Este trabalho foi recuperado de uma versão anterior da revista Educação Pública. Por isso, talvez você encontre nele algum problema de formatação ou links defeituosos. Se for o caso, por favor, escreva para nosso email (educacaopublica@cecierj.edu.br) para providenciarmos o reparo.
Conversa entre professores: vamos avaliar a avaliação?
Prof. Dra. Bertha de Borja Reis do Valle
UERJ
Iniciando a conversa...
Você já percebeu que em nosso meio educacional tem gente que fala mais do que faz? Ou ainda, fala uma coisa e faz outra? A verdade do discurso não está só naquilo que você diz, mas em como você diz. Mais ainda, você pode falar de democracia e ser um ditador e nem se dar conta disso. Será que a avaliação é um assunto bem avaliado? A avaliação da escola deveria permitir que as promessas alardeadas por educadores se tornassem concretas. E o que é avaliar?
Falando sério...
Avaliar tem o sentido de dar ou de determinar o valor. Em sentido mais subjetivo, significa apreciar ou estimar o merecimento de alguém ou de alguma coisa. Pode ser entendido como verificar, comparar, analisar, julgar.
Diante de tantos significados possíveis, é preciso que se tenha clareza do papel da avaliação em cada momento do ato pedagógico. Com que objetivos ela está sendo usada? Em um primeiro momento, cabe perguntar:
- Com que sentido estamos utilizando a avaliação dos nossos alunos?
Historicamente, a avaliação em educação tem tido diferentes enfoques. A avaliação da aprendizagem do aluno é a discussão mais antiga e a mais enfocada pelos pesquisadores deste tema - avaliação. No Brasil, lembramo-nos que os questionamentos sobre como nós, professores de classes de ensino básico, avaliávamos nossos alunos remonta ao início da década de 1970, logo após a Lei 5.692/71. A avaliação do rendimento escolar era tema de cursos, seminários e publicações do Ministério da Educação.(Cf. PAIXÃO, l973) A avaliação como processo e suas diferentes funções eram debatidas em todas as escolas do Rio de Janeiro nas reuniões pedagógicas.
Em um segundo momento, o foco da avaliação recaiu sobre o currículo, mais ou menos nos anos 1980, final da década de 1970. Até esse momento predominava a avaliação quantitativa, embora a introdução de "conceitos", em substituição às "notas" já estivesse em vigor oficialmente desde l973, por meio do Parecer 1350, do Conselho Federal de Educação. Os professores, porém, sem uma orientação clara do papel da avaliação, transformavam os conceitos em notas. A avaliação qualitativa só vai começar a ser discutida academicamente, em l978.
As discussões sobre o caráter quantitativo ou qualitativo da avaliação escolar persistem até hoje, pois muitos professores não estão esclarecidos em relação às políticas governamentais relativas à repetência, à avaliação contínua do aluno, à autoavaliação de seu próprio trabalho. Confundem avaliação continuada, aceleração de estudos, correção de fluxo escolar com promoção automática e desvalorização do papel cerceador do professor por intermédio das notas, quando a avaliação é utilizada como punição e como coerção disciplinar, ao invés de meio de transformação e crescimento de alunos e mestres.
Em relação à avaliação institucional, a avaliação da escola como um todo, as discussões surgem quando se inicia a preocupação com a melhoria do trabalho desenvolvido nas escolas, com a democratização do cotidiano escolar.
A avaliação institucional tem um papel extremamente importante na melhoria da qualidade dos serviços prestados pela instituição e das relações sociais, humanas e interpessoais, além de contribuir para o aperfeiçoamento continuado de seus integrantes, sejam eles os professores da escola, os alunos, os funcionários, a comunidade...
O que diz a LDB?
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - Lei Darcy Ribeiro - em relação à avaliação determina que os docentes zelem pela aprendizagem dos alunos e estabeleçam estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento (Artigo 13, III e IV). Entre as regras comuns para a Educação Básica, a lei diz que a verificação do rendimento escolar deverá observar a avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com "prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos", além de maior valorização dos resultados ao longo do período "sobre os de eventuais provas finais". (Artigo 24, V) Então, como você está vendo, a LDB determina que as escolas façam essa recuperação durante todo o ano letivo.
A recuperação final é simplesmente aquele remédio que se precisa tomar para baixar a febre, algo que tem que se fazer para diminuir a tensão. O importante é que as escolas tenham projetos de recuperação durante o ano. Você concorda que a recuperação durante o ano realmente prepara melhor o aluno? Não há dúvida de que se, no primeiro semestre, o aluno falha ou não teve o desempenho que era esperado, há uma oportunidade de, a partir de agosto, entrar no ritmo desejado.
