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Dos elétrons aos confins do Universo

Lorenzo Aldé

Jornalista

A ciência rompendo limites espaço-temporais

A "conquista" do attossegundo

Nos últimos dias, foram divulgadas duas fantásticas conquistas da Ciência, que simbolizam os extremos do fascínio humano em querer enxergar cada vez mais longe e mais profundamente.

Primeiro veio o anúncio de que cientistas alemães e austríacos haviam conseguido acompanhar o movimento de partículas atômicas no menor espaço de tempo já registrado. Pela primeira vez, foi possível "fotografar" (utilizando emissões de raio-X) ações que acontecem na escala dos attossegundos, ou seja, no intervalo de tempo equivalente a 10 -18 segundos. Representando de outra forma: 1 attossegundo é o mesmo que 0,000000000000000001 segundo.

Para se ter uma ideia da importância desse avanço científico, basta dizer que, em 1999, o professor Ahmed H. Zewail ganhou o Prêmio Nobel de Química por seus estudos utilizando a espectroscopia para acompanhar os movimentos de átomos e moléculas na escala do femtossegundo (10 -15 segundos). Agora, apenas cinco anos depois, a equipe de Ferenc Krauzs conseguiu ir além, captando movimentos que ocorrem em 100 attossegundos: "Nosso objetivo é rastrear o movimento de elétrons dentro dos átomos em tempo real", declarou Krauzs. Isto será alcançando por meio de várias fotografias que, colocadas em sequência, reconstituirão mudanças na estrutura atômica que nunca tinham sido observadas antes.

Interessante notar como, no campo da Ciência, espaço e tempo andam juntos: para enxergar objetos e ações cada vez menores é necessário o mergulho em escalas de tempo infinitesimais. Até onde conseguiremos ir, se tempo e espaço, ao menos em teoria, podem ser subdivididos indefinidamente? Mil vezes mais rápido que o attossegundo é o zeptosegundo (10 -21), e mil vezes mais rápido do que este é o yoctossegundo (10 -24). Dificilmente os cientistas se conformarão em não saber o que ocorre nestas escalas ainda menores do tempo.

O que nos remete ao clássico Paradoxo de Zenão, segundo o qual, para percorrer um metro é antes necessário perfazer a metade do caminho, e antes disso a metade da metade, e assim sucessivamente ad infinitum, resultando numa teórica impossibilidade de movimento. Aplicada à pesquisa em escala microscópica, a provocação matemático-filosófica de Zenão nos leva a pensar que a ideia de infinito não deve ser associada apenas ao nível macroscópico, ilustrado pela famosa discussão sobre a finitude do Universo. O infinito também pode ser concebido em nível microscópico, uma vez que sempre será possível ir "mais longe" (ou mais fundo) no universo da micronatureza, que tantas maravilhas vem nos revelando (vide o mapeamento do código genético).

Uma frase do responsável pelo "cronômetro" de attossegundos, exemplificando a dimensão dessa escala temporal, sugere a relação entre micro e macro: "O attossegundo está para o segundo assim como o minuto está para a idade do Universo", disse Ferenc Krauzs.

Veio justamente da origem do Universo a segunda grande descoberta científica anunciada recentemente: uma imagem das galáxias mais antigas já registradas.

A título de curiosidade, veja abaixo os prefixos oficiais do Sistema Internacional de Unidades (SI) para as ordens de grandeza, das menores às maiores mensurações.

