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As coisas belas são difíceis

André Braga

Mestrando em Filosofia pela UFRJ

Às meninas que representaram minha nação na ginástica olímpica em Atenas

Ginástica e polonaises

Numa destas noites frias, que estão cada vez mais cotidianas no Rio, estava eu em casa, lendo um caderno de esportes que fazia um retrospecto das Olimpíadas. Um CD de peças para piano fazia a trilha sonora da leitura. No caderno pude tomar conhecimento dos feitos de Carl Lewis, Nadia Comaneci, Mark Spitz, Adhemar da Silva e outros - verdadeiros heróis que caminharam entre nós, mortais. Esses feitos, imortalizados pelo olhar das câmeras, ao rechear a publicação, formam um conjunto tal de elementos que, surpreendentemente, pinta em nosso rosto as cores da admiração e do respeito por pessoas que nunca vimos nem conhecemos. Admiração e respeito por homens e mulheres que tiveram, e continuam tendo, o papel de ser o lugar no qual alguns de nossos limites se revelam. Papel difícil na milenar tragédia humana. Fardo pesado. E, no entanto, ainda assim, atraente.

Fiquei pensando nisso, na atração que tudo isso exerce sobre nós... O que faz com que esse papel concentre tanto a nossa atenção e conquiste tanto nossa admiração e respeito? Porque esses feitos aparecem para nós com um quê de magia, como dotados de poder, e até de mistério. Essa atmosfera permeia o esporte como um todo, mas parece encontrar na Olimpíada sua maior expressão. Alguém poderia dizer que é o glamour, o cerimonial que o evento tem e coisas afins. Mas duvido. A questão é: donde vem isso? Donde vem esse espírito que, mesmo na selva do capitalismo global, que fez dos Jogos Olímpicos um fenômeno de marketing e lucratividade, insiste em se fazer presente? E esse espírito se faz presente, sim, enchendo nossos peitos de tensão, alegria e lágrimas, quando do desenrolar das provas... A mesma coisa que nos toma nas finais da Copa do Mundo... Por alguns minutos, esquecemos completamente os logos das empresas de tênis e afins e sincronizamos todos nossos milhões de corações num só ritmo. No ritmo, por exemplo, das pernas ágeis de Danielle Hipólito movimentando-se sobre a trave da ginástica olímpica, quase como dedos de citarista correndo sobre uma só corda... Ou, por exemplo, no ritmo gostoso do requebrado de samba que Daiane dos Santos introduziu no seu número de ginástica solo... Ou no ritmo da subida e aterrissagem de Laís de Souza, na prova de salto sobre cavalo, caindo bela e firme como mão de pianista que salta de um extremo a outro do teclado... Engraçado fazer comentários assim sobre os feitos das meninas da ginástica olímpica. Deve ser efeito do CD pianístico que então embala meu pensamento. No entanto, eu, de fato, fiquei deveras impressionado com a apresentação delas. 

Pensava nisso quando resolvi levantar-me e desligar o aparelho de som; o som da música estava prendendo minha atenção, e eu lembrei que precisava escrever um texto. O CD em tela era um de polonaises e noturnos de Chopin. Ele tocava a faixa quatro quando cheguei a ele como um carrasco chega à vítima. Meu dedo chegou a tocar de leve a tecla que encerraria tudo, mas não pude apertá-la. A peça que era executada naquele momento impediu-me. Tratava-se da "Polonaise Opus 53", a famosa "Heroica"... Não tive coragem de silenciá-la, não pelo menos naquele momento em que pensava na ginástica e na Olimpíada como um todo.

