja em uso particular, pessoal, individual, seja para a vida profissional.
Diante disso, o professor deve ser um profissional conectado, globalizado, que faça uso das redes sociais, que, mesmo sendo um imigrante digital, procure viver no mundo dos nativos digitais, que é o mundo da maioria de seus alunos, que saiba o que é um ciberespaço, que leia e faça hipertextos, que jogue jogos virtuais, que zapeie em busca de conhecimentos distintos, tornando-se assim alguém letrado digitalmente, que deixa sua condição de humano para assumir a de pós-humano ou homem pós-moderno. Essa deve ser a realidade do professor como profissional e ser humano vivendo no mundo da globalização e da tecnologia moderna.
Considerações finais
A tecnologia é algo posto e presente em nossa vida, assim como os termos e expressões aqui tratados, termos que fazem parte do nosso cotidiano, que têm como função explicar ou conceituar as novas realidades e relações entre as pessoas. São termos que, aos poucos, vão fazendo parte da nossa forma de falar e nos expressar, tornando-se palavras comuns em nossas falas, assumindo o lugar de tantas outras que outrora faziam parte de nosso vocabulário.
Portanto, este trabalho trouxe esses vários termos hoje presentes em nossa realidade, mostrando que eles estão presentes e que as realidades explicadas e conceituadas por eles são realidades vividas e praticadas em nosso meio, em nossas relações em sociedade.
O professor não pode ficar alheio, à toa, fora dessa realidade já posta e consolidada, de globalização, de tecnologia moderna, que, como bem falou Bauman (1999), é algo irreversível, que não há mais como acontecer retrocesso, retorno ao passado. Retorno ao passado existe só na ficção do cinema. Por essa razão, o professor tem que ser uma pessoa sempre conectada, estando sempre no modo on line, nunca no modo off line.
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Publicado em 08 de outubro de 2019
Como citar este artigo (ABNT)
MELO, Máximo Luiz Veríssimo de. A internet, alguns de seus termos e o professor. Revista Educação Pública, v. 19, nº 24, 8 de outubro de 2019. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/24/a-internet-alguns-de-seus-termos-e-o-professor
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