Cada criança ou adolescente pode ter um desempenho ruim por determinados motivos. Não existem dois alunos iguais, nem dois seres humanos iguais. Por exemplo, as crianças das escolas de algumas comunidades que ficam fechadas por causa de violência, estão em uma sociedade com clima de tensão. Mesmo que no dia seguinte a escola abra e aparentemente tudo esteja normal, os alunos e os professores estão emocionalmente afetados. Isso vai se refletir na aprendizagem.
A escola vai ter que encontrar os seus próprios caminhos. Há escolas que tem um grupo maior de professores do que o necessário para o dia-a-dia, e pode ter classes de apoio. Outras escolas recebem estudantes universitários de cursos de formação de professores, outras usam os alunos de sétima ou oitava séries, ajudando os colegas de terceira ou quarta séries, o que é bom porque cria um grupo de amigos dentro da escola.
Os caminhos permitidos pela LDB para melhorar os processos avaliativos são vários, cada escola tem que encontrar o seu.
Avaliando o processo ensino-aprendizagem
O processo ensino-aprendizagem é como uma avenida de mão dupla. As duas vias se completam. Deve ficar claro para os professores, que, se o aluno não aprendeu, ele não ensinou, ou, pelo menos, não ensinou tudo aquilo que pretendia ensinar.
Assim, a avaliação não é algo externo ou separado do processo ensino-aprendizagem ou um procedimento isolado, mas um conjunto de fases que se condicionam mutuamente e formam um sistema. A avaliação da aprendizagem do aluno que tem apenas como alvo o julgamento e a classificação do aluno, precisa ser revista. O principal papel da avaliação é fornecer informações sobre o processo pedagógico, permitindo aos docentes fazerem intervenções e ajustes necessários, que garantam a aprendizagem de todos os alunos.
A avaliação, como parte do processo ensino-aprendizagem, torna-se ainda mais importante e deixa de ser apenas a avaliação do aluno, e passa a ser a avaliação de todos: do processo pedagógico, das metodologias utilizadas, do relacionamento professor-aluno e do projeto político-pedagógico da escola.
As estatísticas, ano após ano, mostram que os alunos repetentes não são melhores alunos que os que estão pela primeira vez na série. Se repetência fosse bom, ele seria melhor aluno no ano em que repete. Isso desestrutura emocionalmente a criança ou o adolescente. A própria família em casa, apresenta o menino como o "patinho feio" da família. Não é bom, psicologicamente, para o aluno.
A avaliação não é uma arma a ser utilizada para controlar o comportamento, a disciplina dos alunos, mas uma forma de verificar erros no processo de ensino ou no projeto educativo da escola. É um processo complexo que precisa ser dinâmico, justo, criativo e coerente, envolvendo não apenas o aluno, mas também os professores.
Perguntando e refletindo sobre avaliação...
Para avaliarmos a avaliação que fazemos de nossos alunos e de nosso trabalho pedagógico, é preciso ter bem claro os objetivos que pretendemos alcançar e respondermos para nós mesmos, à guiza de autoavaliação, algumas questões:
- O que eu tenho feito para ajudar meu aluno a aprender?
- Como tenho agido para combater o "fracasso escolar"?
- Como tenho utilizado as vivências de meus alunos para melhorar o meu trabalho educativo?
- Tenho refletido sobre as causas da evasão e da repetência?
- Como avalio meus alunos?
Concluindo a conversa...
Mudanças na formação de professores têm sido uma das soluções apontadas como uma saída para se obter a esperada qualidade da escola brasileira. Obviamente, não será apenas formando-se profissionais mais competentes para o atual momento histórico, que alcançaremos patamares mais elevados de rendimento educacional. Mas, dificilmente, obteremos êxito, sem a participação de professores comprometidos com sua própria prática docente, conscientes de seu papel de formadores de novas gerações, de levas de cidadãos que continuarão (ou não) a caminhada por uma sociedade, de fato, justa e democrática.
Publicado em 5 de setembro de 2005.
Publicado em 31 de dezembro de 2005
Novidades por e-mail
Para receber nossas atualizações semanais, basta você se inscrever em nosso mailing
Este artigo ainda não recebeu nenhum comentário
Deixe seu comentárioEste artigo e os seus comentários não refletem necessariamente a opinião da revista Educação Pública ou da Fundação Cecierj.