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Independência na ponta da língua

Lorenzo Aldé

Jornalista

A língua é minha pátria
E eu não pátria: tenho mátria
Eu quero frátria
("Língua", Caetano Veloso)
Neste 7 de setembro, loas à Língua Portuguesa do Brasil, pátrio bastião de nossa independência!

Independência, sim! Malgrado os alarmistas alarmados que em tudo veem traição às tradições, a língua é nossa e ninguém tasca! Não carece de ser casta, cheia de não-me-toques, medrosa de promiscuidades exógenas. Língua é pra botar pra fora, papilas gustativas receptivas às novidades, que tudo processam e recriam no caótico cotidiano das ruas, das casas, feiras livres, alarido radiofônico em alto-falantes, discursos de palanque e programas de auditório. Toda tribuna é válida, tudo vale a pena na arena viva do falar e do escrever. Eis a verdadeira independência cultural brasileira: nossa plena liberdade criativa.

A globalização, palavrão mal-ajambrado, está na crista da onda. A revolução da informática invade o linguajar, assombrando seresteiros empertigados, de paletó e gravata-borboleta, com feiuras de dar boot! E eles têm razão: pega mouse essa mania de acoplar ao nosso ágil e sonoro vocabulário durezas de hard disk, engasgos de logoff. Outro dia, no trabalho, uma colega me passou a instrução: "Antes de ir embora, você tem que logofar!". Confesso que tive embrulhos, com vontade de ir lá golfar! Mas a graça inata e instantânea do brasileiro não se deixa abater! O delete é deletério? Pois sim. Mas se o terrível Sr. Logoff pode atormentar nossas noites de insônia, sempre haverá um Mano Browser para nos divertir e mostrar que a língua segue em frente, superior.

A Internet é a rede dos sonhos para quem não se contenta em ficar deitado eternamente em berço esplêndido. No terreno virtual, o Português do Brasil se redescobre. Não bastasse a variedade de sítios (tão mais brejeiro falar assim do que "saite", não?) literários, poéticos, folclóricos, culturais e que tais, há também as páginas pessoais (blogs, em bom português), onde jovens e nem-tão-jovens publicam diariamente um volume incalculável de textos rápidos, criativos e bem-humorados. Com um pouco de disposição para navegar, encontram-se tesouros do cotidiano, escritos em linguagem informal e inovadora. Tanta gente que, sem dispor deste meio, estaria empilhando sua criação na escrivaninha, ou alugando tias chatas, incapazes de identificar talento naqueles tortos jogos de palavras. No aniversário, elas sutilmente presenteariam o sobrinho com um livro do Machado, tentando endireitar o pau que nasceu torto ("Também, com um marido desses... Eu avisei à minha irmã!...").

Lançados ao mundo virtual, esses quase-desistentes escritores se veem de súbito livres para publicar o que bem quiserem, quando bem entenderem, do jeito que preferirem, para quem quiser ler. Leem-se uns aos outros, e começam a ser lidos também pelas mídias tradicionais, que deu até para cooptá-los (se não se pode vencê-los...) e criar seus próprios blogs (os colunistas do jornal O Globo agora têm suas páginas pessoais). Saudável mutação escrevente, que não tem hora nem lugar para terminar!

Mas é injusto colocar os "blogueiros" no mesmo saco, até porque há blogs que são um saco. Fácil identificar: se ao entrar em uma página (no território virtual, metáforas espaciais ganham novos sentidos) vc notar q estão faltando letras d+, ou achar q o autor tc em um código qq... logofe já!, delete-o da sua memória rã! São os preguiçosos monossilábicos que ainda não se deram conta da potência do veículo que têm em mãos. Tirando esses e os diários "menininhas" (com direito a visual papel-de-carta-cor-de-rosa), o restante é um saco de gatos. E isto é ótimo: há os mais críticos e intelectualizados, há os abertamente gozadores, há os que comentam o noticiário com bom humor, há os iconoclastas e subversivos (ah, se houvesse Internet na ditadura, pobre DOPS), há os despretensiosos, leves e poéticos.

Sobretudo, o que há é inteligência e bom humor, armas letais contra armaduras linguísticas.

Este é o principal mote para as comemorações de independência da nossa língua: uma nova mídia se criou, capaz de interagir com todas as outras e reinventá-las. Apesar de nascida em solo estrangeiro (no município de Website, província de Link), a Internéti já se naturalizou e hoje defende o lindo pendão da esperança e o símbolo augusto da paz!

Jovem: você que está prestes a completar 18 anos, aliste-se no blog mais próximo. Avante, exército de anônimos! A esperança do Brasil está na ponta de suas mãos!

Soltando a língua

O Portal selecionou e publica (em regime de copyleft) três textos descobertos na Internet que experimentam os prazeres da Língua Portuguesa do Brasil:

  • Disk-pizza@moça - Comentários sobre expressões que saíram de moda e a linguagem da Internet. De Rejane Comum, retirado do blog Os Comuns
  • Soltando os bichos - Brincadeira com ditados que incluem nomes de animais. De Luiz Henrique Gomes Patriota, retirado do site Usina de Letras
  • Amor gramatical - Tudo pode acontecer quando um subtantivo e um artigo feminino ficam presos no elevador. Conto anônimo, recebido por e-mail.

Os dois blogs abaixo também merecem uma visita:

  1. Homem-Chavão - Com humor, dedica-se a identificar chavões, trocadilhos e lugares-comuns na mídia e no cotidiano.
  2. Blog de Português do Colégio Equipe (Recife-PE) - Um bom exemplo de como as escolas podem criar blogs para publicar os trabalhos de seus alunos.

Publicado em 31 de dezembro de 2005

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