Fator de multiplicação F. de multiplic.
(notação científica)
Prefixo Símbolo
1.000.000.000.000.000.000.000.000 1024 yotta Y
1.000.000.000.000.000.000.000 1021 zetta Z
1.000.000.000.000.000.000 1018 exa E
1.000.000.000.000.000 1015 peta P
1.000.000.000.000 1012 tera T
1.000.000.000 109 giga G
1.000.000 106 mega M
1.000 103 quilo k
100 102 hecto h
10 101 deca da
0,1 10-1 deci d
0,01 10-2 centi c
0,001 10-3 mili m
0,000001 10-6 micro µ
0,000000001 10-9 nano n
0,000000000001 10-12 pico p
0,000000000000001 10-15 femto f
0,000000000000000001 10-18 atto a
0,000000000000000000001 10-21 zepto z
0,000000000000000000000001 10-24 yocto y

Logo após o Big Bang

O telescópio espacial Hubble nunca tinha ido tão longe. Astrônomos da NASA divulgaram, no dia 9 de março de 2004, uma fotografia das primeiras galáxias da história do cosmos.


Imagem captada pelo Hubble
e divulgada pela NASA

Durante quatro meses (entre setembro de 2003 e janeiro de 2004), o Hubble ficou direcionado para um ponto fixo do céu, na direção da constelação de Fornax, uma região escura, aparentemente "vazia". Por meio da observação chamada Ultra Deep Field Hubble, os cientistas conseguiram chegar à imagem mais profunda já registrada do Universo. Profundidade, neste caso, significa a maior distância no tempo e no espaço que o ser humano já alcançou.

Aproximadamente 10 mil galáxias aparecem na imagem. Entre elas estão as primeiras galáxias formadas após o Big Bang (explosão que deu origem ao Universo) e a era escura que se seguiu. Enquanto as galáxias "modernas" são todas elípticas ou espirais, as galáxias que surgiram na infância do Universo apresentam formatos e cores os mais diversos. Os cientistas comemoraram a altíssima qualidade da resolução da foto, em que as galáxias antigas aparecem com a mesma nitidez das mais recentes (os pontos avermelhados são as galáxias mais antigas).


Detalhe das galáxias

Segundo os cientistas, a imagem inédita das galáxias-crianças é um registro dos "eventos dramáticos" dos primórdios da história cósmica, quando os astros que conhecemos ainda não haviam surgido e as primeiras galáxias disputavam espaço, em relações e movimentos irregulares.

Isto ocorreu quando o Universo tinha entre 400 e 700 milhões de anos. Hoje calcula-se que a história do cosmos já tenha 13,7 bilhões de anos. Ou seja, a imagem capturada pelo Hubble representa uma viagem de 13 bilhões de anos ao passado.

A imagem acima (obtida, assim como as outras, por meio do Hubble Site), mostra um esquema representativo da História do Universo. Nela podemos ver que os primeiros 400 milhões de anos após o Big Bang foram marcados por uma Era de Radiação, depois pelos "Tempos Escuros" e pelo surgimento das primeiras estrelas e galáxias. A formação das primeiras galáxias durou até cerca de 1 bilhão de anos após o Big Bang, depois do que surgiram as chamadas "galáxias normais", já no "Universo moderno".

Mais uma vez, espaço e tempo caminham de mãos dadas na investigação científica: quanto mais distante queremos ir no espaço, tanto mais distantes estaremos no tempo. Uma viagem rumo ao infinito macrocósmico significa uma viagem pelo tempo, rumo ao passado, ao momento inicial. Que hoje chamamos de Big Bang mas amanhã poderemos descobrir que ele está ainda mais longe. Se é que existe momento inicial.

E aqui poderíamos usar o Paradoxo de Zenão ao contrário: assim como a busca do mínimo não tem fim, por serem o espaço e o tempo sempre divisíveis, a busca do máximo também não pode ter, por serem sempre multiplicáveis. Será?

Mas deixemos de lado as eternas questões irrespondíveis da filosofia e da matemática, para simplesmente nos deliciarmos com mais estes capítulos da fabulosa jornada humana rumo ao saber, onde quer que ele se encontre. No attossegundo onde se movimentam os elétrons ou nos bilhões de anos atrás onde nasceu o Universo, lá está a investigação humana, superando limites.

Publicado em 31 de dezembro de 2005

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