Breve histórico acerca da criação das universidades no Brasil

Dominique Guimarães de Souza

Professora da rede pública (Seeduc/RJ)

Jean Carlos Miranda

Docente do Departamento de Ciências Exatas, Biológicas e da Terra e do Programa de Pós-Graduação em Ensino (UFF)

Fabiano dos Santos Souza

Docente do Departamento de Sociedade, Educação e Conhecimento e do Programa de Pós-Graduação em Ensino (UFF)

Em 1920, pelo Decreto nº 14.343, foi criada a primeira universidade do Brasil, a Universidade do Rio de Janeiro. “Segundo alguns estudiosos, a razão principal da criação da Universidade do Rio de Janeiro teria sido a necessidade diplomática de conceder o título de doutor honoris causa ao rei da Bélgica em visita ao país” (Souza, 2012, p. 51). Com a união da Escola Politécnica, a Escola de Medicina e a Faculdade de Direito, houve a estruturação da universidade, embora as instituições funcionassem de forma isolada, sem integração entre suas áreas. A Universidade do Rio de Janeiro era voltada mais ao ensino do que à pesquisa, tendo caráter elitista (Oliven, 2002).

Um aspecto que vale ser ressaltado em relação à criação da Universidade do Rio de Janeiro foi o destaque dado à sua criação, ganhando notoriedade via Associação Brasileira de Educação (ABE) e Associação Brasileira de Ciências (ABC). Os principais pontos enfatizados por essas entidades foram o conceito e as funções desempenhadas pelas universidades brasileiras, sua autonomia e o modelo de Ensino Superior a ser seguido em âmbito nacional (Fávero, 2006).

Em 1931, no governo de Getúlio Vargas, pelo ministro da Educação e Saúde, Francisco Campos, foi aprovado o Estatuto das Universidades Brasileiras, popularmente conhecido como “Reforma Francisco Campos”; ali era determinado que:

a universidade poderia ser oficial, ou seja, pública (federal, estadual ou municipal) ou livre, isto é, particular; deveria, também, incluir três dos seguintes cursos: Direito, Medicina, Engenharia, Educação, Ciências e Letras. Essas faculdades seriam ligadas, por meio de uma reitoria, por vínculos administrativos, mantendo, no entanto, a sua autonomia jurídica (Oliven, 2002, p. 3).

Segundo Fávero (2006), alguns pontos do Estatuto das Universidades Brasileiras devem ser destacados, entre eles a integração das escolas ou faculdades que funcionavam como “ilhas” à nova estrutura universitária, dependentes da administração superior. Outro ponto a ser ressaltado relaciona-se à cátedra, unidade operativa de ensino e pesquisa docente, entregue a um professor, sendo seu regime considerado o ponto central das instituições de Ensino Superior.

Durante esse período, foi dada grande ênfase à criação de uma faculdade de Educação nas universidades, com o objetivo de formar professores especialistas, que trabalhariam no ensino secundário; grande preocupação do ministro da Educação e Saúde. Essa prioridade dada pelo governo à educação básica causou desconforto entre educadores da Associação Brasileira de Educação (ABE), que almejavam que fossem implantadas nas universidades atividades voltadas à pesquisa (Oliven, 2002).

Pelo Decreto nº 6.283/34, o Estado de São Paulo criou a sua primeira universidade em 1934, a Universidade de São Paulo (USP), a partir do movimento liderado por Fernando Azevedo, que buscava, com sua implantação, reconquistar a hegemonia política paulista, perdida devido à crise do café. Essa empreitada foi considerada por Oliven (2002) “um divisor de águas na história do sistema brasileiro de Educação Superior”.

Para concretizar esse plano político, foram reunidas faculdades tradicionais e independentes, dando origem à nova Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, que contou com professores pesquisadores estrangeiros, principalmente da Europa. A USP tornou-se o maior centro de pesquisa do Brasil, concretizando o ideal de seus fundadores (Oliven, 2002, p. 5).