Alguém pode estranhar a combinação de esporte com música, mas, já nos dizia Platão, importantes são para o homem ginástica e música. Pois bem, a polonaise de Chopin continuava a tocar seus 7,5 minutos, 7,5 minutos, pode-se dizer, de paixão verdadeira extravasada pelas artérias de nossos seres. Uma das maiores obras da humanidade, sem dúvida. Forte, radiante, estupenda... E, ao mesmo tempo, doce, meiga. É dita por alguns como 'militar'. De fato, ela tem uma força bélica, emanada de acordes que desenham em nós uma batalha. Por outro lado, sua melodia é como o canto de uma jovem, entoado na sacada da janela para o namorado. Uma trilha sonora perfeita para a leitura interrompida. Perfeita, na verdade, para interromper a leitura, apontando-me o que não me estava claro ainda no caderno de esportes... Não, mais do que no caderno; não estava claro na Olimpíada mesma. Algo que a permeia... Algo que hoje chamaríamos timidamente de espírito olímpico. E a polonaise era a música de fundo desse espírito. Não fundo como algo esquecido, mas como o solo mesmo onde o espírito se fixa e se nutre.

Pois é... Ao se fincar na peça de Chopin, meu pensamento realizou um salto por sobre a Olimpíada, indo de encontro a isto que nela está fermentando e que, atravessando os séculos, chega a nós... Quase como um sopro, oriundo das praias gregas antigas... Um sopro que não se sabe se foram as Olimpíadas que deram aos gregos, ou se foram eles que o imprimiram nela. De qualquer modo, esse sopro está na cultura deles toda, em todas as áreas. Assim, mais do que olímpico, o correto seria chamá-lo amplamente de espírito grego, algo que mostrou-se presente em toda a cultura daquela sociedade. Mas que é esse sopro? Que vem ele nos dizer?

Espírito grego

Esse espírito é uma forma muito singular de ver a realidade; forma essa que é permeada por certos valores que, por vezes, tendem a nos parecer esquecidos e de pouca importância... No entanto, tais valores já foram motivo de grandes discussões. Já foram motivo mesmo de guerras. Se nos fosse possível traduzir em palavras, o que seria essa forma de ver e compreender as coisas? Nós a chamaríamos - e isso com o desejo de máxima fidelidade - de uma visão estético-esportiva da realidade (Jaeger chama-a visão artística. Cf . JAEGER, W. Paideia.Trad. de Artur Parreira. São Paulo: Martins fontes, 1986, p. 8.).Precisamente, isso é a Grécia antiga, a Hélade: uma compreensão de mundo na qual vida é um fenômeno de beleza e 'esporte'.

Acalme-se, leitor que já esboça levantar a voz em protesto. Esses conceitos têm que ser mais bem explicados a fim de evitar entendimento equivocado. Tanto "beleza" como "esporte" têm que ser tomados em sentido amplo, ou seja, filosófico. Estamos falando da beleza do corpo, das palavras, dos gestos, do espírito, mas também a beleza do pôr-do-sol, das ondas que vêm e vão-se perdendo na areia... Beleza do canto dos pássaros numa manhã ensolarada ou de uma taça de vinho numa noite de brisas geladas. A beleza da vida se dando. "Esportivo", nesse caso, também diz respeito a algo que ultrapassa as instituições, os clubes e as federações. Ultrapassa mesmo os jogos em si. Esportivo tem o sentido muito especial de algo que diz respeito a algo próprio à vida: movimento de conquista. Disputa. Conquista de si, conquista do outro, num embate de forças. Embate como único lugar onde as forças de um e de outro vêm a ser de maneira total e completa. Lugar onde as forças se medem, delimitam-se e, por vezes, se misturam. Nesse sentido, o combate é quase uma dança, isto é, um movimento de amantes, de conquista onde dois têm que vir a ser um, por estarem a serviço de algo maior: a música, que os rodeia e atravessa. Atravessa e dá o tom, tal e qual a polonaise que, finda, insiste em continuar ressoando... em nós. Noto, então, que Chopin também viu essa singular relação do combate com a dança: ele colocou, em meio à sua "Heroica", verdadeiro canto de guerra, toda uma atmosfera de mazurca, que é uma dança. Uma dança de casais...

Nota

Notar que existem de fato certas artes marciais que admitem a beleza de uma dança, como o kung fu, e outras que realmente o são, como a capoeira.
Estamos falando da tragédia. É que sua origem está nos cultos a Dioníso ou Baco, deus do vinho, do festivo e do erótico; assim, a palavra em grego 'tragoidia' significa literalmente 'canto do bode', 'tragós', o animal símbolo do deus.

