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Sua atitude pode influenciar o resultado de seus alunos?
Leonardo Soares Quirino da Silva
Com base em pesquisa sobre como ensinar professores a ter uma atitude reflexiva ou crítico-reflexiva, o professor Antônio dos Santos Andrade defendeu a necessidade de se pesquisar o fracasso escolar a partir da relação professor-aluno.
No artigo "Refletindo sobre a relação professor-aluno em um grupo de professores do ensino fundamental" (2003), o professor do Departamento de Psicologia Social e Educação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP/Ribeirão Preto relata pesquisa sobre como realizar trabalho de promoção do autoconhecimento em relação ao seu desempenho profissional e de incentivo ao aumento da espontaneidade no exercício da profissão.
Antônio encontrou evidências de que o resultado dos alunos pode ser influenciado pelo comportamento do professor, pelo mecanismo que os psicólogos chamam de Princípio da Profecia Autorrealizadora. Esse princípio pode ser definido como o processo pelo qual as expectativas de alguém fazem que outra pessoa se comporte da maneira esperada ou que seja percebida como que fazendo isso.
O trabalho consistiu em nove encontros com professores do ensino fundamental. Na segunda reunião, o tema dos alunos "problema" foi sugerido pelos participantes. Ao fim da experiência, os docentes perceberam o quanto seu comportamento influencia o dos alunos. Para resolver essa questão, foram discutidas as práticas docentes e ensinados aos mestres elementos de comunicação não-verbal.
Outras experiências
Essa, contudo, não é a primeira vez em que se sugere que o comportamento do professor, decorrente de suas expectativas sobre os alunos, influencia a demanda deles.
Na década de 1960, nos EUA, os pesquisadores de sociologia da educação Robert Rosenthal e Leonore Jacobson fizeram testes de QI em todos os alunos de uma escola primária no início do período letivo. Depois, selecionaram 20% deles aleatoriamente e disseram aos professores que esses alunos tiveram o melhor resultado no teste. No fim do ano, os estudantes selecionados apresentaram, na média, um resultado maior que a média da turma.
Origens
No artigo Self-fullfilling prophecy: better perfomance by perception (Profecia autorrealizadora: melhorando seu desempenho pela percepção), Cliff Grimes, da empresa de consultoria britânica Accel Team, diz que o princípio da Profecia Autorrealizadora foi proposto a primeira vez pelo sociólogo americano Robert K. Merton em 1957, no livro Social Theory and Social Structure (Teoria e Estrutura Social). Para Merton, o fenômeno ocorria quando "uma falsa definição de uma situação evoca um novo comportamento que faz a falsa concepção original se tornar verdade".
Grimes cita uma passagem da peça Pigmaleão de Bernard Shaw, adaptada para o cinema com o nome de My Fair Lady, para ilustrar que na verdade esse efeito decorre da maneira como a pessoa é tratada e não de sua essência. Na peça, o professor Henry Higgins aposta que é capaz de treinar uma florista pobre e fazê-la passar por uma duquesa, o que realmente ocorre.
Em seu artigo, o consultor inglês resume os princípios-chave da profecia autorrealizadora nos seguintes pontos:
- Nós formamos certas expectativas a respeito de pessoas ou acontecimentos.
- Nós comunicamos estas expectativas passando várias pistas do que pensamos.
- As pessoas tendem a responder de acordo com essas pistas ao adequarem seu comportamento para correspondê-las.
- O resultado é que a expectativa original torna-se realidade.
Como Grimes observa, as pistas de nossas expectativas são passadas para as pessoas das formas mais diversas, como balançar a cabeça, elevar as sobrancelhas ou dilatar as narinas.
Talvez por isso em seu treinamento o professor da USP/Ribeirão Preto passou para os professores alguns conceitos de comunicação não-verbal.
Formas de comunicar suas expectativas
Em seu artigo, o consultor britânico também apresenta uma lista de onze pontos sobre como os professores comunicam essas expectativas para seus alunos, que apresentamos a seguir:
- Sentando os alunos que têm baixa expectativa longe do professor ou formando um grupo só com eles.
- Dando menos atenção em sala aos que ele considera menos, sorrindo menos frequentemente para eles ou olhando menos nos olhos, por exemplo.
- Chamando-os menos frequentemente para responder perguntas ou se apresentar em público.
- Esperando menos tempo quando são eles que têm que responder a uma questão.
- Não se detendo muito com eles quando erram, por exemplo, dando menos pistas da resposta certa ou fazendo menos questões relacionadas ao ponto.
- Criticando-os mais frequentemente quando erram a resposta do que os alunos sobre os quais tem altas expectativas.
- Elogiando-os menos quando respondem corretamente do que quando são os alunos que considera mais capazes.
- Elogiando-os menos por respostas quase certas ou inadequadas.
- Falhando ao não fazer observações sobre suas respostas tão frequentemente quanto o faz com os alunos que considera melhores.
- Pedindo aos alunos que tem em baixa consideração menos trabalho ou esforço do que aos que tem em alta.
- Interrompendo mais frequentemente os alunos que tem por melhores.
Resistência
Não se deve esperar, contudo, que os alunos ou qualquer outro sejam sujeitos passivos. Por e-mail, o professor Antônio dos Santos Andrade observou que especialmente os autores mais ortodoxamente ligados ao conceito da profecia autorrealizadora tendem a ter uma visão estática do processo, quando "há todo um dinamismo ocorrendo dentro da sala de aula".
Na mesma mensagem, o professor comenta essas formas de resistência adotadas pelos alunos:
- Há toda uma prática de resistência, por parte dos alunos e que inclui não apenas os comportamentos agressivos, mas, por exemplo, a rotulação do próprio professor, a formação de estereótipos reativos sobre o professor, além de outras tantas formas de "resistir" à ordem, à disciplina que estão implícitos nesta rotulação.
Para quem quiser se aprofundar no tema, Antônio recomenda a leitura dos capítulos sobre educação e escola do livro Vigiar e Punir de Michel Foucault. Para ele, a partir da leitura de Foucault, o conceito da profecia autorrealizadora "assume uma perspectiva muito mais dinâmica e, até mesmo, se quiser, dialética".
Publicado em 25 de outubro de 2005
Publicado em 31 de dezembro de 2005
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