A criação da USP surgiu com as finalidades determinadas pelo Art. 2º daquele decreto:

  1. promover, pela pesquisa, o progresso da ciência;
  2. transmitir, pelo ensino, conhecimentos que enriqueçam ou desenvolvam o espírito ou sejam úteis à vida;
  3. formar especialistas em todos os ramos da cultura, bem como técnicos e profissionais em todas as profissões de base científica ou artística;
  4. realizar a obra social de vulgarização das ciências, das letras e artes por meio de cursos sintéticos, conferências e palestras, difusão pelo rádio, filmes científicos e congêneres.

Em 1935, Anísio Teixeira criou a Universidade do Distrito Federal (UDF), que tinha como um dos principais objetivos “a renovação e a ampliação da cultura e os estudos desinteressados”. As atividades voltadas à pesquisa foram estimuladas, mesmo com baixos recursos financeiros, com o objetivo de desenvolvimento social. A UDF surgiu com um princípio diferente das outras universidades do Brasil, inclusive da USP, caracterizando-se por tentar colocar em prática “as concepções e propostas da intelectualidade que, ligada à ABE e à ABC, empunhara, na década anterior, a bandeira de criação da universidade como lugar da atividade científica livre e da produção cultural desinteressada” (Almeida, 1989, p. 195 apud Fávero, 2006, p. 25).

Nessa época, as ideias educacionais que chegavam ao Brasil, rotuladas de "Escola Nova", formaram uma geração de educadores ou "profissionais da educação", responsáveis por reformas do ensino em vários estados na década de 30. Lourenço Filho, no Ceará, Anísio Teixeira na Bahia; Francisco Campos e Mario Casa Santa, em Minas Gerais; Fernando de Azevedo, no Distrito Federal. Esses educadores lutaram para que a República dessa maior prioridade às questões da Educação, criticaram as universidades criadas, como a do Rio de Janeiro, e fizeram propostas de organização do Ensino Superior no Brasil para a criação de "verdadeiras universidades" (Souza, 2012, p. 52).

Foi considerada uma grande vitória alcançada pelos educadores liberais desse período, mas que não teve apoio do governo, sendo extinta em 1939 pelo Decreto nº 1.063, de 20 de janeiro (Fávero, 2006). Seus cursos foram transferidos para a Universidade do Brasil (UB), anteriormente denominada Universidade do Rio de Janeiro. Devido ao clima autoritário estabelecido pelo Estado Novo, o Ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, elaborou novo projeto universitário, de caráter conservador e centralizado, em que a Universidade do Brasil seria um modelo único de Ensino Superior em todo o país (Oliven, 2002; Fávero, 2006).

Em 1939, pelo Decreto nº 1.190, foi criado o primeiro curso de Pedagogia na Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, com o objetivo de criar bacharéis e licenciados. A partir desse momento, iniciou-se um modelo de licenciatura conhecido como “3 + 1”, em que eram dedicados três anos às disciplinas da Pedagogia, os conhecidos “Fundamentos da Educação” e um ano do curso de Didática, para a formação do licenciado (Tanuri, 2000).

A organização da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil fez parte de um contexto social, econômico e político que envolveu, desde meados da década de 1930, a formação dos professores em nível universitário ou superior. Os anos de 1930 foram marcados por um intenso debate político relacionado às questões educacionais, destacando-se as discussões sobre a formação docente. Entre as questões que se discutiam com relação à reforma educacional, havia um consenso de que a educação possuía papel fundamental na construção de um Estado Nacional moderno (Vieira, 2008, p. 3).

Durante toda a década de 1930, houve iniciativas de formação de professores em nível superior; entre eles, quatro projetos de qualificação de professores ganharam notoriedade e se consolidaram.

O primeiro foi o Instituto Católico de Estudos Superiores, no Rio de Janeiro, em 1932; o segundo, o Instituto de Educação da Universidade de São Paulo, criado por Fernando de Azevedo em São Paulo, em 1934; o terceiro, a Escola de Educação da Universidade do Distrito Federal, no Rio de Janeiro, em 1935, criada por Anísio Teixeira. O quarto projeto, consolidado na Universidade do Brasil, resultou do encerramento tanto da experiência de formação de professores de Azevedo quanto da de Teixeira em 1938, fruto do golpe de Estado que instituiu no Brasil o Estado Novo, em 1937. Encerrada a UDF, o Estado autoritário instalou a Universidade do Brasil e nesta a Faculdade Nacional de Filosofia. Nesse empreendimento também estiveram presentes os interesses da Igreja Católica (Vieira, 2008, p. 4).