Uma pergunta, justa, poderia, então, nos ser feita: mas que provas temos da presença desse dito espírito grego em meio à cultura do povo helênico? Isto é, onde ele era visível dentro daquela sociedade? Justo perguntar. Seria tudo tão abstrato assim? Não. Esse culto, por assim dizer, ao belo e ao combate, disputa - respectivamente, no idioma helênico, 'kalós' e 'agòn' (ou 'pólemos' e 'éris', dependendo do contexto) - ganham concretude nos dois maiores acontecimentos sociais do mundo grego: os concursos de poesia (entenda-se: teatro, tragédia e comédia) e as Olimpíadas. A importância dada pelo homem grego antigo a esses dois eventos é a prova da viva presença daquele espírito, daquela essência, de que falávamos, nele... Essa importância é algo sobremaneira hipertrofiado que pode mesmo parecer exagerado aos nossos olhos modernos. Nas apresentações das tragédias, por exemplo, a plateia entrava em transe, experimentando um verdadeiro torpor, na magnitude do belo... Assim, durante o canto ao deus-bode, todos imersos ficavam na dor de Antígona, compartilhando de toda a sua tristeza ao ser levada viva para o túmulo subterrâneo... Todos ficavam tomados pelo ódio de Medeia, pela frieza de sua vingança suprema... Ficavam compadecidos por Hipólito, pelo terror que o amor da deusa lhe imprime... Nos segundos de catarse dos espetáculos, o transe era tal, e as emoções, de tal maneira carregadas, que, relata-se, às vezes mulheres grávidas abortavam... Pessoas tinham que ser retiradas por comprometimento da saúde...

 

Os Jogos Olímpicos também eram, como o teatro, uma realização da essência do povo. O mundo grego parava para assistir às disputas de seus campeões, à consagração dos melhores, daqueles que dentre todos alcançaram a excelência. Hoje, talvez, não nos seja possível visualizar o que era isso em toda a sua plenitude... Para termos uma ideia, o campeão de uma Olimpíada tinha como prêmio na época, entre outras coisas, a graça de ser, na linguagem cotidiana, sustentado pelo Estado. Pelo resto da vida. (A Nike, temos que admitir, fez o mesmo pelo Ronaldinho.) Vale dizer que, na prática, a pretensa separação entre beleza e disputa não existia: os concursos de poesia eram a disputa para eleição das maiores peças de teatro; a Olimpíada, palavra que significa também um canto, literalmente uma ode ao Olimpo, a morada dos deuses, não deixava de ser um culto ao divino e ao belo. Tragédia, combate pela beleza. Olimpíada, a beleza do combate, da disputa.

Hoje, do nosso ponto de vista, chega a parecer que esse espírito, essa 'seiva', os gregos traziam no sangue. Ao a vermos expressa em todos os lugares de sua cultura - pintura, mitologia, poesia, escultura, esportes etc. -, nós, em certa medida entusiastas disso tudo, temos dificuldade de evitar essa ideia. "Um grego nascia com o dito espírito grego", somos tentados a pensar... Ledo engano. Um grego nascido na Grécia, mas criado fora dos muros da Hélade, fora dos padrões helênicos, num país "bárbaro", é tão "bárbaro" quanto qualquer outro homem. Um grego educado fora da educação grega, como ela era aos olhos dos antigos, seria, sem dúvida alguma, "bárbaro" - vide os 'gregos' modernos. Portanto, consideremos ou não especial essa forma grega antiga de ver o mundo, sobre isso não podemos discordar: ela não era natural. Ela era fruto da paideia, a educação, em sentido amplo, com a qual aquele povo provia seus filhos, com a qual ele fomentou neles seus valores, seus ideais de humanidade.