A Universidade do Distrito Federal, dirigida por Anísio Teixeira, sofreu rejeição dos setores conservadores, entre eles a Igreja Católica, por seu caráter liberal. Esta instituição apontava como principal responsável pela crise brasileira a dissociação entre Igreja e Estado. Para reverter esse quadro e promover a “recristianização” das elites do país, em 1946, pelo Decreto nº 8.681, surgiu a primeira universidade católica do Brasil, a Pontifícia Universidade Católica (PUC), do Rio de Janeiro, tendo em seu currículo a frequência ao curso de cultura religiosa (Oliven, 2002).

A partir de 1940, as Faculdades de Filosofia passaram a ser frequentadas por mulheres, que almejavam trabalhar como professoras no ensino secundário. Esse fato foi consequência da expansão do ensino e da entrada da mulher no mercado de trabalho. Essas faculdades se espalharam pelo país, sendo limitadas exclusivamente ao ensino e com infraestrutura defasada, em que cada curso formava um tipo específico de professor.

Durante a Nova República, foram criadas 22 universidades federais, constituindo-se o sistema de universidades públicas federais. Cada unidade da federação passou a contar, em suas respectivas capitais, com uma universidade pública federal. Durante esse mesmo período, foram, também, criadas nove universidades religiosas, oito católicas e uma presbiteriana. Concomitantemente a esse processo de integração, ocorreu uma expressiva expansão das matrículas, acentuando-se, com isso, a mobilização dos universitários, que tiveram, na criação da UNE (União Nacional dos Estudantes), em 1938, um elemento importante para a sua organização (Oliven, 2002, p. 5).

No final da década de 1940 e início da de 1950, houve algumas tentativas frustradas de buscar a autonomia integral das universidades. Na década de 1950, a rede federal de Ensino Superior se expandiu, principalmente com a "federalização" de instituições estaduais e privadas (Saviani, 2004). Com o desenvolvimento industrial e econômico do Brasil nesse período, houve conscientização de várias esferas da sociedade do cenário calamitoso instaurado nas universidades brasileiras, em que, a partir da metade da década de 1950, começou-se a elaborar e discutir as propostas do projeto de Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, confrontando a escola pública com a privada.

Limitados inicialmente ao meio acadêmico, os debates e reivindicações deixam de ser obra exclusiva de professores e estudantes para incorporarem vozes novas em uma análise crítica e sistemática da universidade no país (Fávero, 2006, p. 29).

Em 18 de dezembro de 1960, pela Lei nº 3.848, foi criada a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, nome dado inicialmente à Universidade Federal Fluminense (UFF). Essa instituição surgiu com o objetivo de alavancar o desenvolvimento econômico do Estado do Rio de Janeiro, que sofria com a crise na agricultura, com a formação de engenheiros, médicos, dentistas e advogados, entre outras carreiras. A então Uferj buscou levantar a autoestima da população, que estava baixa devido à transferência do Distrito Federal para Brasília.

Em 1961, foi publicada a Lei nº 4.024, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Essa lei, que veio reafirmar na prática o modelo tradicional de instituições de Ensino Superior existentes no Brasil, manteve a preocupação com o ensino em relação à pesquisa. Em termos organizacionais, não houve grandes interferências, dando plenos poderes ao Conselho Federal de Ensino e reforçou a centralização do sistema de Educação Superior (Oliven, 2002).

No mesmo ano foi criada a Universidade de Brasília (UnB), pela Lei nº 3.998, de 15 de dezembro. Sua proposta se contrapunha às outras instituições de Ensino Superior, por seu caráter inovador, voltado para a pesquisa. Foi a primeira universidade do país que não foi criada a partir da junção de faculdades preexistentes, tendo uma estrutura flexível e integrada, se opondo à universidade segmentada, com cursos profissionalizantes, seguindo o modelo norte-americano, em que as cátedras foram substituídas por departamentos (Oliven, 2002). A implantação da UnB e a Reforma Universitária do Brasil foram marcadas pela grande participação do movimento estudantil (UNE), que almejava acabar com o caráter elitista e ultrapassado das universidades, debatendo questões relevantes sobre estes aspectos: autonomia universitária; participação de professores e alunos na administração, seguindo o critério de proporcionalidade; dedicação exclusiva do professor universitário; ampliação das vagas em escolas públicas e currículo flexível (Fávero, 1994 apud Fávero, 2006).

Com o golpe militar de 1964, as universidades sofreram intervenção direta do governo que buscava reprimir ações “subversivas”, tanto de alunos como de professores. Com isso, vários professores foram afastados, especialmente da Universidade de Brasília. Em 1966, foi promulgado o Decreto-Lei nº 53, que definiu as regras de estruturação para as universidades federais.

Vetava a duplicação de meios para fins idênticos ou equivalentes; determinava a unidade entre ensino e pesquisa; obrigava à concentração do ensino e da pesquisa básicos, de modo a formar um sistema comum para toda a universidade. Obrigava também à criação de uma unidade voltada para a formação de professores para o ensino secundário e de especialistas em questões pedagógicas – a Faculdade (ou centro ou departamento) de Educação (Cunha, 2000, p. 179).

Em 1968, foi aprovada a Lei da Reforma Universitária (Lei nº 5540/68), “que criava os departamentos, o sistema de créditos, o vestibular classificatório, os cursos de curta duração e o ciclo básico, dentre outras inovações” (Oliven, 2002, p. 7). Essa lei também estabeleceu a indissociação entre ensino, pesquisa e extensão, o regime integral de ensino, a dedicação exclusiva dos professores e a valorização do profissional da educação por título e produção científica. A Reforma Universitária, embora tenha sido elaborada para os institutos federais de Ensino Superior, acabou atingindo as universidades particulares, que sofreram reformulações para atender ao que foi estipulado, pois dependiam do governo.

A partir de 1968, houve a expansão do Ensino Superior privado, especialmente em regiões afastadas, como no interior dos estados mais desenvolvidos e na periferia das grandes cidades. Com esse processo de expansão, em 1980, as instituições privadas assumiram a liderança, em quantitativo, de alunos no Ensino Superior, tendo um perfil predominantemente de ensino, não de pesquisa (Oliven, 2002).

Em 1968, havia grande movimento não só nas universidades, mas também nas ruas, com participação ativa do movimento estudantil, que pressionava o governo para que fossem criadas medidas para resolver os problemas educacionais mais profundos. A principal resposta a essas exigências foi a criação do Decreto nº 62.937/68, do Grupo de Trabalho (GT), com objetivo de estudar soluções e implantar medidas para superar os problemas enfrentados nessa modalidade de ensino, além de buscar

a reforma da universidade brasileira, visando à sua eficiência, modernização, flexibilidade administrativa e formação de recursos humanos de alto nível para o desenvolvimento do país (Relatório do Grupo de Trabalho, 1968, p. 15 apud Fávero, 2006, p. 33).

O Relatório ressalta que as universidades brasileiras estão fundamentadas com base nas faculdades tradicionais, não seguindo o mesmo compasso das transformações que estavam acontecendo no país durante esse período, enfatizando que a expansão universitária ocorreu de forma quantitativa, mas sua qualidade não seguiu o mesmo compasso. E acrescenta: “podemos dizer que o sistema, como um todo, não está aparelhado para cultivar a investigação científica e tecnológica” (Relatório do Grupo de Trabalho, 1968, p. 20 apud Fávero, 2006, p. 33), não suprindo as necessidades do mercado de trabalho. Devido a esse contexto, o Relatório propôs algumas medidas: “o sistema departamental, o vestibular unificado, o ciclo básico, o sistema de créditos e a matrícula por disciplina, bem como a carreira do magistério e a pós-graduação” (Fávero, 2006, p. 34).

A reforma do ensino empreendida em 1968 nos marcos das Leis nº 5.540 e nº 5.539 (Estatuto do Magistério Superior Federal), bem como dos documentos legais que as antecederam, propiciaram condições institucionais para a efetiva criação da instituição universitária no Brasil, onde, até então, existiam somente faculdades isoladas ou ligadas por laços mais simbólicos do que propriamente acadêmicos (Cunha, 2000, p. 178).