A educação em primeiro lugar

Educação. Tudo, o alto apreço à disputa, ao choque de forças, à arte, ao belo e divino, tudo era semeado e cultivado no homem grego pela sua família, seus tutores, seus mestres e sua comunidade. Isso desde a mais tenra idade até o resto de seus dias. E tudo o que era fornecido ao homem pela sociedade, na sua educação, o preferível era sempre que fosse belo. E também que fosse conquistado. Que fosse difícil. Os jovens eram ensinados a caçar, mesmo que nunca precisassem disso para prover-se de alimentos. Eram ensinados a lutar com armas, mesmo que nunca entrassem em campanhas militares. Os esportes eram tidos, em relação aos outros tipos de ensinamentos, como de igual necessidade. "Ginástica e música" (PLATÃO, A República. Trad. de Maria Helena da Rocha Pereira. Porto: Fundação Calouste Gulbekian, 1983. Passo 377a.), como já citamos, era o necessário. Primeiro, o esporte ensinava aos jovens as mais básicas regras de sociabilidade, da relação com o outro. Em segundo lugar, ele é em si o exercício do esforço, da conquista de algo que não está simplesmente dado e à mão. A tensão com o próprio limite. Essa forma especial de entender as coisas, que era o cerne da educação, encontrava nos Jogos Olímpicos seu lugar de maior consagração. E, quando vejo a menina Danielle dançando sobre uma trave de 10 centímetros de largura, com a graça de uma garça e a garra de um lince, ouso sentir que, ainda hoje, assim o é. Pela determinação dessas meninas, laborada em quatro anos, concentrada num único dia na luta pela conquista de suas consagrações, ainda o é.

Nota

Vale dizer que o ensino da música, na Grécia antiga, incluía o da poesia enquanto coisas inseparáveis. Não era comum música, por assim dizer, "instrumental".

A beleza também estava lá desde os primeiros ensinamentos da criança grega. Aprender a ler grego era aprender a ler Homero, era aprender a ler a Ilíada. Contra isso, nós poderíamos entrar com protestos mil; baseados em estudos sobre capacidade intelectual infantil, diríamos que as figuras de linguagem, o nível léxico (complexo mesmo para os adultos) e a profundidade semântica não poderiam, de modo algum, ser compreensíveis para os pequenos. Porém, para aquele povo, não havia motivo para facilitar. A seiva grega era, então, desde já fomentada dentro das crianças. O domínio da língua começava pelo aprendizado justamente daquilo que, nela, lhes era o mais caro. O mais belo. O mais difícil.

E orgulhavam-se os gregos de dizer: Homero, educador e pai de toda a Grécia. Na Ilíada, sua maior obra, a saga que conta os feitos de Aquiles e a Guerra de Troia, está contido também o ensino das atividades mais variadas da cultura: como preparar a madeira para o fabrico dos barcos, como fundir os metais para o preparo de armas, como preparar os alimentos, como fazer vestimentas, como enterrar os mortos etc. Enfim, todo o pilar daquela sociedade, do que é mais raro ao mais comum, está lá ensinado sob a forma de poesia, e poesia cantada. A educação no sentido mais completo do termo: Homero ensinou os gregos, desde os mais pequenos detalhes, até os seus mais íntimos e altos princípios, a serem gregos. Está 'tudo' lá, poeticamente ensinado. E ensinado de maneira bela. Porque até o aprendizado das coisas mais cotidianas importava que fosse belo. E importava que fosse conquistado. É como se, por exemplo, nossos livros de receita fossem escritos sob a forma de poesia, e as pessoas aprendessem a cozinhar recitando-os; entenda-se: cantando-os... A própria história da Ilíada é a narrativa da guerra para trazer de volta Helena, a mulher mais bela da Grécia. Mas esta narrativa é contada de maneira tão radiante e extraordinária que chega ao ponto de uma guerra (sem armas químicas e sem extermínio fácil no apertar de um botão, é claro), contada por um poeta, realmente se mostrar bela. A Ilíada educou a Grécia ensinando-lhes nada mais nada menos do que a essência do povo: não só a beleza de cada atividade cotidiana, a graça e importância da conquista de cada prego na construção da nau, de cada tempero na degustação de um assado, mas, sobretudo, por mostrar, de um lado, a própria guerra pela beleza, a guerra pelo que é mais belo; e, do outro, a beleza da guerra, isto é, a beleza do disputar, do  próprio conquistar e do vencer-se a si mesmo.