Após a Lei ser aprovada pelo Congresso, as atribuições relativas à autonomia das Universidades foram vetadas pelo presidente da República. Por ser um período de regime militar, essas prerrogativas não se encaixavam nos interesses do governo, que pelo Decreto-Lei nº 464/69 ajustou a implantação da reforma aos desígnios do regime. Na prática, houve expansão desordenada do Ensino Superior autorizada pelo Conselho Federal de Educação, de escolas isoladas privadas, contrariando o texto aprovado, alterando o que foi estabelecido pela Lei nº 5.540/68, que normatizava a organização universitária, exceto aos estabelecimentos isolados; na realidade, eles se transformaram na regra de ampliação do ensino superior (Saviani, 2004).

Segundo Niskier (2011), houve durante esse período preocupação com o crescimento excessivo e descontrolado do Ensino Superior. O Decreto nº 63.341/68 continha orientações acerca da expansão do Ensino Superior, dentre as quais deveria ser evitada a criação de cursos e instituições para carreiras já suficientemente atendidas.

O Decreto-Lei nº 464/69 reafirmava, em seu Art. 2º:

Será negada autorização para funcionamento de universidade instituída diretamente ou estabelecimento isolado de ensino superior quando, satisfeitos embora os mínimos requisitos prefixados, a sua criação não corresponda às exigências do mercado de trabalho, em confronto com as necessidades do desenvolvimento nacional ou regional.

Durante os anos 1970, foi elaborado expressivo número de normas e regulamentos que, junto com as decisões do Conselho Federal de Educação, possibilitaram o crescimento do sistema nacional de Educação Superior. Isso foi possível pela implantação de faculdades isoladas, que demonstraram o insucesso da perspectiva de um modelo único de organização universitária. Nesse período foram criadas também instituições não universitárias, que eram predominantemente privadas, para atender à elevada procura pelo Ensino Superior. As universidades públicas e privadas não tinham estrutura suficiente para atender a essa demanda, pois

o seu crescimento era limitado pelos altos custos provocados pelo princípio da indissociabilidade e sociabilidade ensino-pesquisa e pela dificuldade de manter em níveis adequados o investimento requerido pelo sistema público (Roquete de Macedo et al., 2005, p. 130).

A partir da década de 1980, teve origem a distinção entre universidades de pesquisa e universidades de ensino, sendo consolidada em 1986, pelo Geres (Grupo Executivo para a Reformulação do Ensino Superior), e sancionada pelo Decreto nº 2.306, de 19 de agosto de 1997, que criou o regimento do sistema federal de ensino de acordo com a atual LDBEN, de 1996. Esse decreto estabelece a separação entre universidades e centros universitários, sendo estes considerados uma universidade de segunda classe, que não precisam realizar pesquisas, uma alternativa para expandir e, consequentemente, “democratizar” a universidade com baixos recursos, se contrapondo à realidade de um restrito percentual de universidades de pesquisa, considerados centros de referência, onde há grandes investimentos, ressaltando seu caráter elitista (Saviani et al., 2004; Saviani, 2009).

A Constituição Federal, promulgada em 1988,

consagrou a autonomia universitária, estabeleceu a indissociabilidade entre ensino pesquisa e extensão, garantiu a gratuidade nos estabelecimentos oficiais, assegurou o ingresso por concurso público e o regime jurídico único. Nesse contexto, a demanda dos dirigentes de instituições de ensino superior públicas e de seu corpo docente encaminhou-se na direção de uma dotação orçamentária que viabilizasse o exercício pleno da autonomia e, da parte dos alunos e da sociedade, de modo geral, o que se passou a reivindicar foi a expansão das vagas das universidades públicas. Desses setores não emergiu, portanto, nenhuma demanda por reforma da universidade (Saviani et al., 2004, p. 51).

A partir de 1995, houve a segunda grande expansão universitária no Brasil. Isso foi possível através das primícias estabelecidas pela Constituição Federal de 1988, que determinou a soberania universitária e a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (Art. 207) e garantiu os preceitos básicos da participação do setor privado na oferta de ensino (Art. 209), e da Lei nº 9.394 (Brasil, 1996), que determinou o regimento e as bases da educação nacional (Roquete de Macedo et al., 2005).

Em 1996, foi criada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394), que em suas diretrizes trata do Ensino Superior (Título IV, “Da Organização da Educação Nacional”), atribuindo à União a manutenção do ensino superior público e, mais especificamente, em seu Capítulo IV, que contém os preceitos relativos a esse nível de ensino (Saviani, 2004).

No que se refere à organização do ensino, apesar da nova LDB e dos demais dispositivos legais aprovados na década de 90, a universidade brasileira continua sendo regida pela estrutura decorrente da reforma instaurada pela Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968, e pelo Decreto nº 464, de 11 de fevereiro de 1969 (Saviani, 2004, p. 56).

De acordo com a legislação criada, complementada por um grupo de leis, decretos, portarias e resoluções, o Ensino Superior passou por expressiva expansão, sofrendo grande transformação em relação às variedades de instituições que passaram a compô-lo. Mas, em função do fim dos investimentos do setor público estatal, o financiamento destinado ao Ensino Superior foi sendo gradativamente reduzido, provocando queda significativa das matrículas em instituições públicas.

Responsável por 42% das matrículas em meados dos anos 90, as instituições públicas respondem, nos anos iniciais do século XXI, por menos de 30% delas. Essa redução é ainda maior quando se analisa apenas o segmento federal de instituições públicas: sua participação no conjunto das matrículas passa de 20,8% em 1995 para 14,6% em 2003.

Quanto à natureza e categoria administrativa das instituições, observa-se, por um lado, a consolidação da participação das universidades privadas no conjunto do sistema, fixando uma tendência já presente ao longo dos anos 1980; por outro, a rápida expansão dos centros universitários criados a partir de 1997. Em 1999, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) registrava a existência de 39 centros universitários que respondiam por 6,8% das matrículas. Em 2003, foram registradas 501.108 matrículas, 12,9% do total, em 81 centros universitários (Roquete de Macedo et al., 2005, p. 130-131).

A classificação das instituições de Ensino Superior no Brasil foi reconfigurada pela LDB de 1996, que, dentre suas renovações, trouxe a natureza acadêmica e a dependência administrativa. A primeira foi definida por decretos complementares, dentre os quais estão os Decretos nº 2.406/97 e nº 3.860/01. Entre as instituições, além das que já existiam, foram criados mais dois novos modelos (as universidades especializadas e os centros universitários). Foram criados também novos tipos de cursos e programas, dentre os quais vale ressaltar os cursos sequenciais (no nível da graduação), os mestrados profissionais e a regulamentação da educação a distância (Neves, 2002).

A atual LDB, bem como os decretos posteriores específicos, definem as funções de cada tipo de instituição universitária e não universitária, classificando-as em: universidades, universidades especializadas, centros universitários, instituições não universitárias, faculdades integradas, centros de educação tecnológica e os centros federais de educação tecnológica, instituições superiores de educação e estabelecimentos isolados ou faculdades isoladas (Neves, 2002).

A LDB nº 9.394/96 trouxe novas modalidades de cursos e programas, como os cursos sequenciais, institutos superiores de educação e o Curso Normal Superior, que foram criados com o objetivo de trazer inovações à educação brasileira, mas sofreram rejeição das entidades de classe e estudantes. Em contrapartida, a Educação Tecnológica, que passou à condição de Curso Superior de graduação, sofreu expressiva expansão (Roquete de Macedo et al., 2005).

As instituições de Ensino Superior (IES) estão entrelaçadas à União no sistema federal de ensino e, mais recentemente, aos sistemas estaduais e municipais. O sistema federal de ensino engloba:

  1. as instituições de ensino mantidas pela União;
  2. as instituições de Educação Superior criadas e mantidas pela iniciativa privada;
  3. os órgãos federais de educação (Brasil, 1996, Art. 16).