E, insistimos, não se faz aqui uma apologia da guerra no sentido moderno, o genocídio covarde empreendido, hoje, pelas nações. Estamos falando de um outro sentido para a palavra guerra, disputa e conquista. Até uma criança, quando toma coragem e desce pela primeira vez na vida um escorregador, está "em guerra". Quem não acredita vá a qualquer parquinho e comprove.

Conclusão

(sem concluir, porque realidade histórica é movimento de eterna conclusão)

[...] é preciso, por profunda necessidade histórica, voltar os olhos para as fontes de onde brota o impulso criador do nosso povo, penetrar nas camadas profundas do ser histórico em que o espírito grego, estreitamente vinculado ao nosso, deu forma à vida palpitante que ainda em nossos dias se mantém, e eternizou o instante criador da sua irrupção.
Werner Jaeger

Esse espírito, então, era de fato 'transmitido' por educação. Não nasceu com os gregos. Nem morreu com eles. Afinal, é e sempre será possível ouvir o seu canto numa polonaise de Chopin. A beleza da batalha da vida de cada um de nós, da vida de todos nós, ressoando nos acordes do compositor polonês, sendo cantada a cada corrida que os dedos executam pelas teclas brancas e pretas... Tal e qual a batalha pela beleza que se desenrola nas vicissitudes da ginasta que corre pelo solo, num esporte que, talvez, ele mesmo, represente a própria Olimpíada. Sim, a ginástica a representa; não é coincidência que seja esse o esporte que está presente (com modificações não essenciais) nas cerimônias de abertura e encerramento. Entre os esportes, é na ginástica olímpica que está o espírito olímpico, o espírito grego em seu mais alto grau... Nesse esporte único, o culto à beleza e o culto à conquista estão talvez conjugados da maneira mais sublime de todas. Certos movimentos da ginasta, podemos ver, são puro esforço, pura conquista, em busca de salto, de impulsão, de subida, de descida, de voltas no solo e no ar... Outros movimentos, no entanto, não têm outro objetivo senão o de puro balé, isto é, senão o de gesto belo, senão o de leveza, o sorriso para os jurados, levantar os braços, quase como dança flamenca, ou apenas deixar o corpo fluir com a música, cheio de feminilidade e gingado... Aliás, isto não pode ser esquecido: a presença viva, visceral, da música... E as meninas do Brasil escolheram "O Guarani", e escolheram samba... "Ginástica e música".

Sem dúvida, a ginástica olímpica e a capoeira, sua versão mais erística e nacionalista, são realmente os esportes que insistem em ser, hoje, a vivência mais autêntica e intensa daquele espírito grego de que tanto falei. A luta: da atleta com o solo, da atleta com o cavalo, com a barra, com a gravidade, com a outra atleta e consigo mesma. E a beleza: dos movimentos, graciosos, firmes, precisos. Cheios de canto e encanto. E ficamos todos nós, aqui, nervosos, a quilômetros oceânicos de distância, com nossos corações regidos pelos coraçõezinhos dessas pequenas grandes brasileiras, regidos num só pulso. Torcendo, gritando, vibrando. Eufóricos. Dionisíacos. Num só pulso. Num só impulso. Numa única polonaise.

É o que nos chegou; é nossa herança. Herança de um povo que, morto, faz-se presente. Faz-se presente numa visão estético-esportiva do que existe a nossa volta. Educação, paideia, é herança, é retomar a vida do que é herdado no próprio ato de herdar, de receber; de conquistar. E, especificamente, a herança de que trata este texto partiu das quentes praias do Mediterrâneo, viajou e encontrou onde germinar, orgulho-me dizer, aqui, uma outra praia quente, nossa tropical Ilha de Vera Cruz, nossa pátria, mãe gentil. Rebatizada, posteriormente pelos conquistadores: Brasil. Lugar e hora de retomar a herança. De reconquistá-la. Porque é belo. É difícil. Como diz um antigo ditado grego, "As coisas belas são difíceis".

Publicado em 31 de dezembro de 2005

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