Em 2004, o Ministério da Educação propôs uma reforma da Educação Superior no Brasil que, em um primeiro momento, causou impacto controverso de diferentes entidades e educadores, diante das propostas elaboradas pelo governo, pois apresentava artigos que se manifestavam inconstitucionais, mas que foram posteriormente adaptados à legislação educacional infraconstitucional. A reestruturação do Ensino Superior se faz necessária para que ocorra modernização, aprimoramento e democratização das instituições de ensino, além do ajuste ao Plano Nacional de Educação, aprovado pelo Congresso Nacional para o período de 2001/2010. A Reforma Universitária deveria ser firmada nas seguintes normas e diretrizes:

  • normatizar a avaliação e a regulação;
  • consolidar a autonomia universitária plena em todo o sistema;
  • aplicar adequadamente o princípio da indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão;
  • contemplar a diversidade de modelos de IES, programas, modalidades;
  • promover a aplicação de novas tecnologias;
  • estabelecer condições, incentivos e propostas para articulação e integração com a Educação Básica;
  • ordenar o processo de expansão da Educação Superior;
  • definir novos mecanismos de financiamento;
  • redefinir as funções de MEC, Capes, Sesu, CNE, INEP;
  • respeitar a Constituição Brasileira e o novo Código Civil (Roquete de Macedo et. al., 2005, p. 133).

Atualmente, a Educação Superior no Brasil engloba um variado grupo de instituições públicas e privadas, que abrange diversos tipos de cursos e programas, integrando vários níveis de ensino que vão desde a graduação até a pós-graduação lato e stricto sensu. O atual regime de funcionamento dessas instituições se encontra fundamentado nos preceitos da Constituição Federal de 1988, na LDBEN de 1996 e num vasto conjunto de decretos, regulamentos e portarias complementares (Neves, 2002).

Referências

BRASIL. Lei nº 9.394/96. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.

CUNHA, L. A. C. R. Ensino superior e universidade no Brasil. In: LOPES, E. M. T.; FILHO, L. M. F.; VEIGA, C. G. (Org.). 500 anos de educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 151-204.

FÁVERO, M. L. A. A universidade no Brasil: das origens à Reforma Universitária de 1968. Educar em Revista, nº 28, p. 17-36, 2006.

NEVES, C. E. B. A estrutura e o funcionamento do ensino superior no Brasil. In: SOARES, M. S. A. (Org.). A educação superior no Brasil. Porto Alegre: Unesco, 2002. p. 43-106.

NISKIER, A. História da educação brasileira: de José de Anchieta aos dias de hoje, 1500-2010. 3ª ed. São Paulo: Europa, 2011.

OLIVEN, A. C. Histórico da educação superior no Brasil. In: SOARES, M. S. A. (Org.). A educação superior no Brasil. Porto Alegre: Unesco, 2002. p. 31-42.

ROQUETE DE MACEDO, A. R.; TREVISAN, L. M. V.; TREVISAN, P.; MACEDO, C. S. Educação Superior no século XXI e a reforma Universitária Brasileira. Ensaio - Avaliação e Políticas Públicas em Educação, v. 13, nº 47, p. 127-148, 2005.

SAVIANI, D. A questão da reforma universitária. Educação & Linguagem,ano 7, nº 10, p. 42-67, 2004.

SAVIANI, D. O futuro da universidade entre o possível e o desejável. Fórum Sabedoria Universitária. Unicamp, Campinas, 2009.

SAVIANI, D.; SOUZA, R. F.; VALDEMARIM, V. T.; ALMEIDA, J. S. O legado educacional do século XX no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2004.

SOUZA, J. G. Evolução histórica da universidade brasileira: abordagens preliminares. Revista de Educação,Campinas, nº 1, p. 42-58, 2012.

TANURI, L. M. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, Campinas, v. 14, p. 61-88, 2000.

VIEIRA, S. R. A trajetória do curso de Pedagogia – de 1939 a 2006. 1º Simpósio NacionaleXX Semana da Pedagogia, v. 11, 2008. Disponível em: https://www.unioeste.br/cursos/cascavel/pedagogia/eventos/2008/4/Artigo%2013.pdf. Acesso em: 13 fev. 2017.

Publicado em 12 de março de 2019

Como citar este artigo (ABNT)

SOUZA, Dominique Guimarães de; MIRANDA, Jean Carlos; SOUZA, Fabiano dos Santos. Breve histórico acerca da criação das universidades no Brasil. Revista Educação Pública, v. 19, nº 5, 12 de março de 2019. Disponível em https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/19/5/breve-historico-acerca-da-criacao-das-universidades-no-brasil

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